quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Bolsonaro e a PEC das domésticas

Por Juliane Furno, no jornal Brasil de Fato:

Na série de entrevistas realizadas pelo Jornal Nacional com os principais candidatos à Presidência da República, me chamou particularmente a atenção as declarações de Jair Bolsonaro do PSL quando questionado sobre ter sido o único deputado federal a votar contrário a PEC das domésticas em 2013.

Sobre a resposta do candidato presidenciável há duas questões importantes que quero tratar aqui: a primeira é a ignorância e o completo desconhecimento de Bolsonaro sobre os efeitos da PEC das domésticas sob a categoria, e a segunda é a externalização de um projeto de Brasil em que as relações servis e pessoalizadas de trabalho seguem como u modelo a ser seguido, fazendo regredir nossos avanços sociais à décadas atrás.

Bolsonaro afirmou ser contrário à equiparação dos direitos das trabalhadoras domésticas aos demais trabalhadores formais – sobre o que legisla a PEC – porque essa medida causaria desemprego. Esse foi exatamente o mesmo argumento utilizado pelos conservadores de plantão em 1972, quando passou a ser obrigatório o registro em carteira das empregadas domésticas. Segundo ele “Foi para proteger. (…) Muita gente teve de demitir porque não teria como pagar. Muitas mulheres perderam emprego pelo excesso desses direitos”.

Vamos analisar rapidamente essa relação. Em primeiro lugar, a PEC das domésticas regulamenta apenas um conjunto de direitos dos quais ainda estavam de fora as domésticas – particularmente o recolhimento do FGTS e INSS pelo empregador. Portanto, a PEC das domésticas só vale para o conjunto das trabalhadoras que já são registradas. Olhando essas alíquotas, que são de 8% cada uma delas para um salário mínimo, o acréscimo final – na simulação de um salário de 900 reais – é de um pouco mais de 100 reais.

Ou seja, não me parece razoável creditar à PEC das domésticas o aumento do desemprego das empregadas domésticas, uma vez que 100 reais a mais não é – efetivamente – um alto custo para o empregador – por outro lado, é de grande diferença para a empregada, que poderá gozar a dignidade da aposentadoria e do Fundo de Garantia. Dessa forma, o argumento de que muitos empregadores demitiram porque não teriam como pagar não é nada razoável!

Em segundo lugar, os empregadores não demitiram! Basta olhar os dados mais recentes sobre o mercado de trabalho para ver que entre 2015 e 2017 o emprego doméstico – ao lado do trabalho por conta própria – foram as únicas ocupações com saldo líquido positivo de emprego para as mulheres! Ou seja, o trabalho doméstico tem um comportamento anticíclico. Nos governos Lula e Dilma, quando o desemprego estava baixo e a economia crescendo, o empregado doméstico perdia participação no mercado de trabalho. Em períodos de crise econômica é apenas no trabalho doméstico que muitas mulheres desempregadas encontram possibilidade de reinserção laboral.

Essa é a reflexão quanto ao que chamei de ignorância e desconhecimento do candidato sobre o tema. No que tange ao seu projeto de país, a análise é simples. Bolsonaro comunga com aqueles que desejam a volta do Brasil servil.

Não regulamentar nem profissionalizar o trabalho das empregadas domésticas é a principal forma de manter esse trabalho na condição de serviçal, de agregado da família, relembrando a organização familiar do século XIX! Além disso, na medida em que persiste o desemprego e aumenta a oferta de mulheres se dispondo ao trabalho doméstico, menores se tornam seus salários. Pela Lei da oferta e da procura: quando mais oferta de mão de obra no mercado por menor preço é negociada a sua contratação.

Essa é mais uma faceta do golpe. Mulheres, especialmente as negras, retornam ao seu lugar de origem, submetidas a baixos salários, jornadas extenuantes e ausência de direitos trabalhistas.

Com Bolsonaro e seu projeto neoliberal de flexibilização ao máximo dos direitos trabalhistas é a volta do Brasil servil de novo.

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