sábado, 3 de outubro de 2015

Reforma ministerial desanima os golpistas

Por Altamiro Borges

A reforma ministerial anunciada pela presidenta Dilma nesta sexta-feira (2) fortaleceu o velho PMDB – o “partido-ônibus”, segundo a clássica definição de Ulysses Guimarães, que reúne políticos de todos os matizes e interesses. Ela foi a expressão do atual quadro adverso do governo, que não conta com a maioria no parlamento, patina no enfrentamento da crise econômica e presencia o crescimento de uma onda de ódio em setores médios da sociedade. Na prática, seu maior objetivo foi tentar evitar o risco da abertura do processo de impeachment. Neste sentido, em mais uma prova das peripécias da "maldita dialética", ela atingiu o seu intento. De imediato, a mídia oposicionista e o seu dispositivo partidário (PSDB, DEM, PPS, SD e outras tranqueiras) sentiram o baque.

Os jornalões deste sábado não esconderam o desânimo diante da ousada manobra política. Em editorial, a Folha tucana tratou de atacar a nova composição: “Afora algumas medidas de impacto simbólico, a reforma ministerial finalmente definida na sexta-feira dá conhecimento de que a presidente Dilma Rousseff (PT) rendeu-se, em um pragmatismo tardio e melancólico, à condição de refém do PMDB. O partido, ao mesmo tempo aliado formal e interessado direto no afastamento da presidente, obteve sete postos na Esplanada... Sem disfarçar o propósito essencial de evitar um processo de impeachment, Dilma entregou poder também a Lula, antecessor e padrinho, que participou das negociações e reorganizou o comando político do PT no Planalto”.

No mesmo diapasão, o “imortal” Merval Pereira, colunista de estimação da famiglia Marinho, esbravejou: “A reforma ministerial da presidenta Dilma cortou menos do que o prometido e é a confirmação da base política corroída desse governo. É um toma lá dá cá descarado, sem nenhuma preocupação. O novo ministério não tem nada da Dilma; tem do PMDB e do Lula, que é quem está dando as cartas”. Outros editoriais e colunistas de plantão bateram na mesma tecla. É interessante observar que as famiglias Frias (Folha), Marinho (Globo), Mesquita (Estadão) e Civita (Veja) nunca se indignaram contra as composições pragmáticas do ex-presidente FHC, que contemplavam até os gatunos do DEM, e nada falam sobre a participação do PMDB em governos estaduais tucanos.

Como meros reprodutores das pautas midiáticas, os dirigentes da oposição conservadora também criticaram a reforma ministerial. Mendonça Filho, líder dos demos na Câmara Federal – que faz alianças até com o capeta –, rosnou: “É um arranjo para sustentar Dilma no governo e para tentar minimizar o quadro de instabilidade. Não teve uma reforma. É um arranjo pífio”. Já o líder do falido PPS, o carreirista Rubens Bueno, tentou dar lições de moral: “A presidente quer se safar do impeachment. Pelo visto, a incompetência vai continuar”. Por fim, o “xerife” Carlos Sampaio, que até hoje não explicou a sua prática nepotista, atacou: “Essa reforma expõe a já notabilizada práticas dos governos do PT, de Lula e Dilma, de lotear o governo”. Haja cinismo!

A histeria da mídia e dos seus satélites partidários indica que a jogada de Dilma pode dar certo. Só o tempo dirá se a presidenta conseguirá aplacar o apetite do centrista PMDB – confirmando a tese de que é ruim com ele, pior sem ele. Temendo ser cassado e até preso, Eduardo Cunha, presidente da Câmara, já avisou que pretende acelerar a queda de Dilma. “Não caio antes dela”, destaca o site da Época deste sábado. Esta batalha será decisiva para conferir o acerto da reforma ministerial. A oposição precisa dos votos de 342 dos 513 deputados federais para abrir o processo de impeachment e afastar Dilma do cargo. Com a nova composição, o governo garante que terá o apoio de 70% a 80% dos 66 deputados peemedebistas. A conferir! De qualquer forma, a reforma ministerial parece que enfraqueceu a tese do impeachment, conforme apontou o cientista político André Singer em artigo publicado neste sábado na Folha.

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Impeachment enfraquecido

A descoberta das contas secretas do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na Suíça e o anúncio de concessões substantivas ao PMDB na reforma ministerial enfraqueceram a hipótese, antes provável, de que fosse considerado admissível o pedido de impeachment protocolado há quinze dias por Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr. A aventura golpista não está afastada, mas pode ter perdido momentum.

Desde fevereiro, quando foi eleito presidente da Câmara com 267 votos, Cunha tornou-se o líder, às vezes semioculto, do movimento pelo impedimento de Dilma Rousseff. Os obstáculos que interpôs aos projetos do Executivo no primeiro semestre, a ruptura teatral com o governo em julho, a incrível divulgação na semana passada da maneira regimental por meio da qual a presidente seria defenestrada não deixavam dúvida a respeito das intenções do parlamentar carioca.

Convém lembrar que está entre as atribuições daquele que dirige a Casa do Povo considerar, de maneira discricionária, admissível qualquer proposta de impeachment que tiver cumprido as exigências burocráticas básicas. O passo seguinte seria instaurar Comissão Especial de 66 deputados de todos os partidos para exarar, em quinze sessões, parecer a respeito. Imagine-se a confusão que tomaria conta das ruas do país.

Agora, com as contas a descoberto, a autoridade de Cunha para tomar tal decisão perdeu legitimidade. Legalmente, enquanto estiver no cargo, ainda está habilitado a fazê-lo, mas o pêndulo da opinião pública deslocou-se para longe dele.

Outro caminho seria aprovar a admissibilidade do pedido de impeachment por meio de maioria simples dos deputados em plenário. Significaria contar com 257 votos, caso o conjunto da Câmara estivesse presente. Embora a recente aproximação da bancada do PSB ao bloco pró-impeachment formado por PSDB, DEM, PPS, PSC e SDD tenha aumentado a musculatura do grupo, a manobra não será possível sem o PMDB.

Foi esta aritmética básica que orientou a reforma ministerial. Atrair votos do PMDB de modo a desidratar a bancada do impedimento é o seu único móvel. A cada cargo negociado devem corresponder x sufrágios trazidos para o lado do "não" e, portanto, retirados do time do "sim".

Desde esse ângulo, o movimento aconselhado por Lula é chocante, mas inevitável. Entregar os anéis da Saúde e da Ciência e Tecnologia, interromper a gestão de Renato Janine Ribeiro na Educação, tirar a interlocução com os movimentos populares de dentro do Planalto, diminuir o status de órgãos que cuidam dos direitos dos trabalhadores constituiu-se no preço para salvar os dedos de Dilma. Vamos ver se, mesmo com a possível condenação das contas de Dilma pelo TCU, dará certo.


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