Por Henrique Beirangê, na revista CartaCapital:
Em Harry Potter, série de livros infantojuvenis, os bruxos bons acreditavam que não mencionar o nome do vilão Lorde Voldemort bastaria para mantê-los seguros. Mas Voldemort continuava lá, mesmo sem ser nomeado. O governo de São Paulo parece apostar na mesma estratégia. Um dos grandes esforços de “inteligência” para combater o PCC foi convencer a maioria dos meios de comunicação a não citar a facção criminosa. Seria uma maneira de não dar visibilidade ao bando e limitar sua expansão. Como no caso da saga da escritora J.K. Rowling, o resultado é desalentador. O PCC acaba de completar 22 anos com pompa e circunstância e com cada vez mais tentáculos.
Os integrantes do Primeiro Comando da Capital celebram em 31 de agosto o aniversário da facção. No fim do mês passado, a festa na Penitenciária Feminina de Sant’Ana, na zona norte da capital paulista, foi regada a cocaína, maconha e cachaça. Tudo gravado em celulares usados dentro da unidade. O vídeo mostra um pavilhão de dois andares com cerca de 200 detentas em festa sem nenhum agente prisional. Cada presa tem direito a cheirar uma parte da droga, que está disposta sobre uma bandeja onde se lê “PCC 1533 22 anos”.
Na quarta-feira 2, outro vídeo expôs o Departamento de Narcóticos da Polícia Civil, responsável por combater o tráfico no estado. Nas imagens, um anão gogo boy faz um strip-tease diante de delegados e agentes durante a comemoração do aniversário de uma escrivã. Vexame total.
Enquanto o aparato de repressão passa vergonha, o PCC está mais organizado que nunca. Documentos de uma investigação da Polícia Federal e do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) de Piracicaba, interior de São Paulo, ligado ao Ministério Público, mostram um alto nível de hierarquização da quadrilha que tem acentuado as dificuldades de monitoramento.
Em Harry Potter, série de livros infantojuvenis, os bruxos bons acreditavam que não mencionar o nome do vilão Lorde Voldemort bastaria para mantê-los seguros. Mas Voldemort continuava lá, mesmo sem ser nomeado. O governo de São Paulo parece apostar na mesma estratégia. Um dos grandes esforços de “inteligência” para combater o PCC foi convencer a maioria dos meios de comunicação a não citar a facção criminosa. Seria uma maneira de não dar visibilidade ao bando e limitar sua expansão. Como no caso da saga da escritora J.K. Rowling, o resultado é desalentador. O PCC acaba de completar 22 anos com pompa e circunstância e com cada vez mais tentáculos.
Os integrantes do Primeiro Comando da Capital celebram em 31 de agosto o aniversário da facção. No fim do mês passado, a festa na Penitenciária Feminina de Sant’Ana, na zona norte da capital paulista, foi regada a cocaína, maconha e cachaça. Tudo gravado em celulares usados dentro da unidade. O vídeo mostra um pavilhão de dois andares com cerca de 200 detentas em festa sem nenhum agente prisional. Cada presa tem direito a cheirar uma parte da droga, que está disposta sobre uma bandeja onde se lê “PCC 1533 22 anos”.
Na quarta-feira 2, outro vídeo expôs o Departamento de Narcóticos da Polícia Civil, responsável por combater o tráfico no estado. Nas imagens, um anão gogo boy faz um strip-tease diante de delegados e agentes durante a comemoração do aniversário de uma escrivã. Vexame total.
Enquanto o aparato de repressão passa vergonha, o PCC está mais organizado que nunca. Documentos de uma investigação da Polícia Federal e do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) de Piracicaba, interior de São Paulo, ligado ao Ministério Público, mostram um alto nível de hierarquização da quadrilha que tem acentuado as dificuldades de monitoramento.
A tabela mostra a contabilidade semanal do PCC na região de Sorocaba. O cadastro controla os integrantes
Há cerca de três anos, apontam as investigações, o sistema de comunicação preferido pelo PCC era o BlackBerry. Sediado no Canadá, o sistema possuía uma criptografia que impedia a interceptação de comunicações e durante muito tempo foi usado para se livrar dos grampos. Apenas a polícia americana possuía os códigos de acesso repassados posteriormente às autoridades brasileiras. Como a criptografia foi quebrada, a nova moda é o WhatsApp. O Sistema Guardião da Polícia Civil paulista não consegue interceptar as ligações e os bandidos sabem.
Apenas em casos excepcionais programas como o Skype e o WhatsApp são grampeados e a nova luta dos investigadores tem sido obter tecnologias adaptadas à nova era. Enquanto a investigação paulista patina com vídeos de festas em delegacias e presídios, o crime organizado se aperfeiçoa. É o que mostram os relatórios das investigações federais e do Ministério Público.
A estrutura organizacional do PCC chama a atenção pelo seu estatuto, a contabilidade e a capilaridade nos demais estados e até no exterior. Para entender como a quadrilha funciona, a investigação fez um mapeamento detalhado da facção. A clareza de propósitos da quadrilha começa pela última atualização de seu código de conduta. O documento com 18 artigos mostra que seus integrantes vivem especificamente da prática de crimes, especialmente o tráfico de drogas (apelidado de progresso), ignoram as leis brasileiras e o Judiciário, tratam as polícias como inimigas e suas ações servem como referência para o mundo do crime.
O organograma do PCC lembra aquele de uma empresa. Em formato piramidal, as principais lideranças ocupam os postos conhecidos como “sintonias”. A cabeça da organização é chefiada pela Sintonia Fina Geral, composta de sentenciados considerados fundadores da organização criminosa, e pelo líder máximo, Marcos Willian Herbas Camacho, o Marcola.
As penas somadas dos líderes passam dos 500 anos de cadeia. Entre as “sintonias” mais importantes destacam-se a do “financeiro”. Nesse setor são colocados apenas integrantes com alto grau de confiança da cúpula. A forma de financiamento da organização é diversificada e detalhada. A arrecadação principal vem especialmente do tráfico nas ruas, mas também do comercializado nas cadeias. É o chamado Progresso 100%. Nas penitenciárias, uma parte deve ser encaminhada à organização.
Quem está fora do sistema prisional, também precisa colaborar com a facção. A Cebola (caixinha mensal) é responsável por arrecadar 650 reais de cada integrante solto, uma contribuição compulsória que, quando não paga, pode levar a alguma punição do integrante.
Há também as rifas. A cada dois meses são sorteados apartamentos, casas, veículos (carros e motos). O membro da quadrilha tem o dever de comprar 20 rifas, ao custo de 30 reais cada, bimestralmente. Com as contribuições, o integrante passa a ter direitos. O Sintonia da Ajuda é o setor responsável por prestar apoio financeiro a quem estiver preso ou em dificuldades. Familiares de integrantes da organização que tenham morrido em missões dadas pela cúpula também recebem auxílio. Ônibus são colocados à disposição na capital paulista para transportar visitas aos presídios no interior.
Há uma denominação especial na contabilidade da facção chamada de Mineral. Uma Mineral significa o montante de 1 milhão de reais a ser escondido por alguém de confiança da cúpula da organização. Esse valor geralmente é enterrado e somente quem o guardou sabe a exata localização.
Para fazer parte, é necessária uma cerimônia de iniciação. Acredita-se que a ritualística tenha paralelo com aquela dos maçons. O novo integrante é “batizado” por outros três e passa a ser conhecido como irmão e a esposa ou companheira é tratada como cunhada. O iniciado ganha um número de identificação, o mesmo usado pela Secretaria de Administração Penitenciária para o registro do detento no sistema carcerário. Caso nunca tenha sido preso, terá em seu registro a expressão: “Nunca foi privado”.
Todas as informações são catalogadas em um programa de computador que fica nas mãos de integrantes próximos à cúpula da organização. Nesse cadastro há um alto nível de detalhamento da vida pregressa do bandido. A ficha contém informações básicas como número de telefone, apelido, onde está localizado, data em que passou a fazer parte do PCC, o nome dos três padrinhos de batismo na quadrilha e a última unidade prisional pela qual passou, até se ele já foi punido pela organização em algum momento.
O PCC, estima-se, movimenta por ano 120 milhões de reais e mexe com muitos interesses. Não foi à toa que a última grande crise com o Estado, em 2006, provocou 564 mortes. Segundo o depoimento de um delegado, um acordo foi feito entre Marcola e o governo estadual para cessar os ataques. Os tucanos, que governam São Paulo há duas décadas, sempre negaram o acordo.
Há cerca de três anos, apontam as investigações, o sistema de comunicação preferido pelo PCC era o BlackBerry. Sediado no Canadá, o sistema possuía uma criptografia que impedia a interceptação de comunicações e durante muito tempo foi usado para se livrar dos grampos. Apenas a polícia americana possuía os códigos de acesso repassados posteriormente às autoridades brasileiras. Como a criptografia foi quebrada, a nova moda é o WhatsApp. O Sistema Guardião da Polícia Civil paulista não consegue interceptar as ligações e os bandidos sabem.
Apenas em casos excepcionais programas como o Skype e o WhatsApp são grampeados e a nova luta dos investigadores tem sido obter tecnologias adaptadas à nova era. Enquanto a investigação paulista patina com vídeos de festas em delegacias e presídios, o crime organizado se aperfeiçoa. É o que mostram os relatórios das investigações federais e do Ministério Público.
A estrutura organizacional do PCC chama a atenção pelo seu estatuto, a contabilidade e a capilaridade nos demais estados e até no exterior. Para entender como a quadrilha funciona, a investigação fez um mapeamento detalhado da facção. A clareza de propósitos da quadrilha começa pela última atualização de seu código de conduta. O documento com 18 artigos mostra que seus integrantes vivem especificamente da prática de crimes, especialmente o tráfico de drogas (apelidado de progresso), ignoram as leis brasileiras e o Judiciário, tratam as polícias como inimigas e suas ações servem como referência para o mundo do crime.
O organograma do PCC lembra aquele de uma empresa. Em formato piramidal, as principais lideranças ocupam os postos conhecidos como “sintonias”. A cabeça da organização é chefiada pela Sintonia Fina Geral, composta de sentenciados considerados fundadores da organização criminosa, e pelo líder máximo, Marcos Willian Herbas Camacho, o Marcola.
As penas somadas dos líderes passam dos 500 anos de cadeia. Entre as “sintonias” mais importantes destacam-se a do “financeiro”. Nesse setor são colocados apenas integrantes com alto grau de confiança da cúpula. A forma de financiamento da organização é diversificada e detalhada. A arrecadação principal vem especialmente do tráfico nas ruas, mas também do comercializado nas cadeias. É o chamado Progresso 100%. Nas penitenciárias, uma parte deve ser encaminhada à organização.
Quem está fora do sistema prisional, também precisa colaborar com a facção. A Cebola (caixinha mensal) é responsável por arrecadar 650 reais de cada integrante solto, uma contribuição compulsória que, quando não paga, pode levar a alguma punição do integrante.
Há também as rifas. A cada dois meses são sorteados apartamentos, casas, veículos (carros e motos). O membro da quadrilha tem o dever de comprar 20 rifas, ao custo de 30 reais cada, bimestralmente. Com as contribuições, o integrante passa a ter direitos. O Sintonia da Ajuda é o setor responsável por prestar apoio financeiro a quem estiver preso ou em dificuldades. Familiares de integrantes da organização que tenham morrido em missões dadas pela cúpula também recebem auxílio. Ônibus são colocados à disposição na capital paulista para transportar visitas aos presídios no interior.
Há uma denominação especial na contabilidade da facção chamada de Mineral. Uma Mineral significa o montante de 1 milhão de reais a ser escondido por alguém de confiança da cúpula da organização. Esse valor geralmente é enterrado e somente quem o guardou sabe a exata localização.
Para fazer parte, é necessária uma cerimônia de iniciação. Acredita-se que a ritualística tenha paralelo com aquela dos maçons. O novo integrante é “batizado” por outros três e passa a ser conhecido como irmão e a esposa ou companheira é tratada como cunhada. O iniciado ganha um número de identificação, o mesmo usado pela Secretaria de Administração Penitenciária para o registro do detento no sistema carcerário. Caso nunca tenha sido preso, terá em seu registro a expressão: “Nunca foi privado”.
Todas as informações são catalogadas em um programa de computador que fica nas mãos de integrantes próximos à cúpula da organização. Nesse cadastro há um alto nível de detalhamento da vida pregressa do bandido. A ficha contém informações básicas como número de telefone, apelido, onde está localizado, data em que passou a fazer parte do PCC, o nome dos três padrinhos de batismo na quadrilha e a última unidade prisional pela qual passou, até se ele já foi punido pela organização em algum momento.
O PCC, estima-se, movimenta por ano 120 milhões de reais e mexe com muitos interesses. Não foi à toa que a última grande crise com o Estado, em 2006, provocou 564 mortes. Segundo o depoimento de um delegado, um acordo foi feito entre Marcola e o governo estadual para cessar os ataques. Os tucanos, que governam São Paulo há duas décadas, sempre negaram o acordo.
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