Por Antônio Barbosa Filho, em seu blog:
Tentem isolar as várias medidas já adotadas ou em fase de aprovação forçada pelo Congresso, desde a posse do grupo de corruptos que tomou o poder federal em 2016. Verifica-se que várias delas constituem isoladamente um golpe que jamais teria sido admitido num quadro de normalidade democrática. Imaginem se Dilma Rousseff congelasse os gastos em saúde e educação por vinte anos! Só isso a derrubaria do governo, por incompetência, insensibilidade social, crime orçamentário e todo tipo de acusações que se pudessem formular.
Imaginem o escarcéu que a mídia faria contra um governo legal, trabalhista, caso anunciasse a entrega da Base Militar de Alcântara aos Estados Unidos! Algo que Fernando Henrique planejou fazer, mas foi forçado a recuar pela resistência de cientistas civis e dos militares preocupados com a soberania e a tecnologia nacionais.
Aliás, falando em militares, convém lembrar que nem o regime fardado teve a ousadia de eliminar a CLT ou cortar a maior parte dos direitos trabalhistas, como acaba de fazer a gangue de Michel Temer. Foi nesta fase, também, que destruiu-se o mais sonhado projeto da Marinha Brasileira, o do submarino a propulsão nuclear. E agora, certamente com a tolerância da quadrilha do Planalto, corremos o risco de perder a Embraer, indústria que orgulha os brasileiros no mundo, igualmente fundada por militares nacionalistas como os saudosos brigadeiros Paulo Victor e Casimiro Montenegro Filho, considerados heróis pelas tropas e oficialato da FAB.
Além das medidas quase diárias do Executivo usurpado, temos as atitudes autoritárias e abusivas de membros do Judiciário, em várias instâncias. O “modelo Moro” de usar o Direito para propósitos políticos e anti-nacionais, ferindo a cada momento o Estado de Direito, os direitos civis e as garantias constitucionais, virou moda entre seus colegas. Juízes pensam que sua única função é punir com base em convicções, ou para agradar a opinião pública manipulada por seis ou sete famílias que nunca primaram pelo apreço a Democracia. Disso participam o Ministério Público Federal e de vários Estados, e a Polícia Federal, que se transformou em figurante de filmes e espetáculos midiáticos …
A tática não foi formulada dentro do Brasil. O assessor da CIA Gene Sharp a resumiu num livro de 63 páginas, onde descreve várias formas de se derrubar um governo. O autor afirma que as concebeu para o combate do povo contra ditaduras; mas sabemos que “ditadura” é todo governo que não obedeça e sirva os interesses dos Estados Unidos. O eixo que une suas 138 táticas de agitação é este: não dar tréguas, atacar por todos os lados, sem pausas. Isso confunde a população, atordoa o governo-alvo, e descola o governo da sociedade, fazendo com que o poder se esvazie pela fadiga coletiva. Foi o que fizeram para derrubar Dilma Rousseff, mas aquela foi apenas a primeira etapa do golpe. O objetivo final é eliminar do tabuleiro geopolítico uma potência emergente que vinha se destacando pela sua riqueza de bens naturais, pelo grande mercado consumidor, pelo dinamismo de sua Economia, por uma Diplomacia altiva e pacifista, e pela liderança natural na América Latina.
O golpe não foi apenas contra o PT, Dilma ou Lula. Faz parte de uma ofensiva dos Estados Unidos (mais imperialistas do que nunca, a medida em perde espaço em outras regiões do planeta) para retomar o controle total do seu “quintal”. A expressão “quintal” é antiga, foi usada por vários ex-presidentes dos EUA, e repetida ainda em 2013 pelo secretário de Estado do governo Obama, John Kerry, em discurso ao Congresso do seu país: “A América Latina é nosso quintal (…) temos que aproximarmos de maneira vigorosa”.
Nas esquerdas brasileiras, poucos têm percebido esta dimensão do golpe iniciado em 2016. O PT, por exemplo (e com certas razões respeitáveis, mas estreitas) colocou como objetivo primordial de lutas a garantia das eleições de 2018, a absolvição de Lula para que possa candidatar-se e a sua vitória. Ficamos no plano eleitoral, quando no subterrâneo um imenso terremoto se avizinha, que pode incluir até a violência e a guerra. Já era tempo de mantermos sérias conversações partido-a-partido com agremiações governistas ou não dos parceiros internacionais mais relevantes, como China, Rússia, Índia, Venezuela, etc. Não podemos esperar uma agressão externa, ou interna movida do exterior, para aí pedirmos socorro a países que consideram o Brasil um parceiro na geopolítica mundial.
Como afirmado acima, tudo faz parte de um mesmo conjunto de frentes de combate. A externa é fundamental. E a interna tem sido bem encaminhada – com as dificuldades causadas pela total manipulação da velha mídia, ainda dominante na formação da consciência (ou inconsciência) popular – pelos heróicos movimentos sociais, pela intelectualidade e, esperemos, pela classe média que começa a despertar do logro a que foi induzida em 2016. É preciso politizar cada episódio, mostrando que cada golpe diário dos usurpadores é um dente numa ampla engrenagem que visa triturar a soberania nacional e a Democracia. O Brasil é muito rico e complexo, mas a História nos mostra exemplos de países muito mais poderosos que foram reduzidos a insignificância, miséria e sofrimento.
Como adverte o líder do Movimento Sem-Terra, João Pedro Stédile: “nós teremos um 2018 cheio de mobilizações, de muita disputa política em que a própria campanha eleitoral se transformará em uma verdadeira luta de classes e é por isso que nós, dos movimentos populares, estamos convocando cada militante, cada companheiro e cada companheira e todos os movimentos para nos engajarmos nesse processo e transformarmos 2018 na derrota desses golpistas e na retomada do desenvolvimento do Brasil”
* Antonio Barbosa Filho é jornalista/escritor, e editor do valepensar.net.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente: