Do site do Centro de Estudos Barão de Itararé:
Secretária-Geral do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Renata Mielli participou, entre os dias 27 e 29 de setembro, dos Diálogos por uma Internet Cidadã. O evento, sediado em Quito, no Equador, reuniu diversas entidades e organizações da sociedade civil para discutir uma agenda regional de ações e propostas de políticas públicas, além de produzir aportes para o Fórum Social Mundial da Internet, a se realizar em 2018.
A Agência Latino-Americana de Informação (ALAI), que atuou na cobertura do evento, registrou em sua página a contribuição de Renata Mielli. Reproduzimos abaixo a íntegra do texto, traduzido do espanhol para o português (leia em espanhol aqui: https://www.alainet.org/es/articulo/188326)
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Internet para promover a cidadania, a soberania e a paz
Escalada para discutir conhecimento, focando os meios de comunicação, tecnologias livres, acesso, diversidade, cultura livre, propriedade intelectual e educação, Renata Mielli assegurou que a luta por uma Internet livre não é de apenas um país, mas uma tarefa de todos. Neste sentido, ela destacou a importância de se fazer um acompanhamento atento do debate de como a Internet está manejando os rumos de nossas vidas.
"A Internet está contribuindo para garantir a efetividade de direitos humanos, a redução das desigualdades e discriminações?", questiona. A esse respeito, Mielli pontuou a necessidade de se refletir sobre quem toma as decisões no campo da Internet. Em sua avaliação, a verdade é que a grande massa de usuários não pensa muito sobre o assunto e tampouco se questiona sobre como a Internet vem alterando as relações econômicas, políticas e sociais.
"Nós, os movimentos sociais, meios alternativos de comunicação, ativistas, entre outros atores da comunidade, não estamos pensando a fundo sobre isto, senão pensando como tornar a Internet mais fácil e funcional. Enquanto isso, alguns grupos econômicos que estão tomando decisões importantes", afirmou. "As pessoas com poder político e econômico para decidir os rumos da Internet não o faz baseando-se no interesse público".
Sobre o papel da Internet na sociedade, a jornalista destacou que as novas tecnologias de comunicação e informação ocupam um espaço estratégico. Ainda assim, o debate urgente acerca deste cenário não está sendo feito. Mielli explicou, ademais, que o mundo digital e a inteligência artificial estão sendo trabalhados por um pequeno punhado de corporações, que influenciam significativamente nas decisões sobre a Internet e no comércio internacional. Os enormes monopólios privados atuam, agora, na Internet - Facebook, Google, Amazon e outros.
É óbvio, na avaliação da jornalista, que esse ambiente monopolista que está se desenhando é totalmente contraditório em relação à ideia de uma Internet aberta e cidadã, que priorize a livre circulação de informação e conhecimento produzidos pela sociedade, de forma a contribuir com a emancipação dos povos. "O aprofundamento do monopólio privado de Internet está desencadeando uma sociedade da desinformação e do desconhecimento para muitas pessoas ao redor do mundo", assinala.
De acordo com números da União Internacional de Telecomunicações (UIT), atualmente, cerca de 48% da população mundial tem acesso á Internet. Ou seja, os 52% restantes foram parte do que podemos chamar de "excluídos digitais".
Entre aproximadamente 3,5 milhões de pessoas conectadas a nivel global, 94% utilizam aparelho celular com conexão 2G (o que não supõe uma conexão completamente segura) e apenas 76% de esta parcela teria acesso a um celular com tecnoogia 3G. Já a conexão 4G seria restrita a aproximadamente 43% dessas pessoas. Para Mielli, o que é realmente importante é perguntar sobre que uso fazem da Internet os que gozam de melhor conexão. Em sua opinião, a maioria dos usuários concentram o uso de sua conexão para navegar em redes sociais, como Whatsapp e Facebook. Esta afirmação leva a contabilizar cerca de um terço da população do planeta como usuários cadastrados no Facebook, aspecto que converte esta rede social no maior monopólio privado existente. "Poucas pessoas navegam na Internet para muito além do Facebook. Lá entram e lá ficam, lendo manchetes de notícias, postagens pessoais e institucionais, fotos e vídeos, mas dificilmente gastam tempo clicando no conteúdo original externo à rede social. A estratégia é criar mais e mais funções para que as pessoas sintam-se cada vez mais em casa. Isto sim é motivo questionamento", frisou a debatedora.
Google, outro gigante de Internet, toma decisões que podem afetar gravemente a democracia e a livre circulação de informação, já que os critérios de indexação utilizado para filtrar os resultados de uma busca geram em sua primeira página apareçam somente notícias "certificadas". E quais são estas notícias certificadas? São exatamente as produzidas por meios monopolistas de comunicação, contemplando uma decisão editorial que atentam contra a liberdade de expressão e a democracia. Do mesmo modo, outras plataformas limitam a informação a 40 caraceteres ou a vídeos de um minuto. De acordo com Mielli, os desafios da inclusão digital se limitam ao acesso à infra-estrutura e, em especial, a problemas como carência de conteúdos e serviços locais.
Se tivermos em vista que a maior parte de conteúdos disponíveis na Internet provêm do norto do mundo e estão em inglês, não será possível alcançar uma consciência crítica na sociedade neste ambiente. Por outro lado, o excesso de informação tampouco é um aspecto necessariamente positivo, já que desvia a atenção daquilo que é realmente relevante. "Estamos, literalmente, perdendo a memória devido ao excesso de imagens e informação", sentenciou.
Finalmente, Mielli enfatiza que estamos sendo monitorados 24 horas, sete dias por semana, em qualquer lugar onde estivermos. Cada respiração, cada passo, cada coisa que fazemos gera informação que é armazenada e comercializada sem nosso consentimento e sem nenhuma transparência. Esse modelo de Internet, que deveria ser uma plataforma de democratização, pode e tende a se converter em um mecanismo de controle.
É por essas razões que Mielli considera urgente estabelecer propostas concretas de forma a evitar esse cenário, mudando a direção para o empoderamento da cidadania e fortalecer seus espaços de capacitação. Discutir uma agenda que promova o software livre e que estabeleça regras a serem cumpridas pelas empresas no que diz respeito à transparência sobre o uso dos dados dos usuários também é imperativo. "Devemos atuar para que as decisões sobre a Internet tenham caráter multissetorial e evitar a concentração em mãos de monopólios privados. Queremos usar a Internet para promover a cidadania, a soberania e a paz. Pode parecer utopia, mas é para isso que a utopia serve: para fazer-nos caminhar", reflete, recordando a célebre citação do escritor Eduardo Galeano.
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