sábado, 13 de janeiro de 2018

Temer festeja, mas país vive uma depressão

Por João Sicsú, no site Vermelho:

Entre 2015 e 2016, o Brasil perdeu 8% do seu PIB. A economia recuou para o tamanho que tinha no 2º semestre de 2010. A economia recuou seis anos. É possível que tenha recuperado no ano passado 1 ponto percentual (ou menos) de tudo que perdeu. O governo comemora, mas é preciso analisar se existe uma recuperação ou se é apenas um suspiro.

É mais provável que seja um suspiro característico de quem bateu no fundo. Contudo, somente é possível sair do poço com uma ação organizada (usando uma corda ou uma escada).

Quando uma economia bate no fundo, pode dar saltos, tal como um distraído que caiu num poço. Mas para haver uma recuperação de forma segura e consistente, não importa se lenta ou rápida, é necessário haver um plano de recuperação.

Para o distraído podem ser oferecidas uma corda ou uma escada. Para a economia, é necessário um plano para estimular o investimento (público ou privado), o consumo ou as exportações líquidas.



O mercado, isto é, os analistas dos bancos, projetam um crescimento de 0,85% a 3,99% para 2018 (pesquisa Focus, Banco Central). Cabe observar que as casas decimais dessas previsões existem somente para dar uma suposta cientificidade aos números e garantir a crença de ingênuos. Mas basta verificar a própria distância entre as projeções para se constatar a incerteza e a imprecisão existentes.

É preciso explicar com base nos eventos correntes e nas informações disponíveis porque se espera tal crescimento. Não existe essa regra de “economia de botequim” que após uma recessão vem sempre uma recuperação. Nos dias de hoje não vivemos uma mera recessão, como aquela que ocorreu em 2009. Vivemos uma depressão.

De forma inusitada, quem colocou a economia em estado de depressão foram as políticas econômicas do governo. O governo elevou os juros e fez contração do crédito. Cortou gastos públicos acentuadamente. Elevou os preços da energia elétrica e dos combustíveis.

Houve uma brusca contração da demanda por produtos e serviços. O desemprego foi às alturas e a produção ao chão. A informalidade e a precarização econômica foram ampliadas em tempo recorde. A pobreza, a miséria e a fome se disseminaram.

A depressão não é caracterizada pela permanência da economia no fundo do poço nem por recessões sucessivas. Mas sim por sucessivos suspiros que ocorrem com a economia sobrevivendo em patamares bem inferiores ao nível original (no caso brasileiro, é o nível de 2014). A depressão é longa, as recessões são curtas.

Em uma depressão, a economia, embora frágil, pode crescer, mas as taxas serão insuficientes e descontinuadas (ou seja, baixas e voláteis). Essa foi, por exemplo, a experiência americana dos anos 1920/30/40.

E, para dificultar a saída do poço, o governo aprovou reformas desestruturantes da economia, o que dificulta ainda mais uma recuperação consistente. Entre elas, destacam-se: desmonte da Petrobras, do BNDES, do Banco do Brasil e da Caixa, a reforma trabalhista e a lei que impede aumento real de gastos do governo. Além dos cortes no valor real do salário mínimo.

Dizem que a recuperação está vindo pelo aumento da produção industrial e por uma maior oferta de serviços. Mas, para tanto, terá que haver aumento consistente da massa salarial. Em outras palavras, terá que haver uma redução continuada do desemprego ou aumento persistente do rendimento médio dos trabalhadores – ou ambos. Contudo, a reforma trabalhista foi elaborada exatamente para que a massa salarial fosse reduzida como proporção do PIB.

A depressão que vivemos foi sendo construída pelos erros de política econômica que se acumulavam desde 2011 e se intensificaram em 2015. Mas os erros não foram aqueles apontados pelos economistas ligados aos bancos ou por aqueles que estão, faz tempo, “costeando o alambrado”, como dizia Leonel Brizola.

A partir de 2011, de forma gradual, foram sendo adotadas todas as receitas propostas pelos adversários dos governos Lula, especialmente do seu segundo governo.

O projeto econômico do governo Dilma era aumentar a competitividade da economia pela via do “fazer o dever de casa” (ajuste fiscal permanente) e de políticas para reduzir custos empresarias (desoneração permanente de impostos empresariais, redução de tarifas de energia elétrica industrial, redução dos spreads bancários visando redução do custo de financiamento empresarial). Portanto, o grande erro de Dilma foi a mudança de projeto – que vigorou do primeiro ao último dia do seu governo.

Foi descartado o modelo do presidente Lula de crescimento com geração de empregos, inclusão social e distribuição de renda – que buscava estimular o investimento e o consumo (colocando dinheiro na mão dos mais pobres que gastam tudo o que recebem e tornam virtuosos processos de crescimento).

Não foram somente erros de ações econômicas do governo Dilma, houve também dificuldades externas e crises políticas. E mais erros decorreram das reações para o enfrentamento de crises e dificuldades. Portanto, foram erros de ações e reações.

Os analistas dos bancos e a turma que “costeia o alambrado” dizem que os erros de Dilma ocorreram basicamente entre 2012 e 2014, que foram erros de descontrole fiscal.

Poupam de suas críticas o ano de 2011 porque naquele ano Dilma fez uma brutal contenção fiscal, conteve a expansão do crédito e elevou juros até o mês de agosto. Isso derrubou a trajetória econômica virtuosa construída no governo do presidente Lula.

O resultado foi que a economia começou a desandar, apesar de ainda ter crescido 4% em 2011 (mas foi uma forte desaceleração em relação aos 7,5% de 2010). Esse mesmo grupo de críticos elogia a intensificação de erros da política econômica de 2015 – que já tinha dado sua primeira amostra em 2011.

Nos dias de hoje, não podemos mais dizer que existem economistas que estão “costeando o alambrado”. Devemos ser mais diretos: já tinham saltado o alambrado desde 2011.

Eles concentravam sua atenção exclusivamente na inflação, na contenção orçamentária e só. Adotam a economia contábil-orçamentária e nunca praticaram a economia como uma ciência moral que busca o bem comum. Esqueceram a redução do desemprego e o combate à desigualdade – e nunca mais falaram em distribuição de renda e de riqueza.

Aliás, são os mesmos que, antes do governo de Michel Temer e apoiados pela presidente Dilma, introduziram na pauta do governo a reforma da Previdência. Relacionam diretamente reforma da Previdência com equilíbrio fiscal e vigor da economia. Não existe essa regra causal na realidade. Isso é regra ideológica que somente serve a interesses econômicos específicos de quem mora do lado de lá do “alambrado”. Os mesmos economistas também tentaram mudar a regra de reajuste do salário mínimo durante o governo Dilma. Mas as centrais sindicais se anteciparam e encurralaram a proposta.

Agora, comemoram um possível suspiro como se fosse uma recuperação. E já trocam olhares de sedução com a equipe econômica do governo dos golpistas.

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