quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Golpe de Cunha lembra filme de gangsters

Por Helena Sthephanowitz, na Rede Brasil Atual:

Impeachment é coisa séria demais para ser tratado como jogada política, muito menos com esperteza para salvar corruptos e trapaça golpista. Mas é assim que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e as lideranças de oposição comandadas pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG) vem operando, o que tem produzido no Congresso Nacional cenas dignas de um cassino em filme de máfia.

Na segunda-feira (7), uma cena inacreditável: usufrutuário confesso de contas clandestinas na Suíça, o poderoso Eduardo Cunha conduzia a reunião de líderes partidários para formar a Comissão Especial do Impeachment. A nação via estarrecida Eduardo Cunha sentado na cabeceira da mesa, conduzindo os trabalhos. Tudo em nome de uma institucionalidade cada vez mais difícil de entender sob a ótica do cidadão comum.

Se um guarda de trânsito tiver um inquérito administrativo aberto contra si por suposta cobrança de propina, ele será afastado da função de cobrar multas enquanto o processo estiver em apuração. Com o presidente da Câmara dos Deputados nada acontece e ainda continua operando politicamente no comando de um processo da magnitude de um impeachment – e com métodos semelhantes aos que o levou a ser denunciado.

No processo de escolha dos 65 deputados membros da comissão de impeachment, os líderes partidários indicaram, em sua maioria, parlamentares legalistas com tendência a serem contra derrubar a presidenta no golpe. Configurava-se uma derrota política para os planos de Cunha e da oposição. Inconformados com o desfecho resolveram virar a mesa e anular o processo de escolha que eles próprios haviam se comprometido a seguir. Cunha, em parceria com a oposição, interrompeu o "jogo" na hora em que estavam perdendo e disseram que começariam de novo no dia seguinte. E começariam do zero, com a oposição apresentando outra chapa.

Lembrou aqueles filmes de máfia onde, quando alguém começa a ganhar no cassino, o dono mafioso interrompe o jogo e leva quem esta com sorte "para conversar a sós com os gangsters em uma sala fechada". Não é a primeira vez que ao perder votações Eduardo Cunha interrompe o processo legislativo, anula o que fora decidido e começa de novo, até ganhar.

A cartada de Cunha matou dois coelhos com uma cajadada só. Além "trapacear" o jogo do impeachment na hora em que estava perdendo, ao jogar o desfecho para terça-feira (8), matou a votação contra si pela quarta vez na reunião do Conselho de Ética que abriria processo de quebra de decoro parlamentar, empurrando com a barriga por mais um dia. É cada vez mais forte o mau cheiro de acordo da oposição para salvar Cunha da cassação em troca do apoio ao impeachment.

Na sessão de terça-feira, Cunha, em parceria com a oposição, tirou as cartas da manga que não faziam parte do baralho na véspera. Primeiro acatou a chapa oposicionista não prevista inicialmente para decidir em votação no plenário qual das chapas seria a Comissão Especial do Impeachment. Depois impôs que a votação seria secreta, um escárnio depois da votação aberta no caso da prisão do senador Delcídio do Amaral.

Depois de muito tumulto e notória falta de legitimidade, no voto secreto imposto por Cunha, a chapa oposicionista venceu.

De novo lembrou aqueles filmes de máfia, onde quem foi levado "para conversar a sós em uma sala fechada com os gangsters" saiu dali combinado que perderia tudo o que ganhou na próxima cartada.

Pausa para uma observação: a vitória de Cunha e Aécio foi de pirro, pois mesmo com voto secreto ficaram longe de conseguir número suficiente que exigiria uma votação do impeachment para valer.

Como não dá para as instituições da República funcionarem à imagem e semelhança de jogos em cassinos de mafiosos, o PCdoB entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o que considerou ilegalidades e trapaças políticas perpetradas por Eduardo Cunha e seus aliados. O ministro Edson Fachin, do STF, acolheu liminar na noite de terça (8) e proibiu a instalação da comissão especial parcialmente eleita por voto secreto, o que suspende todo o processo de impeachment. O julgamento em definitivo será feito por todos os ministros do STF no dia 16.

Não resta mais dúvidas de que Eduardo Cunha e a oposição transformam uma crise política em crise institucional e agrava a crise de representatividade. O povo brasileiro perde os últimos laços de representatividade que via no Congresso Nacional, com uma Câmara conduzida por Eduardo Cunha, com uma oposição que se diverte com jogatina política como jogadores inveterados que só pensam em seus ganhos e perdas pessoais nas suas apostas políticas.

O povo já não se enxerga nem na parte boa do Congresso, sufocada pela agenda imposta pela parte ruim. Cinco jovens foram fuzilados por engano por policiais do Rio. Nenhum era parente de deputado, nem usufrutuário de dinheiro na Suíça. Nenhum era playboy e nenhum era bandido. Estavam comemorando o primeiro salário de Roberto, jovem aprendiz em um supermercado. Todos pretos, pobres e honestos. Suas famílias merecem atenção de parlamentares para fazer alguma coisa que acabe com esse tipo de matança, que aflige toda mãe brasileira com filhos jovens, principalmente se forem pobres. Mães grávidas estão preocupadíssimas com o Zika vírus. Só vimos a presidenta Dilma se ocupar do assunto mobilizando governadores para montar uma operação de guerra contra o mosquito. Com todas as dificuldades econômicas mundiais, Dilma está inaugurando conjuntos habitacionais para quem não tem a casa própria. Enquanto isso, no Congresso só se olha para o próprio umbigo, e ainda se pratica a política do quanto pior para o povo, melhor para as ambições de poder dos caciques da oposição.

Parte do parlamento, resolveu castigar o povo porque não votou em Aécio Neves em 2014. Aliás, o mesmo castigo que aplicariam se o povo tivesse votado no tucano. Vota contra o trabalhador, contra direitos das crianças, vota para concentrar renda, legisla em causa própria e em causa de financiadores de campanha poderosa, aumentam o teto salarial de si mesmos. Brincam de golpe, brincam de impeachment – sim, é brincadeira pedir impeachment inventando que "pedalada" seja motivo –, agem como gangues de rua em disputa por território, só que em uma versão de "bacanas" do colarinho branco. Em comum o desprezo pelo povo aterrorizado, em um caso com balas perdidas nas ruas, no outro com pautas legislativas antipopulares. Exercem a política como jogadores de pôquer se divertindo em cassino, e jogam como trapaceiros que burlam até as regras do jogo, recorrendo à truculência quando começam a perder.

Se a oposição pensa em despertar a ira popular nas ruas pelo impeachment, deveria contar até dez. Falta quórum de deputados honestos que tenham moral para julgar uma presidenta honesta sobre quem não conseguem encontrar nenhum ilícito por mais que tenham vasculhado. E sobram alvos da ira popular sentados neste júri.

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