segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Dilma erra, mas impeachment é incerto

Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador:

Passada a eleição de 2014, estava claro que o cenário seria de confronto permanente. A vitória apertada e o clima de “libertar o Brasil do PT” (era a frase usada por Aécio na campanha) indicavam que não importava muito qual caminho o governo tomasse: de toda forma, Dilma enfrentaria o ódio e a intolerância – além de estar em minoria no Congresso.

Diante desse quadro, se quisesse cumprir o que disse na campanha, a presidenta teria que contar com o campo político que se mobilizou nas ruas no segundo turno.

Mas Dilma fez outra escolha. Adotou o caminho do PASOK – partido socialista grego, que aceitou cumprir a agenda ultra-liberal imposta pelos mercados. Resultado na Grécia: a agenda liberal não deu resultados, e o PASOK se esfarelou.

A maior ameaça ao governo Dilma vem das escolhas do próprio governo. Algum ajuste era, sim, necessário. Mas a presidenta optou pelo ajuste ultra-liberal – que, além de gerar desemprego, desarranja ainda mais as contas públicas (os juros fazem com que aumente a dívida pública; e a recessão reduz arrecadação, abrindo rombo no orçamento). Remédio em doses exageradas vira veneno. A receita liberal de Levy envenenou o paciente.

Reconhecer que Dilma errou feio nessas escolhas é uma coisa. Outra coisa é aceitar um golpe parlamentar como o proposto pela oposição, e insuflado por editoriais da velha mídia corporativa. Cria-se um clima de medo e confusão. E o objetivo é que o governo se torne ainda mais refém da agenda liberal.

Alguns anunciam que o golpe parlamentar começará nesta semana… Não acredito que prospere.

Para que o impeachment avance, a oposição formada por PSDB/DEM/PPS/SD precisa contar com 3 fatores:

1) um fato concreto que justifique o impeachment – sem esse fato, ficaria escancarado o golpe parlamentar e a presidenta poderia recorrer ao STF para barrar o processo no Congresso, o que criaria uma crise institucional inédita; esse cenário não interessa ao grande empresariado;

2) o apoio decidido do PMDB e de Eduardo Cunha – o presidente da Câmara teria que rejeitar um dos vários pedidos de impeachment, para que a oposição (por maioria simples dos deputados presentes em sessão) propusesse o desarquivamento, iniciando assim o impeachment;

3) a manutenção e/ou aprofundamento do ajuste liberal de Levy.

Comecemos pelo ponto 3. Se Dilma mudasse de rota na economia, provocaria turbulência adicional no mercado (se bem que a turbulência já se deu, com o rebaixamento da nota na S&P), mas poderia assim recompor a base social que vai defendê-la na rua no caso de o impeachment avançar. Dilma dá todos sinais de que não adotará esse caminho. Ela prefere ficar em paz com o mercado, contando apenas com as ferramentas “institucionais” (e não com a rua) para evitar o desastre.

Politicamente, trata-se de um erro. Mas do ponto de vista da sobrevivência do governo, o cálculo parece estar correto. Vejamos…

Sem o item 1 (fato concreto contra a presidenta), o processo torna-se arriscado demais para a elite econômica. Uma aventura, que tornará o futuro governo tão ou mais frágil que o atual.

E quanto ao item 2, a pergunta que devemos fazer é: será que interessa a Cunha tornar-se instrumento indireto do impeachment? O que ele ganharia com isso?

Qual garantia de que Cunha, depois de ajudar a operar o impeachment, não seria jogado aos leões pelos tucanos? Nenhuma. Cunha sabe que o melhor é lidar com uma presidenta fraca, o que lhe garante alguma margem de manobra. Vai seguir operando nessa dubiedade.

Além disso, Eduardo Cunha está prestes a virar réu no STF. Ou seja: pode ser um risco para a oposição apostar tudo numa estratégia que depende de um ator visivelmente manco. Muito mais inteligente seria esperar a queda de Cunha, elegendo para a presidência da Câmara um peemedebista “limpo” – que pudesse conduzir o processo sem contestações (Jarbas Vasconcelos seria esse nome?) no início de 2016.

Os itens 1 e 2 – hoje – não estão equacionados. Pode ser que até novembro estejam. Ou, mais provavelmente, em fevereiro ou março de 2016 (quando a economia tradicionalmente reflui, porque já não há Natal nem décimo-terceiro para empurrar o consumo)…

Se minha hipótese estiver correta, a oposição – ao acelerar agora o movimento pelo impeachment – está mais uma vez jogando no desgaste a médio prazo de Dilma/Lula/PT. Parece-me que, apesar da gravidade do quadro político, não há condições objetivas de processar nesse momento o impeachment.

Dilma conta com essa fresta muito estreita, para sobreviver até junho/julho do ano que vem – quando a economia começaria a dar sinais de melhora e o país passaria a respirar o clima de Olimpíadas e, logo depois, de eleições municipais. Essa é a aposta do governo. Se é que há alguma aposta coordenada…

O problema é que, ao não mudar o item 3, Dilma permite que o quadro se torne ainda mais grave no primeiro semestre de 2016.

Minha aposta é que Dilma não cai agora. Mas, se seguir nessa rota, poderá ver no próximo ano as ruas tomadas não por paneleiros e pela oposição raivosa. Mas pela turma que apostou no lulismo e hoje se sente abandonada. Esse é o risco.

Quando essa parte da equação fechar, aí sim o impeachment pode vir com mais força.

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Sobre o tema, leiam o artigo brilhante de Mário Magalhâes, que afirma: se Dilma aprofundar o programa liberal, pela direita, cometerá suicídio político.

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