Por Tereza Cruvinel, em seu blog:
Com as liminares deferidas pelos ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, o Supremo Tribunal Federal deixou o presidente da Câmara de mãos atadas, em relação a processos de impeachment, até que o plenário se pronuncie sobre os ritos do processo. Mais do que isso, o Supremo entrou em cena avisando ao articuladores do impeachment da presidente Dilma Rousseff que atuará como freio e contrapeso na disputa, assegurando a ordem institucional e suprindo as lacunas legais existentes sobre o assunto. Elas existem, são importantes e não foram enfrentadas na experiência de 1992.
O protagonismo e o compromisso da corte maior com Estado Democrático de Direito podem fazer a diferença entre uma democracia e uma república bananeira. As duas liminares ainda serão objeto de deliberação do plenário mas foram concedidas em sintonia com o pensamento médio da corte, que se manifesta pela primeira vez sobre o tema. E outras vezes o fará, num processo que será intensamente judicializado, até por conta das referidas lacunas legais.
A liminar de Teori Zavascki suspendeu a aplicação do rito definido por Cunha atendendo à questão de ordem levantada pela oposição. A de Rosa, mais ampla, suspendeu toda e qualquer iniciativa sobre o impeachment até que o STF se pronuncie.
Um desdobramento importante diz respeito ao papel do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, no processo. Pelo jogo combinado com a oposição, ele rejeitaria o pedido Hélio Bicudo/Reale Junior e a oposição recorreria ao plenário. Aprovaria o recurso por maioria simples de votos e a engrenagem do impeachment começaria a rodar. Por tal roteiro, Cunha, com todos os problemas que pesam contra ele, seria figura secundária no processo. Afinal, rejeitou o pedido mas foi vencido no voto. Mas se o STF mantiver o entendimento de Teori e Rosa, será tudo diferente. Cunha só poderá acolher ou mandar arquivar qualquer pedido de impeachment. Sem esta de recurso. E assim, só haverá processo de impeachment com a digital dele, através do acolhimento. E isso tiraria força e legitimidade do processo contra Dilma, reforçando suspeitas de que ele busca vingança e tenta turvar a percepção de seu envolvimento no petrolão a partir da descoberta de suas contas na Suíça.
E pior ainda ficou a situação para a oposição porque no sábado, 10, PSDB, DEM, PSB, SD e PPS soltaram nota pedindo o afastamento de Cunha da Presidência da Câmara. “Vamos ter que consertar esta m... que fizemos”, disse o deputado Paulinho da Força, que foi contra a nota. Nela os cinco partidos dizem que Cunha deve se afastar do cargo “até mesmo para que possa exercer, de forma adequada, o seu direito constitucional à ampla defesa". Depois disso, será pelo menos delicado tocar um processo de impeachment autorizado por ele.
Lacunas legais
O pedido de liminar do deputado Wadih Damous sustentou a necessidade de ser aplicado rito próprio, definido em lei específica, e não o regimento interno, como fez Eduardo Cunha ao definir o rito do impeachment a pedido da oposição. “Se não temos uma lei adequada, tratemos de aprová-la mas não de improvisar”, disse ele.
O artigo 85 da Constituição Federal define os crimes de responsabilidade do presidente da República e diz em seu parágrafo único: “Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento.” Sete anos depois da promulgação da Carta de 1988 tal lei especial não havia sido votado mas os congressistas valeram-se, então, de uma outra, ainda em vigor, que trata do mesmo tema, a Lei 1.079, de 1950. E assim, foi ela que norteou o processo de 1992 contra Collor.
Mas também ela tem uma lacuna importante, que naquele caso não foi problema porque o presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, não titubeou ao aceitar o pedido apresentado por Marcelo Lavènère (OAB) e Barbosa Lima Sobrinho (ABI). Tal lei, depois de definir os crimes de responsabilidade do presidente, assegura que qualquer cidadão pode apresentar denúncia contra o presidente junto à presidência da Câmara, estabelecendo algumas formalidades. Mas pula daí para o processo em si. E começa dizendo, no artigo 19: “Recebida a denúncia, será lida no expediente da sessão seguinte e despachada a uma comissão especial eleita, da qual participem, observada a respectiva proporção, representantes de todos os partidos para opinar sobre a mesma”.
Ou seja, a lei não considera a possibilidade de o presidente da Câmara deixar de acolher a denúncia. Não fala em arquivamento e muito menos em recurso ao plenário em caso de não-acolhimento, por não atendimento as formalidades e pressupostos, como a indicação de provas ou de como obtê-las. Na ausência de definição legal específica, Cunha aplicou o regimento da Câmara ao definir o ritual; Foi isso que o STF desautorizou nas duas liminares. Cunha se inspirou numa decisão de Michel Temer, quando presidente da Câmara, ao despachar pedido de processo contra Fernando Henrique, subscrito individualmente por deputados petistas. Houve o recurso ao plenário mas como foi rejeitado pelas forças governistas de então, ninguém se deu ao trabalho de contestar o rito adotado por Michel.
Sem aditivo
A oposição, antes da concessão das liminares pelos ministros do STF, pediu a Cunha que segurasse o processo esta semana porque estava sendo preparado um “aditivo” ao pedido Hélio Bicudo/Reale Júnior. Nele, a presidente Dilma seria acusada de ter cometido pedaladas fiscais também em 2015. Com isso, tentaria neutralizar o argumento de que, constitucionalmente, Dilma não pode ser responsabilizada por atos do mandato anterior. Bicudo e Reale falam, no documento já protocolado, apenas em pedaladas cometidas em 2014.
Mas também este aditivo, se chegar a ser recebido por Cunha, será questionado pelo PT junto ao STF. A lei 1.079 não contempla a possibilidade de se ficar alterando a denúncia com aditivos. E isso será outra pedra no caminho da oposição.
Os ministros Teori e Rosa sugerem, com suas liminares, que o STF será o fiel da balança, arbitrando todas as questões em que houve dúvida jurídica. “Em processo de tamanha magnitude institucional, que põe a juízo o mais elevado cargo do Estado e do governo da nação, é pressuposto elementar a observância do devido processo legal, formado e desenvolvido à base de um procedimento cuja validade esteja fora de qualquer dúvida de ordem jurídica", afirmou Teori.
Ou seja, preparem-se os dois lados para a guerra política e também jurídica.
Com as liminares deferidas pelos ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, o Supremo Tribunal Federal deixou o presidente da Câmara de mãos atadas, em relação a processos de impeachment, até que o plenário se pronuncie sobre os ritos do processo. Mais do que isso, o Supremo entrou em cena avisando ao articuladores do impeachment da presidente Dilma Rousseff que atuará como freio e contrapeso na disputa, assegurando a ordem institucional e suprindo as lacunas legais existentes sobre o assunto. Elas existem, são importantes e não foram enfrentadas na experiência de 1992.
O protagonismo e o compromisso da corte maior com Estado Democrático de Direito podem fazer a diferença entre uma democracia e uma república bananeira. As duas liminares ainda serão objeto de deliberação do plenário mas foram concedidas em sintonia com o pensamento médio da corte, que se manifesta pela primeira vez sobre o tema. E outras vezes o fará, num processo que será intensamente judicializado, até por conta das referidas lacunas legais.
A liminar de Teori Zavascki suspendeu a aplicação do rito definido por Cunha atendendo à questão de ordem levantada pela oposição. A de Rosa, mais ampla, suspendeu toda e qualquer iniciativa sobre o impeachment até que o STF se pronuncie.
Um desdobramento importante diz respeito ao papel do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, no processo. Pelo jogo combinado com a oposição, ele rejeitaria o pedido Hélio Bicudo/Reale Junior e a oposição recorreria ao plenário. Aprovaria o recurso por maioria simples de votos e a engrenagem do impeachment começaria a rodar. Por tal roteiro, Cunha, com todos os problemas que pesam contra ele, seria figura secundária no processo. Afinal, rejeitou o pedido mas foi vencido no voto. Mas se o STF mantiver o entendimento de Teori e Rosa, será tudo diferente. Cunha só poderá acolher ou mandar arquivar qualquer pedido de impeachment. Sem esta de recurso. E assim, só haverá processo de impeachment com a digital dele, através do acolhimento. E isso tiraria força e legitimidade do processo contra Dilma, reforçando suspeitas de que ele busca vingança e tenta turvar a percepção de seu envolvimento no petrolão a partir da descoberta de suas contas na Suíça.
E pior ainda ficou a situação para a oposição porque no sábado, 10, PSDB, DEM, PSB, SD e PPS soltaram nota pedindo o afastamento de Cunha da Presidência da Câmara. “Vamos ter que consertar esta m... que fizemos”, disse o deputado Paulinho da Força, que foi contra a nota. Nela os cinco partidos dizem que Cunha deve se afastar do cargo “até mesmo para que possa exercer, de forma adequada, o seu direito constitucional à ampla defesa". Depois disso, será pelo menos delicado tocar um processo de impeachment autorizado por ele.
Lacunas legais
O pedido de liminar do deputado Wadih Damous sustentou a necessidade de ser aplicado rito próprio, definido em lei específica, e não o regimento interno, como fez Eduardo Cunha ao definir o rito do impeachment a pedido da oposição. “Se não temos uma lei adequada, tratemos de aprová-la mas não de improvisar”, disse ele.
O artigo 85 da Constituição Federal define os crimes de responsabilidade do presidente da República e diz em seu parágrafo único: “Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento.” Sete anos depois da promulgação da Carta de 1988 tal lei especial não havia sido votado mas os congressistas valeram-se, então, de uma outra, ainda em vigor, que trata do mesmo tema, a Lei 1.079, de 1950. E assim, foi ela que norteou o processo de 1992 contra Collor.
Mas também ela tem uma lacuna importante, que naquele caso não foi problema porque o presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, não titubeou ao aceitar o pedido apresentado por Marcelo Lavènère (OAB) e Barbosa Lima Sobrinho (ABI). Tal lei, depois de definir os crimes de responsabilidade do presidente, assegura que qualquer cidadão pode apresentar denúncia contra o presidente junto à presidência da Câmara, estabelecendo algumas formalidades. Mas pula daí para o processo em si. E começa dizendo, no artigo 19: “Recebida a denúncia, será lida no expediente da sessão seguinte e despachada a uma comissão especial eleita, da qual participem, observada a respectiva proporção, representantes de todos os partidos para opinar sobre a mesma”.
Ou seja, a lei não considera a possibilidade de o presidente da Câmara deixar de acolher a denúncia. Não fala em arquivamento e muito menos em recurso ao plenário em caso de não-acolhimento, por não atendimento as formalidades e pressupostos, como a indicação de provas ou de como obtê-las. Na ausência de definição legal específica, Cunha aplicou o regimento da Câmara ao definir o ritual; Foi isso que o STF desautorizou nas duas liminares. Cunha se inspirou numa decisão de Michel Temer, quando presidente da Câmara, ao despachar pedido de processo contra Fernando Henrique, subscrito individualmente por deputados petistas. Houve o recurso ao plenário mas como foi rejeitado pelas forças governistas de então, ninguém se deu ao trabalho de contestar o rito adotado por Michel.
Sem aditivo
A oposição, antes da concessão das liminares pelos ministros do STF, pediu a Cunha que segurasse o processo esta semana porque estava sendo preparado um “aditivo” ao pedido Hélio Bicudo/Reale Júnior. Nele, a presidente Dilma seria acusada de ter cometido pedaladas fiscais também em 2015. Com isso, tentaria neutralizar o argumento de que, constitucionalmente, Dilma não pode ser responsabilizada por atos do mandato anterior. Bicudo e Reale falam, no documento já protocolado, apenas em pedaladas cometidas em 2014.
Mas também este aditivo, se chegar a ser recebido por Cunha, será questionado pelo PT junto ao STF. A lei 1.079 não contempla a possibilidade de se ficar alterando a denúncia com aditivos. E isso será outra pedra no caminho da oposição.
Os ministros Teori e Rosa sugerem, com suas liminares, que o STF será o fiel da balança, arbitrando todas as questões em que houve dúvida jurídica. “Em processo de tamanha magnitude institucional, que põe a juízo o mais elevado cargo do Estado e do governo da nação, é pressuposto elementar a observância do devido processo legal, formado e desenvolvido à base de um procedimento cuja validade esteja fora de qualquer dúvida de ordem jurídica", afirmou Teori.
Ou seja, preparem-se os dois lados para a guerra política e também jurídica.
Que bom se tudo isso fosse verdade!
ResponderExcluirMas quem ainda acredita no STF depois do Mensalão do PSDB, depois do Gilmar e depois do Joaquinzão?