quarta-feira, 5 de abril de 2017

Doria, o Berlusconi da Lava-Jato?

Por Jeferson Miola

O prefeito paulistano João Dória é uma das apostas da classe dominante caso a Lava Jato fracasse na condenação arbitrária do Lula e não consiga impedir sua candidatura. Estariam reservando a Dória, o “João trabalhador” do marketing eleitoral, o mesmo papel que o fascista Sílvio Berlusconi desempenhou na Itália pós-Operação Mãos Limpas?

O PIB da Itália em 1992, então a quinta economia do planeta, era de U$$ 1,28 trilhões. Em 1994, no auge das apurações da Mãos Limpas, o PIB desabou 17%, para US$ 1,06 trilhões, significando o derretimento de US$ 221 bilhões da economia do país em decorrência do fechamento de empresas e de prisões e suicídios de empresários.

Atualmente a economia da Itália, que nunca mais recuperou o patamar pré-Mãos Limpas, ocupa a décima posição na classificação do PIB dentre todos os países do mundo. E o padrão atual de corrupção não difere em nada do anterior: mudaram os procedimentos, não o volume.

No sistema político e partidário, os efeitos não foram menos devastadores. Políticos, líderes e governantes foram presos, exilados ou se suicidaram. Os partidos tradicionais que formavam a coalizão de governo foram extintos: a Democracia Cristã e os Partidos Socialista, Social-Democrata e Liberal.

Depois da devastação da economia e do sistema político italiano, ao contrário do que apregoam os bíblicos de Curitiba, não sobreveio a prosperidade, a civilidade, a pureza e o fortalecimento da república e da democracia; mas sim o desalento, a desesperança, a descrença e o niilismo da sociedade italiana em relação à política, à república e à democracia.

O sentimento de terra arrasada foi capturado pelo então outsider Sílvio Berlusconi, um milionário do setor midiático acusado de corrupção e de ligações com a máfia que, com a mesma peculiar astúcia e populismo do Dória, soube se projetar como uma alternativa por fora do sistema político e partidário tradicional.

Berlusconi foi um fenômeno arrebatador; ele impôs derrotas inclusive aos partidos não investigados. Este político cínico e enganador conseguiu permanecer no centro da política italiana por quase 20 anos, até 2011, tendo sido eleito primeiro-ministro em três ocasiões.

Ele se beneficiou do descrédito geral da política para ganhar projeção. Eleito, soube converter a instabilidade política e o enfraquecimento institucional causados pelas Mãos Limpas em fontes para o exercício autoritário e corrupto do poder. Contou, para isso, com a manipulação e alienação do seu império de comunicação, equivalente ao poder da Rede Globo no Brasil.

Os efeitos trágicos na desorganização da economia e da política, assim como na degeneração da cultura italiana, são sentidos ainda hoje, 5 anos depois do fim das gestões “berlusconianas”.

João Dória segue uma trajetória semelhante ao Berlusconi e num contexto político parecido com aquele da Itália no pós-Mãos Limpas, que consagrou o Mussolini contemporâneo: crise econômica, fragilidade institucional, instabilidade política e conflito social agudo.

Dória não apresenta um projeto para a reconstrução econômica, para a reversão dos retrocessos e para a restauração democrática do Brasil devastado pelo golpe de 2016. Com sua visão de mundo formada no eixo São Paulo-Miami, é perda de tempo esperar do Dória uma idéia ou um conceito elementar sobre nação, desenvolvimento e soberania.

No seu pensamento mais profundo e complexo, o Berlusconi brasileiro no máximo consegue igualar o Brasil a um auditório de frivolidades, onde ele executa suas performances ridículas sob os aplausos de uma mídia escrota.

Dória é um embuste. Ele se afirma midiaticamente fazendo a manipulação demagógica que só os mais nefastos políticos, os mais “berlusconianos”, são capazes de fazer. Ele faz a política fascista por inteiro: dizendo-se um anti-política, um anti-sistema, um anti-corrupção, ele faz da negação da política e do combate hipócrita à corrupção instrumentos para a conquista fanática do poder.

A viabilização do Dória dispensaria a oligarquia ter de aprofundar o golpe e endurecer o regime de exceção com medidas temerárias como: [1] arbítrios do Moro para condenar Lula ilegalmente, com base em “convicções”; e [2] o cancelamento da eleição de 2018.

Encontrar quem encarne o odioso sentimento anti-Lula é a prioridade da oligarquia golpista. Encontrar quem possa duelar eleitoralmente com Lula é uma urgência para os golpistas, que assim ficariam livres de uma deslegitimação definitiva acarretada pela condenação ou a prisão do Lula, o mito vivo do povo brasileiro; ou devido ao cancelamento da eleição de 2018.

Na eventualidade improvável do Lula fora da primeira eleição depois do golpe, o que é de duvidosa concretização pela revolta popular que geraria, vai se eleger o candidato que defender a anistia política, a reabilitação jurídica do Lula e o julgamento dos fascistas de toga e de farda que instrumentalizam o cargo de funcionários públicos para a prática fascista de perseguir e liquidar adversários.

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