quarta-feira, 18 de julho de 2018

Mídia aposta na apatia política

Por Laurindo Lalo Leal Filho, na Revista do Brasil:

Segue animada a luta de partidos e candidatos por alguns segundos a mais no horário eleitoral obrigatório no rádio e na TV, a se iniciar em 31 de agosto. Há candidatos, como é o caso do ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que apostam tudo nesse tipo de propaganda. É a sua última esperança de melhorar os índices de intenção de voto registrados até aqui por todas as pesquisas.

A expectativa, por certo, é que se repita o fenômeno das últimas eleições municipais realizadas em São Paulo, onde um candidato desconhecido recebeu uma cuidadosa embalagem de marketing e venceu as eleições no primeiro turno graças à TV – e ao desinteresse pela política, já que Doria perdeu para abstenções e brancos e nulos.

Se por um lado esse tipo de uso do horário eleitoral distorce sua finalidade, levando o eleitor ao engano, por outro é nesse momento que as mensagens honestas e não manipuladoras podem transitar livremente. Personagens e ideias banidas ou distorcidas durante as programações regulares das emissoras podem aparecer em sua integralidade nos horários obrigatórios.

A ditadura civil-militar de 1964-1985 tentou aniquilar todas as organizações de esquerda existentes no pais, mesmo aquelas que não aderiram à luta armada. Qual não foi a surpresa quando, ao final desse período, era possível ver nas telas de TV, nos horários obrigatórios, os símbolos do comunismo até então demonizados pela ditadura. Além das mensagens denunciando as mazelas nacionais contrastando com a propaganda governamental ufanista.

Os programas eleitorais cumpriram um importante papel na abertura democrática dos anos 1980 e na consolidação das liberdades políticas dali em diante.

A sua importância está diretamente ligada à falta de pluralidade no noticiário e na ausência de debates políticos no rádio e na TV. Durante a ditadura a Polícia Federal enviava seguidamente ordens às redações proibindo a divulgação de determinados assuntos ou a realização de entrevistas com determinadas pessoas.

Entre os nomes censurados estavam, por exemplo, os de dom Hélder Câmara e de Darcy Ribeiro e entre os inúmeros assuntos proibidos incluíam-se o surto de meningite que ocorreu em São Paulo em meados da década de 1970 e a volta às ruas das manifestações estudantis.

Hoje a situação se repete, não por via direta da Policia Federal mas pela própria censura empresarial imposta pelos donos dos meios de comunicação. Exemplo mais recente é o do banimento do nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dos noticiários. Ao ser preso, a ordem das empresas é que ele fosse esquecido, com a intenção de determinar a sua queda nas pesquisas de intenção de voto, o que não ocorreu.

Sobreveio, no entanto, um fato novo, inesperado para os operadores do jornalismo dessas empresas. A ordem do desembargador Rogério Favreto de libertar o ex-presidente em pleno domingo pegou os plantonistas nas redações de surpresa. De repente, tinham que falar de Lula de novo.

Para tanto, comentaristas e apresentadores de folga foram chamados e, ao longo do dia, tentaram ir se refazendo do susto. Se o nome do ex-presidente não podia deixar de voltar as telas e microfones, a forma como isso foi feito enquadrou-se na linha da distorção, enfatizando o irrelevante (o desembargador ser plantonista ou ter trabalhado em administrações petistas) e escondendo o relevante (a incomunicabilidade do ex-presidente impedindo-o de falar com a imprensa, a ausência de razões para o seu encarceramento e a perseguição pessoal exercida sobre ele pelo juiz de piso Sérgio Moro).

Mas não é só em momentos excepcionais como os do domingo, 8 de julho, que a mídia adota essa postura. Ela faz parte da rotina normal de trabalho.

Na televisão aberta, o veículo informativo único para a maioria da população brasileira, não se debate política. E na TV fechada os poucos que existem mantêm uma linha editorial conservadora, quando não reacionária. O contraditório inexiste.

Outro exemplo recente de parcialidade ocorreu com o programa Roda Viva, da TV Cultura que, diga-se, não é um programa de debates e sim uma espécie de entrevista coletiva, ao contrário do que afirmou o vice-presidente do Conselho Curador da emissora, Jorge da Cunha Lima, em artigo publicado num jornal da imprensa corporativa.

Nesse programa, a pré-candidata do PCdoB à Presidência da República, Manuela D’Ávila, viveu um dos momentos mais constrangedores da história da TV brasileira. Cercada de entrevistadores alinhados ideologicamente em campo oposto ao dela, quase não pôde falar, interrompida que foi por mais de 60 vezes. As perguntas eram de nível pedestre, quase sempre evidenciando a indigência cultural dos perguntadores.

Como se vê, nos raros momentos em que a TV se abre para a política, o faz de forma canhestra, não dando ao telespectador a possibilidade de formar opinião através de um debate qualificado, rico em ideias capazes de despertar o público para temas que são essenciais à sua vida.

Ao contrário, programas como o Roda Viva já há muito tempo vêm dando a sua contribuição para o desencanto com a política cujo resultado é o surgimento de “salvadores da pátria” que, em outros momentos históricos, espalharam o terror pelo mundo.

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