Por Valter Pomar, em seu blog:
Treze observações sobre classes, sobre o governo e sobre o PT.
Classes
Acho que o principal nó do debate (deste, dos anteriores e dos próximos) está na análise que cada um de nós faz acerca da estrutura de classes no Brasil, em especial acerca do comportamento da burguesia no seu conjunto e de frações dela.
Minha opinião é a seguinte:
1) no âmbito da burguesia (proprietários de meios de produção que empregam predominantemente trabalho assalariado) existem distintas frações;
2) a fração hegemônica é um consórcio financeiro-transnacional. Esta fração tolerou a presença do PT na presidência enquanto isto não afetou sua rentabilidade, o que começou a ocorrer a partir da crise de 2007, especialmente depois que a marolinha virou tsunami e -- apesar disto e para enfrentar isto -- o governo petista não adotou política de ajuste recessivo;
3) as frações hegemonizadas da burguesia (especialmente aquelas voltadas ao mercado interno) toleraram e alguns setores até apoiaram a presença do PT na presidência, enquanto a fração hegemônica não puxou as rédeas. Se o governo tivesse enfrentado e imposto derrotas à fração hegemônica, esta digamos burguesia média poderia ser colocada sob hegemonia da classe trabalhadora. Mas como o governo em geral não enfrentou e, quando enfrentou, não derrotou a fração hegemônica, a burguesia média segue do lado de lá e militante contra o PT. Pois se não são os ricos que vão pagar a conta do ajuste, só há duas alternativas: os trabalhadores ou os setores médios;
4) portanto, é também em defesa de seus interesses imediatos que a média burguesia se soma às manifestações;
5) nunca chegou a existir uma frente desenvolvimentista ou neo-desenvolvimentista. Existiram pessoas ou grupos que falaram disto. Mas a existência de uma frente -- no sentido de bloco histórico -- dependeria do PT e do governo ter operado no sentido de enfrentar e derrotar a fração hegemônica. Como isto até agora não ocorreu, a tal frente nunca saiu dos sonhos;
6) como o ajuste fiscal poupa (e portanto beneficia) apenas o setor financeiro, alguns deduzem que este setor é "base de apoio" do governo. E desta "teoria" concluem que se o governo abrir mão do ajuste fiscal, ele perde sua única base de apoio e portanto cai. Este raciocínio confunde duas situações disitintas: a) se o governo abre mão do ajuste e não faz nada; b) se o governo abre mão do ajuste fiscal recessivo e adota outro ajuste fiscal, que faça os ricos pagarem a conta. Neste caso, o governo pode até cair, mas cairá tendo o apoio de amplos setores populares;
Governo
7) é totalmente possível ocorrer uma "ressureição" do PT em 2018. E fico sinceramente impressionante como uma geração que se habituou a estudar e a elogiar as reviravoltas aparentemente impossíveis do passado, entre em estado de desânimo por uma situação que, convenhamos, é grave mas (pelo menos ainda) não mais grave que, por exemplo, 1964;
8) agora, só haverá ressurreição se o governo Dilma e o PT mudarem sua rota. Seguramente vem daí o pessimismo que campeia em alguns setores.
9) nossa presidenta tem uma porção que é herdeira do trabalhismo: a mudança pelo alto (a partir do Estado). E quando o Estado não consegue/não pode mais capitanear a mudança, o trabalhismo oscilou entre os extremos do suicídio e da capitulação sem luta;
10) é possível, por algum tempo, derrotar a direita sem a ajuda do governo. Mas é impossível impor à direita uma derrota tática e/ou estratégica se o governo trabalha contra isto. E a verdade é que a linha adotada pelo governo, tanto na economia quanto na política, divide a esquerda e alimenta a direita. É preciso recuar das MPs, propor que os ricos paguem o ajuste, incluir no ministério gente disposta e que saiba enfrentar a direita e dar protagonismo à presidenta da República. Sem isto, a chance de Lula e o PT vencerem em 2018 é quase zero;
11) por isso, trata-se de aumentar a pressão sobre o governo, para tentar empurrá-lo a assumir outra posição. Mas continuará sendo "nosso governo", no sentido de que se ele for derrotado, seremos derrotados juntos. Mais ou menos como a URSS: boa parte da esquerda já não gostava/concordava com os soviéticos nos anos 1980. Mas o fim da URSS em 1991 nos golpeou a todos profundamente;
PT
12) como dirigente do PT desde 1997 até 2013, acho que eu poderia perpetrar uma lista imensa dos motivos pelos quais o PT não está neste momento à altura das suas tarefas e com isto reforçar os argumentos de quem acredita que dificilmente ele será capaz de virar o jogo. Mas o único efeito prático deste tipo de análise seria tornar ainda mais difícil, senão praticamente impossível, evitar uma derrota estratégica nos próximos meses e anos;
13) assim, acho que o ponto de partida não deve ser o que fazer uma vez que o PT não vai cumprir o seu papel. O ponto de partida deve ser o que se pode fazer que possa contribuir para que o PT cumpra um papel positivo nesta conjuntura. Lembro, para reforçar meu raciocínio, que o ato do dia 13 não ocorreria sem a CUT. E a CUT é dirigida pelo mesmo setor que dirige o PT. Logo, há condições de virar o jogo.
Treze observações sobre classes, sobre o governo e sobre o PT.
Classes
Acho que o principal nó do debate (deste, dos anteriores e dos próximos) está na análise que cada um de nós faz acerca da estrutura de classes no Brasil, em especial acerca do comportamento da burguesia no seu conjunto e de frações dela.
Minha opinião é a seguinte:
1) no âmbito da burguesia (proprietários de meios de produção que empregam predominantemente trabalho assalariado) existem distintas frações;
2) a fração hegemônica é um consórcio financeiro-transnacional. Esta fração tolerou a presença do PT na presidência enquanto isto não afetou sua rentabilidade, o que começou a ocorrer a partir da crise de 2007, especialmente depois que a marolinha virou tsunami e -- apesar disto e para enfrentar isto -- o governo petista não adotou política de ajuste recessivo;
3) as frações hegemonizadas da burguesia (especialmente aquelas voltadas ao mercado interno) toleraram e alguns setores até apoiaram a presença do PT na presidência, enquanto a fração hegemônica não puxou as rédeas. Se o governo tivesse enfrentado e imposto derrotas à fração hegemônica, esta digamos burguesia média poderia ser colocada sob hegemonia da classe trabalhadora. Mas como o governo em geral não enfrentou e, quando enfrentou, não derrotou a fração hegemônica, a burguesia média segue do lado de lá e militante contra o PT. Pois se não são os ricos que vão pagar a conta do ajuste, só há duas alternativas: os trabalhadores ou os setores médios;
4) portanto, é também em defesa de seus interesses imediatos que a média burguesia se soma às manifestações;
5) nunca chegou a existir uma frente desenvolvimentista ou neo-desenvolvimentista. Existiram pessoas ou grupos que falaram disto. Mas a existência de uma frente -- no sentido de bloco histórico -- dependeria do PT e do governo ter operado no sentido de enfrentar e derrotar a fração hegemônica. Como isto até agora não ocorreu, a tal frente nunca saiu dos sonhos;
6) como o ajuste fiscal poupa (e portanto beneficia) apenas o setor financeiro, alguns deduzem que este setor é "base de apoio" do governo. E desta "teoria" concluem que se o governo abrir mão do ajuste fiscal, ele perde sua única base de apoio e portanto cai. Este raciocínio confunde duas situações disitintas: a) se o governo abre mão do ajuste e não faz nada; b) se o governo abre mão do ajuste fiscal recessivo e adota outro ajuste fiscal, que faça os ricos pagarem a conta. Neste caso, o governo pode até cair, mas cairá tendo o apoio de amplos setores populares;
Governo
7) é totalmente possível ocorrer uma "ressureição" do PT em 2018. E fico sinceramente impressionante como uma geração que se habituou a estudar e a elogiar as reviravoltas aparentemente impossíveis do passado, entre em estado de desânimo por uma situação que, convenhamos, é grave mas (pelo menos ainda) não mais grave que, por exemplo, 1964;
8) agora, só haverá ressurreição se o governo Dilma e o PT mudarem sua rota. Seguramente vem daí o pessimismo que campeia em alguns setores.
9) nossa presidenta tem uma porção que é herdeira do trabalhismo: a mudança pelo alto (a partir do Estado). E quando o Estado não consegue/não pode mais capitanear a mudança, o trabalhismo oscilou entre os extremos do suicídio e da capitulação sem luta;
10) é possível, por algum tempo, derrotar a direita sem a ajuda do governo. Mas é impossível impor à direita uma derrota tática e/ou estratégica se o governo trabalha contra isto. E a verdade é que a linha adotada pelo governo, tanto na economia quanto na política, divide a esquerda e alimenta a direita. É preciso recuar das MPs, propor que os ricos paguem o ajuste, incluir no ministério gente disposta e que saiba enfrentar a direita e dar protagonismo à presidenta da República. Sem isto, a chance de Lula e o PT vencerem em 2018 é quase zero;
11) por isso, trata-se de aumentar a pressão sobre o governo, para tentar empurrá-lo a assumir outra posição. Mas continuará sendo "nosso governo", no sentido de que se ele for derrotado, seremos derrotados juntos. Mais ou menos como a URSS: boa parte da esquerda já não gostava/concordava com os soviéticos nos anos 1980. Mas o fim da URSS em 1991 nos golpeou a todos profundamente;
PT
12) como dirigente do PT desde 1997 até 2013, acho que eu poderia perpetrar uma lista imensa dos motivos pelos quais o PT não está neste momento à altura das suas tarefas e com isto reforçar os argumentos de quem acredita que dificilmente ele será capaz de virar o jogo. Mas o único efeito prático deste tipo de análise seria tornar ainda mais difícil, senão praticamente impossível, evitar uma derrota estratégica nos próximos meses e anos;
13) assim, acho que o ponto de partida não deve ser o que fazer uma vez que o PT não vai cumprir o seu papel. O ponto de partida deve ser o que se pode fazer que possa contribuir para que o PT cumpra um papel positivo nesta conjuntura. Lembro, para reforçar meu raciocínio, que o ato do dia 13 não ocorreria sem a CUT. E a CUT é dirigida pelo mesmo setor que dirige o PT. Logo, há condições de virar o jogo.
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