"A Democracia que eu quero é diferente da que a elite quer, você só pode gritar que está com fome, mas não pode comer" - Lula |
Nada mais intenso para remoer o meio político brasileiro do que Lula na rua. Mesmo com todo esforço da mídia tradicional de esconder o que está acontecendo com a Caravana de Lula pelo Brasil, iniciada, mais uma vez, no Nordeste brasileiro, as imagens bravamente difundidas pela cobertura alternativa mexem com todos. Nesse momento em que muitos se emocionam, se irritam, outros se amedrontam com as cenas explícitas de ligação de Lula e do conjunto de forças políticas e sociais, que o defendem, com o povo nordestino, além de exemplos simbólicos do legado do seu governo, poucos imaginam o que teve de gente que ficou aconselhando Lula a não sair de casa ou do escritório.
Vencido o risco de se submeter à inércia, hora era gente falando dos “riscos jurídicos”, hora gente falando dos “riscos de segurança e políticos”, a caravana já revelou o que poucos políticos e forças políticas têm condições de fazer no país, ainda mais no momento atual.
Vencido o risco de se submeter à inércia, hora era gente falando dos “riscos jurídicos”, hora gente falando dos “riscos de segurança e políticos”, a caravana já revelou o que poucos políticos e forças políticas têm condições de fazer no país, ainda mais no momento atual.
Diante do sucesso incontestável do encontro de Lula com o povo, uma das pautas dos últimos dias foi o encontro do ex-presidente com o governador de Alagoas, Renan Filho, e seu pai, Renan, o senador. Ou o jantar com Renata Campos, acompanhado pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara. Todos e todas, para além de outros símbolos, políticos que votaram a favor do impeachment de Dilma.
Os encontros suscitaram uma saraivada de debates por todos os lados, de certa forma o prenúncio de movimentações políticas no Brasil. Sejam na atual defesa dos direitos sociais, dos trabalhadores, dos mais pobres e de um projeto nacional de desenvolvimento, todos sob o ataque da agenda econômica e política do governo golpista. Sejam na atual defesa de Lula e todos aqueles que sofrem com o estado de exceção jurídico-policial-midiático, ou na construção de um projeto alternativo ao atual, que farão nosso povo e o Brasil voltar a sonhar.
Lula e o PT são maduros o suficiente para não cair na tentação por ingenuidades. Sabemos claramente qual foi a posição de lideranças políticas nacionais e regionais diante do golpe a Dilma, ou no posicionamento de vários em relação à destruição dos direitos dos trabalhadores, ao congelamento por 20 anos dos recursos da saúde e educação e ao programa de entrega do pré-sal e, agora, da Eletrobras e de outros ativos nacionais. Também Lula e o PT têm absoluta clareza da natureza das elites econômicas brasileiras e da fragilidade de qualquer governabilidade pautada apenas por maiorias no parlamento.
Mais do que isso, temos mais do que convicção de que as esperanças das forças políticas que enfrentaram o golpe e defendem Lula estarão na construção de um programa de governo que enfrente injustiças históricas do nosso país, como a profunda desigualdade econômica, social e regional; a injustiça tributária; a concentração nas mãos de poucos dos meios de comunicação; o descompromisso da elite econômica brasileira com qualquer projeto de nação e a desconsideração de um conjunto de setores com a centralidade de um projeto de desenvolvimento ambientalmente sustentável em um país como o Brasil.
E sabemos que o centro de sustentação de um projeto como esse será a disputa de hegemonia na sociedade, construindo-se um novo bloco histórico protagonizado pelas forças populares e democráticas, que se comprometem a superar a agenda das políticas que alçam a austeridade fiscal e a inserção submissa na globalização como o destino final do projeto de país. A disputa dessa hegemonia se faz com o programa e não com fotos.
Quando fui ministro da Coordenação Política de Lula e da Saúde de Dilma, só para citar três exemplos, conduzi o debate e a aprovação de projetos absolutamente polarizadores na sociedade, escancarando o preconceito e a defesa de privilégios de parte substancial das elites econômicas brasileiras: a aprovação da lei de cotas, do marco regulatório do pré-sal e do programa Mais Médicos. Todos só passaram de intenção para leis e atos concretos ao sermos competentes em mobilizar o debate na sociedade e, ao mesmo tempo, conseguir expressivas maiorias na Câmara e no Senado para aprová-los, constrangendo aqueles contrários à proposta.
Lula e nós do PT sabemos que essa disputa de hegemonia só será possível como um patamar superior de organização popular, não repetindo os erros de brutal esvaziamento da organização partidária, do movimento sindical e social para compor os espaços de governo. Mas, não só isso, assumindo uma ousadia político-organizativa de se reinventar, reconhecendo que o mundo contemporâneo, as novas formas de participação da política, as bandeiras e pautas que emergiram com muita intensidade com o avanço das manifestações do machismo e misoginia, da homofobia, do genocídio da juventude negra periférica, da apropriação privada do espaço urbano e da nossa riqueza ambiental.
Não há nenhum vacilo quanto à necessidade de derrotar a agenda daqueles que usaram da prerrogativa de um golpe parlamentar-jurídico-midiático para rasgar o pacto Constitucional, que refundou o nosso estado brasileiro, com o processo de redemocratização.
Como também sabemos que temos que estar atentos, que Lula e o PT precisam, novamente, significar uma luz para um novo sistema político e não a reprodução do velho, com suas entranhas escancaradas, com a sucessão escândalos relacionados ao financiamento das campanhas eleitorais.
Resistência
Mas Lula e o PT podem representar mais do que isso. Uma imensidão de brasileiros e brasileiras, entre 93 – 95%, rechaçam o atual governo Temer. Parcelas desse povo somos nós, que resistimos ao golpe contra a Dilma e já nos manifestamos em querer Lula de volta. Outros são aposentados ou em vias de aposentar, que se indignam com as ameaças à aposentadoria pública. Outros são funcionários públicos, muitos alçados a esta condição nos governos Lula e Dilma, que caíram na cantilena da “meritocracia e de muitos hipócritas que se vestiram como paladinos do combate à corrupção” e que hoje ainda estão meio atordoados sem saber para onde ir.
Outros são lideranças regionais, políticas, econômicas, sociais, que assistem, sem chão e sem teto, à ausência de qualquer projeto de desenvolvimento que dialogue com suas aspirações pela coalizão Temer-PSDB-Meireles-Rodrigo Maia. Muitas delas participam de governos com o PT na Bahia, Sergipe, com Jackson Barreto, Paraíba, Ceará, Piauí, Maranhão, do PCdoB, sem falar de Minas Gerais, o segundo colégio eleitoral do país.
É bom para a defesa de Lula e é bom para o debate que precisamos conduzir no país de um novo projeto de governo, de um Brasil que o povo quer, que sejamos o principal polo alternativo à atual política da aliança Temer/PSDB/Globo/sistema financeiro. Que todos aqueles que estão sofrendo com as consequências do atual governo enxerguem em Lula, no PT e no conjunto de forças políticas e sociais que resistem à destruição dos direitos e à agenda da austeridade fiscal, uma perspectiva real de volta ao centro do governo federal e queiram discutir conosco projetos políticos para o país.
Para muitos desses, Lula e o PT significaram, por mais de uma década e pela primeira vez na história brasileira, uma liderança e um partido que conseguiu tirar o Brasil de uma recessão profunda, sem permitir o descontrole da inflação, conduzir o maior período de crescimento da nossa economia, realizar a maior inclusão social da nossa história, instituir o ciclo de maior expansão de empregos e poder de compra da classe trabalhadora, olhar e desengavetar projetos de investimentos estratégicos para regiões esquecidas pelo mercado financeiro, reposicionar o Brasil no mundo, passando a ser respeitado e até admirado. Para alguns, Lula e PT não são mais isso. Para outros, Lula e o PT ainda podem ser isso. Para nós, Lula e PT têm que ser isso e muito mais, e não menos.
* Alexandre Padilha é médico, vice-presidente nacional do PT, foi secretário municipal da saúde na gestão de Fernando Haddad e ministro nas gestões Lula e Dilma.
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