Por Tarso Genro, no site Sul-21:
Quem leu a sentença do juiz Sergio Moro que condenou o presidente Lula, sem as paixões imediatistas determinadas pela luta política em curso (da qual ela faz parte), pode até compreender os elogios solidários de alguns dos seus pares corporativos que circularam com uma rapidez estranha, mas dificilmente ficará convencido que tal decisão poderia prosperar num tribunal neutro, sem o uso das “razões de exceção”, que tem pautado – até aqui – as ações penais contra o ex-presidente. Falta de fundamentação lógica, método indutivo-analítico na apreciação dos depoimentos sem cotejamento do seu valor probatório, eleição de relevância e irrelevância de fatos, segundo uma opção já feita pela condenação, e claro viés político. Sequência do massacre midiático, patrocinado de forma consciente pela maioria da mídia tradicional, que foi guindada, inclusive, à condição de processante “ex-oficio”, através da suas manchetes arbitrárias.
Adotado este método e esta visão processual-penal, todos os réus que foram alvo de delação premiada – refiro-me aos acusados de tirarem algum proveito dos financiamentos das empreiteiras – independentemente das defesas que apresentarem, deverão ser inapelavelmente condenados. O motivo é simples: a convicção do Magistrado não precisa mais fundamentar-se no processo, mas pode emergir da convicção programada ou voluntária, fora dos autos, logo, formada no espaço da política e do contraditório partidário. Isso é válido para qualquer réu, de qualquer partido ou de qualquer empresa apontada como corruptora. A sinalização que está dada pelo STF, todavia, não é essa, pois à medida que os processos avançam sobre os protagonistas do golpe e os “defensores” das reformas, a Corte Suprema tem revalorizado os princípios da presunção de inocência, da ampla defesa e as formas não-excepcionais do devido processo legal.
Enganam-se, porém, os que pensam que o juiz Moro é um diletante em matéria jurídica, que se “equivocou” numa sentença importante. Sua eleição, pelo oligopólio da mídia, à condição de primeiro homem da lei, que instou o Supremo a mudar suas interpretações históricas, em matéria de garantias constitucionais -para superpor as necessidades do processo político às garantias do Estado de Direito (porque o “país tem pressa” no combate à corrupção)- garantiram a Moro que ele passaria a ter estatuto político para dar um “xeque-mate” no país. E assim ele o fez, porque todas as alternativas que a sua sentença lega, ou prolongam a crise, ou abrem um vasto espaço para a impunidade, ou deslegitimam, ainda mais, a esfera da política, se promoverem a ausência de Lula na disputa presidencial de 18.
Primeira hipótese, “prolongam” a crise através da crise do Poder Judiciário, porque a sentença de Moro vem à luz, precisamente, quando os seus métodos de investigação e suas decisões de manutenção das prisões infinitas, começam a ser glosadas por outras instâncias, o que denuncia, portanto, a sua seletividade. Segunda hipótese, abrem um ” vasto espaço de impunidade”, porque a retorsão, eventualmente feita pelo STJ e pelo Supremo – para restabelecer as garantias da presunção da inocência e do trânsito em julgado para o cumprimento das penas – beneficiarão diretamente a próxima geração de réus, culpados ou não -originários do golpismo- que já estão sendo soltos ou ainda não foram julgados. Terceira hipótese, se a sua sentença excludente de Lula for simplesmente mantida ou agravada, qualquer Presidente eleito em 18 não vai ter nenhuma legitimidade para governar.
Assim, quaisquer que sejam as decisões adotadas pelas instâncias superiores (porque todo o processo foi um rosário de exceções e seletividades) a partir de agora – mantendo a sentença, reformando-a para absolver Lula ou aumentando a pena – elas reforçarão a crise política, abalarão a confiança no Poder Judiciário, mais do que já está abalada, aguçarão a radicalidade do confronto de classes no país e permitirão que a agenda nacional continue sendo controlada pelo oligopólio da mídia. O mesmo oligopólio que produziu a incriminação fascista -em abstrato- dos partidos e dos políticos, colocando no mesmo plano, os honestos, os que usaram a tradição deformada do caixa 2 e os que viverem e sobreviveram na escola da propina e do c rime.
A sentença de Moro – fraca, condenatória sem provas e previamente decidida na esfera da difusão da informação – é um “xeque-mate” na República, que não tem uma elite política no Parlamento, capaz de resistir à decomposição, que especialmente o PMDB e o PSDB, ora promovem na nossa democracia em crise. Mas a sentença também é um cheque sem fundos, que paga um serviço à direita liberal tutora das reformas, cuja maioria no Congresso pode cair no patíbulo imprevisível dos processos sem lei ou pelo julgamento do povo soberano, que eles ludibriaram para fazer as reformas, como se estivessem preocupados com a corrupção. Um “xeque-mate”, combinado com um cheque sem fundos, que repete, como farsa, a era berlusconiana na Itália das “mãos limpas”, que se tornaram mais sujas.
Quem leu a sentença do juiz Sergio Moro que condenou o presidente Lula, sem as paixões imediatistas determinadas pela luta política em curso (da qual ela faz parte), pode até compreender os elogios solidários de alguns dos seus pares corporativos que circularam com uma rapidez estranha, mas dificilmente ficará convencido que tal decisão poderia prosperar num tribunal neutro, sem o uso das “razões de exceção”, que tem pautado – até aqui – as ações penais contra o ex-presidente. Falta de fundamentação lógica, método indutivo-analítico na apreciação dos depoimentos sem cotejamento do seu valor probatório, eleição de relevância e irrelevância de fatos, segundo uma opção já feita pela condenação, e claro viés político. Sequência do massacre midiático, patrocinado de forma consciente pela maioria da mídia tradicional, que foi guindada, inclusive, à condição de processante “ex-oficio”, através da suas manchetes arbitrárias.
Adotado este método e esta visão processual-penal, todos os réus que foram alvo de delação premiada – refiro-me aos acusados de tirarem algum proveito dos financiamentos das empreiteiras – independentemente das defesas que apresentarem, deverão ser inapelavelmente condenados. O motivo é simples: a convicção do Magistrado não precisa mais fundamentar-se no processo, mas pode emergir da convicção programada ou voluntária, fora dos autos, logo, formada no espaço da política e do contraditório partidário. Isso é válido para qualquer réu, de qualquer partido ou de qualquer empresa apontada como corruptora. A sinalização que está dada pelo STF, todavia, não é essa, pois à medida que os processos avançam sobre os protagonistas do golpe e os “defensores” das reformas, a Corte Suprema tem revalorizado os princípios da presunção de inocência, da ampla defesa e as formas não-excepcionais do devido processo legal.
Enganam-se, porém, os que pensam que o juiz Moro é um diletante em matéria jurídica, que se “equivocou” numa sentença importante. Sua eleição, pelo oligopólio da mídia, à condição de primeiro homem da lei, que instou o Supremo a mudar suas interpretações históricas, em matéria de garantias constitucionais -para superpor as necessidades do processo político às garantias do Estado de Direito (porque o “país tem pressa” no combate à corrupção)- garantiram a Moro que ele passaria a ter estatuto político para dar um “xeque-mate” no país. E assim ele o fez, porque todas as alternativas que a sua sentença lega, ou prolongam a crise, ou abrem um vasto espaço para a impunidade, ou deslegitimam, ainda mais, a esfera da política, se promoverem a ausência de Lula na disputa presidencial de 18.
Primeira hipótese, “prolongam” a crise através da crise do Poder Judiciário, porque a sentença de Moro vem à luz, precisamente, quando os seus métodos de investigação e suas decisões de manutenção das prisões infinitas, começam a ser glosadas por outras instâncias, o que denuncia, portanto, a sua seletividade. Segunda hipótese, abrem um ” vasto espaço de impunidade”, porque a retorsão, eventualmente feita pelo STJ e pelo Supremo – para restabelecer as garantias da presunção da inocência e do trânsito em julgado para o cumprimento das penas – beneficiarão diretamente a próxima geração de réus, culpados ou não -originários do golpismo- que já estão sendo soltos ou ainda não foram julgados. Terceira hipótese, se a sua sentença excludente de Lula for simplesmente mantida ou agravada, qualquer Presidente eleito em 18 não vai ter nenhuma legitimidade para governar.
Assim, quaisquer que sejam as decisões adotadas pelas instâncias superiores (porque todo o processo foi um rosário de exceções e seletividades) a partir de agora – mantendo a sentença, reformando-a para absolver Lula ou aumentando a pena – elas reforçarão a crise política, abalarão a confiança no Poder Judiciário, mais do que já está abalada, aguçarão a radicalidade do confronto de classes no país e permitirão que a agenda nacional continue sendo controlada pelo oligopólio da mídia. O mesmo oligopólio que produziu a incriminação fascista -em abstrato- dos partidos e dos políticos, colocando no mesmo plano, os honestos, os que usaram a tradição deformada do caixa 2 e os que viverem e sobreviveram na escola da propina e do c rime.
A sentença de Moro – fraca, condenatória sem provas e previamente decidida na esfera da difusão da informação – é um “xeque-mate” na República, que não tem uma elite política no Parlamento, capaz de resistir à decomposição, que especialmente o PMDB e o PSDB, ora promovem na nossa democracia em crise. Mas a sentença também é um cheque sem fundos, que paga um serviço à direita liberal tutora das reformas, cuja maioria no Congresso pode cair no patíbulo imprevisível dos processos sem lei ou pelo julgamento do povo soberano, que eles ludibriaram para fazer as reformas, como se estivessem preocupados com a corrupção. Um “xeque-mate”, combinado com um cheque sem fundos, que repete, como farsa, a era berlusconiana na Itália das “mãos limpas”, que se tornaram mais sujas.
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