terça-feira, 30 de janeiro de 2018

A capacidade do povo para defender Lula

Foto: Ricardo Stuckert
Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

Embora a sentença do TRF-4 não tenha sido uma surpresa real para quem acompanha a conjuntura do país, o caráter injusto e absurdo da decisão projeta um novo momento político, mais grave e a ameaçador para a maioria dos brasileiros.

A pena de 12 anos confirma que, além de seguir uma linha aberta de perseguição a Lula, o Judiciário sente-se à vontade para atuar sem freios nem ponderação, sob impulso da pura vontade de condenar e punir, construindo um poder acima da vontade do povo.

Ao agravar a sentença de Sérgio Moro, fechando espaços legítimos para recursos e contestações, o TRF-4 assumiu uma postura que não tem a menor relação com a evidente ausência de provas, a começar pela penhora do triplex que, atribuído a Lula, sempre foi propriedade da OAS.

A partir de 24 de janeiro o risco de prisão deve ser reconhecido como uma ameaça imediata a Lula e ao país.

A apreensão do passaporte é o tipo de iniciativa que mostra que o abuso está cada vez mais próximo e que novos ataques aos direitos de Lula podem estar sendo urdidos na Lava Jato e arredores.

Esta situação não faz nem deveria fazer sentido diante da total fragilidade das acusações, que nem mesmo uma sentença original com base em falácias demonstradas é capaz de disfarçar.

Neste ambiente, proclamações de moralismo sentimental do relator João Pedro Gebran Neto (“Infelizmente, reafirme-se, infelizmente, está sendo condenado um ex-presidente “), que deu curso a uma postura semelhante exibida pelo procurador Maurício Gerum (“lamentavelmente, Lula se corrompeu”) não convencem, nem podem comover.

A pena recebida por Lula é tão alta, tão dura, tão injusta, que desde a semana passada permite uma comparação surpreendente mas instrutiva. Graças a sentença do TRF-4, o Brasil se tornou o único país do mundo no qual um ex-presidente da República, aprovado por 80% da população ao deixar o cargo, foi condenado a um período de encarceramento maior, por exemplo, do que a recebida pelo gangster de Chicago Al Capone na Justiça dos Estados Unidos, onde foi condenado a 11 anos – num sistema judiciário que é apontado como exemplo a seguir por 10 entre 10 estrelas da Lava Jato.

A pena menor de Al Capone não lhe foi imposta porque os crimes faltassem na lista de acusações que pesavam contra ele. A lista de denuncias incluía assassinatos encomendados e compra de juízes, sem falar no contrabando de bebidas alcóolicas e tráfico de drogas, numa estrutura de organização criminosa poucas vezes vista até então. Acontece que, mesmo no caso do maior dos gangsters, seguiu-se o princípio civilizado de que uma pessoa só pode ser condenada com provas.

Contra Al Capone, sabemos todos, só se demonstrou que havia cometido crimes de natureza fiscal, com base nos volumes de seus livros de contabilidade. Por eles foi condenado. E só. Embora as investigações criminais do FBI tenham até inspirado o seriado de TV Os Intocáveis, não tiveram serventia na condenação. Por que? Não se provava nada.

No Brasil de 2018, mais do que nunca a defesa da liberdade de Lula e a preservação de seus direitos torna-se a prioridade política absoluta. Toda e qualquer iniciativa neste sentido deve ser ampliada e reforçada.

Este esforço inclui, para começar, os esforços para recuperar garantias da Constituição relativas ao direito de defesa, em particular pelo transito em julgado para o cumprimento da pena, cuja supressão antecipou e agravou um quadro de exceção que se tornou a principal ameaça a democracia e ao país.

Não se trata de defender um casuísmo para proteger Lula, nem um privilégio de qualquer natureza, mas recuperar uma medida de caráter universal, como toda garantia própria do Estado Democrático de Direito.

Reconhecendo que a conjuntura atual de colapso institucional tem a origem na quebra do respeito à soberania popular pelo afastamento sem prova de crime de responsabilidade de uma presidente eleita pelo povo, a defesa da liberdade do principal líder popular do país equivale à garantia de liberdade para a maioria da população, como sempre o grande termômetro de determinada situação política.

No Brasil de hoje Lula deve ser defendido como a possibilidade de uma saída democrática para a catástrofe institucional na qual o país se encontra, onde expressa a resistência básica diante de um conjunto de medidas em curso contra o povo e a soberania nacional, em marcha acelerada contra o país e o sentido de sua História.

No atual momento, os perigos são vários. A leitura dos jornais lembra que, entre os adversários novos e velhos, não faltam vozes interessadas em tirar proveito da situação, indicando que, numa hora de tragédia brasileira, nenhum papel lhes resta além alcançar o céu em voo de abutre.

O grande erro, na hora atual, consiste em desconfiar da capacidade do povo em lutar por seus direitos e defender o próprio destino. Passado o choque provocado por uma decisão absurda, basta andar pela rua, conversar com homens e mulheres em cada esquina, pontos de ônibus e outros pontos de encontro, para ouvir cidadãos que compreendem a gravidade da situação e se mostram dispostos a lutar e resistir. Neste fim-de-semana, era possível ouvir reações indignadas com a sentença mesmo em conversas nos Jardins, em São Paulo, região que ninguém classificaria como bastião do lulo-petismo.

Esta é a novidade depois do 24 de janeiro. Os comitês pró-Lula, que foram criados no impulso das caravanas, como uma primeira iniciativa para defender uma candidatura que já nascia como as cicatrizes da luta de classes, voltam a se reunir nos próximos dias. É hora de fazer um balanço, traçar perspectivas e definir tarefas. Há uma grande luta pela frente e a mobilização do povo, do homem comum, terá um papel fundamental em seu resultado.

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