Da Revista do Brasil:
Um antigo hábito da política estabelece certa "trégua" aos governantes em seus 100 primeiros dias de gestão. No caso de Dilma Rousseff, que chega a essa marca em 10 de abril, não houve calmaria. Uma combinação de erros de gestão, medidas impopulares, situação econômica difícil e sanha oposicionista, ainda com inconformismo pela derrota eleitoral, deixou o governo na defensiva. No final do mês passado, o Planalto anunciou medidas de combate à corrupção e acenou com diálogo, mas ainda enfrenta impopularidade e uma reação turbulenta com o Congresso. Fora e dentro do governo, a avaliação é de que o Executivo terá de se comunicar melhor e ouvir mais.
"No momento, qualquer coisa que o governo faça é ruim. O governo não está pautando a discussão, é uma reação. Perdeu a hora de sair a público", diz o filósofo Renato Janine Ribeiro, professor titular de Ética e Filosofia Política na Universidade de São Paulo (USP). Por outro lado, acrescenta, até por esse motivo não custa nada tomar iniciativas. "Se tiver sangue-frio e souber fazer nos meios adequados, adequar crítica, calúnia, aí tem boa chance de recompor", avalia.
Cabe ao Executivo reorganizar seu diálogo com a população, afirma Janine. E ter paciência. "Rearticular a comunicação, mas não é chamando um marqueteiro. O governo tem de ter a convicção interna de que tem de prestar contas à sociedade. Vai ter de insistir muito nisso. Não falando, não justificando, ela (Dilma) deu espaço para crescer um descontentamento, absolutamente descontrolado."
Um antigo hábito da política estabelece certa "trégua" aos governantes em seus 100 primeiros dias de gestão. No caso de Dilma Rousseff, que chega a essa marca em 10 de abril, não houve calmaria. Uma combinação de erros de gestão, medidas impopulares, situação econômica difícil e sanha oposicionista, ainda com inconformismo pela derrota eleitoral, deixou o governo na defensiva. No final do mês passado, o Planalto anunciou medidas de combate à corrupção e acenou com diálogo, mas ainda enfrenta impopularidade e uma reação turbulenta com o Congresso. Fora e dentro do governo, a avaliação é de que o Executivo terá de se comunicar melhor e ouvir mais.
"No momento, qualquer coisa que o governo faça é ruim. O governo não está pautando a discussão, é uma reação. Perdeu a hora de sair a público", diz o filósofo Renato Janine Ribeiro, professor titular de Ética e Filosofia Política na Universidade de São Paulo (USP). Por outro lado, acrescenta, até por esse motivo não custa nada tomar iniciativas. "Se tiver sangue-frio e souber fazer nos meios adequados, adequar crítica, calúnia, aí tem boa chance de recompor", avalia.
Cabe ao Executivo reorganizar seu diálogo com a população, afirma Janine. E ter paciência. "Rearticular a comunicação, mas não é chamando um marqueteiro. O governo tem de ter a convicção interna de que tem de prestar contas à sociedade. Vai ter de insistir muito nisso. Não falando, não justificando, ela (Dilma) deu espaço para crescer um descontentamento, absolutamente descontrolado."
Ódio
As manifestações de março contra o governo tinham e têm motivações legítimas, mas incluíram uma carga extra de raiva. O que levou a jornalista Laura Capriglione a questionar: "O que leva pessoas educadas, profissionalmente bem colocadas, gentis no trato pessoal, a comparecer a um ato público contra a corrupção e para lá levar cartazes, faixas e rimas podres de cunho sexista e de ódio contra a presidente Dilma Rousseff?"
Ela faz referência ainda a uma "indecorosa" camiseta com estampa de uma mão com quatro dedos, vestida, entre outras pessoas, por Ana Eliza Setúbal, mulher de Paulo Setúbal, da família controladora do banco Itaú. "Teve grosserias para todos os gostos e estômagos."
O cientista político André Singer, em entrevista à Rede Brasil Atual, chamou a atenção para a importância da mídia nesse processo. "Há um papel fiscalizador da mídia, apesar de todos os defeitos que ela possa ter, que é imprescindível. Tem que existir, e a democracia tem que ser forte o suficiente para enfrentar as denúncias, quando elas têm fundamento. Por outro lado, existe a questão de que a grande mídia tem uma tendência ideológica legítima, porém real, para posições mais conservadoras. Essa tendência tem que ser respeitada, mas, ao mesmo tempo, tem que ser notada. É preciso que o jornalismo perceba que pode causar um dano importante se dissolver instituições das quais a democracia brasileira necessita", afirma, citando o PT, alvo dos protestos. "Não há interesse em dissolver o PT, nem o PSDB e diria, nem o PMDB, que são os três maiores partidos da democracia brasileira. É importante que o jornalismo se dê conta de que é preciso separar o joio do trigo."
Assim, ele identifica riscos originados pelo "ódio" constatado em algumas manifestações. "Não vejo, do lado dos que estão no campo do PT, um ódio equivalente ao PSDB, nem nunca vi. Havia, e há, divergências. Se o PSDB voltar ao governo, suponho que o PT vai fazer uma oposição dura, como o PSDB faz. Isso é da natureza da democracia. Uma coisa é oposição dura, outra é você querer eliminar o adversário do campo. Vejo que, às vezes, há certa tendência a alimentar um ódio político que é malsão, que não é saudável para a democracia brasileira", diz Singer.
Observadores de mídia e analistas viram na cobertura da Globo um estímulo à participação no 15 de março, contra o governo. O jornalista Rodrigo Vianna, do blog Escrevinhador, escreveu que a emissora usou "o seu poder de agitação" para chamar a manifestação. "A Globo foi a central de operações do dia 15." Para ele, foi um "Diretas já às avessas", para insuflar a população conta Dilma. Em 1º de abril, haveria uma manifestação para lembrar os 50 anos da Globo, com a avaliação de que a emissora foi beneficiada pela ditadura.
Ainda no terreno midiático, março reservaria um episódio curioso. A agência britânica Reuters publicou no dia 23 uma entrevista com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que trazia críticas ao seu sucessor, o também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o texto incluía uma referência negativa a FHC, seguida de uma observação, em parênteses: "Podemos tirar, se achar melhor". O comentário indicava a possibilidade de ser suprimido justamente um trecho sobre corrupção no governo tucano. A Reuters disse que a frase foi publicada "inadvertidamente" e posteriormente retirada, lamentando "qualquer confusão causada pelo engano".
As manifestações de março contra o governo tinham e têm motivações legítimas, mas incluíram uma carga extra de raiva. O que levou a jornalista Laura Capriglione a questionar: "O que leva pessoas educadas, profissionalmente bem colocadas, gentis no trato pessoal, a comparecer a um ato público contra a corrupção e para lá levar cartazes, faixas e rimas podres de cunho sexista e de ódio contra a presidente Dilma Rousseff?"
Ela faz referência ainda a uma "indecorosa" camiseta com estampa de uma mão com quatro dedos, vestida, entre outras pessoas, por Ana Eliza Setúbal, mulher de Paulo Setúbal, da família controladora do banco Itaú. "Teve grosserias para todos os gostos e estômagos."
O cientista político André Singer, em entrevista à Rede Brasil Atual, chamou a atenção para a importância da mídia nesse processo. "Há um papel fiscalizador da mídia, apesar de todos os defeitos que ela possa ter, que é imprescindível. Tem que existir, e a democracia tem que ser forte o suficiente para enfrentar as denúncias, quando elas têm fundamento. Por outro lado, existe a questão de que a grande mídia tem uma tendência ideológica legítima, porém real, para posições mais conservadoras. Essa tendência tem que ser respeitada, mas, ao mesmo tempo, tem que ser notada. É preciso que o jornalismo perceba que pode causar um dano importante se dissolver instituições das quais a democracia brasileira necessita", afirma, citando o PT, alvo dos protestos. "Não há interesse em dissolver o PT, nem o PSDB e diria, nem o PMDB, que são os três maiores partidos da democracia brasileira. É importante que o jornalismo se dê conta de que é preciso separar o joio do trigo."
Assim, ele identifica riscos originados pelo "ódio" constatado em algumas manifestações. "Não vejo, do lado dos que estão no campo do PT, um ódio equivalente ao PSDB, nem nunca vi. Havia, e há, divergências. Se o PSDB voltar ao governo, suponho que o PT vai fazer uma oposição dura, como o PSDB faz. Isso é da natureza da democracia. Uma coisa é oposição dura, outra é você querer eliminar o adversário do campo. Vejo que, às vezes, há certa tendência a alimentar um ódio político que é malsão, que não é saudável para a democracia brasileira", diz Singer.
Observadores de mídia e analistas viram na cobertura da Globo um estímulo à participação no 15 de março, contra o governo. O jornalista Rodrigo Vianna, do blog Escrevinhador, escreveu que a emissora usou "o seu poder de agitação" para chamar a manifestação. "A Globo foi a central de operações do dia 15." Para ele, foi um "Diretas já às avessas", para insuflar a população conta Dilma. Em 1º de abril, haveria uma manifestação para lembrar os 50 anos da Globo, com a avaliação de que a emissora foi beneficiada pela ditadura.
Ainda no terreno midiático, março reservaria um episódio curioso. A agência britânica Reuters publicou no dia 23 uma entrevista com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que trazia críticas ao seu sucessor, o também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o texto incluía uma referência negativa a FHC, seguida de uma observação, em parênteses: "Podemos tirar, se achar melhor". O comentário indicava a possibilidade de ser suprimido justamente um trecho sobre corrupção no governo tucano. A Reuters disse que a frase foi publicada "inadvertidamente" e posteriormente retirada, lamentando "qualquer confusão causada pelo engano".
Sem diálogo
Mais uma vez, as redes sociais foram cenário de confrontos. Até a cantora Pitty sofreu ataques, ao escrever: "Pressionar qualquer governo por melhorias sim, marchar ao lado de extremistas de direita, fanáticos religiosos e saudosos da ditadura JAMÉ". Lembrou que não defendia o PT e disse ter recebido "um jogo de ódio irracional", "diálogo zero, só ofensas preconceituosas". Um internauta sugeriu que ela "voltasse para a cozinha" após "terminar o mimimi". Ela respondeu: "Pois eu não volto pra cozinha, nem o negro pra senzala, nem o gay pro armário. O choro é livre (e nós também)".
Insuspeito, o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira (governo FHC), em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, identificou um fenômeno que ele chama de "ódio coletivo da classe alta, dos ricos, contra um partido e uma presidente". Para o economista, esse ódio "decorre do fato de que o governo revelou uma preferência forte e clara pelos trabalhadores e pelos pobres". Na visão de Bresser-Pereira, Dilma teria chamado Joaquim Levy para a Fazenda por questão de sobrevivência. "Ela tinha perdido o apoio na sociedade, formada por quem tem poder. A divisão que ocorreu nos dois últimos anos foi violenta."
Defensor de um "pacto desenvolvimentista que una trabalhadores, empresários do setor produtivo, burocracia pública e amplos setores da baixa classe média", Bresser-Pereira não vê espaço para iniciativas relacionadas a impeachment. "A democracia está consolidada e todos ganham com ela, ricos e pobres. O Brasil só se desenvolve quando tem uma estratégia nacional de desenvolvimento", afirma.
Mais uma vez, as redes sociais foram cenário de confrontos. Até a cantora Pitty sofreu ataques, ao escrever: "Pressionar qualquer governo por melhorias sim, marchar ao lado de extremistas de direita, fanáticos religiosos e saudosos da ditadura JAMÉ". Lembrou que não defendia o PT e disse ter recebido "um jogo de ódio irracional", "diálogo zero, só ofensas preconceituosas". Um internauta sugeriu que ela "voltasse para a cozinha" após "terminar o mimimi". Ela respondeu: "Pois eu não volto pra cozinha, nem o negro pra senzala, nem o gay pro armário. O choro é livre (e nós também)".
Insuspeito, o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira (governo FHC), em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, identificou um fenômeno que ele chama de "ódio coletivo da classe alta, dos ricos, contra um partido e uma presidente". Para o economista, esse ódio "decorre do fato de que o governo revelou uma preferência forte e clara pelos trabalhadores e pelos pobres". Na visão de Bresser-Pereira, Dilma teria chamado Joaquim Levy para a Fazenda por questão de sobrevivência. "Ela tinha perdido o apoio na sociedade, formada por quem tem poder. A divisão que ocorreu nos dois últimos anos foi violenta."
Defensor de um "pacto desenvolvimentista que una trabalhadores, empresários do setor produtivo, burocracia pública e amplos setores da baixa classe média", Bresser-Pereira não vê espaço para iniciativas relacionadas a impeachment. "A democracia está consolidada e todos ganham com ela, ricos e pobres. O Brasil só se desenvolve quando tem uma estratégia nacional de desenvolvimento", afirma.
Indignação
Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), há agravante em relação aos protestos de 2013, quando, segundo ele, muitos foram as ruas na condição de eleitor, contribuinte, usuário de serviço público e consumidor. "Mas ele não se se manifestou como assalariado, porque o emprego e a renda estavam crescendo. Ele continua indignado, agora como assalariado."
Dois anos atrás, o governo tinha margem fiscal para fazer concessões ao empresariado e condições de investir. "O quadro é muito mais dramático do que naquela ocasião. O ajuste tem de passar, mas não escolhendo só o trabalhador para pagar essa conta’, diz o diretor do Diap, que vê o governo, neste momento, "na retranca". Também para ele, faltou comunicação e clareza para mostrar que o país passaria por um momento difícil. "Terminada a campanha, tinha de ir preparando o terreno."
Os primeiros problemas vieram com a decisão de editar medidas provisórias restringindo acesso a direitos trabalhistas e previdenciários, ainda no final do ano passado. Impopulares por si, as MPs, agora em discussão no Congresso, onde devem sofrer alterações, foram anunciadas sem qualquer discussão prévia com as centrais sindicais. A reação foi ainda pior porque parte dos dirigentes apoiou a reeleição da presidenta. Diante da resistência generalizada, o governo acena, embora ainda não tenha apresentado propostas, com medidas como a taxação sobre grandes fortunas . Também cedeu parcialmente no imbróglio sobre a correção da tabela do Imposto de Renda e garantiu a renovação, até 2019, da política de renovação do salário mínimo.
À questão social, vieram se somar as implicações da Operação Lava Jato, que atinge uma empresa-chave da economia brasileira. Por esse motivo, centrais e movimentos sociais que saíram às ruas em março defendiam a continuação das investigações e punição de envolvidos no escândalo, mas de forma a preservar as atividades da Petrobras e de empresas que atuam no setor.
A corrupção é um problema que atinge não apenas um partido e se espalha pela sociedade, lembra Janine. "O problema é que agora está no campo da esquerda." Mesmo assim, ele avalia que há um espaço para começar a mudar essa situação, desde que com um discurso sincero. "A batalha não está perdida", diz o filósofo. "Para quem elegeu a Dilma e para quem se preocupa com o bem do Brasil, a questão é esse mandato ir até o fim com um governo bom, uma gestão de qualidade."
Janine ressalta a importância, especialmente neste momento, de falar com franqueza e mostrar uma boa gestão. "Nenhum governo cumpre tudo o que gostaria de cumprir ou o que prometeu. A questão é como se explica", observa o professor. Para ele, embora "a bola da vez" possa ser o PT, as críticas e protestos se estendem aos partidos de oposição e ao Congresso.
Mas ele também considera que nos últimos anos houve melhorias institucionais no combate à corrupção. "Do ponto de vista prático, o PT municiou a Polícia Federal, pôs no Supremo juízes independentes. São dados que não vêm a público. Acho que o PT fez uma grande obra ética, que é a redução da miséria, que não é vista como um insulto ético." Falhou, em sua visão, ao concentrar a inclusão social pelo ângulo do consumo. "Virou uma coisa de fôlego curto."
O jornalista Janio de Freitas, articulista da Folha, vê sinais de "golpismo" no comportamento da oposição, ao mostrar "exibida indignação" com práticas do governo opostas ao discurso de campanha. "É só falsidade. Oposição honesta, se não for imbecil, não tem como não estar satisfeita com a adoção de política econômica e medidas antissociais que são autenticamente suas, e de sua conveniência. E satisfeita ainda com a derrota final dos que a repudiaram nas urnas. Um só motivo para tanta indignação exibida: golpismo", escreveu em sua coluna na edição de 22 de março. "As negativas de adoção do golpismo feitas pelos oposicionistas vociferantes são apenas falsidade política."
Para a CUT, houve em 15 de março manipulação do "legítimo apelo popular de combate à corrupção", particularmente em São Paulo. Isso permitiu que surgissem propostas antidemocráticas, "que todos os setores comprometidos com a sociedade devem combater". Ao mesmo tempo em que admite descontentamento na sociedade, a central alerta para a importância de evitar manobras que busquem o retrocesso político. As entidades sindicais insistem em um ponto: o governo deve ouvir mais os movimentos sociais e apresentar medidas na direção da retomada do crescimento, mantendo políticas de distribuição de renda. A voz das ruas, mas sem desvios de rota na democracia.
Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), há agravante em relação aos protestos de 2013, quando, segundo ele, muitos foram as ruas na condição de eleitor, contribuinte, usuário de serviço público e consumidor. "Mas ele não se se manifestou como assalariado, porque o emprego e a renda estavam crescendo. Ele continua indignado, agora como assalariado."
Dois anos atrás, o governo tinha margem fiscal para fazer concessões ao empresariado e condições de investir. "O quadro é muito mais dramático do que naquela ocasião. O ajuste tem de passar, mas não escolhendo só o trabalhador para pagar essa conta’, diz o diretor do Diap, que vê o governo, neste momento, "na retranca". Também para ele, faltou comunicação e clareza para mostrar que o país passaria por um momento difícil. "Terminada a campanha, tinha de ir preparando o terreno."
Os primeiros problemas vieram com a decisão de editar medidas provisórias restringindo acesso a direitos trabalhistas e previdenciários, ainda no final do ano passado. Impopulares por si, as MPs, agora em discussão no Congresso, onde devem sofrer alterações, foram anunciadas sem qualquer discussão prévia com as centrais sindicais. A reação foi ainda pior porque parte dos dirigentes apoiou a reeleição da presidenta. Diante da resistência generalizada, o governo acena, embora ainda não tenha apresentado propostas, com medidas como a taxação sobre grandes fortunas . Também cedeu parcialmente no imbróglio sobre a correção da tabela do Imposto de Renda e garantiu a renovação, até 2019, da política de renovação do salário mínimo.
À questão social, vieram se somar as implicações da Operação Lava Jato, que atinge uma empresa-chave da economia brasileira. Por esse motivo, centrais e movimentos sociais que saíram às ruas em março defendiam a continuação das investigações e punição de envolvidos no escândalo, mas de forma a preservar as atividades da Petrobras e de empresas que atuam no setor.
A corrupção é um problema que atinge não apenas um partido e se espalha pela sociedade, lembra Janine. "O problema é que agora está no campo da esquerda." Mesmo assim, ele avalia que há um espaço para começar a mudar essa situação, desde que com um discurso sincero. "A batalha não está perdida", diz o filósofo. "Para quem elegeu a Dilma e para quem se preocupa com o bem do Brasil, a questão é esse mandato ir até o fim com um governo bom, uma gestão de qualidade."
Janine ressalta a importância, especialmente neste momento, de falar com franqueza e mostrar uma boa gestão. "Nenhum governo cumpre tudo o que gostaria de cumprir ou o que prometeu. A questão é como se explica", observa o professor. Para ele, embora "a bola da vez" possa ser o PT, as críticas e protestos se estendem aos partidos de oposição e ao Congresso.
Mas ele também considera que nos últimos anos houve melhorias institucionais no combate à corrupção. "Do ponto de vista prático, o PT municiou a Polícia Federal, pôs no Supremo juízes independentes. São dados que não vêm a público. Acho que o PT fez uma grande obra ética, que é a redução da miséria, que não é vista como um insulto ético." Falhou, em sua visão, ao concentrar a inclusão social pelo ângulo do consumo. "Virou uma coisa de fôlego curto."
O jornalista Janio de Freitas, articulista da Folha, vê sinais de "golpismo" no comportamento da oposição, ao mostrar "exibida indignação" com práticas do governo opostas ao discurso de campanha. "É só falsidade. Oposição honesta, se não for imbecil, não tem como não estar satisfeita com a adoção de política econômica e medidas antissociais que são autenticamente suas, e de sua conveniência. E satisfeita ainda com a derrota final dos que a repudiaram nas urnas. Um só motivo para tanta indignação exibida: golpismo", escreveu em sua coluna na edição de 22 de março. "As negativas de adoção do golpismo feitas pelos oposicionistas vociferantes são apenas falsidade política."
Para a CUT, houve em 15 de março manipulação do "legítimo apelo popular de combate à corrupção", particularmente em São Paulo. Isso permitiu que surgissem propostas antidemocráticas, "que todos os setores comprometidos com a sociedade devem combater". Ao mesmo tempo em que admite descontentamento na sociedade, a central alerta para a importância de evitar manobras que busquem o retrocesso político. As entidades sindicais insistem em um ponto: o governo deve ouvir mais os movimentos sociais e apresentar medidas na direção da retomada do crescimento, mantendo políticas de distribuição de renda. A voz das ruas, mas sem desvios de rota na democracia.
Reforma política sim, mas qual?
O tema da reforma política voltou à baila em março, defendida principalmente pelos movimentos sociais. A questão é qual reforma. "Chegou a hora de vencer as escaramuças dos interesses sombrios e renovar a democracia brasileira. A crise que se aprofunda não é meramente econômica. Ela é, sobretudo, política", afirma a articulista Maria Inês Nassif, em artigo na Carta Maior que lembra os 30 anos do fim da ditadura brasileira. Ela defende uma proposta de reforma que una "as forças progressistas" e seja "capaz de salvar a política do cativeiro a que foi jogada pelo poder econômico".
Esse é um ponto crucial para o bispo de Jales (SP), dom Luiz Demétrio Valentini, integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. "Com tantos episódios, envolvendo grandes empresas, ficou evidenciado o vínculo da corrupção com as doações de empresas para financiar campanhas eleitorais", escreveu em artigo publicado na página da Conferência Nacional dos Bispos do Brasi (CNBB). Mas ele também chama a atenção para ameaças conservadores. "Tanto mais, como cidadãos herdeiros de uma lição histórica, que ainda serve de advertência, precisamos estar atentos a possíveis manobras golpistas. Não podemos repetir a experiência de 64, que levou para a ditadura, da qual saímos a duras penas depois de vinte anos, e dela ainda restam alguns resíduos tóxicos."
A Fundação Ulysses Guimarães, vinculada ao PMDB, apresentou proposta que inclui fim da reeleição, mandato de cinco anos e manutenção do financiamento privado, mas incluindo também modalidade pública. "Temos a obrigação de não falharmos neste momento", declarou o vice-presidente da República, Michel Temer, ressaltando que "o Congresso é o senhor absoluto dessa matéria".
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Dias Toffoli, defende uma cláusula de barreira, a fim de limitar o número de partidos políticos. Atualmente, existem 32 registrados, e 28 têm representação no Congresso, seis a mais do que na legislatura anterior. "É mais fácil criar um partido do que apresentar um projeto de iniciativa popular", afirmou, durante debate. Ele também é favorável à fixação de um teto de gastos para campanhas eleitorais, incluindo um limite nominal por parte das empresas. "A democracia no Brasil é sustentada por grupos empresariais."
"Não será uma tarefa fácil promover uma reforma política moralizadora, que valorize os partidos e aproxime os representantes dos representados", alerta Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Diap. "A falta de educação política e os custos da participação só serão superados com mudança cultural dos eleitores e principalmente das lideranças políticas e partidárias. Enquanto as pessoas não souberem o que são, para que servem, o que fazem e como funcionam as instituições, não haverá representação política autência, com participação e controle político e social. As escolas, os partidos, a imprensa, ninguém cuida desse aspecto", acrescenta o analista, defendendo a importância de os eleitores se informarem sobre o papel das instituições.
Por enquanto, o professor Renato Janine Ribeiro vê mais palavreado em torno do tema. Ele vê uma "forte chance de ser uma coisa muito acessória, que atenda a interesses paroquiais". "O PT defende o financiamento público, o Temer apresentou uma proposta mais elaborada e com mais suporte político, o Cunha (o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB-RJ) a gente nem sabe qual é a proposta direito, os tucanos falam em voto distrital."
Cunha já afirmou que a reforma será votada até o final de maio. A Casa criou uma comissão especial sobre o tema. Enquanto isso, movimentos sociais insistem em uma campanha por uma Constituinte exclusiva para mudança do sistema político e na defesa do fim do financiamento privado de campanhas.
A respeito desse tema, se aguarda com expectativa que o Supremo Tribunal Federal retome o julgamento de uma ação direta de inconstitucionalidade, impetrada pela Ordem dos Advogados do Brasil. O julgamento começou há mais de um ano. Já teve seis votos a favor da ação. E foi interrompida em abril do ano passado, quando o ministro Gilmar Mendes pediu vista. A demora fez nascer um movimento, nas redes, denominado "devolve, Gilmar".
O tema da reforma política voltou à baila em março, defendida principalmente pelos movimentos sociais. A questão é qual reforma. "Chegou a hora de vencer as escaramuças dos interesses sombrios e renovar a democracia brasileira. A crise que se aprofunda não é meramente econômica. Ela é, sobretudo, política", afirma a articulista Maria Inês Nassif, em artigo na Carta Maior que lembra os 30 anos do fim da ditadura brasileira. Ela defende uma proposta de reforma que una "as forças progressistas" e seja "capaz de salvar a política do cativeiro a que foi jogada pelo poder econômico".
Esse é um ponto crucial para o bispo de Jales (SP), dom Luiz Demétrio Valentini, integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. "Com tantos episódios, envolvendo grandes empresas, ficou evidenciado o vínculo da corrupção com as doações de empresas para financiar campanhas eleitorais", escreveu em artigo publicado na página da Conferência Nacional dos Bispos do Brasi (CNBB). Mas ele também chama a atenção para ameaças conservadores. "Tanto mais, como cidadãos herdeiros de uma lição histórica, que ainda serve de advertência, precisamos estar atentos a possíveis manobras golpistas. Não podemos repetir a experiência de 64, que levou para a ditadura, da qual saímos a duras penas depois de vinte anos, e dela ainda restam alguns resíduos tóxicos."
A Fundação Ulysses Guimarães, vinculada ao PMDB, apresentou proposta que inclui fim da reeleição, mandato de cinco anos e manutenção do financiamento privado, mas incluindo também modalidade pública. "Temos a obrigação de não falharmos neste momento", declarou o vice-presidente da República, Michel Temer, ressaltando que "o Congresso é o senhor absoluto dessa matéria".
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Dias Toffoli, defende uma cláusula de barreira, a fim de limitar o número de partidos políticos. Atualmente, existem 32 registrados, e 28 têm representação no Congresso, seis a mais do que na legislatura anterior. "É mais fácil criar um partido do que apresentar um projeto de iniciativa popular", afirmou, durante debate. Ele também é favorável à fixação de um teto de gastos para campanhas eleitorais, incluindo um limite nominal por parte das empresas. "A democracia no Brasil é sustentada por grupos empresariais."
"Não será uma tarefa fácil promover uma reforma política moralizadora, que valorize os partidos e aproxime os representantes dos representados", alerta Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Diap. "A falta de educação política e os custos da participação só serão superados com mudança cultural dos eleitores e principalmente das lideranças políticas e partidárias. Enquanto as pessoas não souberem o que são, para que servem, o que fazem e como funcionam as instituições, não haverá representação política autência, com participação e controle político e social. As escolas, os partidos, a imprensa, ninguém cuida desse aspecto", acrescenta o analista, defendendo a importância de os eleitores se informarem sobre o papel das instituições.
Por enquanto, o professor Renato Janine Ribeiro vê mais palavreado em torno do tema. Ele vê uma "forte chance de ser uma coisa muito acessória, que atenda a interesses paroquiais". "O PT defende o financiamento público, o Temer apresentou uma proposta mais elaborada e com mais suporte político, o Cunha (o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB-RJ) a gente nem sabe qual é a proposta direito, os tucanos falam em voto distrital."
Cunha já afirmou que a reforma será votada até o final de maio. A Casa criou uma comissão especial sobre o tema. Enquanto isso, movimentos sociais insistem em uma campanha por uma Constituinte exclusiva para mudança do sistema político e na defesa do fim do financiamento privado de campanhas.
A respeito desse tema, se aguarda com expectativa que o Supremo Tribunal Federal retome o julgamento de uma ação direta de inconstitucionalidade, impetrada pela Ordem dos Advogados do Brasil. O julgamento começou há mais de um ano. Já teve seis votos a favor da ação. E foi interrompida em abril do ano passado, quando o ministro Gilmar Mendes pediu vista. A demora fez nascer um movimento, nas redes, denominado "devolve, Gilmar".
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