sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Pacote do Veneno beneficia Blairo Maggi

Por Cida de Oliveira, na Rede Brasil Atual:

Ministro da Agricultura de Michel Temer e senador licenciado, o ruralista Blairo Maggi (PP-MT) é proprietário da Amaggi. Gigante do agronegócio brasileiro, o conglomerado controla todos os elos da cadeia da agricultura industrial: insumos, produção, escoamento, processamento, transporte e exportação.

Portanto, todas as decisões tomadas no âmbito da pasta comandada por Blairo afetam diretamente seus negócios. É o caso de perdão de dívidas, liberação de crédito, regulação de agrotóxicos e regularização de terras, entre outras.

"Somente nas plantações de soja, o grupo Amaggi possui 173 mil hectares de plantações. De acordo com nossas estimativas, isso equivale a cerca de US$ 30 milhões em gastos com agrotóxicos por ano. Assim, é da fato bem vantajoso para eles, além de plantarem soja, também venderem agrotóxicos", avalia o integrante da coordenação nacional da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, Alan Tygel.

Segundo Tygel, é por isso que há tanto interesse por parte do ministro da Agricultura na aprovação do Pacote do Veneno, lei que afeta diretamente os seus lucros. "Foi também pelo mesmo motivo que o ministro se empenhou tanto na derrubada da decisão da Justiça que proibia o registro do glifosato."

Na segunda-feira (3), a RBA publicou reportagem sobre as duas empresas que o ruralista mantém no ramo de agrotóxicos. Segundo a Receita Federal, é do grupo de Blairo a Amaggi Exportação e Importação Ltda.,em Cuiabá (MT), que tem como atividade econômica principal o "comércio atacadista de defensivos agrícolas, adubos, fertilizantes e corretivos do solo".

Entre as atividades secundárias, está o comércio atacadista de matérias primas agrícolas não especificadas anteriormente. Defensivo agrícola é o nome que Maggi e os ruralistas preferem chamar os agrotóxicos.

O conglomerado da família do ministro tem ainda a Amaggi Exportação e Importação Ltda, em Vilhena (RO). Apesar do mesmo nome, o CNPJ tem número diferente. E embora a atividade principal seja o "comércio atacadista de matérias primas agrícolas não especificadas anteriormente", o comércio atacadista de agrotóxicos está entre as atividades secundárias.

Conflito de interesses

"Em qualquer lugar do mundo, o nome disso é 'conflito de interesses'. Mas aqui, parece que já virou normal. O sistema político brasileiro e a estrutura oligárquica histórica de nosso país criam as condições perfeitas para que diversos cargos públicos sejam ocupados por pessoas que agem em seu próprio interesse", diz Alan Tygel.

O caso dos ruralistas, segundo ele, talvez seja o exemplo mais claro dessa situação. "Famílias que historicamente detêm a propriedade das terras, também controlam politicamente os municípios e conseguem eleger seus familiares, e com isso conseguem mais terras, mais perdão de dívidas, num processo contínuo. Por isso não chega a ser espantoso que o ministro da Agricultura seja o dono de uma grande empresa do agronegócio."

Tygel destaca que o atual modelo agrícola deixou o Brasil completamente dependente das empresas transnacionais do agronegócio, como Bayer, Monsanto, Syngenta e outras. "Por esse mesmo motivo é que nós apostamos na agroecologia, que produz alimentos de forma soberana, dependendo apenas da força da agricultura camponesa para produzir alimentos saudáveis."

Medidas

Assim como a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, o Fórum Nacional de Combate aos Agrotóxicos e Transgênicos ainda não discutiu internamente a possibilidade de alguma medida para questionar o conflito de interesses envolvendo Blairo, que além de ministro é autor de um dos projetos de Lei que integram o Pacote do Veneno, o de número 6.299/2002, aprovado quando ainda era senador.

No entanto, o coordenador do Fórum, o subprocurador-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT)Pedro Luiz Serafim, avalia que o que "o fato merece, no mínimo, uma repreensão ética a um senador da República licenciado para ocupar o posto de ministro da Agricultura".

Voto contrário à aprovação do substitutivo do ruralista Luiz Nishimori (PR-PR) ao PL 6.299 na comissão especial que o aprovou no final de junho, o relator da comissão especial que analisa o PL 6.670/2016, da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pnara), deputado federal Nilto Tatto (PT-SP) usou a tribuna da Câmara para denunciar o conflito de interesses denunciado pela RBA.

Segundo o parlamentar, caberia uma ação de inconstitucionalidade, bem como utilizar o argumento desse conflito de interesses. "Mas este tipo de ação judicial só deve ser feita quando do risco iminente de aprovação do Pacote. O Judiciário não toma decisão que possa gerar conflito entre os poderes. E há ainda a possibilidade de o projeto vir a ser modificado durante a votação em plenário na Câmara e depois, quando voltar ao Senado. Por isso não adianta entrar com ação neste momento", disse Tatto.

Repúdio

Nesta quinta-feira, a Comissão Permanente do Meio Ambiente, Habitação, Urbanismo e Patrimônio Cultural (Copema), criada no âmbito do Conselho Nacional de Procuradores-gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) aprovou moção de repúdio ao Pacote do Veneno.

Clique aqui para ler a íntegra do documento.

O texto aponta, entre outros retrocessos, a substituição do termo "agrotóxico" – utilizado, inclusive, pela Constituição Federal de 1988 – por "pesticida", a concentração de poderes para a aprovação de novos produtos no Ministério da Agricultura – hoje compartilhados com os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente –, e também a adoção de uma tabela de grau de risco para novas substâncias no Brasil. Isso permite que produtos atualmente vetados por lei, por conter substâncias cancerígenas, teratogênicas (que causam malformações fetais), mutagênicas (que provocam modificações no material genético), prejudiciais para as funções reprodutivas e que causam distúrbios hormonais, passem a ser analisados conforme um grau de tolerância.

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