Por Luis Nassif, no Jornal GGN:
3,6% de queda do PIB em 2016 não é culpa de Dilma Rousseff. Arriscaria a dizer que nem é culpa de Michel Temer. Quem levou o país à maior recessão desde 1930 é uma subciência econômica, uma submissão atrasada a um pensamento econômico equivocado, raso, que transformou o conhecimento científico em matéria de fé, abolindo princípios básicos de uma economia de mercado.
A culpa de Dilma e Temer foi a da semi-ignorância de uma, da ignorância ampla de outro, deixando a condução do país nas mãos de técnicos e Ministros de pequena estatura, escasso conhecimento geral.
A tragédia brasileira pós-redemocratização é fruto direto da ação deletéria dos economistas brasileiros, alguns com interesses financeiros explícitos – como a geração do Plano Real -, outros com a ignorância fatal dos falsos especialistas, os que confiam cegamente em respostas de manuais, com total incapacidade de enxergar o todo.
A economia sempre foi uma ciência auxiliar das políticas públicas, assim como o financeiro é auxiliar dos projetos de uma empresa. Cabe ao financeiro avaliar os custos, as formas de financiamento, apontar os limites, mas sempre se subordinando à estratégia definida pelo Board da companhia.
Os erros de Dilma em 2014 foram fruto da sua cabeça. Os desastres de 2015 se deveram à pressão suicida do mercado/mídia e a erros trágicos de diagnóstico de Joaquim Levy, que persistiram na gestão Henrique Meirelles.
1º Passo – a crise fiscal
A crise fiscal do governo Dilma Rousseff foi fruto direto de um erro de diagnóstico dos economistas.
Basearam-se em estudos dos anos 90 – que haviam sido revisados pelo FMI em 2012 – segundo os quais subsídios fiscais tinham impacto positivo no PIB. A enxurrada de subsídios se somou à compressão das tarifas de energia, visando conter a inflação. Havia um quadro externo de queda nos preços internacionais de commodities, prenunciando reflexos negativos sobre o país. E a Lava Jato cumprindo sua missão de destruir a economia brasileira.
A pobreza institucional e política do país permitiu que toda a estratégia fosse comandada de forma autocrática por Dilma e Guido Mantega, abrindo mão de qualquer consulta a outras cabeças.
2º Passo – o ajuste fiscal radical
Joaquim Levy encontrou pela frente o seguinte quadro:
1. Crise fiscal, decorrente da queda da atividade econômica e do exagero dos subsídios concedidos na gestão Mantega.
2. Problemas no front externo com a compressão do câmbio.
3. Aceleração da Selic impactando profundamente a dívida pública.
4. Desmonte da cadeia do petróleo e gás pela compressão das tarifas e pelo missão internacional da Lava Jato.
A estratégia desenhada por Levy/mercado consistia em um choque tarifário gigantesco, um profundo arrocho fiscal e uma desvalorização cambial.
A tática consistia em equilibrar rapidamente as contas públicas, através dessa dupla investida, equilibrar a relação dívida/PIB (principal indicador de solidez fiscal). E, com isso, despertar a fé dos empresários na solidez fiscal. Bastaria para trazer de volta os investimentos em um prazo exíguo. Com os investimentos de volta, haveria a volta do crescimento e, consequentemente, da arrecadação fiscal.
3º Passo - A volta da inflação
Não há economia que resista a um choque simultâneo de tarifas e de câmbio. A consequência lógica foi uma explosão da inflação. O desafio do governo consistiria em impedir os efeitos secundários do duplo choque de preços por alguns meses. Depois, em curto prazo, os investidores voltariam a acreditar no país, retomando os investimentos e trazendo de volta o crescimento.
Na prática, o que ocorreu:
1. Mega-reajustes de tarifas e desvalorização cambial produziram uma aceleração da inflação.
2. Para conter a inflação, o governo aumentou o aperto fiscal.
3. Simultaneamente, subiu a Selic e promover uma política de crédito extremamente restritiva, promovendo o chamado efeito-engavetamento: empresas que tinham crescido mais no período de bonança não tiveram tempo de voltar ao patamar anterior, espremida pelas restrições de crédito e juros altos.
5º Passo – o mantra das expectativas
O jogo, de agora em diante, é tão óbvio que chega a ser cansativo. Nas próximas semanas, economistas de mercado e editorias de economia sairão buzinando que os 3,6% foram um sacrifício necessário. Se afrouxar agora, jogará todo o sacrifício no lixo.
Em 1994 escrevi que a maior praga brasileira foi a mística dos pacotes econômicos. Ali, morria a geração dos economistas que sabia pensar o país de forma sistêmica.
3,6% de queda do PIB em 2016 não é culpa de Dilma Rousseff. Arriscaria a dizer que nem é culpa de Michel Temer. Quem levou o país à maior recessão desde 1930 é uma subciência econômica, uma submissão atrasada a um pensamento econômico equivocado, raso, que transformou o conhecimento científico em matéria de fé, abolindo princípios básicos de uma economia de mercado.
A culpa de Dilma e Temer foi a da semi-ignorância de uma, da ignorância ampla de outro, deixando a condução do país nas mãos de técnicos e Ministros de pequena estatura, escasso conhecimento geral.
A tragédia brasileira pós-redemocratização é fruto direto da ação deletéria dos economistas brasileiros, alguns com interesses financeiros explícitos – como a geração do Plano Real -, outros com a ignorância fatal dos falsos especialistas, os que confiam cegamente em respostas de manuais, com total incapacidade de enxergar o todo.
A economia sempre foi uma ciência auxiliar das políticas públicas, assim como o financeiro é auxiliar dos projetos de uma empresa. Cabe ao financeiro avaliar os custos, as formas de financiamento, apontar os limites, mas sempre se subordinando à estratégia definida pelo Board da companhia.
Os erros de Dilma em 2014 foram fruto da sua cabeça. Os desastres de 2015 se deveram à pressão suicida do mercado/mídia e a erros trágicos de diagnóstico de Joaquim Levy, que persistiram na gestão Henrique Meirelles.
1º Passo – a crise fiscal
A crise fiscal do governo Dilma Rousseff foi fruto direto de um erro de diagnóstico dos economistas.
Basearam-se em estudos dos anos 90 – que haviam sido revisados pelo FMI em 2012 – segundo os quais subsídios fiscais tinham impacto positivo no PIB. A enxurrada de subsídios se somou à compressão das tarifas de energia, visando conter a inflação. Havia um quadro externo de queda nos preços internacionais de commodities, prenunciando reflexos negativos sobre o país. E a Lava Jato cumprindo sua missão de destruir a economia brasileira.
A pobreza institucional e política do país permitiu que toda a estratégia fosse comandada de forma autocrática por Dilma e Guido Mantega, abrindo mão de qualquer consulta a outras cabeças.
2º Passo – o ajuste fiscal radical
Joaquim Levy encontrou pela frente o seguinte quadro:
1. Crise fiscal, decorrente da queda da atividade econômica e do exagero dos subsídios concedidos na gestão Mantega.
2. Problemas no front externo com a compressão do câmbio.
3. Aceleração da Selic impactando profundamente a dívida pública.
4. Desmonte da cadeia do petróleo e gás pela compressão das tarifas e pelo missão internacional da Lava Jato.
A estratégia desenhada por Levy/mercado consistia em um choque tarifário gigantesco, um profundo arrocho fiscal e uma desvalorização cambial.
A tática consistia em equilibrar rapidamente as contas públicas, através dessa dupla investida, equilibrar a relação dívida/PIB (principal indicador de solidez fiscal). E, com isso, despertar a fé dos empresários na solidez fiscal. Bastaria para trazer de volta os investimentos em um prazo exíguo. Com os investimentos de volta, haveria a volta do crescimento e, consequentemente, da arrecadação fiscal.
3º Passo - A volta da inflação
Não há economia que resista a um choque simultâneo de tarifas e de câmbio. A consequência lógica foi uma explosão da inflação. O desafio do governo consistiria em impedir os efeitos secundários do duplo choque de preços por alguns meses. Depois, em curto prazo, os investidores voltariam a acreditar no país, retomando os investimentos e trazendo de volta o crescimento.
Na prática, o que ocorreu:
1. Mega-reajustes de tarifas e desvalorização cambial produziram uma aceleração da inflação.
2. Para conter a inflação, o governo aumentou o aperto fiscal.
3. Simultaneamente, subiu a Selic e promover uma política de crédito extremamente restritiva, promovendo o chamado efeito-engavetamento: empresas que tinham crescido mais no período de bonança não tiveram tempo de voltar ao patamar anterior, espremida pelas restrições de crédito e juros altos.
4º Passo – o efeito engavetamento
As empresas que mais cresceram no período anterior foram as primeiras a bater no muro da inadimplência: atrás delas, vieram as empresas da cadeia produtiva promovendo um amplo engavetamento, que resultou no aprofundamento inédito da recessão.
O resultado foi trágico. Ajuste fiscal, mais elevação dos juros, mais restrição do crédito resultaram um corte radical na economia. A crise das empresas aumentou o desemprego e afetou a parte fiscal de duas maneiras: na ponta da receita, derrubando a arrecadação devido à crise; na ponta da dívida pública, crescimento devido ao aumento da Selic. Queda do numerador (receita), aumento no denominado (dívida), promoveu um aumento maior da relação dívida/PIB.
No final de 2015, Levy saiu e o novo Ministro da Fazenda Nelson Barbosa ensaiou uma mudança de estratégia: acenaria com o ajuste fiscal no longo prazo em troca de mais fôlego para aumentar os gastos públicos no curto prazo.
O boicote de Eduardo Cunha, mais a ação política combinada com a Lava Jato, impediram qualquer mudança. E a única saída fiscal – a volta da CPMF – foi soterrada pela campanha feita pelo golpe.
Michel Temer assumiu dobrando a aposta no pacote desastroso de Joaquim Levy. O resultado foi o esperado: 3,6% de queda do PIB em cima de uma queda de 4% em 2015. E nenhuma perspectiva de recuperação vigorosa da economia este ano.
As empresas que mais cresceram no período anterior foram as primeiras a bater no muro da inadimplência: atrás delas, vieram as empresas da cadeia produtiva promovendo um amplo engavetamento, que resultou no aprofundamento inédito da recessão.
O resultado foi trágico. Ajuste fiscal, mais elevação dos juros, mais restrição do crédito resultaram um corte radical na economia. A crise das empresas aumentou o desemprego e afetou a parte fiscal de duas maneiras: na ponta da receita, derrubando a arrecadação devido à crise; na ponta da dívida pública, crescimento devido ao aumento da Selic. Queda do numerador (receita), aumento no denominado (dívida), promoveu um aumento maior da relação dívida/PIB.
No final de 2015, Levy saiu e o novo Ministro da Fazenda Nelson Barbosa ensaiou uma mudança de estratégia: acenaria com o ajuste fiscal no longo prazo em troca de mais fôlego para aumentar os gastos públicos no curto prazo.
O boicote de Eduardo Cunha, mais a ação política combinada com a Lava Jato, impediram qualquer mudança. E a única saída fiscal – a volta da CPMF – foi soterrada pela campanha feita pelo golpe.
Michel Temer assumiu dobrando a aposta no pacote desastroso de Joaquim Levy. O resultado foi o esperado: 3,6% de queda do PIB em cima de uma queda de 4% em 2015. E nenhuma perspectiva de recuperação vigorosa da economia este ano.
5º Passo – o mantra das expectativas
O jogo, de agora em diante, é tão óbvio que chega a ser cansativo. Nas próximas semanas, economistas de mercado e editorias de economia sairão buzinando que os 3,6% foram um sacrifício necessário. Se afrouxar agora, jogará todo o sacrifício no lixo.
Em 1994 escrevi que a maior praga brasileira foi a mística dos pacotes econômicos. Ali, morria a geração dos economistas que sabia pensar o país de forma sistêmica.
A recessão e seus efeitos perversos, como o desemprego, não são frutos de cegueira teórica, de adoção de concepções equivocadas, de medidas e de política econômicas ineficientes. Ao contrário, são objetivos perseguidos conscientemente pelos que comandam a política econômica do governo golpista, e que atendem plenamente aos interesses da plutocracia financeira que ocupa o poder. Não se pode fazer análises econômicas certeiras dispensando a luta de classes e os interesses de classe como fio condutor dessas análises. Ciência econômica não existe fora daquela que se fundamenta na análise marxista do sistema capitalismo. Nesse sentido, os preceitos que empolgam Nassif, que é um social-democrata, são tão equivocados quanto aqueles que implementam os neoliberais. E, para piorar, são apresentados como diferenças conceituais, equívocos analíticos, como se os condutores da política econômica do governo golpista fossem apenas incompetentes e estivessem efetivamente empenhados em promover o desenvolvimento econômico em benefício do conjunto da sociedade, assim entendido um organismo social sem contradições antagônicas de interesses de classe. A propósito, é mais lamentável ainda ler representantes de partidos comunistas defendendo medidas anticíclicas keynesianas como se acreditassem poder contornar as crises de superprodução do sistema capitalista adotando o receituário keynesiano implementado por ocasião da crise de 1929. Essa visão leva a que se conceba a possibilidade de estender a vida desse sistema eternamente, sem necessidade de superá-lo através de uma revolução. Os comunistas podem e devem fazer alianças com social-democratas, sempre que tiverem que combater as políticas econômicas e sociais dos neoliberais. Entretanto, não podem jamais se deixar confundir com os sociais-democratas, reproduzindo discurso destes, esquecendo-se de denunciar a falácia das concepções reformistas. Dada a tremenda concentração da produção capitalista ocorrida desde a crise de 1929 para cá, o espaço para a preservação desse sistema através de políticas anticíclicas keynesianas está cada vez mais reduzido. Esse fato é, a meu ver, uma das causas do fim dos Estados de Bem Estar que assistimos atualmente na Europa.
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