Por Ricardo Kotscho, em seu blog:
Quis o destino, sempre ele, que a chamada da minha matéria “Das Diretas-Já a Tancredo Neves, a longa transição para a democracia”, na capa da Folha deste sábado, saísse junto com a foto de um boneco de Jair Bolsonaro.
Entre estes dois episódios emblemáticos da nossa história, passaram-se apenas 34 anos - da grande festa cívica da redemocratização, que varreu de esperança as ruas do país em 1984, à tragédia que vivemos hoje, na antevéspera de mais uma eleição direta para presidente da República.
O que foi feito do Brasil? O que sobrou de nós? Quem poderia imaginar isso? Que futuro nos espera?
Me deu uma tristeza profunda ao reler minha matéria junto com o noticiário do dia, após o atentado contra o inacreditável ex-capitão Jair Bolsonaro em Juiz de Fora.
Bons tempos, aqueles, em que a gente parecia ter o nosso destino novamente nas nossas mãos, depois da longa noite da ditadura, agora defendida por Bolsonaro e o seu vice, general Mourão.
E o que é ainda mais dramático: grande parcela da população, segundo todas as pesquisas, já aderiu a esta insanidade, como se fosse a coisa mais natural do mundo, mera “alternância de poder”.
Como assim? Passar de um regime democrático, duramente reconquistado pela minha geração, para voltar outra vez a um governo fardado, não é alternância de partidos no poder, é suicídio coletivo.
Nem partido têm o capitão, o general e seus fanáticos seguidores, assim como Fernando Collor também não, outra ironia do destino, que na primeira eleição direta colocou no poder este herdeiro da velha oligarquia que manda no país há séculos, com breves intervalos.
Collor não completou o mandato, mas esta foi apenas uma das tragédias que marcaram indelevelmente nossa História, desde que as forças do atraso, as mesmas de hoje, levaram Getúlio Vargas ao suicídio, em 1954.
Tempos atrás, num jantar com os amigos jornalistas Selma e Sérgio Motta Mello, eles me sugeriram escrever um livro com este título: “A tragédia brasileira, de Getúlio a Temer”.
Ainda nem se falava em Bolsonaro, um inexpressivo e, então, apenas folclórico deputado federal, que só falava besteira, a nos mostrar que esta sucessão de tragédias ainda pode estar longe de acabar.
Getúlio suicidado, Juscelino quase impedido de tomar posse, Jango derrubado por um golpe cívico-militar, generais-presidentes se sucedendo, Tancredo morto antes de empossado, Collor impichado, Dilma golpeada.
E agora o que nos espera?
Quando parecia que o Brasil tinha tomado um rumo, após os 16 anos de FHC e Lula, breve período sem tragédias e com plena democracia, nos últimos quatro anos regredimos muitas décadas, desconstruindo o país, tijolo por tijolo, não deixando pedra sobre pedra.
Neste melancólico 7 de Setembro, não tínhamos mais nada a comemorar, com a nossa independência ameaçada e as instituições todas em frangalhos, antes de completar 200 anos.
Nem dá para imaginar hoje como estaremos em 2022, quando terminar o mandato do presidente a ser eleito em outubro, se tiver eleição.
Quem melhor resume esta nossa história feita de tragédias só poderia ser o grande humorista e filósofo José Simão, em sua coluna deste sábado na Folha:
“A insanidade venceu!”
Vida que segue. Para onde?
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