Por Aldo Fornazieri, no Jornal GGN:
Por mais que José Dirceu possa ter errado, não há como negar-lhe muitos méritos. Junto com Lula, foi o artífice do fortalecimento do PT e da construção das condições para que o partido chegasse ao governo. Na última semana, Dirceu emitiu um forte alerta: a possibilidade de Lula ser preso ou de ser inviabilizado juridicamente de concorrer às eleições de 2018. Até agora não surgiram elementos substantivos que possam justificar a sua prisão. Mas existe uma nova estrada de espinhos nas andanças do ex-presidente, apontada por Dirceu: a delação premiada de João Santana e Mônica Moura. Como a delação ainda não veio a público, fica na conta do imponderável.
O PT tem tratado a candidatura Lula como bala de prata que estará disponível em 2018. Dadas as incertezas dos cenários, o mais apropriado seria que o partido abrisse mais seu leque estratégico para não ser surpreendido se acontecimentos adversos se tornarem efetivos. Se o recuo no lançamento da candidatura Lula foi acertado, o que parece não existir é uma articulação necessária de forças para defender Lula e o direito dele concorrer como uma questão central da restauração da ordem democrática.
A dinâmica da evolução da crise produziu, nas últimas semanas, algumas certezas que fizeram, paradoxalmente, aumentar as incertezas. Uma das certezas se refere ao fato de que Michel Temer, salvo acidentes desconhecidos, deverá chegar até o final do mandato. Ficou mais ou menos claro que o TSE não caçará a chapa Dilma-Temer. Ademais, em que pese a palavra de ordem "Fora Temer" ecoar cada vez mais pelas ruas, os partidos de oposição perderam o interesse de tirá-lo do governo.
Quanto às incertezas produzidas pelas incertezas: Temer é altamente impopular e não constitui perspectiva de poder para 2018; a agenda do governo é anti-social e antipopular e afeta o eleitorado; a economia não reage, o desemprego aumenta e as contas públicas apresentam déficit crescente e a pressão das ruas já desarrumou a reforma da previdência tal como ela vinha sendo apresentada. Em face desses elementos, somados à necessidade de buscar votos em 2018, a base de Temer começa a se esfacelar colocando em risco a capacidade do governo produzir os resultados exigidos pelo mercado. Os movimentos e as incertezas da Lava Jato aumentam ainda mais a pressão sobre o governo, fazendo-o, aos poucos, perder seu principal trunfo: os votos no Congresso.
Assim, o PMDB caminhará para seu modo natural de ser: a divisão e o papel de coadjuvante nas eleições presidenciais. Os partidos do centrão buscarão acoplar-se a alternativas eleitorais viáveis. E o PSDB, nas figuras dos seus líderes tradicionais - Aécio, Serra e Alckmin - tende a submergir abraçado a Temer. Aparentemente, o PSDB está definindo uma estratégia com dois planos. No plano A, se fará um esforço para viabilizar a candidatura Alckmin como uma candidatura competitiva. Se este plano fracassar, Dória será o candidato.
Há que se considerar que a conjuntura e as circunstâncias jogam a favor de Dória, mesmo que ele proclame fidelidade a Alckmin. No momento da escolha, não será esta fidelidade quem decidirá, mas as circunstâncias do momento e o potencial competitivo de cada candidato.
Se a análise de conjuntura tomar por base os dois cenários tradicionais sugeridos por Maquiavel - conservação e mudança - não resta dúvida de que o cenário das eleições de 2018 será de mudanças. Os eleitores vão querer mudanças. Neste aspecto, no âmbito do PSDB, Dória será o nome que mais potencializa esta perspectiva e ele poderá ser ungido como candidato de consenso, com Alckmin concorrendo ao Senado.
Não trate como adversário alguém que te trata como inimigo
Contando com a possibilidade de ser candidato, Dória já sabe que Lula é principal obstáculo para chegar à presidência da República. Com essa projeção em mente, Dória não trata Lula como um possível adversário num jogo democrático. Decidiu tratá-lo como inimigo a ser destruído num campo de batalha. Neste aspecto, Dória decidiu seguir a 15ª "lei do poder" do seu guru. A lei ensina aniquilar totalmente o inimigo, sem misericórdia.
Dória quer ver Lula preso em Curitiba, destruindo-o previamente ao jogo eleitoral. É isto que vem pregando diariamente, fazendo da exigência um mantra. Talvez Dória se imagine um Catão paulistano que substitui "Delenda est Carthago" por "Lula preso em Curitiba". Convém lembrar que o juiz Sérgio Moro é um compagno de Dória e que, por juízo político, poderá favorecê-lo, prendendo ou simplesmente condenando Lula.
O cenário das eleições de 2018 terá vários pontos de semelhança com o cenário de 1989. O primeiro, será o da pulverização das candidaturas. O segundo, será o da decomposição e derrocada das forças vigentes no governo. O terceiro será a conjuntura de mudança que marcará as eleições. Esta conjugação de pontos favorece, de imediato, três candidatos: Dória, que se apresentará como um candidato-gestor e empresário, vindo de fora do sistema vigente; Bolsonaro, que será o candidato da lei, da ordem e da bala, contra a decomposição do país; e Marina Silva, que se ausentou dos embates políticos da crise e que se apresentará como a renovação civilizada da política.
Lula, como mostram todas as pesquisas, em tese também é beneficiário, por algumas razões. Ele se tornou paradigma de governo dos direitos, das oportunidades e da redução das pobreza e das desigualdades. E este paradigma ainda é uma memória viva na mente de milhões de brasileiros. Em segundo lugar, muitos eleitores comparam as realizações do governo Lula com os desastres do governo Temer.
Mas Lula tem também vulnerabilidades: terá que prestar contas do fracasso do governo Dilma e dos problemas de corrupção. Numa conjuntura de mudanças, em alguma medida, será associado, pelos adversários, como um candidato do sistema e será responsabilizado pela crise.
Se Lula vier a ser candidato, teria que construir uma estratégia altamente complexa capaz de dar conta, preliminarmente, de três movimentos: 1) o resgate da boa herança do passado; 2) a condição de vítima em face da ação persecutória que sofreu; 3) uma promessa (ou programa) fortemente inovadora em relação ao futuro. Nas campanhas eleitorais e na vida em geral, as pessoas se preocupam mais com o futuro do que com o passado, principalmente em tempos de crise. Se Lula vier para ser o candidato apenas dos seus êxitos, será derrotado. Na hipótese de Lula não ser candidato, a candidatura Ciro Gomes torna-se viável. Ele também poderá apresentar-se como candidato da inovação e da mudança.
A elaboração de uma estratégia complexa, as questões de alianças, de organização e comunicação serão decisivas para enfrentar Dória, se este vier a ser candidato. Dória viria com uma vantagem: imagem positiva, encarnação da mudança, candidato de fora do sistema deteriorado, empresário-gestor, inovador, enfim, um "novo príncipe". Bolsonaro teria que rivalizar com Dória, pois disputariam os mesmos eleitores e o mesmo imaginário político-ideológico, com diferentes ênfases.
Se este cenário de candidaturas vier a se constituir, as eleições não serão nenhum convite para um jantar, nenhum congraçamento de programas comuns que as fundações partidárias vierem a construir, não serão nenhum evento acadêmico. Serão campos de batalha, mobilizações de rua, trepidar de ofensas, disseminações de ódios.
Não se tratará de uma escolha entre condutas civilizadas ou condutas combativas. O problema é que as circunstâncias da conjuntura brasileira, marcadas pelo golpe, pela agressão aos direitos, pela violação da Constituição e da democracia exigirão a preparação de duros embates. Quem imaginar as eleições fora deste contexto ficará lamentando a polarização. Nesta conjuntura, as forças democráticas e progressistas precisam fincar estacas e estabelecer linhas intransponíveis pelos inimigos. Afinal de contas, não se pode tratar como adversário alguém que te trata como inimigo.
O PT tem tratado a candidatura Lula como bala de prata que estará disponível em 2018. Dadas as incertezas dos cenários, o mais apropriado seria que o partido abrisse mais seu leque estratégico para não ser surpreendido se acontecimentos adversos se tornarem efetivos. Se o recuo no lançamento da candidatura Lula foi acertado, o que parece não existir é uma articulação necessária de forças para defender Lula e o direito dele concorrer como uma questão central da restauração da ordem democrática.
A dinâmica da evolução da crise produziu, nas últimas semanas, algumas certezas que fizeram, paradoxalmente, aumentar as incertezas. Uma das certezas se refere ao fato de que Michel Temer, salvo acidentes desconhecidos, deverá chegar até o final do mandato. Ficou mais ou menos claro que o TSE não caçará a chapa Dilma-Temer. Ademais, em que pese a palavra de ordem "Fora Temer" ecoar cada vez mais pelas ruas, os partidos de oposição perderam o interesse de tirá-lo do governo.
Quanto às incertezas produzidas pelas incertezas: Temer é altamente impopular e não constitui perspectiva de poder para 2018; a agenda do governo é anti-social e antipopular e afeta o eleitorado; a economia não reage, o desemprego aumenta e as contas públicas apresentam déficit crescente e a pressão das ruas já desarrumou a reforma da previdência tal como ela vinha sendo apresentada. Em face desses elementos, somados à necessidade de buscar votos em 2018, a base de Temer começa a se esfacelar colocando em risco a capacidade do governo produzir os resultados exigidos pelo mercado. Os movimentos e as incertezas da Lava Jato aumentam ainda mais a pressão sobre o governo, fazendo-o, aos poucos, perder seu principal trunfo: os votos no Congresso.
Assim, o PMDB caminhará para seu modo natural de ser: a divisão e o papel de coadjuvante nas eleições presidenciais. Os partidos do centrão buscarão acoplar-se a alternativas eleitorais viáveis. E o PSDB, nas figuras dos seus líderes tradicionais - Aécio, Serra e Alckmin - tende a submergir abraçado a Temer. Aparentemente, o PSDB está definindo uma estratégia com dois planos. No plano A, se fará um esforço para viabilizar a candidatura Alckmin como uma candidatura competitiva. Se este plano fracassar, Dória será o candidato.
Há que se considerar que a conjuntura e as circunstâncias jogam a favor de Dória, mesmo que ele proclame fidelidade a Alckmin. No momento da escolha, não será esta fidelidade quem decidirá, mas as circunstâncias do momento e o potencial competitivo de cada candidato.
Se a análise de conjuntura tomar por base os dois cenários tradicionais sugeridos por Maquiavel - conservação e mudança - não resta dúvida de que o cenário das eleições de 2018 será de mudanças. Os eleitores vão querer mudanças. Neste aspecto, no âmbito do PSDB, Dória será o nome que mais potencializa esta perspectiva e ele poderá ser ungido como candidato de consenso, com Alckmin concorrendo ao Senado.
Não trate como adversário alguém que te trata como inimigo
Contando com a possibilidade de ser candidato, Dória já sabe que Lula é principal obstáculo para chegar à presidência da República. Com essa projeção em mente, Dória não trata Lula como um possível adversário num jogo democrático. Decidiu tratá-lo como inimigo a ser destruído num campo de batalha. Neste aspecto, Dória decidiu seguir a 15ª "lei do poder" do seu guru. A lei ensina aniquilar totalmente o inimigo, sem misericórdia.
Dória quer ver Lula preso em Curitiba, destruindo-o previamente ao jogo eleitoral. É isto que vem pregando diariamente, fazendo da exigência um mantra. Talvez Dória se imagine um Catão paulistano que substitui "Delenda est Carthago" por "Lula preso em Curitiba". Convém lembrar que o juiz Sérgio Moro é um compagno de Dória e que, por juízo político, poderá favorecê-lo, prendendo ou simplesmente condenando Lula.
O cenário das eleições de 2018 terá vários pontos de semelhança com o cenário de 1989. O primeiro, será o da pulverização das candidaturas. O segundo, será o da decomposição e derrocada das forças vigentes no governo. O terceiro será a conjuntura de mudança que marcará as eleições. Esta conjugação de pontos favorece, de imediato, três candidatos: Dória, que se apresentará como um candidato-gestor e empresário, vindo de fora do sistema vigente; Bolsonaro, que será o candidato da lei, da ordem e da bala, contra a decomposição do país; e Marina Silva, que se ausentou dos embates políticos da crise e que se apresentará como a renovação civilizada da política.
Lula, como mostram todas as pesquisas, em tese também é beneficiário, por algumas razões. Ele se tornou paradigma de governo dos direitos, das oportunidades e da redução das pobreza e das desigualdades. E este paradigma ainda é uma memória viva na mente de milhões de brasileiros. Em segundo lugar, muitos eleitores comparam as realizações do governo Lula com os desastres do governo Temer.
Mas Lula tem também vulnerabilidades: terá que prestar contas do fracasso do governo Dilma e dos problemas de corrupção. Numa conjuntura de mudanças, em alguma medida, será associado, pelos adversários, como um candidato do sistema e será responsabilizado pela crise.
Se Lula vier a ser candidato, teria que construir uma estratégia altamente complexa capaz de dar conta, preliminarmente, de três movimentos: 1) o resgate da boa herança do passado; 2) a condição de vítima em face da ação persecutória que sofreu; 3) uma promessa (ou programa) fortemente inovadora em relação ao futuro. Nas campanhas eleitorais e na vida em geral, as pessoas se preocupam mais com o futuro do que com o passado, principalmente em tempos de crise. Se Lula vier para ser o candidato apenas dos seus êxitos, será derrotado. Na hipótese de Lula não ser candidato, a candidatura Ciro Gomes torna-se viável. Ele também poderá apresentar-se como candidato da inovação e da mudança.
A elaboração de uma estratégia complexa, as questões de alianças, de organização e comunicação serão decisivas para enfrentar Dória, se este vier a ser candidato. Dória viria com uma vantagem: imagem positiva, encarnação da mudança, candidato de fora do sistema deteriorado, empresário-gestor, inovador, enfim, um "novo príncipe". Bolsonaro teria que rivalizar com Dória, pois disputariam os mesmos eleitores e o mesmo imaginário político-ideológico, com diferentes ênfases.
Se este cenário de candidaturas vier a se constituir, as eleições não serão nenhum convite para um jantar, nenhum congraçamento de programas comuns que as fundações partidárias vierem a construir, não serão nenhum evento acadêmico. Serão campos de batalha, mobilizações de rua, trepidar de ofensas, disseminações de ódios.
Não se tratará de uma escolha entre condutas civilizadas ou condutas combativas. O problema é que as circunstâncias da conjuntura brasileira, marcadas pelo golpe, pela agressão aos direitos, pela violação da Constituição e da democracia exigirão a preparação de duros embates. Quem imaginar as eleições fora deste contexto ficará lamentando a polarização. Nesta conjuntura, as forças democráticas e progressistas precisam fincar estacas e estabelecer linhas intransponíveis pelos inimigos. Afinal de contas, não se pode tratar como adversário alguém que te trata como inimigo.
Temos aqui mais uma excelente análise de caráter acadêmico. Aliás, são dessas análises que a esquerda tem vivido nesses últimos 20 anos. Nelas - porém não por causa delas- a política fica confinada aonde a democracia burguesa permite e gostaria que ela sempre ficasse: no terreno da fulanização, das opções eleitorais, dos "príncipes" maquiavélicos, etc. A leitura do texto, não me esqueceram as palavras de Marx, em seu "18 de Brumário": "Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa". Nesse sentido, em se acreditando nos pressupostos de Aldo Fornazieri, 2018 seria uma farsa de 1989, Dória, a farsa de Color. Mas, as aparências enganam. A História decorreu 28 anos de 1989 para cá. As promessas do PT viraram realidade e decepção nesse tempo (uma vida, pelo menos, a minha vida !). As análises acadêmicas, os artigos dos blogueiros, não devemos menosprezá-las, por suposto. Entretanto, está faltando no Brasil o "Príncipe" de Gramsci, com raízes fincadas no povo, capaz de produzir uma análise a partir de sua convivência, influência e relação com o povo. Refiro-me a uma análise partidária, classista, coletiva, científica. Na minha opinião, o tempo do príncipe de Maquiavel, o tempo do líder carismático de Max Weber, se esgotou. A luta de classes não poderá mais ficar confinada no calendário eleitoral. O tempo dos golpes, dos enfrentamentos, tais como assistimos na América do Sul, vieram para ficar, pelo menos, enquanto a crise do capitalismo durar. Ao contrário, o calendário eleitoral precisa ser uma ferramenta para fazer avançar a luta de classes. Jamais existiram adversários! Essa é uma velha fé reformista. Isso porque os opostos se relacionam por mecanismos de exploração e opressão e, por isso, não há lugar para conciliação. O "Príncipe", de Gramsci, é o partido revolucionário, de Lênin. A tarefa urgente é mobilizar, organizar e conscientizar as grandes massas de nosso povo. A aliança central deveria ser entre todos as correntes que se disponham a cumprir essa tarefa. As eleições, em minha opinião, jamais voltarão a ter a importância que tiveram, enquanto subsistirem os fundamentos desse Estado plutocrático. Lógico que me preocupo com as eleições. Elas apenas não deveriam ser, em minha opinião, o centro de nossa atuação. Mas, para dizer que não falei delas, penso que as chances de vitória de uma candidatura Ciro Gomes, desde que apoiada pelas forças que apoiaram Lula, teria muito mais chance de vitória que a própria candidatura de Lula.
ResponderExcluir