O pensamento de que as praias são o espaço mais democrático de qualquer cidade cai por terra a cada investida da visão preconceituosa e militarizada do Estado. Numa ação recente no Rio de Janeiro de espírito segregador, jovens negros e pobres foram retirados à força de um ônibus que partia em direção a uma praia da Zona Sul. Mais um ato patrocinado pelo Governo do Rio que nos enche de vergonha e revolta.
Dos 15 jovens detidos para “averiguação” pela polícia no último final de semana, todos vindos da periferia, nenhum portava armas ou drogas. No Centro Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente, em Laranjeiras, foram amontoados num corredor, esperando a análise de antecedentes criminais à moda do Doi-Codi de 1964.
Para entender a gravidade desse cerco descontrolado que a PM do Rio tem feito, uma conselheira tutelar denunciou à imprensa que o recolhimento de jovens “pretos e pobres” na Zona Sul vem se tornando corriqueiro, numa alusão à limpeza étnica da Alemanha nazista. Na tentativa de combater o crime, o governador Pezão tem mostrado todo o preconceito que ronda sua gestão, rebocando garotos e garotas das favelas da Zona Norte para delegacias, mesmo sem a ocorrência de delitos ou provas de crimes.
Correta a ação da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, que pediu esta semana a abertura de um inquérito na Delegacia da Criança e Adolescente Vítima para apurar a ação dos policiais militares que impediram o acesso desses adolescentes às praias. Com que fundamento estes agentes públicos tomaram a iniciativa de detê-los? Antecedente criminal é crime de caráter perpétuo?
Essa miopia do poder público se revela mais forte e presente quando vamos para além do eixo Copacabana-Leblon. As mortes quase que diárias de inocentes dentro das comunidades carentes por tiros da polícia revelam um cenário de intensa criminalização da pobreza. O lema é: “Varrer o favelado como se varre uma sujeira”.
Devemos repudiar políticas de Segurança como essa, separatistas, intolerantes e preconceituosas. Longe de prevenir crimes, provoca outros, gerando constrangimentos e discriminação públicos. Enfrentar os furtos e roubos nas calçadas ou areias do IPTU mais caro da capital carioca não se faz lotando camburões de jovens inocentes. Esta, nem de longe, deve representar a prática do policiamento ostensivo que tanto clamam os cariocas, mas nunca ocorre.
O Rio perde muito quando a exclusão vem à tona de maneira tão hostil, quando são punidos num belo domingo de sol por causa da cor da pede e condição social aqueles que já nasceram marginalizados pelo estado. O Governo Pezão, pelo que se acompanha, só tem democratizado uma coisa: o preconceito.
* Jandira Feghali é médica, deputada federal (RJ) e líder do PCdoB.
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