Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Na abertura de "Anna Karenina," seu romance mais famoso, Leon Tolstoi construiu uma das mais conhecidas frases da literatura universal: "todas as famílias felizes são parecidas; as infelizes são cada uma à sua maneira."
Com todas as adaptações necessárias, esta observação se aplica à situação política do Brasil, país onde a desaprovação a Michel Temer oscila entre 79%, no Ibope, e 90%, no Ipsos. É um marco vergonhoso e reconhecidamente insustentável.
Em abril de 2015, diante da notícia de que a aprovação a Dilma limitava-se a 12%, o vice fez um comentário inacreditável. Disse que neste patamar ela não chegaria ao fim do mandato. Parecia falta de educação, no máximo deslealdade. Pior: era uma inescrupulosa sinalização de apoio ao golpe contra uma presidente eleita, em preparativos desde a contagem dos votos de outubro de 2014.
A aprovação de Temer, hoje, encontra-se em 10%, patamar que o transforma num desses alvos permanentes de raiva da população, como se pode comprovar tanto em espaços públicos como na vida privada das famílias brasileiras. Ontem, mais uma vez, ocorreram grandes manifestações nas principais cidades brasileiras, etapa preparatória para um dia de greve geral marcada para 28 de abril.
Numa situação que só acontece quando o descontentamento tornou-se muito grande, o "Fora Temer" tornou-se um dado permanente de nossa vida cotidiana. No capacho da porta de entrada da residência de uma profissional liberal nos Jardins, típico bairro de classe média alta de São Paulo, pode-se ler: "Entre sem Temer" -- mensagem que substitui o tradicional "Limpe os pés antes de entrar" que era tão comum em casas e escritórios, décadas atrás, quando as ruas não tinham calçamento e os visitantes eram estimulados a deixar a poeira, o barro e a lama do lado de fora.
Disponível na internet, em palestra em Curitiba, a grande Fernanda Montenegro aproveitou um debate morno para lembrar que, nos teatros de hoje, as vezes as pessoas "dizem ' Fora Temer'...", repetindo a expressão uma vez, duas, sempre com delicadeza, sem forçar, até que a expressão se tornasse um grito da plateia.
Ontem, eu estava dentro de um ônibus que descia a avenida da Consolação, em São Paulo, quando um repentista arrancou gargalhadas, aplausos -- e merecidas moedinhas -- quando falou do "golpe" que vai "acabar com a aposentadoria."
Dado essencial de nossa vida política, a repulsa a Temer é uma demonstração da sabedoria popular, este alimento insubstituível na formação de um país.
Expressando-se em toda parte, essa atitude lembra o protesto da juventude norte-americana na década de 1970, quando denunciava a falta de princípios e os desmandos do governo de Richard Nixon em camisetas onde perguntava: "Você compraria um carro usado deste homem?"
Quando a rejeição a um homem público atinge este patamar, o debate político ultrapassou o nível tradicional de quem está a favor, de quem está contra. Isso é o normal da diversidade política, de toda discussão democrática. Ganha-se hoje, perde-se amanhã, recupera-se depois.
Estamos falando da etapa seguinte, de um patamar mais baixo e mais grave, quando a maioria da população sente-se diretamente prejudicada e quer expelir um presidente como se fosse livrar-se de um vírus incurável, responsável por problemas graves no presente e sequelas impensáveis no futuro. Para os trabalhadores e a imensa parcela de brasileiros que sobrevivem numa situação de dureza e exclusão do Estado, Temer é um risco a sobrevivência do melhor que o Brasil construiu em 500 anos de uma história com tantos retrocessos e derrotas.
A maioria já percebeu aquilo que, em sua entrevista ao 247 Aloizio Mercadante definiu como "o paradoxo de Temer: quanto mais impopular se torna, mais impopular precisa ser para manter no poder."
A urgência da saída de um predador que nunca fica satisfeito reflete a necessidade de interromper, de imediato,o retrocesso em curso e sem limites. Imagine que faltaram apenas quatro votos para a aprovação de uma nova medida impopular, que autorizava cobrança de mensalidades em universidades públicas, o que só agravaria o acesso dos estudantes mais pobres. É assim no Brasil de hoje. A tragédia é a regra. Ontem o mesmo Temer sancionou a terceirização, um avanço que chega a ser humilhante. Imagine: temer derrubando, com sua assinatura, a grande herança social de Getúlio Vargas.
Numa situação em que a falta de legitimidade se soma à impopularidade, nada mais resta nem parece importar a Temer. A opção está feita: mais e maiores concessões que lhe permitiram chegar ao poder, com funções rebaixadas, de caráter apenas gerencial, sem nenhum poder real.
Do núcleo real que organizou a tomada do poder, Temer é o único sobrevivente. O aliado Geddel Lima e Eliseu Padilha já caíram. Moreira Franco finge que sobrevive.
O desarranjo de um núcleo político que nunca teria votos próprios para assumir o governo teria o efeito salutar de estancar a sangria que realmente preocupa o país -- o esvaziamento da democracia -- e permitir a escolha de um novo governo, pelo voto livre de 100 milhões de brasileiras e brasileiros. O caminho é este.
Quando e se a vontade das ruas for atendida, e Michel Temer for colocado para fora, vai ser muito difícil bloquear a convocação de eleições diretas -- e este é o temor estratégico daqueles que irão carregar sua presidência, hoje, amanhã, até o fim.
O desfile de novas e candidaturas improvisadas para enfrentar Lula -- o último exemplo é Luciano Huck-- mostra que essa mudança pode estar mais próxima do que se costuma admitir.
Na abertura de "Anna Karenina," seu romance mais famoso, Leon Tolstoi construiu uma das mais conhecidas frases da literatura universal: "todas as famílias felizes são parecidas; as infelizes são cada uma à sua maneira."
Com todas as adaptações necessárias, esta observação se aplica à situação política do Brasil, país onde a desaprovação a Michel Temer oscila entre 79%, no Ibope, e 90%, no Ipsos. É um marco vergonhoso e reconhecidamente insustentável.
Em abril de 2015, diante da notícia de que a aprovação a Dilma limitava-se a 12%, o vice fez um comentário inacreditável. Disse que neste patamar ela não chegaria ao fim do mandato. Parecia falta de educação, no máximo deslealdade. Pior: era uma inescrupulosa sinalização de apoio ao golpe contra uma presidente eleita, em preparativos desde a contagem dos votos de outubro de 2014.
A aprovação de Temer, hoje, encontra-se em 10%, patamar que o transforma num desses alvos permanentes de raiva da população, como se pode comprovar tanto em espaços públicos como na vida privada das famílias brasileiras. Ontem, mais uma vez, ocorreram grandes manifestações nas principais cidades brasileiras, etapa preparatória para um dia de greve geral marcada para 28 de abril.
Numa situação que só acontece quando o descontentamento tornou-se muito grande, o "Fora Temer" tornou-se um dado permanente de nossa vida cotidiana. No capacho da porta de entrada da residência de uma profissional liberal nos Jardins, típico bairro de classe média alta de São Paulo, pode-se ler: "Entre sem Temer" -- mensagem que substitui o tradicional "Limpe os pés antes de entrar" que era tão comum em casas e escritórios, décadas atrás, quando as ruas não tinham calçamento e os visitantes eram estimulados a deixar a poeira, o barro e a lama do lado de fora.
Disponível na internet, em palestra em Curitiba, a grande Fernanda Montenegro aproveitou um debate morno para lembrar que, nos teatros de hoje, as vezes as pessoas "dizem ' Fora Temer'...", repetindo a expressão uma vez, duas, sempre com delicadeza, sem forçar, até que a expressão se tornasse um grito da plateia.
Ontem, eu estava dentro de um ônibus que descia a avenida da Consolação, em São Paulo, quando um repentista arrancou gargalhadas, aplausos -- e merecidas moedinhas -- quando falou do "golpe" que vai "acabar com a aposentadoria."
Dado essencial de nossa vida política, a repulsa a Temer é uma demonstração da sabedoria popular, este alimento insubstituível na formação de um país.
Expressando-se em toda parte, essa atitude lembra o protesto da juventude norte-americana na década de 1970, quando denunciava a falta de princípios e os desmandos do governo de Richard Nixon em camisetas onde perguntava: "Você compraria um carro usado deste homem?"
Quando a rejeição a um homem público atinge este patamar, o debate político ultrapassou o nível tradicional de quem está a favor, de quem está contra. Isso é o normal da diversidade política, de toda discussão democrática. Ganha-se hoje, perde-se amanhã, recupera-se depois.
Estamos falando da etapa seguinte, de um patamar mais baixo e mais grave, quando a maioria da população sente-se diretamente prejudicada e quer expelir um presidente como se fosse livrar-se de um vírus incurável, responsável por problemas graves no presente e sequelas impensáveis no futuro. Para os trabalhadores e a imensa parcela de brasileiros que sobrevivem numa situação de dureza e exclusão do Estado, Temer é um risco a sobrevivência do melhor que o Brasil construiu em 500 anos de uma história com tantos retrocessos e derrotas.
A maioria já percebeu aquilo que, em sua entrevista ao 247 Aloizio Mercadante definiu como "o paradoxo de Temer: quanto mais impopular se torna, mais impopular precisa ser para manter no poder."
A urgência da saída de um predador que nunca fica satisfeito reflete a necessidade de interromper, de imediato,o retrocesso em curso e sem limites. Imagine que faltaram apenas quatro votos para a aprovação de uma nova medida impopular, que autorizava cobrança de mensalidades em universidades públicas, o que só agravaria o acesso dos estudantes mais pobres. É assim no Brasil de hoje. A tragédia é a regra. Ontem o mesmo Temer sancionou a terceirização, um avanço que chega a ser humilhante. Imagine: temer derrubando, com sua assinatura, a grande herança social de Getúlio Vargas.
Numa situação em que a falta de legitimidade se soma à impopularidade, nada mais resta nem parece importar a Temer. A opção está feita: mais e maiores concessões que lhe permitiram chegar ao poder, com funções rebaixadas, de caráter apenas gerencial, sem nenhum poder real.
Do núcleo real que organizou a tomada do poder, Temer é o único sobrevivente. O aliado Geddel Lima e Eliseu Padilha já caíram. Moreira Franco finge que sobrevive.
O desarranjo de um núcleo político que nunca teria votos próprios para assumir o governo teria o efeito salutar de estancar a sangria que realmente preocupa o país -- o esvaziamento da democracia -- e permitir a escolha de um novo governo, pelo voto livre de 100 milhões de brasileiras e brasileiros. O caminho é este.
Quando e se a vontade das ruas for atendida, e Michel Temer for colocado para fora, vai ser muito difícil bloquear a convocação de eleições diretas -- e este é o temor estratégico daqueles que irão carregar sua presidência, hoje, amanhã, até o fim.
O desfile de novas e candidaturas improvisadas para enfrentar Lula -- o último exemplo é Luciano Huck-- mostra que essa mudança pode estar mais próxima do que se costuma admitir.
Precisamos derrubar o golpe ESTE ANO. Não haverá eleições em 2018.
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