quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Alckmin, Bolsonaro ou BTG Pactual?

Por Alexandre Andrada, no site The Intercept-Brasil:

Quando o jornalismo se refere a esse ente abstrato chamado “mercado”, saiba que é apenas o nome impessoal dado um punhado de empresas do setor financeiro, de origem nacional e estrangeira, cujas sedes se concentram no Rio e em São Paulo.

O Banco Central divulga semanalmente o Relatório Focus, que apresenta as expectativas do “mercado” sobre uma série de variáveis econômicas. Em seu último número, vê-se que “ele” espera para 2018 uma inflação de 4,11%, e de 4% para 2019 e 2020.

O valor científico dessas previsões é próximo de zero, já que os economistas não acertam sequer a inflação do mês corrente. Mas isso não significa que elas são inúteis. O fato de o mercado projetar uma inflação no centro da meta para os anos vindouros, significa que ele está tranquilo em relação ao próximo governo do país.

Na República Velha, que durou entre 1889 e 1930, São Paulo era café, e os cafeicultores elegiam seus presidentes. Na Nova República, São Paulo é derivativos, e o setor financeiro elege seus presidentes.

Mesmo quando um outsider ameaça romper a política do café-com-leite moderno, ele é obrigado a beijar a mão do “mercado”.

Exemplo claro disso foi Lula em 2002, com sua Carta aos Brasileiros e a escolha de Henrique Meirelles para comandar o Banco Central. Meirelles era àquela altura deputado federal eleito pelo PSDB e ex-funcionário da alta cúpula internacional do Bank Boston. Ou seja, era um digno representante os que mandam nesta terra, feito o filho bacharel de um grande cafeicultor de Campinas no início do século passado.

Agora, o plano A do “mercado” é Alckmin. Além de paulista, e com bom trânsito nas regiões da Paulista e Vila Olímpia, Alckmin tem sua equipe econômica liderada por Pérsio Arida.

Arida é ele mesmo um desses milionários do “mercado”, sendo quem assumiu o controle do banco BTG Pactual quando André Esteves foi para o xilindró, na esteira da queda de Delcídio do Amaral.

Nascido em São Paulo, Arida é doutor em Economia pelo MIT, o badalado Massachusetts Institute of Technology. Tornou-se nacionalmente conhecido no início dos anos 1980 como professor da PUC-Rio, quando elaborou um plano de combate à inflação junto com André Lara Resende, que serviria de base para o Plano Real.

Arida trabalhou na burocracia estatal já no governo Sarney, durante a implementação do Plano Cruzado. Depois voltou à cena no governo FHC, dirigindo o Banco Central e o BNDES. Na época do BC, surgiram denúncias de que ele teria repassado informações privilegiadas para Fernão Bracher do banco BBA.

Saindo do governo, entrou pela porta da frente do “mercado”.

Arida é um liberal. Em entrevista recente disse: “o Estado tem de deixar de ser empresário. O que as pessoas querem hoje e o que Brasil precisa é de uma economia dinâmica. Para isso, não precisa de estatal”. Acredita que o Brasil não pode crescer mais de 2% ao ano, bem como que os juros bancários só poderão ser reduzidos se forem retiradas as interferências governamentais. Subsídios creditícios e crédito direcionado, acredita, são as causas dos juros elevados. Nada de errado com os bancos, pois.

Sua proposta é, resumidamente, a de avançar nas privatizações, abrir a economia à competição internacional e reduzir a regulamentação estatal sobre o funcionamento dos mercados.

No caso do plano A falhar, o “mercado” está claramente disposto a acionar seu plano B: Bolsonaro.

Suas declarações afirmando ser ignorante em assuntos econômicos têm duas dimensões. A primeira, suas óbvias limitações cognitivas. Segundo, e mais importante, sinaliza ao “mercado” que toda as coisas que disse ao longo de sua vida parlamentar sobre assuntos econômicos, que tendiam para um nacionalismo do tipo Médici-Geisel, eram palavras ao vento de um incauto.

A equipe econômica de Bolsonaro é liderada por Paulo Guedes.

Guedes é doutor em Economia pela Universidade de Chicago, a mais famosa escola econômica liberal do mundo. Como Arida, teve seu momento como acadêmico, lecionando na PUC e na FGV do Rio. No início dos anos 1980, foi um dos fundadores do banco Pactual, que está na origem do BTG Pactual há pouco mencionado.

Coincidência? Quiçá.

A verdade é que o universo das grandes finanças do país é pequeno. E o BTG Pactual orgulha-se de ser o quinto maior banco brasileiro, e o maior banco de investimento “puro sangue” da América Latina.

Estamos, pois, falando de uma máquina de fazer dinheiro em grande escala e cujos donos interferem de maneira republicana (ou não) nos rumos da política nacional.

Guedes era um dos dirigentes da Bozano Investimentos, empresa do bilionário Júlio Bozano (que ganhou uma bolada na época das privatizações dos anos 1990). A empresa tem hoje uma carteira de investimento acima dos 3 bilhões de reais.

Guedes é também um dos principais nomes do Instituto Millenium, o think tankultraliberal, cujo panteão de colunistas conta com grandes nomes do “mercado”, como Gustavo Franco e Alexandre Schwartzman, para ficar nos mais conhecidos.

A “agenda Guedes” é a mesma de Arida, mas sob o efeito de anabolizantes.

E se tudo der errado, há ainda Marina Silva, que viveu encangada com Neca Setúbal, filha do fundador e sócia do banco Itaú. O maior banco privado do país (junto com Bradesco) e uma de nossas grandes multinacionais. Cabe lembrar que Itaú, BB, Caixa e Bradesco controlam quase 80% de todos os depósitos bancários do país.

Marina conta ainda com o auxílio de Lara Resende, parceiro intelectual de Arida nos anos 1980.

Lara Resende tem currículo parecido com os dois anteriormente citados: doutor pelo MIT, passagem pela academia, pela burocracia estatal e pelo “mercado”.

Foi recentemente apedrejado por seus pares, quando suspeitou de que poderia haver algo de errado no sistema financeiro nacional, dono das maiores taxas de juros.

Lara Resende, porém, está a anos-luz de ser um heterodoxo ou outsider. Só vacilou em sua fé.

Enfim, não tem como dar errado. O “mercado” já elegeu seu próximo presidente.

Não se governa país algum indo-se contra a elite econômica local. E a elite econômica do Brasil de hoje são as empresas financeiras.

A nós, resta o voto de cabresto desse coronelismo repaginado.

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