Por Lidiane Rezende Vieira, Luna de Oliveira Sassara e João Feres Júnior, no site Manchetômetro:
Jornal Nacional
“O Brasil mais uma vez em choque”: assim começou, na noite da última quarta-feira (17), uma edição histórica do Jornal Nacional. A primeira chamada tinha como personagem principal o Presidente da República, Michel Temer, acusado de envolvimento em esquema de corrupção. A gravação que deu origem à denúncia não foi exibida, diferentemente do que ocorreu no episódio do vazamento de áudios envolvendo o ex-presidente Lula e a então presidenta Dilma Rousseff. A fala de Temer foi lida pelo âncora William Bonner: “Tem que manter isso, viu?”. A notícia possuía potencial embaraçoso até para os âncoras e repórteres, que apresentavam visível insegurança nas falas e erros frequentes, como o Bonner que ao apresentar Temer, chamou-o de “ex presidente”. Sem dúvida, a divulgação recente dos acontecimentos afetou o desempenho dos jornalistas.
Além da pauta explosiva divulgada pouco mais de uma hora antes do início do Jornal Nacional, outra característica desta edição foi sua curta duração. Usualmente, o Jornal Nacional dura em torno de 40 minutos, chegando às vezes até a 1 hora. A edição da noite passada teve apenas 25 minutos e 34 segundos, ou 1.534 segundos, dos quais 802 foram dedicados ao caso de Temer e ao dono da JBS. É importante destacar que mais da metade deste tempo (540 segundos) foi dedicada a fala de correspondentes que entravam no ar diretamente de Brasília, na tentativa mal sucedida de trazer novas informações, seja do Supremo, da Câmara ou do Palácio do Planalto. No final das contas, a “notícia bombástica”, tal como a nomeou o telejornal, se resumiu a apresentações simplórias de trechos da notícia publicada no jornal O Globo, e ocupou um total de 262 segundos na edição.
Outra notícia do pacote da delação de Joesley teve como tema o áudio de Aécio Neves, Senador da República e Presidente do PSDB, pedindo 2 milhões de reais e o vídeo da entrega do dinheiro a seu primo, que foi por ele indicado para receber a propina (123 segundos). Em semelhança à cobertura sobre Temer, o Jornal Nacional se restringiu a apresentar as informações veiculadas pelo jornal O Globo e não mostrar áudios e vídeos. Das conversas transcritas, a que causa maior espanto foi aquela na qual Aécio comenta acerca de Frederico Pacheco de Medeiros, primo do senador, pessoa que receberia o dinheiro: “tem que ser um que a gente mata ele antes de fazer delação”. Nenhum dos citados na notícia da delação de Joesley Batista recebeu espaço para o contraditório.
É provável que a ausência de uma cobertura mais elaborada seja justificada no pouco tempo entre a divulgação da notícia e o início do Jornal, porém outro ponto ganha importância na análise desta cobertura: os demais temas tratados nesta edição. Fato que não causará surpresa a um espectador atento do Jornal Nacional é que a única notícia nacional de teor negativo sem relação com Joesley Batista apresentada no programa tinha como objeto central o ex-presidente Lula. A ele foram dedicados especificamente 210 segundos de notícia – mais tempo que aquele dedicado a cobrir a gravação de Aécio Neves. 27 segundos da notícia foram dedicados a anunciar à derrubada da ordem de suspensão das atividades do Instituto Lula. O restante do tempo foi gasto em contrastar documentos do Ministério Público sobre o caso do triplex que apresentam agendamento de reuniões de Lula com os diretores da Petrobras e fragmentos do depoimento de Lula a Moro do dia 10 de maio no qual o ex-presidente afirmou ter tido apenas duas reuniões com tais diretores. Houve espaço para a defesa do ex presidente. Além deste espaço significativo na histórica edição do JN, Lula também foi citado no primeiro minuto do Jornal, durante as chamadas para as notícias mais importantes da edição, mesmo sem possuir ligação direta com a delação de Joesley Batista. Citado na delação, Guido Mantega é identificado pelo âncora como “ex-ministro dos governos Lula e Dilma”. É evidente que esta citação nos primeiros segundos do jornal, que não foi repetida quando da explanação do caso, é uma decisão editorial do Jornal Nacional.
Folha de S.Paulo
Proporcional ao impacto das notícias publicadas na noite de ontem (17), a Folha de S. Paulo teve a maior parte da capa da edição desta quinta-feira (18) ocupada com uma manchete e chamadas a respeito do caso JBS. Interessante foi a desajustada imagem de Michel Temer escolhida para retratar esse momento descrito pelo próprio jornal como “a pior crise” do seu governo. A foto mostra um presidente sorridente, ao lado de estudantes em encontro realizado na tarde de ontem, antes da divulgação da notícia.
Considerando as páginas de opinião do jornal, entre as quatro colunas publicadas na quarta-feira (17), apenas aquela assinada por Bernardo Mello Franco tratava do julgamento no TSE da chapa Dilma-Temer. O autor, seguro de suas análises conjunturais, afirmou que “se Brasília não for atingida por um raio capaz de mudar este roteiro, restará saber de que forma o TSE vai “matar no peito” o julgamento”. Pois bem, na coluna de hoje, o mesmo autor afirma: “o raio acaba de cair sobre Temer”. Franco narra os últimos acontecimentos com tom fatalista, à prejuízo de Temer, e conclui apresentando as opções em alta nas rodas políticas: renúncia, impeachment e cassação via TSE: de fato, o raio caiu.
Os editoriais da Folha, por sua vez, não espelharam a massificação dessas notícias, tratando de outros dois temas, também em alta: Crise política de Trump e a ineficácia da polícia paulista. Ao fim, o humor também transmite seu recado sobre a maior empresa de carne bovina do mundo. Em uma charge intitulada “JBS – abatedouro nacional” o cartunista expõe peças de carnes penduradas com nome dos envolvidos no escândalo simulando o momento pós-abatimento, entre eles Temer, Aécio e Guido Mantega.
O Globo
O jornal carioca também dedicou a maior parte de sua capa à cobertura do novo escândalo. A manchete tem tom fatalista: “O país na incerteza: Temer é gravado ao dar aval a compra de silêncio de Cunha”. O texto relata o caso, e informa que Temer negou, em nota, as acusações. Uma imagem do presidente sozinho, sob um fundo negro, e de mãos espalmadas com a legenda “E agora?” ocupa quase toda a metade superior da página. Lê-se também abaixo da foto que o futuro do peemedebista é incerto na avaliação de políticos aliados e da oposição. Segundo o texto, Aécio disse que sua relação com Joesley era “só pessoal”.
Nas páginas de opinião do jornal O Globo, contudo, não há palavra sobre o novo escândalo. Um dos editoriais trata da “recuperação econômica”. O texto é inteiramente dedicado a criticar a política econômica implementada por governos petistas, destacar a importância do impeachment para a “reconstrução da economia” e tecer elogios ao governo Temer e sua equipe. O segundo editorial trata da crise política estadunidense. Na mesma página, lê-se na coluna de Carlos Alberto Sardenberg um texto intitulado “Do Lula que mandava ao que não sabia”, que versa ainda sobre o depoimento de Lula a Sérgio Moro realizado no último dia 10. Sardenberg dedica-se, em seu texto, a argumentar que Lula foi responsável por projetos não lucrativos da Petrobrás e do Banco do Brasil.
Na página seguinte, os colunistas Veríssimo e Demétrio Magnoli tratam da morte de Antonio Candido e das relações entre a China e a Eurásia, respectivamente. Já o articulista Chico D’Angelo faz uma defesa da Lei Rouanet e um elogio à CPI que investigou sua aplicação. O segundo articulista convidado, João Luiz Mauad, critica ferrenhamente a política econômica dos governos Lula e Dilma e elogia a Operação Lava Jato.
Conclusão
É muito provável que as páginas de opinião dos jornais não tenham tido tempo ainda para reagir aos fatos ocorridos no final da tarde de ontem, e que editores optaram por estampar o assunto nas capas, para não parecerem defasados, mesmo que não tivessem material opinativo para disponibilizar a seus leitores. Mas essa particularidade revela claramente o paradoxo enfrentado pela grande mídia brasileira. Maior responsável pela redução da política à questão da corrupção, aposta na qual embarcou desde pelo menos meados da década passada, com a superexploração do escândalo do “Mensalão”, a grande mídia nacional também é apoiadora ferrenha das reformas neoliberais de Michel Temer, mais do que propriamente de sua figura política. As matérias das páginas de opinião analisadas acima mostram claramente a obsessão de editores e colunistas na defesa dessa agenda: ela dá o tom em todos os jornais impressos. Contudo, agora a mídia precisa resolver o problema da perda total de credibilidade daquele que levaria a cabo essa agenda, pois como os arautos midiáticos da “honestidade” podem defender aquele que é pego em gravação aconselhando uma pessoa sob investigação criminal de corrupção a continuar a cometer seus delitos, entre eles silenciar um ex-presidente da Câmara preso e comprar juízes e promotores?
Enquanto terminamos este artigo o Jornal Nacional reprisava uma cobertura altamente negativa em relação a Temer, mas que ao mesmo tempo mostrava o mandatário tentando uma reação por meio da coletiva que deu essa tarde. Se resolver revisar sua abordagem e voltar a se alinhar com Temer a grande mídia estará arriscando a pouca credibilidade que lhe resta. Temer se tornou radioativo. Aécio, um darling global, que era levemente desprezado pelos jornais paulistas, já é carta fora do baralho. Se Temer, agora lançado ao mar, não conseguir se recuperar, entraremos numa nova fase na crise política atual: a busca pelo salvador da pátria. E isso praticamente um ano e meio antes da próxima eleição. Façam suas apostas!
[1] Com exceção do último período, que vai de 27/04/2017 a 12/05/2017, tendo portanto 16 dias.
Menos de uma semana após comemorar seu primeiro ano à frente da Presidência da República, Michel Temer foi surpreendido ontem por informações veiculadas na coluna de Lauro Jardim, na edição online do jornal O Globo. Segundo a reportagem, o dono da JBS, Joesley Batista, gravou uma conversa na qual contou ao peemedebista estar pagando uma mesada ao deputado Eduardo Cunha, que atualmente está preso no Paraná, e ao doleiro Lúcio Funaro para que não fizessem delações premiadas, ao que Temer teria respondido: “Tem que manter isso, viu?” O material faz parte de um acordo de delação premiada assinado pelo empresário junto ao Ministério Público.
A coluna também revelou que Aécio Neves, presidente do PSDB, principal partido da coligação que sustenta o governo de Michel Temer, teria recebido R$ 2 milhões de reais de Batista. Ao acertarem a entrega do dinheiro, Neves teria comentado: “Tem que ser um que a gente mata antes de fazer delação”. A entrega teria sido filmada pela Polícia Federal e o dinheiro teria sido repassado a um assessor do Senador Zezé Perrella (PMDB-MG) – o dono do helicóptero que transportou 445 quilos de pasta base de cocaína apreendidos pela Polícia Federal em novembro de 2013. O delator também afirmou que o ex-ministro Guido Mantega seria o responsável por repassar pagamentos para parlamentares do Partido dos Trabalhadores e agiria como um “operador” junto ao BNDES.
As análises do Manchetômetro têm mostrado consistentemente um viés da grande mídia contrário ao PT. Esse viés favoreceu o PSDB na eleição de 2014 e vinha favorecendo Michel Temer, cujo governo a mídia trata de maneira bem mais benevolente do que tratou o de sua predecessora Dilma Rousseff, como já demonstramos em trabalho anterior. Mas as revelações do dia de ontem colocaram esse padrão de posicionamento da grande mídia em xeque. A Rede Globo, campeã do antipetismo, foi responsável pelo furo que abalou o governo Temer e ameaça lançar Aécio Neves atrás das grades. Como explicar tal mudança brusca?
Neste artigo nos debruçamos sobre a cobertura que a grande mídia dedicou ao mais recente escândalo, logo em seguida a sua eclosão, no esforço de lançar algum sentido aos fatos. Para tal, é preciso antes colocar as coisas em perspectiva.
A coluna também revelou que Aécio Neves, presidente do PSDB, principal partido da coligação que sustenta o governo de Michel Temer, teria recebido R$ 2 milhões de reais de Batista. Ao acertarem a entrega do dinheiro, Neves teria comentado: “Tem que ser um que a gente mata antes de fazer delação”. A entrega teria sido filmada pela Polícia Federal e o dinheiro teria sido repassado a um assessor do Senador Zezé Perrella (PMDB-MG) – o dono do helicóptero que transportou 445 quilos de pasta base de cocaína apreendidos pela Polícia Federal em novembro de 2013. O delator também afirmou que o ex-ministro Guido Mantega seria o responsável por repassar pagamentos para parlamentares do Partido dos Trabalhadores e agiria como um “operador” junto ao BNDES.
As análises do Manchetômetro têm mostrado consistentemente um viés da grande mídia contrário ao PT. Esse viés favoreceu o PSDB na eleição de 2014 e vinha favorecendo Michel Temer, cujo governo a mídia trata de maneira bem mais benevolente do que tratou o de sua predecessora Dilma Rousseff, como já demonstramos em trabalho anterior. Mas as revelações do dia de ontem colocaram esse padrão de posicionamento da grande mídia em xeque. A Rede Globo, campeã do antipetismo, foi responsável pelo furo que abalou o governo Temer e ameaça lançar Aécio Neves atrás das grades. Como explicar tal mudança brusca?
Neste artigo nos debruçamos sobre a cobertura que a grande mídia dedicou ao mais recente escândalo, logo em seguida a sua eclosão, no esforço de lançar algum sentido aos fatos. Para tal, é preciso antes colocar as coisas em perspectiva.
Cobertura de Temer: um ano de governo
Desde que Michel Temer tomou posse, o governo federal tem recebido tratamento bastante favorável por parte da grande mídia brasileira, especialmente se comparado ao governo de Rousseff. Mas será que podemos dizer o mesmo acerca da cobertura da pessoa de Michel Temer? Vejamos no gráfico abaixo como foi a cobertura do peemedebista desde sua posse até o dia 12 de maio, quando completou um ano de governo. O gráfico mostra o número de notícias publicadas nos três jornais estudados pelo Manchetômetro (Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo, O Globo) e Jornal Nacional, agregadas em períodos de duas semanas [1].
O noticiário político costuma ser formado majoritariamente por notícias neutras e contrárias. Como fica nítido no gráfico acima, em seus primeiros meses de governo, Michel Temer contou com certa boa vontade por parte da grande mídia – algo que já havíamos identificado na cobertura do governo federal e que a literatura de Ciência Política chama de Lua de Mel. Com exceção de sua segunda semana de governo, até o início de novembro, a cobertura do presidente foi majoritariamente neutra, e o número de notícias favoráveis a seu respeito esteve longe de ser desprezível, chegando a ultrapassar o de notícias contrárias. Ao final do ano de 2016, o número de notícias contrárias ultrapassa o noticiário neutro. Desde então, as duas curvas têm se mantido relativamente próximas, com proeminência mais frequente do noticiário contrário nas últimas semanas. As notícias ambivalentes e favoráveis, porém, continuam em patamar significativo – fato não verificado na cobertura de seus predecessores petistas – apesar dos péssimos índices de popularidade que o peemedebista tem mantido.
O caso revelado ontem pode representar uma alteração significativa do noticiário sobre Temer. Vejamos a seguir como as edições do Jornal Nacional e dos jornais impressos veiculadas após o escândalo repercutiram o vazamento da delação de Joesley Batista.
Desde que Michel Temer tomou posse, o governo federal tem recebido tratamento bastante favorável por parte da grande mídia brasileira, especialmente se comparado ao governo de Rousseff. Mas será que podemos dizer o mesmo acerca da cobertura da pessoa de Michel Temer? Vejamos no gráfico abaixo como foi a cobertura do peemedebista desde sua posse até o dia 12 de maio, quando completou um ano de governo. O gráfico mostra o número de notícias publicadas nos três jornais estudados pelo Manchetômetro (Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo, O Globo) e Jornal Nacional, agregadas em períodos de duas semanas [1].
O noticiário político costuma ser formado majoritariamente por notícias neutras e contrárias. Como fica nítido no gráfico acima, em seus primeiros meses de governo, Michel Temer contou com certa boa vontade por parte da grande mídia – algo que já havíamos identificado na cobertura do governo federal e que a literatura de Ciência Política chama de Lua de Mel. Com exceção de sua segunda semana de governo, até o início de novembro, a cobertura do presidente foi majoritariamente neutra, e o número de notícias favoráveis a seu respeito esteve longe de ser desprezível, chegando a ultrapassar o de notícias contrárias. Ao final do ano de 2016, o número de notícias contrárias ultrapassa o noticiário neutro. Desde então, as duas curvas têm se mantido relativamente próximas, com proeminência mais frequente do noticiário contrário nas últimas semanas. As notícias ambivalentes e favoráveis, porém, continuam em patamar significativo – fato não verificado na cobertura de seus predecessores petistas – apesar dos péssimos índices de popularidade que o peemedebista tem mantido.
O caso revelado ontem pode representar uma alteração significativa do noticiário sobre Temer. Vejamos a seguir como as edições do Jornal Nacional e dos jornais impressos veiculadas após o escândalo repercutiram o vazamento da delação de Joesley Batista.
Jornal Nacional
“O Brasil mais uma vez em choque”: assim começou, na noite da última quarta-feira (17), uma edição histórica do Jornal Nacional. A primeira chamada tinha como personagem principal o Presidente da República, Michel Temer, acusado de envolvimento em esquema de corrupção. A gravação que deu origem à denúncia não foi exibida, diferentemente do que ocorreu no episódio do vazamento de áudios envolvendo o ex-presidente Lula e a então presidenta Dilma Rousseff. A fala de Temer foi lida pelo âncora William Bonner: “Tem que manter isso, viu?”. A notícia possuía potencial embaraçoso até para os âncoras e repórteres, que apresentavam visível insegurança nas falas e erros frequentes, como o Bonner que ao apresentar Temer, chamou-o de “ex presidente”. Sem dúvida, a divulgação recente dos acontecimentos afetou o desempenho dos jornalistas.
Além da pauta explosiva divulgada pouco mais de uma hora antes do início do Jornal Nacional, outra característica desta edição foi sua curta duração. Usualmente, o Jornal Nacional dura em torno de 40 minutos, chegando às vezes até a 1 hora. A edição da noite passada teve apenas 25 minutos e 34 segundos, ou 1.534 segundos, dos quais 802 foram dedicados ao caso de Temer e ao dono da JBS. É importante destacar que mais da metade deste tempo (540 segundos) foi dedicada a fala de correspondentes que entravam no ar diretamente de Brasília, na tentativa mal sucedida de trazer novas informações, seja do Supremo, da Câmara ou do Palácio do Planalto. No final das contas, a “notícia bombástica”, tal como a nomeou o telejornal, se resumiu a apresentações simplórias de trechos da notícia publicada no jornal O Globo, e ocupou um total de 262 segundos na edição.
Outra notícia do pacote da delação de Joesley teve como tema o áudio de Aécio Neves, Senador da República e Presidente do PSDB, pedindo 2 milhões de reais e o vídeo da entrega do dinheiro a seu primo, que foi por ele indicado para receber a propina (123 segundos). Em semelhança à cobertura sobre Temer, o Jornal Nacional se restringiu a apresentar as informações veiculadas pelo jornal O Globo e não mostrar áudios e vídeos. Das conversas transcritas, a que causa maior espanto foi aquela na qual Aécio comenta acerca de Frederico Pacheco de Medeiros, primo do senador, pessoa que receberia o dinheiro: “tem que ser um que a gente mata ele antes de fazer delação”. Nenhum dos citados na notícia da delação de Joesley Batista recebeu espaço para o contraditório.
É provável que a ausência de uma cobertura mais elaborada seja justificada no pouco tempo entre a divulgação da notícia e o início do Jornal, porém outro ponto ganha importância na análise desta cobertura: os demais temas tratados nesta edição. Fato que não causará surpresa a um espectador atento do Jornal Nacional é que a única notícia nacional de teor negativo sem relação com Joesley Batista apresentada no programa tinha como objeto central o ex-presidente Lula. A ele foram dedicados especificamente 210 segundos de notícia – mais tempo que aquele dedicado a cobrir a gravação de Aécio Neves. 27 segundos da notícia foram dedicados a anunciar à derrubada da ordem de suspensão das atividades do Instituto Lula. O restante do tempo foi gasto em contrastar documentos do Ministério Público sobre o caso do triplex que apresentam agendamento de reuniões de Lula com os diretores da Petrobras e fragmentos do depoimento de Lula a Moro do dia 10 de maio no qual o ex-presidente afirmou ter tido apenas duas reuniões com tais diretores. Houve espaço para a defesa do ex presidente. Além deste espaço significativo na histórica edição do JN, Lula também foi citado no primeiro minuto do Jornal, durante as chamadas para as notícias mais importantes da edição, mesmo sem possuir ligação direta com a delação de Joesley Batista. Citado na delação, Guido Mantega é identificado pelo âncora como “ex-ministro dos governos Lula e Dilma”. É evidente que esta citação nos primeiros segundos do jornal, que não foi repetida quando da explanação do caso, é uma decisão editorial do Jornal Nacional.
Folha de S.Paulo
Proporcional ao impacto das notícias publicadas na noite de ontem (17), a Folha de S. Paulo teve a maior parte da capa da edição desta quinta-feira (18) ocupada com uma manchete e chamadas a respeito do caso JBS. Interessante foi a desajustada imagem de Michel Temer escolhida para retratar esse momento descrito pelo próprio jornal como “a pior crise” do seu governo. A foto mostra um presidente sorridente, ao lado de estudantes em encontro realizado na tarde de ontem, antes da divulgação da notícia.
Considerando as páginas de opinião do jornal, entre as quatro colunas publicadas na quarta-feira (17), apenas aquela assinada por Bernardo Mello Franco tratava do julgamento no TSE da chapa Dilma-Temer. O autor, seguro de suas análises conjunturais, afirmou que “se Brasília não for atingida por um raio capaz de mudar este roteiro, restará saber de que forma o TSE vai “matar no peito” o julgamento”. Pois bem, na coluna de hoje, o mesmo autor afirma: “o raio acaba de cair sobre Temer”. Franco narra os últimos acontecimentos com tom fatalista, à prejuízo de Temer, e conclui apresentando as opções em alta nas rodas políticas: renúncia, impeachment e cassação via TSE: de fato, o raio caiu.
Os editoriais da Folha, por sua vez, não espelharam a massificação dessas notícias, tratando de outros dois temas, também em alta: Crise política de Trump e a ineficácia da polícia paulista. Ao fim, o humor também transmite seu recado sobre a maior empresa de carne bovina do mundo. Em uma charge intitulada “JBS – abatedouro nacional” o cartunista expõe peças de carnes penduradas com nome dos envolvidos no escândalo simulando o momento pós-abatimento, entre eles Temer, Aécio e Guido Mantega.
O Globo
O jornal carioca também dedicou a maior parte de sua capa à cobertura do novo escândalo. A manchete tem tom fatalista: “O país na incerteza: Temer é gravado ao dar aval a compra de silêncio de Cunha”. O texto relata o caso, e informa que Temer negou, em nota, as acusações. Uma imagem do presidente sozinho, sob um fundo negro, e de mãos espalmadas com a legenda “E agora?” ocupa quase toda a metade superior da página. Lê-se também abaixo da foto que o futuro do peemedebista é incerto na avaliação de políticos aliados e da oposição. Segundo o texto, Aécio disse que sua relação com Joesley era “só pessoal”.
Nas páginas de opinião do jornal O Globo, contudo, não há palavra sobre o novo escândalo. Um dos editoriais trata da “recuperação econômica”. O texto é inteiramente dedicado a criticar a política econômica implementada por governos petistas, destacar a importância do impeachment para a “reconstrução da economia” e tecer elogios ao governo Temer e sua equipe. O segundo editorial trata da crise política estadunidense. Na mesma página, lê-se na coluna de Carlos Alberto Sardenberg um texto intitulado “Do Lula que mandava ao que não sabia”, que versa ainda sobre o depoimento de Lula a Sérgio Moro realizado no último dia 10. Sardenberg dedica-se, em seu texto, a argumentar que Lula foi responsável por projetos não lucrativos da Petrobrás e do Banco do Brasil.
Na página seguinte, os colunistas Veríssimo e Demétrio Magnoli tratam da morte de Antonio Candido e das relações entre a China e a Eurásia, respectivamente. Já o articulista Chico D’Angelo faz uma defesa da Lei Rouanet e um elogio à CPI que investigou sua aplicação. O segundo articulista convidado, João Luiz Mauad, critica ferrenhamente a política econômica dos governos Lula e Dilma e elogia a Operação Lava Jato.
Estadão
Seguindo a tônica adotada pelos outros jornais impressos, a capa do Estadão também foi tomada por notícias sobre o escândalo. Nas páginas de opinião, os articulistas convidados Roberto Macedo e Fernão Lara Mesquita tratam de criticar a política econômica e os programas sociais implementados por governos petistas. O segundo contém, inclusive, elogios a Michel Temer e sua equipe de economistas. Já em seus editoriais, o Estadão resolveu tratar de possíveis inconsistências no depoimento de Lula a Sergio Moro no que se refere a reuniões com diretores da Petrobrás, do problema da corrupção em presídios brasileiros (elogioso ao governo federal) e dos rumos da política econômica do governo Temer, também favoravelmente. Novamente, não há palavra sobre a polêmica ora envolvendo Temer.
Seguindo a tônica adotada pelos outros jornais impressos, a capa do Estadão também foi tomada por notícias sobre o escândalo. Nas páginas de opinião, os articulistas convidados Roberto Macedo e Fernão Lara Mesquita tratam de criticar a política econômica e os programas sociais implementados por governos petistas. O segundo contém, inclusive, elogios a Michel Temer e sua equipe de economistas. Já em seus editoriais, o Estadão resolveu tratar de possíveis inconsistências no depoimento de Lula a Sergio Moro no que se refere a reuniões com diretores da Petrobrás, do problema da corrupção em presídios brasileiros (elogioso ao governo federal) e dos rumos da política econômica do governo Temer, também favoravelmente. Novamente, não há palavra sobre a polêmica ora envolvendo Temer.
Conclusão
É muito provável que as páginas de opinião dos jornais não tenham tido tempo ainda para reagir aos fatos ocorridos no final da tarde de ontem, e que editores optaram por estampar o assunto nas capas, para não parecerem defasados, mesmo que não tivessem material opinativo para disponibilizar a seus leitores. Mas essa particularidade revela claramente o paradoxo enfrentado pela grande mídia brasileira. Maior responsável pela redução da política à questão da corrupção, aposta na qual embarcou desde pelo menos meados da década passada, com a superexploração do escândalo do “Mensalão”, a grande mídia nacional também é apoiadora ferrenha das reformas neoliberais de Michel Temer, mais do que propriamente de sua figura política. As matérias das páginas de opinião analisadas acima mostram claramente a obsessão de editores e colunistas na defesa dessa agenda: ela dá o tom em todos os jornais impressos. Contudo, agora a mídia precisa resolver o problema da perda total de credibilidade daquele que levaria a cabo essa agenda, pois como os arautos midiáticos da “honestidade” podem defender aquele que é pego em gravação aconselhando uma pessoa sob investigação criminal de corrupção a continuar a cometer seus delitos, entre eles silenciar um ex-presidente da Câmara preso e comprar juízes e promotores?
Enquanto terminamos este artigo o Jornal Nacional reprisava uma cobertura altamente negativa em relação a Temer, mas que ao mesmo tempo mostrava o mandatário tentando uma reação por meio da coletiva que deu essa tarde. Se resolver revisar sua abordagem e voltar a se alinhar com Temer a grande mídia estará arriscando a pouca credibilidade que lhe resta. Temer se tornou radioativo. Aécio, um darling global, que era levemente desprezado pelos jornais paulistas, já é carta fora do baralho. Se Temer, agora lançado ao mar, não conseguir se recuperar, entraremos numa nova fase na crise política atual: a busca pelo salvador da pátria. E isso praticamente um ano e meio antes da próxima eleição. Façam suas apostas!
Nota
[1] Com exceção do último período, que vai de 27/04/2017 a 12/05/2017, tendo portanto 16 dias.
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