Por Clemente Ganz Lúcio, na revista Teoria e Debate:
O Brasil tem, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma população de 170 milhões de pessoas em idade ativa, das quais 104,5 milhões compõem a força de trabalho, sendo 91,7 milhões na situação de ocupados e 12,8 milhões desempregados (PNAD-IBGE, trimestre maio-julho 2018). O nível de ocupação está em 53,9% das pessoas em idade ativa, cerca de 3 p.p. abaixo do nível de ocupação no período 2012 a 2014 (57%).
O Brasil segue com elevada taxa de desemprego que se reduz lentamente, coerente com uma economia que anda de lado. No trimestre fevereiro a abril a taxa de desemprego atingiu 12,9%, caindo no trimestre maio a julho para 12,3%, segundo a PNAD-IBGE. Em um ano observa-se uma leve redução de 0,5 p.p. (12,8% para 12,3%). Lembremos que a taxa de desocupação que estava em 6,4% em dezembro de 2014 – menor patamar – dobrou em dois anos e atingiu 13,6% no primeiro semestre de 2017. Perderam-se em dois anos os postos de trabalho criados em uma década. No ritmo atual de redução anual do desemprego, o mercado de trabalho brasileiro levaria 29 anos para ocupar os 13 milhões de desempregados, desde que ninguém mais entrasse no mercado de trabalho! Ou quase 10 anos para repor as ocupações extintas na atual grave crise econômica.
As desigualdades: no Nordeste observa-se uma taxa de desemprego que é o dobro da região Sul (16% contra 8,4%, respectivamente). A desigualdade se reproduz na taxa de desemprego entre homens 13,6% e mulheres 15%; entre os jovens de 18 e 24 anos a taxa de desemprego é de 28%; entre os brancos é de 10,5%, entre pardos 15,1% e entre os negros 16%.
O IBGE passou a produzir e publicar um novo importante indicador que procura estimar o contingente da força de trabalho que está desocupada ou que está subocupada trabalhando jornada parcial. No trimestre maio a julho a taxa de subutilização da força de trabalho foi de 24,5%, taxa que cresceu se comparada ao trimestre do ano anterior (23,9%). O acompanhamento desse indicador será muito importante, pois aponta a intensidade da precarização do mercado de trabalho – são quase 28 milhões de pessoas subutilizadas no mercado de trabalho brasileiro, contingente que aumentou em mais 900 mil em um ano –, em um contexto presente e futuro de aumento da vulnerabilidade dos postos de trabalho decorrente das mudanças no sistema produtivo, apoiado pela ampla e perversa flexibilidade legislativa nas formas de contratação e de terceirização liberada.
São 6,6 milhões de trabalhadores subocupados com jornada parcial de trabalho, contingente que cresceu 9,3% em um ano, ou seja, mais 560 mil pessoas subocupadas com jornada de trabalho insuficiente. A nova legislação já está gerando seus frutos, legalizando os empregos precários, inseguros e vulneráveis.
Outro indicador fundamental para observar a “alma” da confiança do trabalhador no mercado de trabalho é a taxa de desalento. O trabalhador desalentado é aquele que precisa de trabalho e trabalharia se houvesse possibilidade, entretanto desiste de procurar porque sabe que não encontrará um posto de trabalho. O desalento revela uma taxa de desistência, de falta de confiança, de descrença que a economia tem vitalidade para ocupá-lo produtivamente. O IBGE estimou em 4,8 milhões o número de pessoas desalentadas no trimestre maio-julho, nesse contingente está incluído o aumento de mais de 700 mil desalentados em um ano, o que representa um grave aumento de 18%!
O setor privado emprega com registro em carteira cerca de 33 milhões de trabalhadores – estável no último ano –, e outros 11 milhões são assalariados sem registro em carteira – aumento de 3,4% em um ano. As trabalhadoras domésticas são 6,3 milhões – aumento de 3,2% em um ano. Totalizam, portanto, cerca de quase 50,5 milhões de trabalhadores assalariados.
Os trabalhadores por conta própria são 23,1 milhões de pessoas, contingente que cresceu 2,1% em um ano, e os empregadores somam 4,4 milhões. Os servidores públicos (estatutários e militares) são 11,7 milhões, estável em um ano.
O setor de serviços emprega 51% da força de trabalho, o comércio ocupa 20% dos trabalhadores, a indústria 13%, a agricultura, pecuária e pesca 9% e a construção 7%.
O rendimento real médio é de cerca de R$ 2.205,00, o que equivale a 2,3 salários mínimos. Os ocupados com esse rendimento médio mobilizam uma massa de rendimentos da ordem de R$ 197,2 bilhões.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) disponibilizou duas importantes publicações: Perspectivas Sociales y del Empleo en el Mundo – Tendencias 2018 (OIT, Genebra, 2018) e Panorama Laboral 2017 América Latina y Caribe (OIT, Lima, 2017). Esses documentos reúnem informações e análises preciosas.
A força de trabalho mundial é da ordem de 3,3 bilhões de pessoas, das quais mais de 190 milhões estão desempregadas. Aumenta o contingente dos desalentados, pessoas que desistem de procurar empregos.
A América Latina e o Caribe reúnem uma força de trabalho de 300 milhões de pessoas, com 20 milhões de desempregados e quase 36% dos ocupados em empregos vulneráveis.
A OIT estima que 42% dos empregos no mundo são desprotegidos, número que cresce desde 2012. Há, portanto, um fenômeno estrutural de aumento dos empregos vulneráveis (trabalhadores por conta própria, trabalhadores familiares auxiliares e assalariados sem registro) em um contexto de altas taxas de desemprego de longa duração. Nos países emergentes, os empregos vulneráveis atingem 76% das ocupações.
Cerca de 300 milhões de trabalhadores recebem salários inferiores a US$ 1,90 por dia. Nos países em desenvolvimento, a força de trabalho em situação de extrema pobreza ultrapassa 114 milhões de pessoas, o que equivale a 40% de todos aqueles que estão empregados nessas regiões. A pobreza moderada (situação na qual está quem recebe entre US$ 1,90 e US$ 3,10 por dia) atinge 430 milhões de trabalhadores.
São imensas as desigualdades de gênero, as mulheres ganham menos e ocupam a maioria dos empregos vulneráveis. Os jovens enfrentam restrições para o acesso a um posto de trabalho precário e convivem com taxas de desemprego três vezes superiores às dos adultos.
O emprego rural já não é mais substituído pelo industrial e urbano. A ocupação rural é eliminada e agora suprida por um posto no segmento dos serviços, a maioria de baixa qualidade, precária e vulnerável, com pequenos salários. Enquanto isso, o emprego industrial entra em declínio. A desindustrialização precoce dos países emergentes compromete o desafio de alçar e emparelhar o desenvolvimento produtivo dessas nações ao das desenvolvidas.
O crescimento econômico no mundo segue baixo e no Brasil anêmico. Problemas estruturais como o baixo investimento privado, a escassez de demanda (baixos salários, empregos precários e inseguros etc.), desigualdade crescente de renda e riqueza, esterilizam ainda mais a demanda e travam o crescimento econômico.
A observação cuidadosa do momento histórico presente indica claramente que o processo civilizatório, a partir do emprego, regride multidimensionalmente. Com isso, armadilhas se espalham no tecido social, que se rompe, dando vazão a novas formas de regressões econômicas pró-desigualdade, a novas manifestações de conflitos e a inúmeras possibilidades de infinita estupidez humana.
* Clemente Ganz Lúcio é sociólogo, diretor técnico do Dieese.
O Brasil tem, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma população de 170 milhões de pessoas em idade ativa, das quais 104,5 milhões compõem a força de trabalho, sendo 91,7 milhões na situação de ocupados e 12,8 milhões desempregados (PNAD-IBGE, trimestre maio-julho 2018). O nível de ocupação está em 53,9% das pessoas em idade ativa, cerca de 3 p.p. abaixo do nível de ocupação no período 2012 a 2014 (57%).
O Brasil segue com elevada taxa de desemprego que se reduz lentamente, coerente com uma economia que anda de lado. No trimestre fevereiro a abril a taxa de desemprego atingiu 12,9%, caindo no trimestre maio a julho para 12,3%, segundo a PNAD-IBGE. Em um ano observa-se uma leve redução de 0,5 p.p. (12,8% para 12,3%). Lembremos que a taxa de desocupação que estava em 6,4% em dezembro de 2014 – menor patamar – dobrou em dois anos e atingiu 13,6% no primeiro semestre de 2017. Perderam-se em dois anos os postos de trabalho criados em uma década. No ritmo atual de redução anual do desemprego, o mercado de trabalho brasileiro levaria 29 anos para ocupar os 13 milhões de desempregados, desde que ninguém mais entrasse no mercado de trabalho! Ou quase 10 anos para repor as ocupações extintas na atual grave crise econômica.
As desigualdades: no Nordeste observa-se uma taxa de desemprego que é o dobro da região Sul (16% contra 8,4%, respectivamente). A desigualdade se reproduz na taxa de desemprego entre homens 13,6% e mulheres 15%; entre os jovens de 18 e 24 anos a taxa de desemprego é de 28%; entre os brancos é de 10,5%, entre pardos 15,1% e entre os negros 16%.
O IBGE passou a produzir e publicar um novo importante indicador que procura estimar o contingente da força de trabalho que está desocupada ou que está subocupada trabalhando jornada parcial. No trimestre maio a julho a taxa de subutilização da força de trabalho foi de 24,5%, taxa que cresceu se comparada ao trimestre do ano anterior (23,9%). O acompanhamento desse indicador será muito importante, pois aponta a intensidade da precarização do mercado de trabalho – são quase 28 milhões de pessoas subutilizadas no mercado de trabalho brasileiro, contingente que aumentou em mais 900 mil em um ano –, em um contexto presente e futuro de aumento da vulnerabilidade dos postos de trabalho decorrente das mudanças no sistema produtivo, apoiado pela ampla e perversa flexibilidade legislativa nas formas de contratação e de terceirização liberada.
São 6,6 milhões de trabalhadores subocupados com jornada parcial de trabalho, contingente que cresceu 9,3% em um ano, ou seja, mais 560 mil pessoas subocupadas com jornada de trabalho insuficiente. A nova legislação já está gerando seus frutos, legalizando os empregos precários, inseguros e vulneráveis.
Outro indicador fundamental para observar a “alma” da confiança do trabalhador no mercado de trabalho é a taxa de desalento. O trabalhador desalentado é aquele que precisa de trabalho e trabalharia se houvesse possibilidade, entretanto desiste de procurar porque sabe que não encontrará um posto de trabalho. O desalento revela uma taxa de desistência, de falta de confiança, de descrença que a economia tem vitalidade para ocupá-lo produtivamente. O IBGE estimou em 4,8 milhões o número de pessoas desalentadas no trimestre maio-julho, nesse contingente está incluído o aumento de mais de 700 mil desalentados em um ano, o que representa um grave aumento de 18%!
O setor privado emprega com registro em carteira cerca de 33 milhões de trabalhadores – estável no último ano –, e outros 11 milhões são assalariados sem registro em carteira – aumento de 3,4% em um ano. As trabalhadoras domésticas são 6,3 milhões – aumento de 3,2% em um ano. Totalizam, portanto, cerca de quase 50,5 milhões de trabalhadores assalariados.
Os trabalhadores por conta própria são 23,1 milhões de pessoas, contingente que cresceu 2,1% em um ano, e os empregadores somam 4,4 milhões. Os servidores públicos (estatutários e militares) são 11,7 milhões, estável em um ano.
O setor de serviços emprega 51% da força de trabalho, o comércio ocupa 20% dos trabalhadores, a indústria 13%, a agricultura, pecuária e pesca 9% e a construção 7%.
O rendimento real médio é de cerca de R$ 2.205,00, o que equivale a 2,3 salários mínimos. Os ocupados com esse rendimento médio mobilizam uma massa de rendimentos da ordem de R$ 197,2 bilhões.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) disponibilizou duas importantes publicações: Perspectivas Sociales y del Empleo en el Mundo – Tendencias 2018 (OIT, Genebra, 2018) e Panorama Laboral 2017 América Latina y Caribe (OIT, Lima, 2017). Esses documentos reúnem informações e análises preciosas.
A força de trabalho mundial é da ordem de 3,3 bilhões de pessoas, das quais mais de 190 milhões estão desempregadas. Aumenta o contingente dos desalentados, pessoas que desistem de procurar empregos.
A América Latina e o Caribe reúnem uma força de trabalho de 300 milhões de pessoas, com 20 milhões de desempregados e quase 36% dos ocupados em empregos vulneráveis.
A OIT estima que 42% dos empregos no mundo são desprotegidos, número que cresce desde 2012. Há, portanto, um fenômeno estrutural de aumento dos empregos vulneráveis (trabalhadores por conta própria, trabalhadores familiares auxiliares e assalariados sem registro) em um contexto de altas taxas de desemprego de longa duração. Nos países emergentes, os empregos vulneráveis atingem 76% das ocupações.
Cerca de 300 milhões de trabalhadores recebem salários inferiores a US$ 1,90 por dia. Nos países em desenvolvimento, a força de trabalho em situação de extrema pobreza ultrapassa 114 milhões de pessoas, o que equivale a 40% de todos aqueles que estão empregados nessas regiões. A pobreza moderada (situação na qual está quem recebe entre US$ 1,90 e US$ 3,10 por dia) atinge 430 milhões de trabalhadores.
São imensas as desigualdades de gênero, as mulheres ganham menos e ocupam a maioria dos empregos vulneráveis. Os jovens enfrentam restrições para o acesso a um posto de trabalho precário e convivem com taxas de desemprego três vezes superiores às dos adultos.
O emprego rural já não é mais substituído pelo industrial e urbano. A ocupação rural é eliminada e agora suprida por um posto no segmento dos serviços, a maioria de baixa qualidade, precária e vulnerável, com pequenos salários. Enquanto isso, o emprego industrial entra em declínio. A desindustrialização precoce dos países emergentes compromete o desafio de alçar e emparelhar o desenvolvimento produtivo dessas nações ao das desenvolvidas.
O crescimento econômico no mundo segue baixo e no Brasil anêmico. Problemas estruturais como o baixo investimento privado, a escassez de demanda (baixos salários, empregos precários e inseguros etc.), desigualdade crescente de renda e riqueza, esterilizam ainda mais a demanda e travam o crescimento econômico.
A observação cuidadosa do momento histórico presente indica claramente que o processo civilizatório, a partir do emprego, regride multidimensionalmente. Com isso, armadilhas se espalham no tecido social, que se rompe, dando vazão a novas formas de regressões econômicas pró-desigualdade, a novas manifestações de conflitos e a inúmeras possibilidades de infinita estupidez humana.
* Clemente Ganz Lúcio é sociólogo, diretor técnico do Dieese.
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