quinta-feira, 15 de março de 2018

O golpe de 2016 e o feminicídio político

Por Cynara Menezes, no blog Socialista Morena:

Muito já se escreveu e se escreverá sobre as implicações machistas do golpe que derrubou uma mulher da presidência da República no Brasil em 2016. Havia ódio político contra Dilma Rousseff, mas também componentes claríssimos de misoginia, de ódio de gênero. Característica, aliás, da extrema-direita em ascensão no mundo. Um homem machista, assediador e abusador ocupa a presidência dos Estados Unidos.

Dilma foi xingada para o mundo inteiro ver na abertura da Copa do Mundo, em pleno Itaquerão. Nas redes sociais e nas manifestações verde-amarelas nas ruas, sobravam depreciativos à presidenta relacionados a gênero: “puta”, “vaca”, “quenga”, “sapatão”, “feia”, “burra”, “gorda”, inclusive por (de)formadores de opinião direitistas com espaço na mídia. Uma revista semanal retratou Dilma como “louca”, “desequilibrada”, em sua capa.

O mesmo tem acontecido nos últimos anos com mulheres que se destacam na defesa dos direitos humanos, como a deputada federal Maria do Rosário, do PT gaúcho. Rosário é cotidianamente vilipendiada, xingada, caluniada e já foi ameaçada de morte por homens reacionários estimulados por uma família de parlamentares de extrema-direita. Um pseudohumorista com um programa na TV aberta e milhões de seguidores publicou nas redes sociais um vídeo onde fazia gestos obscenos para a deputada.

O viés machista do golpe de 2016 abriu a brecha para a volta dos feminicídios políticos, modalidade criminal que não dava as caras por aqui desde a ditadura militar. O regime autoritário de que hoje tantos têm nostalgia torturou, estuprou e matou centenas, talvez milhares de mulheres. Algumas delas adolescentes, como a estudante baiana Nilda, de apenas 17 anos, morta após dois meses sendo torturada. A própria Dilma foi vítima de tortura.

Ontem à noite uma mulher de esquerda, negra, LGBT, defensora dos direitos humanos e denunciante da violência policial, foi executada a tiros no centro do Rio. A morte brutal da vereadora do PSOL Marielle Franco, que tinha companheira e filha, coloca uma sombra sobre todas nós, mulheres progressistas. É um aviso, uma ameaça a todas nós. A partir de agora, todas corremos perigo.
As digitais dos que agridem mulheres de esquerda nas redes socais estão naquela arma.

É como se dissessem para nós: não se meta, cale-se ou podemos matá-la no meio da rua, à vista de todo mundo, onde você estiver. Exatamente como fazem companheiros e ex-companheiros das quase 5 mil mulheres assassinadas todos os anos no Brasil, o quinto país que mais mata mulheres no mundo, e os números estão crescendo desde o golpe contra Dilma. Feminicídio. Uma palavra que Dilma colocou no código penal e que a extrema-direita queria retirar. Felizmente, perderam a disputa e a pena para feminicídio foi ampliada esta semana no Senado.

Quem são os responsáveis pela morte de Marielle Franco? Apenas aquele ou aqueles que apertaram o gatilho? Não. As digitais de todos os que, nos últimos anos, têm agredido mulheres de esquerda nas redes socais estão naquela arma. As digitais dos que, na mídia comercial, atacam o feminismo e as feministas, também. Você, que xingou Dilma naquele estádio, é cúmplice da morte de Marielle e do Brasil que nos tornamos em apenas quatro anos. Não é à toa que continuaram atacando a vereadora mesmo depois de assassinada.

O ovo da serpente foi chocado. O futuro do Brasil é incerto. Marielle está morta. Em um de seus últimos tweets dizia: “Quantos mais vão precisar morrer?” Quantos? Quantas?

E quem irá nos defender?

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