A ascensão do governo Temer gerou novas expectativas em relação à condução da política externa frente às críticas dos ministros tucanos que assumiram o Itamaraty à experiência altiva e ativa dos governos petistas. De imediato, as articulações sul-sul que estavam em curso foram imediatamente secundarizadas, o que logo indicou o quanto a temática da soberania nacional poderia ser abalada.
Pela sucessão de fiascos protagonizados pelos ministros de Temer no Itamaraty, o problema se revelou não apenas no enfoque ideológico e programático associado ao retorno da integração subordinada aos países ricos, sobretudo aos Estados Unidos. Apareceu ser também de competência, a começar pela escandalosa imprudência de apoio pré-eleitoral do então recém empossado ministro do Itamaraty de Temer, José Serra, à candidata Hillary Clinton.
Com a confirmação da vitória de Donald Trump nas eleições estadunidenses do final de 2016, a pretendida aproximação subordinada de Temer ao governo dos Estados Unidos sofreu abalo sísmico. Na sequência, a manifestação de desinteresse dos EUA pelo ingresso do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), clube dos 35 países ricos do mundo, revelou mais um fracasso do governo brasileiro, terminando por asfaltar o horizonte de irrelevância geral e crescente a que o país passou a se situar sob a governança de Temer e seus ministros de baixíssima qualificação e competência.
Concomitante com a irrelevância assegurada ao Brasil seguiu liberado o desmantelamento das bases da soberania, com o desfazimento de ativos nacionais, como o petróleo. Na agenda econômica, a pauta de privatização interessou ao grande capital estadunidense, seja na privatização, especialmente no petróleo, como na condução destrutiva dos competidores nacionais pela Operação Lava Jato.
Para além dos Estados Unidos, outros países se interessaram em participar da feira de liquidação de empresas estatais e do patrimônio de riquezas nacionais. Somente a China, por exemplo, adquiriu 21 empresas, equivalendo à somatória de 21 bilhões de dólares.
Ao mesmo tempo, o processo chinês de internacionalização de sua moeda nacional (Yuan) contemplou participar em diversas operações de fusões e aquisições. No mercado financeiro, os chineses começaram com o investimento de 100 bilhões de dólares, por meio de um dos seus bancos. Todas as regiões brasileiras foram impactadas pelos investimentos chineses, embora venha sendo a região Sudeste a que concentrou 56% do total dos empreendimentos, acompanhada pelo Nordeste (17%), Centro-Oeste (17%) e Sul e Norte, ambas com 6%, cada, no total dos investimentos.
Essa realidade brasileira, se ampliada para a América Latina, expressa a rapidez com que a China se recoloca no mundo, com perda relativa dos Estados Unidos. No ano de 2016, por exemplo, um terço de todas as importações da América Latina era proveniente dos Estados Unidos, a passo que em 1980 representavam a metade.
Em compensação à perda de importância relativa dos Estados Unidos, observa-se que a China passou a responder por 18% das importações da América Latina em 2016. No ano de 1980 era apenas de 3%. Destaca-se, além disso, que desde 2014, o presidente chinês (Ji Jinping) visitou três vezes a América Latina, tendo o seu ministro de Relações Exterior (Wang Yi) realizado duas viagens pela região em menos de dois anos.
Como o Brasil segue à venda pelo governo Temer, a presença chinesa parece ser cada vez mais crescente. Sem um plano estratégico nacional, conjuntamente com o desfazimento da capacidade de coordenação econômica do governo golpista, o país se subverte rapidamente ao novo colonialismo, sem soberania e perda de suas riquezas e patrimônio nacional.
* Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
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