Por Roberto Andrés, no site Outras Palavras:
Até onde a vista alcança, o futuro é um poço fundo cheio de alçapões, tipo aquelas bonecas russas: segundo turno polarizado com metade do país no colo de um defensor de ditaduras.
Resolvi dar uma olhada para trás, relembrar como chegamos até aqui. Como não achei os dados filtrados assim, criei uma planilha com a intenção de voto no primeiro turno em Bolsonaro, Ciro, Lula, Marina e Aécio/Alckmin, além da rejeição do governo, desde 2015. Tudo pelo Datafolha, para ficar com um instituto só e evitar diferenças metodológicas.
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Em dezembro de 2015, Eduardo Cunha tinha acabado de dar prosseguimento a um pedido de impeachment de Dilma Rousseff. Bolsonaro tinha 3% de intenções de votos, em 5º lugar nas pesquisas. Aécio liderava, com 26%. Lula e Marina empatados com 19%. A reprovação do governo Dilma era enorme: 65%.
Até onde a vista alcança, o futuro é um poço fundo cheio de alçapões, tipo aquelas bonecas russas: segundo turno polarizado com metade do país no colo de um defensor de ditaduras.
Resolvi dar uma olhada para trás, relembrar como chegamos até aqui. Como não achei os dados filtrados assim, criei uma planilha com a intenção de voto no primeiro turno em Bolsonaro, Ciro, Lula, Marina e Aécio/Alckmin, além da rejeição do governo, desde 2015. Tudo pelo Datafolha, para ficar com um instituto só e evitar diferenças metodológicas.
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Em dezembro de 2015, Eduardo Cunha tinha acabado de dar prosseguimento a um pedido de impeachment de Dilma Rousseff. Bolsonaro tinha 3% de intenções de votos, em 5º lugar nas pesquisas. Aécio liderava, com 26%. Lula e Marina empatados com 19%. A reprovação do governo Dilma era enorme: 65%.
Abatido sucessivamente pela Lava Jato, Aécio seguiu em queda livre até maio de 2017, quando foi degolado de vez pela divulgação de conversas delinquentes com Joesley Batista. Alckmin passou então a ser o presidenciável, mas nunca cresceu. Foi nesse vácuo de um PSDB alvejado por denúncias de corrupção que cresceu um certo ex-capitão do exército. Talvez seja preciso olhar para o eleitor do Bolso por essa chave: a pessoa que vestia camiseta “A culpa não é minha, votei no Aécio” e que depois viu seus heróis desmoronarem chafurdados na mesma lama em que estariam “os outros”.
É de ressentimento que estamos falando, visto que esse eleitor não deixou de odiar o PT, mas se sentiu traído pela opção na qual tinha apostado. E decidiu partir pra uma solução mais radical, ainda que obviamente não menos corrupta (a nova decepção é questão de tempo, mas aí talvez as eleições já não sejam mais como conhecemos).
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Em março de 2016, às vésperas da votação do impeachment, Lula atinge seu piso, 17%. O governo Dilma batia recorde de reprovação, 69%. Marina liderava com 21%. Nesse sentido, o golpe parlamentar executado pela velha direita brasileira foi o grande turbinador eleitoral de Lula e do PT. Mesmo economistas de esquerda reconhecem que o governo Dilma1 foi um desastre na economia e que os ajustes do governo Dilma2 não levariam a um lugar melhor do que o que estamos.
Colocado como vítima de uma conspiração, e frente a um governo corrupto e uma economia patinando, Lula viu suas intenções de voto subirem mês a mês desde então. A prisão do ex-presidente, a partir de um processo frágil e desproporcional aos que sofrem outros políticos, fortaleceu ainda mais esse lugar.
É preciso reconhecer que a campanha do PT soube explorar com maestria essa situação, fazendo de um sujeito atrás das grades uma cachoeira de votos. Assim foi possível se criar uma narrativa em que o Brasil triste de hoje teria surgido a partir de 2016 e o Brasil feliz de novo remeteria aos tempos de boa economia de 2010, como se os anos de 2014 e 2015 em que o país passou por uma das maiores recessões de sua história não tivessem existido.
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A curva de crescimento de Bolsonaro segue a de Lula, naquela lógica de que os polos se fortalecem.
Marina Silva, que liderava em 2016, ficou esmagada e não soube se posicionar. Apoiou o impeachment – que era então aprovado pela maioria da população. Talvez por ressentimento com a campanha violenta que sofreu do PT em 2014; talvez por achar que poderia ter ganho político. O fato é que acabou ferida de morte entre o eleitorado progressista de classe média, restando para ela o eleitorado popular que agora migra em massa para o indicado de Lula.
Ciro Gomes veio estável nesse tempo todo, sempre com 4 a 7% de votos. Seu crescimento recente tem a ver com a boa campanha que vem fazendo, mas talvez não se sustente quando Haddad for se tornando mais conhecido (o que está sendo muito mais rápido do que se previa) e com as próprias trapalhadas de Ciro, que tem gosto em morrer pela boca.
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O PT é o único partido grande de fato no Brasil, com militância engajada, capilaridade, e se há poucos anos ele estava em declínio, a parlamentada de 2016 e a prisão do ex-presidente contribuíram para coesionar o partido de uma maneira que ninguém apostaria. Com o crescimento do petismo, avança também o antipetismo, e hoje o ocaso do PSDB deixou essa metade da população entregue a pessoas que falam abertamente em autogolpe, nova Constituição feita pelos amigos, em metralhar adversários.
Não parece haver nenhuma alternativa de terceira via com chances de chegar ao segundo turno. Se a vida já não era fácil para Marina em 2010 e 2014, quando disputava sozinha a segunda vaga, agora que essa disputa se dá entre três candidatos competitivos, a labuta é no limite do impossível.
Marina e Ciro precisariam estar juntos e com muito mais musculatura para fazer frente ao cenário de extrema polarização que vem aí. Não aconteceu, infelizmente – porque a possibilidade de uma terceira via faria muito bem ao país. Despolarizar ajuda a pensar e focar nos verdadeiros problemas (que são muitos e graves) que assolam o povo brasileiro.
A abertura do próximo alçapão indica que teremos uma eleição mais polarizada e mais violenta do que em 2014, com risco de eleger aqueles que podem fazer com que fiquemos algumas décadas sem conhecer eleições, liberdade individual, posts como este no facebook. Mesmo que isso não aconteça, a tendência é passarmos outros anos calcados no ódio, no flerte com golpes, na burrice enraizada e na proposta fascista surfando na onda da oposição ao governo.
É de ressentimento que estamos falando, visto que esse eleitor não deixou de odiar o PT, mas se sentiu traído pela opção na qual tinha apostado. E decidiu partir pra uma solução mais radical, ainda que obviamente não menos corrupta (a nova decepção é questão de tempo, mas aí talvez as eleições já não sejam mais como conhecemos).
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Em março de 2016, às vésperas da votação do impeachment, Lula atinge seu piso, 17%. O governo Dilma batia recorde de reprovação, 69%. Marina liderava com 21%. Nesse sentido, o golpe parlamentar executado pela velha direita brasileira foi o grande turbinador eleitoral de Lula e do PT. Mesmo economistas de esquerda reconhecem que o governo Dilma1 foi um desastre na economia e que os ajustes do governo Dilma2 não levariam a um lugar melhor do que o que estamos.
Colocado como vítima de uma conspiração, e frente a um governo corrupto e uma economia patinando, Lula viu suas intenções de voto subirem mês a mês desde então. A prisão do ex-presidente, a partir de um processo frágil e desproporcional aos que sofrem outros políticos, fortaleceu ainda mais esse lugar.
É preciso reconhecer que a campanha do PT soube explorar com maestria essa situação, fazendo de um sujeito atrás das grades uma cachoeira de votos. Assim foi possível se criar uma narrativa em que o Brasil triste de hoje teria surgido a partir de 2016 e o Brasil feliz de novo remeteria aos tempos de boa economia de 2010, como se os anos de 2014 e 2015 em que o país passou por uma das maiores recessões de sua história não tivessem existido.
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A curva de crescimento de Bolsonaro segue a de Lula, naquela lógica de que os polos se fortalecem.
Marina Silva, que liderava em 2016, ficou esmagada e não soube se posicionar. Apoiou o impeachment – que era então aprovado pela maioria da população. Talvez por ressentimento com a campanha violenta que sofreu do PT em 2014; talvez por achar que poderia ter ganho político. O fato é que acabou ferida de morte entre o eleitorado progressista de classe média, restando para ela o eleitorado popular que agora migra em massa para o indicado de Lula.
Ciro Gomes veio estável nesse tempo todo, sempre com 4 a 7% de votos. Seu crescimento recente tem a ver com a boa campanha que vem fazendo, mas talvez não se sustente quando Haddad for se tornando mais conhecido (o que está sendo muito mais rápido do que se previa) e com as próprias trapalhadas de Ciro, que tem gosto em morrer pela boca.
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O PT é o único partido grande de fato no Brasil, com militância engajada, capilaridade, e se há poucos anos ele estava em declínio, a parlamentada de 2016 e a prisão do ex-presidente contribuíram para coesionar o partido de uma maneira que ninguém apostaria. Com o crescimento do petismo, avança também o antipetismo, e hoje o ocaso do PSDB deixou essa metade da população entregue a pessoas que falam abertamente em autogolpe, nova Constituição feita pelos amigos, em metralhar adversários.
Não parece haver nenhuma alternativa de terceira via com chances de chegar ao segundo turno. Se a vida já não era fácil para Marina em 2010 e 2014, quando disputava sozinha a segunda vaga, agora que essa disputa se dá entre três candidatos competitivos, a labuta é no limite do impossível.
Marina e Ciro precisariam estar juntos e com muito mais musculatura para fazer frente ao cenário de extrema polarização que vem aí. Não aconteceu, infelizmente – porque a possibilidade de uma terceira via faria muito bem ao país. Despolarizar ajuda a pensar e focar nos verdadeiros problemas (que são muitos e graves) que assolam o povo brasileiro.
A abertura do próximo alçapão indica que teremos uma eleição mais polarizada e mais violenta do que em 2014, com risco de eleger aqueles que podem fazer com que fiquemos algumas décadas sem conhecer eleições, liberdade individual, posts como este no facebook. Mesmo que isso não aconteça, a tendência é passarmos outros anos calcados no ódio, no flerte com golpes, na burrice enraizada e na proposta fascista surfando na onda da oposição ao governo.
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