Por Paulo Kliass, no site Carta Maior:
A cerimônia já havia sido preparada pela equipe do vice-presidente em exercício com todo o esmero possível. Afinal, a intenção era realizar o anúncio oficial das medidas econômicas tão esperadas pela turma do financismo. A expectativa era que um ministro da Fazenda do porte de Henrique Meirelles - antigo integrante do “crème de la crème” da banca internacional - certamente comandaria o blá-blá com maestria e deveria dar conta do recado.
Mas, como Garrincha lembrou ao técnico Feola na Copa de 1958, faltou combinar com os russos. Tanto mais quanto se trata de articulações no plano da política, onde tudo é carregado de uma certa dose de imprevisibilidade. Combina-se tudo de véspera, mas o imponderável pode surgir e obrigar a algum rearranjo. No caso da nomeação de Romero Jucá, em particular, não foi por falta de advertência e aviso, mas Michel Temer resolveu insistir. Colocar com tanto destaque em sua primeira equipe de governo um indivíduo tão visado e encrencado revelou-se por demais arriscado.
Exoneração de Jucá e o anúncio das medidas
E eis que, antes mesmo de completar 2 semanas de governo provisório, o principal articulador político da equipe e ocupante da pasta do Planejamento é vítima de uma armadilha do fogo amigo. As implicações e investigações de casos de corrupção do parlamentar de Roraima vieram a público mais uma vez. Nesse caso por meio de uma gravação simulada do ex-senador e ex-diretor da Petrobrás, Sérgio Machado. A conversa entre ambos deixou evidente a tentativa de Jucá em acabar com a Operação Lava Jato e promover o afastamento de Dilma. Por mais que ele tenha tentado ensaiar o enredo da “licença temporária”, o fato é que foi mesmo exonerado.
A dupla da área econômica ficou manca, perdeu um pé e o anúncio do pacote acabou frustrando os que contavam com propostas mais ousadas para resolver de vez com aquela suposta “irresponsabilidade fiscal” herdada do governo anterior. Henrique Meirelles estava ladeado pelo secretário executivo do Ministério do Planejamento, que está respondendo interinamente pela pasta. Por mais que a grande imprensa tente manter as aparências e segurar a onda da incompetência temerária, o fato é que muito pouco foi decidido ou anunciado para resolver a crise fiscal no curto prazo. Na verdade, durante o evento foi apresentada uma longa lista de declarações de intenção. Um extenso rol de maldades, mas que dependem ainda de outros fatores e de outros espaços para serem implementadas.
A declaração mais reverberada pelos articulistas apoiados pelo sistema financeiro foi a “bombástica” manobra contábil dos R$ 100 bilhões. Ora, trata-se de uma mera pedalada micheliana, um procedimento que chega a causar inveja aos integrantes da equipe do primeiro mandato de Dilma. “Mas como é que a gente não tinha pensado nisso antes?” O BNDES antecipa um pagamento devido ao Tesouro Nacional, cujo vencimento estava previsto para as próximas décadas. O cronograma sugerido contempla uma parcela de R$ 40 bi nesse ano, outra de R$ 30 bi em 2017 e mais uma de R$ 30 bi em 2018. É verdade que essa manobra permite uma economia de R$ 7 bi em razão do diferencial de juros dessa dívida. Mas a natureza do endividamento público não se altera em sua essência. E a medida ainda deverá ser objeto de avaliação jurídica, pois há economistas no próprio campo conservador que são contra tal procedimento de criatividade contábil. Além disso, o BNDES deixará de contar com esses recursos em sua carteira para estimular o financiamento, aspecto fundamental para a retomada do crescimento da economia.
Intenções da força do mal
A extinção do Fundo Soberano do Brasil (FSB) é um absurdo! Ele foi criado justamente para preservar valores desse tipo de utilização pelo governante de plantão. É sabido que a emergência de crise conjuntural leva á adoção de medidas pautadas pelo desespero do curto prazo. Esse tipo de oportunismo casuístico seria contornado pela inacessibilidade ao Fundo Soberano. Seus valores seriam utilizados para o benefício das gerações futuras em áreas como educação, saúde e ciência e tecnologia. Mas a lógica do ex-presidente internacional do Bank of Boston é outra. Ele se preocupa apenas em evitar as perdas imediatas do financismo. E com isso lá se vão os R$ 2 bi que o FSB tem em caixa atualmente. Tudo isso com o discurso de que o Pré Sal não está sendo muito utilizado para formar o fundo estratégico.
Mas as maiores perversidades do pacote de intenções referem-se às reduções previstas para área social, como já preconizava o documento “A ponte para o futuro” da Fundação Ulysses Guimarães do PMDB. Ainda que sejam todas propostas que necessitam aprovação de lei ou mudança constitucional, elas apontam para o terrível risco de retrocesso nas políticas públicas de natureza social. O governo fala em alterar a política de valorização do salário mínimo. O governo fala em desvincular os benefícios da previdência social do piso salário mínimo. O governo fala em estabelecer tetos para as despesas públicas, mas estão excluídos desse procedimento os gastos financeiros com juros e serviços da dívida pública. O governo fala em retirar os percentuais obrigatórios de despesas com saúde e com educação. O governo fala em avançar na flexibilização das relações trabalhistas, incorporando uma proposta irresponsavelmente apresentada pela CUT, onde está previsto que o negociado entre empresas e sindicatos pode ser contrário ao previsto na legislação.
Pressionado pelas entidades empresariais, Temer acabou não apresentando nenhuma medida para recuperar o lado das receitas na equação fiscal. Havia cogitado até pouco tempo atrás em recuperar a proposta da CPMF e de promover a eliminação das desonerações tributárias. Mas tudo indica que o pato da FIESP falou mais alto. Como a economia continua a ser pautada pelo ritmo da recessão, a capacidade de obtenção de mais recursos tributários permanece congelada. Não há meio de sair da armadilha que não seja por meio de impostos sobre a renda não atingida pelo fisco e sobre o patrimônio. Por outro lado, é urgente a ruptura com a lógica perversa do superávit primário. Ou seja, a lógica dos cortes deveria também reduzir os gastos de natureza financeira.
Pedalada do Michel: R$ 170 bi que se evaporam?
Resta o anúncio do aumento do déficit fiscal previsto para esse ano: saindo dos atuais R$ 97 bi para os R$ 170 bi constantes na proposta enviada ao Congresso Nacional. Trata-se tão somente de um reconhecimento das dificuldades existentes na administração das contas públicas e de uma medida preventiva, para evitar qualquer problema de descumprimento das regras estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal no final do ano. O que vai ser determinante mesmo é a administração da política ao longo do tempo, com os cortes e os contingenciamentos que o Tesouro Nacional deverá sugerir.
Em resumo, pode-se analisar esse movimento todo como uma reação do governo à pressão da base de sustentação no Congresso Nacional, tendo em vista a realização de eleições para vereadores e prefeitos em cada um dos mais de 5.570 municípios. Ao que tudo indica, os integrantes das máquinas dos partidos do centrão não querem carregar nas costas o peso de medidas impopulares a poucos meses das eleições previstas para outubro. Por outro lado, processos para aprovação de emenda constitucional exigem presença constante e quórum elevado em Brasília, requisitos difíceis de serem obtidos em períodos que antecedem os pleitos.
As maldades foram quase todas anunciadas “apenas” como um pacote de intenções. Nenhuma medida concreta foi apresentada no evento. As expectativas positivas para os empresários estão sendo mantidas artificialmente pela narrativa construída pelos representantes do financismo no interior dos meios de comunicação. No outro campo, os movimentos de resistência ao golpeachment e ao retrocesso social apresentam sua estratégia de ação. O cenário de disputa está aberto.
* Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
A cerimônia já havia sido preparada pela equipe do vice-presidente em exercício com todo o esmero possível. Afinal, a intenção era realizar o anúncio oficial das medidas econômicas tão esperadas pela turma do financismo. A expectativa era que um ministro da Fazenda do porte de Henrique Meirelles - antigo integrante do “crème de la crème” da banca internacional - certamente comandaria o blá-blá com maestria e deveria dar conta do recado.
Mas, como Garrincha lembrou ao técnico Feola na Copa de 1958, faltou combinar com os russos. Tanto mais quanto se trata de articulações no plano da política, onde tudo é carregado de uma certa dose de imprevisibilidade. Combina-se tudo de véspera, mas o imponderável pode surgir e obrigar a algum rearranjo. No caso da nomeação de Romero Jucá, em particular, não foi por falta de advertência e aviso, mas Michel Temer resolveu insistir. Colocar com tanto destaque em sua primeira equipe de governo um indivíduo tão visado e encrencado revelou-se por demais arriscado.
Exoneração de Jucá e o anúncio das medidas
E eis que, antes mesmo de completar 2 semanas de governo provisório, o principal articulador político da equipe e ocupante da pasta do Planejamento é vítima de uma armadilha do fogo amigo. As implicações e investigações de casos de corrupção do parlamentar de Roraima vieram a público mais uma vez. Nesse caso por meio de uma gravação simulada do ex-senador e ex-diretor da Petrobrás, Sérgio Machado. A conversa entre ambos deixou evidente a tentativa de Jucá em acabar com a Operação Lava Jato e promover o afastamento de Dilma. Por mais que ele tenha tentado ensaiar o enredo da “licença temporária”, o fato é que foi mesmo exonerado.
A dupla da área econômica ficou manca, perdeu um pé e o anúncio do pacote acabou frustrando os que contavam com propostas mais ousadas para resolver de vez com aquela suposta “irresponsabilidade fiscal” herdada do governo anterior. Henrique Meirelles estava ladeado pelo secretário executivo do Ministério do Planejamento, que está respondendo interinamente pela pasta. Por mais que a grande imprensa tente manter as aparências e segurar a onda da incompetência temerária, o fato é que muito pouco foi decidido ou anunciado para resolver a crise fiscal no curto prazo. Na verdade, durante o evento foi apresentada uma longa lista de declarações de intenção. Um extenso rol de maldades, mas que dependem ainda de outros fatores e de outros espaços para serem implementadas.
A declaração mais reverberada pelos articulistas apoiados pelo sistema financeiro foi a “bombástica” manobra contábil dos R$ 100 bilhões. Ora, trata-se de uma mera pedalada micheliana, um procedimento que chega a causar inveja aos integrantes da equipe do primeiro mandato de Dilma. “Mas como é que a gente não tinha pensado nisso antes?” O BNDES antecipa um pagamento devido ao Tesouro Nacional, cujo vencimento estava previsto para as próximas décadas. O cronograma sugerido contempla uma parcela de R$ 40 bi nesse ano, outra de R$ 30 bi em 2017 e mais uma de R$ 30 bi em 2018. É verdade que essa manobra permite uma economia de R$ 7 bi em razão do diferencial de juros dessa dívida. Mas a natureza do endividamento público não se altera em sua essência. E a medida ainda deverá ser objeto de avaliação jurídica, pois há economistas no próprio campo conservador que são contra tal procedimento de criatividade contábil. Além disso, o BNDES deixará de contar com esses recursos em sua carteira para estimular o financiamento, aspecto fundamental para a retomada do crescimento da economia.
Intenções da força do mal
A extinção do Fundo Soberano do Brasil (FSB) é um absurdo! Ele foi criado justamente para preservar valores desse tipo de utilização pelo governante de plantão. É sabido que a emergência de crise conjuntural leva á adoção de medidas pautadas pelo desespero do curto prazo. Esse tipo de oportunismo casuístico seria contornado pela inacessibilidade ao Fundo Soberano. Seus valores seriam utilizados para o benefício das gerações futuras em áreas como educação, saúde e ciência e tecnologia. Mas a lógica do ex-presidente internacional do Bank of Boston é outra. Ele se preocupa apenas em evitar as perdas imediatas do financismo. E com isso lá se vão os R$ 2 bi que o FSB tem em caixa atualmente. Tudo isso com o discurso de que o Pré Sal não está sendo muito utilizado para formar o fundo estratégico.
Mas as maiores perversidades do pacote de intenções referem-se às reduções previstas para área social, como já preconizava o documento “A ponte para o futuro” da Fundação Ulysses Guimarães do PMDB. Ainda que sejam todas propostas que necessitam aprovação de lei ou mudança constitucional, elas apontam para o terrível risco de retrocesso nas políticas públicas de natureza social. O governo fala em alterar a política de valorização do salário mínimo. O governo fala em desvincular os benefícios da previdência social do piso salário mínimo. O governo fala em estabelecer tetos para as despesas públicas, mas estão excluídos desse procedimento os gastos financeiros com juros e serviços da dívida pública. O governo fala em retirar os percentuais obrigatórios de despesas com saúde e com educação. O governo fala em avançar na flexibilização das relações trabalhistas, incorporando uma proposta irresponsavelmente apresentada pela CUT, onde está previsto que o negociado entre empresas e sindicatos pode ser contrário ao previsto na legislação.
Pressionado pelas entidades empresariais, Temer acabou não apresentando nenhuma medida para recuperar o lado das receitas na equação fiscal. Havia cogitado até pouco tempo atrás em recuperar a proposta da CPMF e de promover a eliminação das desonerações tributárias. Mas tudo indica que o pato da FIESP falou mais alto. Como a economia continua a ser pautada pelo ritmo da recessão, a capacidade de obtenção de mais recursos tributários permanece congelada. Não há meio de sair da armadilha que não seja por meio de impostos sobre a renda não atingida pelo fisco e sobre o patrimônio. Por outro lado, é urgente a ruptura com a lógica perversa do superávit primário. Ou seja, a lógica dos cortes deveria também reduzir os gastos de natureza financeira.
Pedalada do Michel: R$ 170 bi que se evaporam?
Resta o anúncio do aumento do déficit fiscal previsto para esse ano: saindo dos atuais R$ 97 bi para os R$ 170 bi constantes na proposta enviada ao Congresso Nacional. Trata-se tão somente de um reconhecimento das dificuldades existentes na administração das contas públicas e de uma medida preventiva, para evitar qualquer problema de descumprimento das regras estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal no final do ano. O que vai ser determinante mesmo é a administração da política ao longo do tempo, com os cortes e os contingenciamentos que o Tesouro Nacional deverá sugerir.
Em resumo, pode-se analisar esse movimento todo como uma reação do governo à pressão da base de sustentação no Congresso Nacional, tendo em vista a realização de eleições para vereadores e prefeitos em cada um dos mais de 5.570 municípios. Ao que tudo indica, os integrantes das máquinas dos partidos do centrão não querem carregar nas costas o peso de medidas impopulares a poucos meses das eleições previstas para outubro. Por outro lado, processos para aprovação de emenda constitucional exigem presença constante e quórum elevado em Brasília, requisitos difíceis de serem obtidos em períodos que antecedem os pleitos.
As maldades foram quase todas anunciadas “apenas” como um pacote de intenções. Nenhuma medida concreta foi apresentada no evento. As expectativas positivas para os empresários estão sendo mantidas artificialmente pela narrativa construída pelos representantes do financismo no interior dos meios de comunicação. No outro campo, os movimentos de resistência ao golpeachment e ao retrocesso social apresentam sua estratégia de ação. O cenário de disputa está aberto.
* Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
A PEWRGUNTA É A SEGUINTE: BARROSO DEU 5 DIAS A TEMER PARA EXPLICAR SUAS ARBITRARIEDADES COMO INTERINO, ENTAO É HORA DE SABER SE O INTERINO QUE O NOME JA ESTA DIZENDO APENAS SUBSTITUI E NAO PODERIA MUDAR OS MINISTROS ACABAR COM MINISTERIOS, SECRETARIAS, E OUTROS ELE RESPONDEU AO SUPREMO OU NAO TOMOU CONHECIMENTO E ESPERA QUE TODOS NÓS ESQUEÇAMOS QUE BARROSO O QUESTIONOU?
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