Por Ricardo Kotscho, em seu blog:
Sem apoio popular e sem votos no Congresso para aprovar a reforma da Previdência, o presidente Michel Temer mudou e deu m uma guinada na agenda para não ver seu governo definhar dez meses antes do final do mandato.
Mandou os escrúpulos às favas, como os militares fizeram na edição do AI-5 em 1968, e convocou as tropas das Forças Armadas para fazer uma intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, agora a principal bandeira da sua campanha à reeleição, que começa neste sábado com uma reunião do seu alto comando no Palácio Guanabara.
É fácil botar tropas na rua, bem mais difícil é manda-las de volta para o quartel. Da última vez, levou 21 anos.
Com o sepultamento do “governo das reformas”, Temer aproveitou o fim do Carnaval para trocar de fantasia e partir para o tudo ou nada.
Aonde ele quer chegar?
Resolver o problema da insegurança pública não vai, porque as tropas federais já estão nas ruas do Rio praticamente desde as Olimpíadas, e de lá para cá o problema só se agravou.
O próprio ministro da Defesa, Raul Jungmann, resolveu baixar as expectativas de quem esperava um cenário de guerra nas primeiras horas desta manhã.
Na véspera da reunião do alto comando temerista, Jungmann afirmou que “não haverá policiamento ostensivo de saída, nem tanques”.
Afirmou também que o efetivo existente no Rio “é suficiente” e ainda não há definição sobre o tamanho da tropa que será colocada à disposição do general Walter Sousa Braga Netto, o interventor nomeado por Temer.
Se é assim, por que então todo esse barulho, com pronunciamento em rede nacional de televisão e tudo, falando em “medidas extremas”, “metástase que se espalhou pelo país” depois que “o crime organizado quase tomou conta do Rio”.
Porque Michel Temer já está em campanha e resolveu fugir para a frente, ancorado por uma campanha de marketing, que lembra muito os discursos de Jair Bolsonaro, o líder da extrema direita que lidera todas as pesquisas na ausência do nome de Lula.
“Nossos presídios não serão mais escritórios de bandidos, nem nossas praças continuarão a ser salões de festa do crime organizado. Nossas estradas devem ser rota de fuga segura para motoristas honestos, nas vias, e nunca via de transporte de drogas ou roubo de cargas”.
De quem é a bombástica declaração acima? Pois é, tanto pode ser de Bolsonaro, como agora do Temer vestido para a guerra em seu discurso na televisão.
Jungmann não afastou a possibilidade de mandar tanques para as ruas, mas não já, porque isso ainda depende de um planejamento. “Não será algo assim de saída, amanhã”.
Será quando? Se a população carioca já vive aterrorizada, com medo de sair de casa, em meio aos tiroteios entre policiais e bandidos nas principais vias da cidade, pode-se imaginar o que vai acontecer quando for detonada a primeira bala de canhão.
Tropas militares são treinadas para combater e matar inimigos externos, se necessário, não para fazer papel de polícia.
É muita responsabilidade colocada sobre os ombros do general Braga Netto que na sexta-feira ao voltar de férias nem achou a situação do Rio tão grave quanto parece, atribuindo o clima de panico ao noticiário. “É muita mídia”, limitou-se a dizer.
De fato, no Atlas da Violência de 2017, o Rio aparece com uma taxa de 40 mortes violentas por 100 mil habitantes, bem abaixo de Estados como Sergipe, Alagoas e Ceará, com apelo midiático muito menor.
O que Temer mais quer é muita mídia para desfilar o figurino de “linha dura” que vai adotar na campanha eleitoral, agora correndo o risco de se transformar num bangue-bangue generalizado.
E se a intervenção militar não der certo antes das eleições, qual será o próximo passo? Estado de Sítio? Ou Temer vai chamar tropas da ONU, quem sabe a 4ª Frota dos Estados Unidos, a mesma que esteve por aqui no apoio ao golpe de 1964?
Não sei, não, mas tudo neste momento vampiresco que vive o país me cheira a naftalina, a filme velho em preto e branco, a começar pelos trajes e gomalinas usados pelos principais personagens do Palácio do Planalto.
Contra a vontade dos militares, as fardas e seus canhões estão de volta a chamado de um governo civil que não se dá ao respeito.
Sai Carlos Marun, o líder da tropa de choque de Temer no Congresso, que fracassou na compra dos votos da Previdência, e entram em cena as tropas do general Braga Netto.
Em lugar de cargos e verbas para parlamentares, o governo agora vem com outra munição mais pesada.
Só de uma coisa tenho certeza: isso não vai acabar em coisa boa.
Já pensaram no que pode acontecer se os militares forem chamados a intervir em manifestações de rua durante a campanha eleitoral?
Espero apenas que a nossa jovem e frágil democracia sobreviva até outubro.
Vida que segue.
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