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De um lado, a caçada sem trégua ao ex-presidente operário que tirou o país do mapa da miséria e da fome da ONU;
- que colocou a economia a operar a pleno emprego –e fez os salários terem ganhos reais por uma década;
- que elevou o peso internacional da nação a ponto de ter assento em todas as reuniões do G-8 – ‘aquilo que o sociólogo sempre sonhou (e nunca teve)’;
- que por isso tudo estendeu raízes longas, profundas, na sociedade e no seu imaginário.
E se elevou muito acima da média dos demais, como o líder popular mais importante da história.
Do outro lado, a terra arrasada da política nacional.
Essa que o fervoroso Coordenador da Força Tarefa do Ministério Público Federal na Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol, procurou condensar em um power point.
Talvez mais que isso.
Um novo mapa do Brasil, quem sabe.
Nele, uma terra em transe é condensada em uma geografia circular manipulada por forças satânicas, para as quais prescreve-se um descarrego de purificação.
O grafismo lembra os mapas celestiais das aulas de catecismo de antigamente, com os sinais invertidos.
Na cosmologia dallagnoliana, o agigantamento de Luiz Inácio Lula da Silva ocupa o centro solar do ‘Mal’, de onde partem, e para o qual retornam –sobretudo, retornam, segundo o autor-- as estripulias e benesses capitais de toda a nação.
A fé, como se sabe, dispensa-nos das banalidades terrenas.
Dallagnol não economiza na convicção transposta em aliterações de púlpito: Lula ‘comandou’, ele ‘garantiu’ ‘foi o chefe’, ‘ o general’, ‘o principal beneficiado’.
Oremos?
Moro o fará - alguns dizem que já nesta 2ª feira.
Na volta de mais uma de suas viagens aos EUA – quantas, na preparação e implementação da Lava Jato? Não vem ao caso.
Especula-se que aceitará o sermão de Dallagnol e despachará os encaminhamentos da purificação pontificada.
Qual?
Oferecer a cabeça de Lula à galeria dos ex-presidentes cassados em seus direitos políticos, de modo a faxinar preventivamente as urnas de 2018, livrando-nos do mal, para todo o sempre, amém.
Redimidos?
Melhor olhar o mapa do que sobra antes de engrossar o ‘Aleluia’ da mídia beata.
Na terra arrasada, sobra a solidão da sociedade órfã da democracia pelo descrédito na política.
Lavado, lixiviado na conjunção de uma crise institucional e de ciclo de desenvolvimento - da qual as elites souberam se aproveitar com a notável coordenação que sugere algo mais nesse enredo - a sociedade assiste romperem-se os cadeados e anteparos que a protegem do mercado em estado bruto.
A aliança da mídia com a escória, o dinheiro e o judiciário, a mesma que derrubou Dilma, aprofunda-se nesse desmonte das defesas da democracia diante do mercado.
‘E tudo isso sem um tiro’, lembraria Lula na 5ª feira
Mas com um tipo de virulência não menos sangrenta na duração e abrangência de um custo social, estratégico e geopolítico.
A paraguaização do Brasil irradia efeitos na América Latina.
A extensão do golpe permite hoje que o Departamento de Estado logre o que nunca conseguiu, em mais de uma década de colisão frontal com Caracas: isolar a Venezuela no âmbito do Mercosul.
É um exemplo.
Não será o único.
O chanceler José Serra quer prestar serviços. Almeja postos futuros.
O braço de cooperação do Itamaraty com dezenas de nações em desenvolvimento no combate à fome - frente na qual o Brasil se tornou referência internacional - já foi amputado pelo bisturi ideológico do tucano.
É na demolição dos contrapesos internos a um capitalismo marcado por desigualdade pétrea, porém, que reside a centralidade da espiral regressiva em ação desde o golpe de 31 de agosto.
Se não for detida na rua, que é onde a democracia ainda respira o ar já empesteado de gás lacrimogênio, essa lógica não hesitará em levar à antessala da barbárie.
Não é preciso muito.
Basta conceder ao capitalismo a liberdade de ser integralmente o que é.
Defesas históricas, contrapostas à voragem intrínseca do sistema, ameaçam tombar aqui num efeito dominó fulminante.
A PEC 241 resume o método e o mérito.
Atua-se no atacado.
O ‘teto’ da nova matriz fiscal consiste em romper garantias orçamentárias de todo o escopo de serviços públicos previstos na Constituição Cidadã de 1988.
Tira-se o pobre do orçamento.
Rompe-se o pacto da sociedade.
Sem consulta-la.
Pelos próximos vinte anos.
Qual é o nome disso?
Paralelo à blitzkrieg contra a Carta de 88, o STF instala uma bomba relógio nos alicerces da CLT.
As mesmas togas complacentes com Eduardo Cunha operavam ardilosamente sancionando o negociado sobre o legislado em pendências trabalhistas.
Com 12 milhões de desempregados, sem o estorvo do pleno emprego para fortalecer sindicatos e grevistas, a primazia do negociado esfarela a função da lei de proteger o mais fraco, no momento mais difícil.
Na história das sociedades, depois que certos pilares são derrubadas, o resto obedece a lei a física e desmorona por gravidade.
É um exemplo.
Não será o único.
O chanceler José Serra quer prestar serviços. Almeja postos futuros.
O braço de cooperação do Itamaraty com dezenas de nações em desenvolvimento no combate à fome - frente na qual o Brasil se tornou referência internacional - já foi amputado pelo bisturi ideológico do tucano.
É na demolição dos contrapesos internos a um capitalismo marcado por desigualdade pétrea, porém, que reside a centralidade da espiral regressiva em ação desde o golpe de 31 de agosto.
Se não for detida na rua, que é onde a democracia ainda respira o ar já empesteado de gás lacrimogênio, essa lógica não hesitará em levar à antessala da barbárie.
Não é preciso muito.
Basta conceder ao capitalismo a liberdade de ser integralmente o que é.
Defesas históricas, contrapostas à voragem intrínseca do sistema, ameaçam tombar aqui num efeito dominó fulminante.
A PEC 241 resume o método e o mérito.
Atua-se no atacado.
O ‘teto’ da nova matriz fiscal consiste em romper garantias orçamentárias de todo o escopo de serviços públicos previstos na Constituição Cidadã de 1988.
Tira-se o pobre do orçamento.
Rompe-se o pacto da sociedade.
Sem consulta-la.
Pelos próximos vinte anos.
Qual é o nome disso?
Paralelo à blitzkrieg contra a Carta de 88, o STF instala uma bomba relógio nos alicerces da CLT.
As mesmas togas complacentes com Eduardo Cunha operavam ardilosamente sancionando o negociado sobre o legislado em pendências trabalhistas.
Com 12 milhões de desempregados, sem o estorvo do pleno emprego para fortalecer sindicatos e grevistas, a primazia do negociado esfarela a função da lei de proteger o mais fraco, no momento mais difícil.
Na história das sociedades, depois que certos pilares são derrubadas, o resto obedece a lei a física e desmorona por gravidade.
É desse mirante que se deve avaliar o agigantamento adicional de Lula na solidão da política brasileira nesse momento.
A sôfrega exposição de fé do procurador Dallagnol em convicções didaticamente condensadas em power point, reflete a visão da elite sobre o país, a partir desse promontório.
Dallagnol talvez nem saiba - Lula lembrou na 5ª feira que não faltam doutores universitários analfabetos em política. Mas o fato é que higienização que advoga com a destruição do ex-presidente operário, converge a sua fé com outra.
A do golpe, em sua crença esférica na virtude dos mercados autorregulados.
O mundo inteiro se despede desse altar no qual o golpe se ajoelha agora, em uma restauração tardia do neoliberalismo, em nome do qual se pretende impor uma comunhão de vinte anos de jejum à sociedade.
Joseph Stiglitz/jornal El País/sexta-feira/16/09: ‘...disseram que a liberalização do mercado financeiro aceleraria o crescimento e o que fez foi dar mais dinheiro ao 1% de cima. A lição é que precisamos de proteção. Quando se fala de proteção, fala-se de forma pejorativa. Em uma sociedade democrática é preciso se assegurar que a economia funcione para todos; a nossa não o faz. A teoria econômica já predisse, e agora temos a evidência; (a ascensão dos partidos de extrema direita) resulta do fato de que os de centro apoiaram uma série de políticas durante um terço de século que aumentaram a desigualdade e deixaram para trás muitas frações da sociedade’.
Emocionado, porém assertivo, Lula responderia ao mapa de Dellagnol, na 5ª feira, com um objetivo que cobrou, mesmo sabendo que seria apenas uma denúncia:
‘Espero que a mídia me dê hoje o mesmo tempo destinado aos meus acusadores ontem’, sapecou o ex-presidente em reunião nas dependências lotadas de um hotel no centro de São Paulo.
Na rua igualmente ocupada por simpatizantes e populares o clima de indignação espelhava o sentimento de democratas de todos os matizes.
No dia anterior, o Jornal Nacional dedicara seu tempo e recursos de edição a encorpar, como suas, as convicções ordenadas no power point do procurador.
A fala de Lula começou mansa e transparecia mágoa com o sofrimento da família, em especial da esposa, ‘dona Marisa’.
Mas a tônica, logo ficou claro, é a da presa que adiou o quanto pode um enfrentamento difícil, que afinal se revelou uma incontornável disjuntiva de vida ou morte.
E Lula escolheu a vida.
Fez do seu pronunciamento um palanque para deixar claro essa escolha, reiteradas vezes
O que para ele significa turbinar aquilo que a vida sempre foi para o retirante nordestino que dentro de um mês meio completará 71 anos de idade: lutar e resistir; resistir e lutar.
O inaceitável, para muitos, é que tenha dado tão certo.
O ex-presidente parece convencido de que só há um lugar para ele, a salvo desse ressentimento transformado em caçada implacável – ‘por não ter fracassado’, como repetiu várias vezes na 5ª feira.
‘Nada disso aconteceria’, explicou, ‘ o PT não seria perseguido, se nós tivéssemos fracassado como eles esperavam; e não tivéssemos feito mais do que eles fizeram, durante séculos, pelos pobres deste país’.
O lugar seguro que resta , paradoxalmente, é justamente aquele do qual o golpe gostaria de afasta-lo de forma definitiva: a luta pela volta ao poder.
Seu trunfo contra o cerco que se fecha é a própria contradição de ter feito tudo o que fez sem violência social: ‘Vocês acham que me eliminando resolvem o problema? Ao contrário’, saboreia as palavras como um sal secreto, que salpica aos poucos, com a pontuação de quem sabe conversar com a multidão, como se conversa com o amigo na mesa de bar.
‘Problema vocês vão ter quando começarem a tirar direitos dos trabalhadores; problema vocês vão ter quando começarem a vender o patrimônio nacional, como o pré-sal ... (vocês) pensam que governar é vender’, acusa com a autoridade de quem retirou o equivalente a uma Argentina da miséria e propiciou a ascensão do equivalente a uma outra na escala da renda.
‘Eles só pesam em vender’ (desdenha); ‘governar é assumir o compromisso de acabar com a miséria, colocando o pobre no orçamento --como nós fizemos’, sentencia para sapatear na prioridade expressa na PEC golpista, que pretende congelar o gasto real com serviços essenciais ‘Problema vocês vão ter com essa molecada’, fuzila, ‘essa que impediu o Alckmin de fechar escolas’, adverte e escancara o tamanho do revide: ‘Eles são o Lula com 71 anos de idade -- só que multiplicado por milhares’, sorri pela primeira vez.
O flerte com a volta às ruas já fora expresso em outras ocasiões.
A longa vigília da caça perseguida em um estirão indiviso, que já dura mais de dois anos, até a tentativa, agora, de enreda-lo num power point rudimentar, impõe o passo adiante.
A diferença é a mutação daquilo que era uma advertência, em compromisso definitivo pelo tempo de vida que lhe restar, porque a alternativa é a morte política, o que em se tratando de Lula equivale à biológica.
É esse o aviso intrínseco ao comentário que dispara em direção aos que assombrados o temem e odeiam, com igual intensidade: ‘Aos 71 anos não estou cansado’, comunica com voz serena. ‘Ainda vou viver muito, mais uns vinte anos’, provoca, ’estou me preparando fisicamente, e vou me dedicar para fazer um país melhor’.
O dardo ergue o espectro de uma popularidade andarilha, solta em um Brasil convulsionado pelo repto de uma agenda neoliberal desastrosa e explosiva.
Ele sabe disso.
E dá mais uma volta na rosca: ‘Tenham a certeza de que nada, nada, só Deus pode me fazer parar de lutar pelo que acredito. Estou à disposição do PT’.
Não falta quem considere essa disposição uma carta fora do baralho político.
A corrosão na imagem, inegável, paradoxalmente, porém, pode sofrer uma reversão quando parecia encaminhar-se para o abate de misericórdia. E não apenas pela qualidade colegial da apoteose oferecida pelo MP.
O mito pode ter perdido a aura, para se tornar uma liderança de carne e osso, com os limites da carne e do osso.
Mas a deterioração do país, os anúncios de um arrocho adicional devolvem-lhe o cetro da única liderança, hoje, capaz de falar a todo o Brasil e ser ouvida –inclusive por setores produtivos, que mesmo vulnerável defende: ‘Empresário falido é uma desgraça; empresário precisa ganhar dinheiro ou não paga salários, não paga impostos...’
Mal ou bem, com omissões e equívocos que Carta Maior discutiu fartamente, foram os seus dois governos e os da presidenta Dilma que mais longe levaram o compromisso de reduzir a desigualdade brasileira, congelada pelas elites como o eletrocardiograma de um morto.
Lula resgatou milhões de mortos sociais descartados pelos punhos de renda que governaram antese agora estão de volta.
Fez isso no seu primeiro mandato e depois ampliou a porta da cidadania a milhões de famílias assalariadas, junto com a sucessora, Dilma Rousseff.
‘O Brasil que sonho está longe de estar construído’, admitiu, todavia, ao final do pronunciamento da 5ª feira. ‘O que se fez foi subir apenas um degrau, esse que eles estão destruindo’, ensaiou o discurso de volta para o futuro.
‘Quero fazer mais; tenho a certeza de que dá para fazer; aí sim, vale a convicção porque tenho a prova: já fiz antes’, espetou no encerramento para deixar uma certeza no ar.
Aquela que a santa aliança mais teme.
Lula até pode ser cassado em seus direitos políticos, como uiva a cosmologia do procurador.
Mas será difícil impedi-lo de ser um protagonista decisivo no caminho de volta do Brasil, do céu de Dallagnol – onde fica o reino do mercado de Temer, à história concreta da luta pelo desenvolvimento.
Aquela feita por homens e mulheres dotados de virtudes e defeitos que secularmente empurram o país para frente, não ao olimpo perfeito dos deuses e dos mercados, mas a uma sociedade mais justa, diversa e democrática no mundo destrambelhado do século XXI.
A sôfrega exposição de fé do procurador Dallagnol em convicções didaticamente condensadas em power point, reflete a visão da elite sobre o país, a partir desse promontório.
Dallagnol talvez nem saiba - Lula lembrou na 5ª feira que não faltam doutores universitários analfabetos em política. Mas o fato é que higienização que advoga com a destruição do ex-presidente operário, converge a sua fé com outra.
A do golpe, em sua crença esférica na virtude dos mercados autorregulados.
O mundo inteiro se despede desse altar no qual o golpe se ajoelha agora, em uma restauração tardia do neoliberalismo, em nome do qual se pretende impor uma comunhão de vinte anos de jejum à sociedade.
Joseph Stiglitz/jornal El País/sexta-feira/16/09: ‘...disseram que a liberalização do mercado financeiro aceleraria o crescimento e o que fez foi dar mais dinheiro ao 1% de cima. A lição é que precisamos de proteção. Quando se fala de proteção, fala-se de forma pejorativa. Em uma sociedade democrática é preciso se assegurar que a economia funcione para todos; a nossa não o faz. A teoria econômica já predisse, e agora temos a evidência; (a ascensão dos partidos de extrema direita) resulta do fato de que os de centro apoiaram uma série de políticas durante um terço de século que aumentaram a desigualdade e deixaram para trás muitas frações da sociedade’.
Emocionado, porém assertivo, Lula responderia ao mapa de Dellagnol, na 5ª feira, com um objetivo que cobrou, mesmo sabendo que seria apenas uma denúncia:
‘Espero que a mídia me dê hoje o mesmo tempo destinado aos meus acusadores ontem’, sapecou o ex-presidente em reunião nas dependências lotadas de um hotel no centro de São Paulo.
Na rua igualmente ocupada por simpatizantes e populares o clima de indignação espelhava o sentimento de democratas de todos os matizes.
No dia anterior, o Jornal Nacional dedicara seu tempo e recursos de edição a encorpar, como suas, as convicções ordenadas no power point do procurador.
A fala de Lula começou mansa e transparecia mágoa com o sofrimento da família, em especial da esposa, ‘dona Marisa’.
Mas a tônica, logo ficou claro, é a da presa que adiou o quanto pode um enfrentamento difícil, que afinal se revelou uma incontornável disjuntiva de vida ou morte.
E Lula escolheu a vida.
Fez do seu pronunciamento um palanque para deixar claro essa escolha, reiteradas vezes
O que para ele significa turbinar aquilo que a vida sempre foi para o retirante nordestino que dentro de um mês meio completará 71 anos de idade: lutar e resistir; resistir e lutar.
O inaceitável, para muitos, é que tenha dado tão certo.
O ex-presidente parece convencido de que só há um lugar para ele, a salvo desse ressentimento transformado em caçada implacável – ‘por não ter fracassado’, como repetiu várias vezes na 5ª feira.
‘Nada disso aconteceria’, explicou, ‘ o PT não seria perseguido, se nós tivéssemos fracassado como eles esperavam; e não tivéssemos feito mais do que eles fizeram, durante séculos, pelos pobres deste país’.
O lugar seguro que resta , paradoxalmente, é justamente aquele do qual o golpe gostaria de afasta-lo de forma definitiva: a luta pela volta ao poder.
Seu trunfo contra o cerco que se fecha é a própria contradição de ter feito tudo o que fez sem violência social: ‘Vocês acham que me eliminando resolvem o problema? Ao contrário’, saboreia as palavras como um sal secreto, que salpica aos poucos, com a pontuação de quem sabe conversar com a multidão, como se conversa com o amigo na mesa de bar.
‘Problema vocês vão ter quando começarem a tirar direitos dos trabalhadores; problema vocês vão ter quando começarem a vender o patrimônio nacional, como o pré-sal ... (vocês) pensam que governar é vender’, acusa com a autoridade de quem retirou o equivalente a uma Argentina da miséria e propiciou a ascensão do equivalente a uma outra na escala da renda.
‘Eles só pesam em vender’ (desdenha); ‘governar é assumir o compromisso de acabar com a miséria, colocando o pobre no orçamento --como nós fizemos’, sentencia para sapatear na prioridade expressa na PEC golpista, que pretende congelar o gasto real com serviços essenciais ‘Problema vocês vão ter com essa molecada’, fuzila, ‘essa que impediu o Alckmin de fechar escolas’, adverte e escancara o tamanho do revide: ‘Eles são o Lula com 71 anos de idade -- só que multiplicado por milhares’, sorri pela primeira vez.
O flerte com a volta às ruas já fora expresso em outras ocasiões.
A longa vigília da caça perseguida em um estirão indiviso, que já dura mais de dois anos, até a tentativa, agora, de enreda-lo num power point rudimentar, impõe o passo adiante.
A diferença é a mutação daquilo que era uma advertência, em compromisso definitivo pelo tempo de vida que lhe restar, porque a alternativa é a morte política, o que em se tratando de Lula equivale à biológica.
É esse o aviso intrínseco ao comentário que dispara em direção aos que assombrados o temem e odeiam, com igual intensidade: ‘Aos 71 anos não estou cansado’, comunica com voz serena. ‘Ainda vou viver muito, mais uns vinte anos’, provoca, ’estou me preparando fisicamente, e vou me dedicar para fazer um país melhor’.
O dardo ergue o espectro de uma popularidade andarilha, solta em um Brasil convulsionado pelo repto de uma agenda neoliberal desastrosa e explosiva.
Ele sabe disso.
E dá mais uma volta na rosca: ‘Tenham a certeza de que nada, nada, só Deus pode me fazer parar de lutar pelo que acredito. Estou à disposição do PT’.
Não falta quem considere essa disposição uma carta fora do baralho político.
A corrosão na imagem, inegável, paradoxalmente, porém, pode sofrer uma reversão quando parecia encaminhar-se para o abate de misericórdia. E não apenas pela qualidade colegial da apoteose oferecida pelo MP.
O mito pode ter perdido a aura, para se tornar uma liderança de carne e osso, com os limites da carne e do osso.
Mas a deterioração do país, os anúncios de um arrocho adicional devolvem-lhe o cetro da única liderança, hoje, capaz de falar a todo o Brasil e ser ouvida –inclusive por setores produtivos, que mesmo vulnerável defende: ‘Empresário falido é uma desgraça; empresário precisa ganhar dinheiro ou não paga salários, não paga impostos...’
Mal ou bem, com omissões e equívocos que Carta Maior discutiu fartamente, foram os seus dois governos e os da presidenta Dilma que mais longe levaram o compromisso de reduzir a desigualdade brasileira, congelada pelas elites como o eletrocardiograma de um morto.
Lula resgatou milhões de mortos sociais descartados pelos punhos de renda que governaram antese agora estão de volta.
Fez isso no seu primeiro mandato e depois ampliou a porta da cidadania a milhões de famílias assalariadas, junto com a sucessora, Dilma Rousseff.
‘O Brasil que sonho está longe de estar construído’, admitiu, todavia, ao final do pronunciamento da 5ª feira. ‘O que se fez foi subir apenas um degrau, esse que eles estão destruindo’, ensaiou o discurso de volta para o futuro.
‘Quero fazer mais; tenho a certeza de que dá para fazer; aí sim, vale a convicção porque tenho a prova: já fiz antes’, espetou no encerramento para deixar uma certeza no ar.
Aquela que a santa aliança mais teme.
Lula até pode ser cassado em seus direitos políticos, como uiva a cosmologia do procurador.
Mas será difícil impedi-lo de ser um protagonista decisivo no caminho de volta do Brasil, do céu de Dallagnol – onde fica o reino do mercado de Temer, à história concreta da luta pelo desenvolvimento.
Aquela feita por homens e mulheres dotados de virtudes e defeitos que secularmente empurram o país para frente, não ao olimpo perfeito dos deuses e dos mercados, mas a uma sociedade mais justa, diversa e democrática no mundo destrambelhado do século XXI.
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