Por George Monbiot, no site Outras Palavras:
Ninguém. E no entanto, isso acontece. Sete bilhões de seres humanos permitem às empresas petroleiras fechar a porta atmosférica estreita pela qual a humanidade passou. Autorizamos a agricultura industrial a envenenar o solo e eliminar as árvores. Permanecemos calados quando frotas de pesqueiros devastam os oceanos.
Por que somos, os defensores da vida, tão ineficazes? Em parte, é claro, todo mundo é cúmplice. Todos fomos levados pela maré do hiperconsumismo, nossa cobiça natural atiçada, a propaganda das corporações fazendo tabela com o desejo de acreditar que não há custos. Mas talvez o ambientalismo esteja também às voltas com um problema mais grave, que tem origem na vergonha ou no medo – uma falha de honestidade emocional.
Propus, em diversos encontros de pessoas identificadas com o ambientalismo, que erguessem as mãos os que se tornaram defensores da natureza por se preocuparem com a situação de suas contas bancárias. Nunca apareceu uma única mão erguida. Mas vejo que as mesmas pessoas, ao dialogarem com o público, argumentam que é preciso proteger o mundo natural para não enfrentar uma devastação que significaria perder dinheiro.
Tais apelos são pragmáticos, mas também são desonestos: fingimos que este é o motivo que nos anima quando, na maior parte dos casos, não é. A verdade é que cuidamos porque amamos. A natureza nos emocionava quando éramos crianças, muito antes de sensibilizar nossa mente – para não falar do nosso bolso. No entanto, parecemos acreditar que podemos persuadir as pessoas a mudar suas vidas por meio dos poderes mecânicos e frios da razão, apoiados por estatísticas.
Vejo a encíclica do Papa Francisco, que será publicada na quinta-feira, como um possível ponto de mudança. Ele argumentará que não apenas a sobrevivência física dos pobres, mas também a riqueza espiritual, depende da proteção do mundo natural; e está correto, em ambos os pontos.
Não quero dizer que a crença em Deus seja a resposta para nossa crise ambiental. Entre os oponentes do Papa Francisco estão religiosos conservadores – como a Aliança pela Valorização da Criação, sediada nos EUA. Ela enviou carta ao pontífice afirmando o dever sagrado de continuar queimando combustível fóssil, já que “os céus declaram a glória de Deus e o firmamento proclama sua obra”. O texto também insiste que exercer a dominação assegurada à humanidade no Gênesis significa trabalhar “a Terra inteira”, transformando-a “de selva em jardim e, ao final, em cidade ajardinada”.
Quem deseja ver o mundo destruído? Quem quer acabar com o canto das aves, as abelhas, os recifes de coral, o salto do salmão? Quem espera ver os solos devastados pela erosão, ou o mar entulhado de lixo?
Ninguém. E no entanto, isso acontece. Sete bilhões de seres humanos permitem às empresas petroleiras fechar a porta atmosférica estreita pela qual a humanidade passou. Autorizamos a agricultura industrial a envenenar o solo e eliminar as árvores. Permanecemos calados quando frotas de pesqueiros devastam os oceanos.
Por que somos, os defensores da vida, tão ineficazes? Em parte, é claro, todo mundo é cúmplice. Todos fomos levados pela maré do hiperconsumismo, nossa cobiça natural atiçada, a propaganda das corporações fazendo tabela com o desejo de acreditar que não há custos. Mas talvez o ambientalismo esteja também às voltas com um problema mais grave, que tem origem na vergonha ou no medo – uma falha de honestidade emocional.
Propus, em diversos encontros de pessoas identificadas com o ambientalismo, que erguessem as mãos os que se tornaram defensores da natureza por se preocuparem com a situação de suas contas bancárias. Nunca apareceu uma única mão erguida. Mas vejo que as mesmas pessoas, ao dialogarem com o público, argumentam que é preciso proteger o mundo natural para não enfrentar uma devastação que significaria perder dinheiro.
Tais apelos são pragmáticos, mas também são desonestos: fingimos que este é o motivo que nos anima quando, na maior parte dos casos, não é. A verdade é que cuidamos porque amamos. A natureza nos emocionava quando éramos crianças, muito antes de sensibilizar nossa mente – para não falar do nosso bolso. No entanto, parecemos acreditar que podemos persuadir as pessoas a mudar suas vidas por meio dos poderes mecânicos e frios da razão, apoiados por estatísticas.
Vejo a encíclica do Papa Francisco, que será publicada na quinta-feira, como um possível ponto de mudança. Ele argumentará que não apenas a sobrevivência física dos pobres, mas também a riqueza espiritual, depende da proteção do mundo natural; e está correto, em ambos os pontos.
Não quero dizer que a crença em Deus seja a resposta para nossa crise ambiental. Entre os oponentes do Papa Francisco estão religiosos conservadores – como a Aliança pela Valorização da Criação, sediada nos EUA. Ela enviou carta ao pontífice afirmando o dever sagrado de continuar queimando combustível fóssil, já que “os céus declaram a glória de Deus e o firmamento proclama sua obra”. O texto também insiste que exercer a dominação assegurada à humanidade no Gênesis significa trabalhar “a Terra inteira”, transformando-a “de selva em jardim e, ao final, em cidade ajardinada”.
Há tendências similares dentro do próprio Vaticano. O Cardeal George Pell, chefe de finanças da Santa Sé, mergulhado atualmente num escândalo envolvendo padres pedófios na Austrália, é um proeminente negacionista da mudança climática. Sua conferência na Fundação para Políticas sobre Aquecimento Global, reabriu o catálogo usual de mitos zumbis (aquelas alegações desacreditadas, que reemergem de tempos em tempos), declarações de desconfiança na ciência e defesa indisfarçada de baboseiras – por exemplo, a afirmação sem base, segundo a qual vulcões submarinos poderiam ser responsáveis pelo aquecimento global. Há muita gente na hierarquia católica interessada em sabotar a defesa, pelo Papa, do mundo natural – o que poderia explicar por que vazou um rascunho de sua encíclica. Mas quero dizer que o Papa Francisco, um homem de quem discordo profundamente em temas como casamento igualitário e contracepção, está nos lembrando de que a natureza produz não apenas bens materiais e serviços tangíveis, mas é também essencial para outros aspectos do bem-estar. E não é preciso acreditar em Deus para compartilhar este ponto de vista.
Em um ótimo livro, The Moth Snowstorm, Michael McCarthy sugere que a capacidade de amar a natureza, mais do que apenas existir em meio a ela, pode ser uma característica humana única. Ele acredita que somos capazes de desenvolver uma relação emocional com a natureza. Diversas pesquisas sugerem que o contato com o mundo vivo é essencial para nosso bem-estar psíquico e fisiológico. (Um estudo publicado esta semana, afirma, por exemplo, que espaços verdes em torno das escolas urbanas melhoram o desempenho mental das crianças.)
O reconhecimento do amor pelo mundo vivo produz algo para o qual não basta uma biblioteca repleta de papers sobre o desenvolvimento sustentável e os serviços da natureza. Ele engaja a imaginação, tanto quanto o intelecto. Ele inspira confiança, algo essencial para o sucesso duradouro de qualquer movimento.
Isso seria uma tradução das convicções religiosas a partir das quais fala Francisco? Ou esta religião poderia ser uma versão de um amor muito mais profundo e ancestral? A crença em Deus poderia ser um meio de explicar dar sentido à alegria, a brecha de amor que a natureza às vezes provoca? Em contrapartida, o hiperconsumismo que os ambientalistas seculares e religiosos lastimam, não seria o responsável pelo tédio ecológico: o vazio que a perda de contato com o mundo natural deixa em nosso universo psíquico?
É claro que isso não responde o problema como um todo. Se o reconhecimento do amor tornar-se o meio pelo qual inspiramos a consciência ambiental nos outros, será preciso traduzi-lo também em projetos de mudança política. Mas acredito que esta seja uma base maior para a ação do que fingir que o que importa realmente é o estado da economia. Ao sermos honestos sobre o que nos mobiliza, podemos inspirar nos outros as paixões que nos animam.
Em um ótimo livro, The Moth Snowstorm, Michael McCarthy sugere que a capacidade de amar a natureza, mais do que apenas existir em meio a ela, pode ser uma característica humana única. Ele acredita que somos capazes de desenvolver uma relação emocional com a natureza. Diversas pesquisas sugerem que o contato com o mundo vivo é essencial para nosso bem-estar psíquico e fisiológico. (Um estudo publicado esta semana, afirma, por exemplo, que espaços verdes em torno das escolas urbanas melhoram o desempenho mental das crianças.)
O reconhecimento do amor pelo mundo vivo produz algo para o qual não basta uma biblioteca repleta de papers sobre o desenvolvimento sustentável e os serviços da natureza. Ele engaja a imaginação, tanto quanto o intelecto. Ele inspira confiança, algo essencial para o sucesso duradouro de qualquer movimento.
Isso seria uma tradução das convicções religiosas a partir das quais fala Francisco? Ou esta religião poderia ser uma versão de um amor muito mais profundo e ancestral? A crença em Deus poderia ser um meio de explicar dar sentido à alegria, a brecha de amor que a natureza às vezes provoca? Em contrapartida, o hiperconsumismo que os ambientalistas seculares e religiosos lastimam, não seria o responsável pelo tédio ecológico: o vazio que a perda de contato com o mundo natural deixa em nosso universo psíquico?
É claro que isso não responde o problema como um todo. Se o reconhecimento do amor tornar-se o meio pelo qual inspiramos a consciência ambiental nos outros, será preciso traduzi-lo também em projetos de mudança política. Mas acredito que esta seja uma base maior para a ação do que fingir que o que importa realmente é o estado da economia. Ao sermos honestos sobre o que nos mobiliza, podemos inspirar nos outros as paixões que nos animam.
* Tradução de Antonio Martins.
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