terça-feira, 6 de junho de 2017

Diretas-Já e as alianças amplas

Por José Reinaldo Carvalho, no site Vermelho:

A verdade está nos fatos. E estes estão indicando o eixo em torno do qual gira a ação política protagonizada pelas forças da esquerda consequente e do movimento popular.

Em 24 de maio, uma centena de milhar de pessoas foi em caravana a Brasília com as bandeiras “Fora, Temer!” e “Diretas, Já!” A manifestação constituiu um contundente pronunciamento contra as reformas da Previdência e Trabalhista propostas pelo governo golpista e adotadas como prioridade na agenda do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do partido direitista DEM.

Dias 28 de maio e 4 de junho, algumas dezenas de milhares de pessoas, embora que em clima de “domingo no parque” e “virada cultural”, na metáfora do companheiro Artur Araújo, reuniram-se em Copacabana e no Largo da Batata (SP), para, entre números musicais, performances e falas, protestar contra o governo usurpador, exigir sua queda e a convocação de eleições presidenciais diretas já.

É um movimento que não se vai deter. De nada adianta compará-lo com o de 1984 com fins de desqualificação. Nem demandar “fato novo” por obra e graça da intervenção de governadores que não têm força política e entre os quais há apoiadores das eleições indiretas e defensores de um acordo nacional entre as forças progressistas e a direita conservadora e neoliberal. O movimento pelas diretas de 2017 seguirá seu caminho e adotará suas formas. Os resultados não são passíveis de previsão, mas o seu potencial de crescimento não pode ser subestimado.

No último fim de semana (3 de junho), reunido em Congresso, o Partido dos Trabalhadores tomou uma histórica decisão. Manifestou “posição inegociável pelas Diretas Já e contra o golpe dentro do golpe”. E afirmou, alto e bom som, que enfrentará “quaisquer iniciativas das classes dominantes de impor eleições indiretas”. Aprovou por unanimidade a decisão de rejeitar “terminantemente as alternativas dos golpistas”. E arremata: “Para pôr fim a essa crescente escalada de retrocessos é preciso antecipar as eleições, inclusive do Congresso Nacional, para que a vontade livre e soberana do povo se manifeste nas urnas. O PT e seus parlamentares não irão a um eventual Colégio Eleitoral”.

Pouco mais de dez dias antes, a 22 de maio, a Comissão Política Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), reunida em São Paulo, aprovava, também por unanimidade: “Ante a efetiva possibilidade da saída do usurpador da cadeira presidencial, está em curso a disputa política entre duas alternativas: as eleições indiretas e as eleições diretas”. E afirmava categoricamente, com a ênfase própria dos comunistas: “O PCdoB, desde a consumação do golpe, está empenhado pela realização de eleições diretas para presidente da República. Convicto de que a soberania do voto popular é O caminho para a restauração da democracia e, com base nela, encaminhar o país à normalidade institucional”.

É significativo que as duas principais forças da esquerda consequente do país estejam unidas em torno da bandeira das Diretas Já. A posição é coincidente com a dos movimentos agrupados na Frente Brasil Popular que, em plenária nacional e em ato político em 28 de maio, adotou as mesmas posições e ainda lançou um plano de emergência para o Brasil pós-golpe e pós-diretas.

Não há, portanto, qualquer articulação em curso, autorizada pelas direções do PT e do PCdoB, nem pelos movimentos que integram a Frente Brasil Popular, em favor de eleições indiretas, nem muito menos de formação de chapa tendo por centro o presidente golpista da Câmara Rodrigo Maia.

Durante a semana passada, foram insistentes as notícias veiculadas nos grandes meios de comunicação de que o presidente Lula seria levado por setores da bancada petista a negociar com Maia um eventual apoio à sua condução à presidência da República por via indireta. Não foi necessário um desmentido, pois Lula, questionado, apenas disse que sequer foi convidado a tal conversa. Foi a Brasília para participar do congresso do PT e, num intervalo, teve uma audiência com a CNBB. Igualmente, foram inúmeras as notícias em veículos de comunicação da chamada grande mídia e nas redes sociais de que um deputado e um ex-ministro do PCdoB estariam mantendo entendimentos para a composição de uma chapa DEM-PCdoB, com Maia na presidência e um quadro do PCdoB na vice-presidência.

Não conheço um desmentido dos supostos protagonistas das conversações, mas posso assegurar, como membro da direção do PCdoB que a legenda da foice e do martelo não está embarcando nessa canoa furada. As bandeiras imediatas dos comunistas diante da presente crise são a derrubada do governo Temer, a rejeição às reformas desse governo e a convocação de eleições diretas, já. O Partido tem reiterado que não se aliará a candidatos que defendem agendas antipopulares e antinacionais. Mesmo que tenha sido, como foi, um erro estratégico e tático apoiar Maia em duas eleições à presidência da Câmara, não se justifica invocar o episódio para atestar que é possível que isto se repita em eventuais eleições indiretas. E, mesmo para quem o voto em Maia se justificou nas duas últimas eleições da Mesa da Câmara, as supostas razões para esse apoio estão superadas pela prática concreta de Maia como presidente da Câmara. Página virada.

Igualmente, são desarrazoadas certas analogias históricas, comuns e recorrentes em tempos de rebaixado debate político e ideológico. É preciso refrescar a memória para não incorrer em falsificações. Teotônio Vilela, o Menestrel das Alagoas, rompeu com a ditadura e aderiu à luta democrática. Desempenhou papel fundamental na luta pela anistia aos presos políticos. Tancredo Neves era um político democrata-liberal de centro, moderado e conciliador, mas nunca pertenceu à ditadura. Foi eleito no Colégio Eleitoral, em sufrágio indireto, no bojo de um multitudinário movimento de massas, com o compromisso e a finalidade de pôr fim à ditadura. Já Rodrigo Maia é alto prócer de um partido de direita, reacionário empedernido, nunca pertenceu às forças democráticas, é golpista, antipetista e anticomunista, apoia o governo golpista do Temer, é o esteio principal no Parlamento para aprovar as reformas antipopulares e antinacionais do governo ilegítimo e não conta a seu favor com nenhum movimento de massas pedindo a sua eleição. Mais: ele não rompeu e já disse que não romperá com o regime golpista.

Ademais, não há partido progressista, de esquerda ou comunista que esteja propondo a sua eleição.

Não estão à vista nem em cogitação pelas forças de esquerda “soluções” para a crise via eleições indiretas, nem acordos para eleger Rodrigo Maia presidente da República. Enquanto não houver eleições diretas e o protagonismo das ações não voltar para as forças progressistas, em aliança com amplos setores políticos e sociais, não há saída possível para a crise.

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