Por Jandira Feghali
Maria Diana, de 25 anos, saiu de casa no último dia 30 para protestar no Centro de São Paulo. O mesmo aconteceu com Fernanda Mello, no Rio de Janeiro. E Letícia. Pollyana. Tábata. Maíra. Foram milhões de mulheres, juntas, ocupando o asfalto de capitais do Brasil nos últimos dias. Como flores de uma forte primavera, passaram a florir mentes e almas pelos centros urbanos. Gritavam em uníssono contra o retrocesso que se abate sobre o Parlamento. Boa parte dele caracterizado por um projeto de lei.
A matéria de número 5069/2013, de autoria do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é o alvo de todas elas. Surge no seio da Casa legislativa para suplantar direitos, criminalizar atendimentos de saúde e revogar a dignidade de milhões de mulheres. Transforma o aborto legal em crime, pune pelo Código Penal profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) e susta o atendimento às vítimas de violência sexual.
O absurdo passa pelo seu entendimento de que uma vítima de estupro, por exemplo, precise comprovar danos físicos e psicológicos para conseguir atendimento em hospitais ou postos de saúde. Vai além: obriga que a mulher procure o IML para provar a violência citada, “punindo-a” com uma via crucis.
O direito legal ao aborto por estupro e risco de morte é, sim, garantido em nosso país desde a década de 40 e retroceder para antes disso é um absurdo diante de todos os avanços dados na saúde mundial. O projeto de Cunha caminha na criminalização de muitos atendimentos de saúde previstos em lei e restringe o repasse de informações legais e sanitárias às vítimas, o que é um absurdo!!
Está claro que há um fundamentalismo religioso na tentativa de se criminalizar o aborto legal. É uma visão restrita do mundo que se tenta impor ao Estado, ignorando a laicidade e a realidade aqui e lá fora. O silêncio sobre o aborto ilegal é parte deste cenário e contribui para a gravidade do assunto.
O que dizer para a família de tantas meninas que perderam suas vidas por se submeterem a procedimentos frágeis em porões e becos? O que dizer à família de Jandira Magdalena, por exemplo, que faleceu ano passado ao tentar realizar um aborto ilegal por R$ 4,5 mil? O que dizer?
Mesmo com intenso debate e resistência, o projeto 5069/2013 pode atravessar a Câmara. Mas é preciso que se diga que ele precisará enfrentar a onda que se forma no país. Uma onda de mulheres aguerridas e empoderadas, que não aceitarão ter direitos sexuais e reprodutivos reduzidos a pó, bandeira que se amplia na sociedade. A primavera das mulheres chegou e será praticamente impossível impedir sua luz, força e voz para outras mulheres e os homens.
* Jandira Feghali é médica, deputada federal (RJ) e líder do PCdoB.
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