quarta-feira, 20 de julho de 2016

A pintura da paisagem para o golpe

Por Tereza Cruvinel, em seu blog:

Há alguns dias, o Brasil começou a parecer um país agradável nos telejornais, especialmente no Jornal Nacional, com notícias amenas e apresentadores serenos. Os jornais deixaram de falar de uma paisagem devastada e começaram a dar notícias boas: “Cresce o otimismo com a economia”, anunciou o Datafolha divulgando uma pesquisa pouco convincente, tanto em aspectos políticos como econômicos. Agora, 50% querem que Temer fique, contra 32% que preferem a volta de Dilma. Em abril o instituto apurou que a maioria não queria Dilma nem Temer. 61% aprovavam o impeachment dela, e 58% o dele. Alguma fada deve estar protegendo Temer porque nada mudou no cenário que justifique tal guinada do sentimento popular.

Nesta terça-feira, por sinal, ele deu um prazo de 20 dias para que seus ministros da área econômica apresentem medidas para estimular o crescimento. Tal prazo termina quando? Em agosto, ora, bolas. E tem a Olimpíada, que absorverá muita luz nas próximas semanas, deixando em segundo plano os problemas reais. Não há dúvida: começou a ser pintado, com cores suaves, um quadro de otimismo para favorecer a consumação final do golpe revestido de impeachment em agosto. Uma pintura em aquarela, com muita cor borrada e pouca nitidez das formas.

Na política, o governo emplacou Rodrigo Maia na presidência da Câmara para tocar sua agenda conservadora, começando pela PEC que aprisiona o crescimento do gasto publico no índice da inflação e pela reforma previdenciária. Da agenda de agosto Temer tratará esta noite num jantar com Rodrigo e Renan Calheiros, presidente do Senado. Quando o Congresso reabrir, no início de agosto, Meirelles e sua equipe estarão apresentando medidas pró-crescimento. Se elas fossem de fato possíveis e viáveis, já estariam sendo aplicadas, não estaria o governo perdendo um precioso tempo. Não importa o recheio do bolo, importa que tenha um glacê vistoso, que agora começará a ser preparado com muito açúcar.

Até o FMI apareceu neste início de semana informando que a recessão pode acabar sendo alguns décimos menor este ano, em relação ao que previra, e que em 2017 haverá crescimento, ainda que seja apenas de 0,5%. Mas nada como o Datafolha, ao informar que os otimistas com a economia são 38%, contra 30% de pessimistas. E numa contradição com os 60% que esperam aumento da inflação e do desemprego. Mas o que importa é a manchete, e ela falou de aumento do otimismo econômico.

Na linha do otimismo, apesar da inflação, do desemprego e do paradeira nos negócios, fomos também informados de que:

- A Caixa Econômica Federal voltará a financiar imóveis para a classe média.

- Temer pediu à equipe econômica que reduza os juros.

- As exportações podem ter um superávit de US$ 46,934 bilhões na balança comercial deste ano.

- Segundo a CNI, o Índice de Confiança do Empresário Industrial teve a terceira alta seguida em julho, passando de 45,7 pontos para 47,3.

- Segundo o Credit Default Swap (CDS), com a posse de Temer o risco Brasil caiu significativamente, passado de 495,09 pontos em dezembro passado para 294,35 neste mês de julho.

Muito mais pode ser encontrado numa garimpagem do noticiário econômico. Enquanto isso os congressistas aproveitam as férias e voltarão para trabalhar três dias por semana em agosto. No Senado, depois deste banho de cheiro e otimismo, será mais fácil confirmar a condenação de Dilma. A democracia? Seria problema se houvesse milhões nas ruas cobrando respeito ao voto, como na Turquia, mas aqui tudo segue na santa paz dos trópicos. O golpe não foi feito com tanques, o que gera indignação e revolta, mas com leis. Leis retorcidas e interpretações convenientes, mas com leis. E isso gera resignação e não revolta.

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