terça-feira, 13 de novembro de 2018

A guerra ideológica do bolsonarismo

Por Tereza Cruvinel, no Jornal do Brasil:

A eleição passou mas os grupos de whatsapp do bolsonarismo continuam em franca atividade, alimentando a guerra ideológica e cultural que o presidente eleito também atiça, ao investir contra as universidades e contra o Enem, cujas provas promete fiscalizar, como fez na transmissão de sexta-feira à noite por uma rede social.

A “ideologia de gênero” e sua maior lenda, o kit gay, o antipetismo e o comunismo continuam com a cotação alta nos grupos, indicando que o obscurantismo e a intolerância não foram espasmos da campanha. Vieram para ficar.

A continuidade da guerrilha digital não decorre de fanatismo dos adoradores do mito mas de uma estratégia de marketing que o clã Bolsonaro e seus aliados puseram em prática, conhecida lá fora como “firehosing”, de matriz russa. Em tradução aproximada, seria a técnica do uso da mangueira de fogo, o despejo constante de informações, em sua maioria fake news, distorcendo a realidade e forjando percepções coletivas.

O “firehosing” mantém as pessoas mobilizadas em torno dos temas pautados e desligadas das decisões que realmente importam.

Ao jornal El País, o administrador de 75 grupos de WhatsApp, o empreendedor Carlos Nacli, radicado em Portugal, disse que a estrutura foi mantida para dar suporte às “pautas que serão importantes ao desenvolvimento do Brasil” pois, a seu ver, grande parte da mídia persegue Bolsonaro.

Os disparos em massa que o TSE está investigando certamente cessaram mas o fluxo continua, em ritmo menor.

As mensagens dos últimos dias passam ao lago dos fatos polêmicos produzidos pelo presidente eleito e sua equipe. Não comentam decisões mal recebidas, como a de fundir os ministérios da Agricultura e Meio Ambiente, da qual ele recuou, nem a de acabar com o Ministério do Trabalho.

Ignoraram a reação do Egito ao anúncio de que a embaixada brasileira em Israel poderia ser transferida para Jerusalém e o empenho em aprovar logo a reforma previdenciária. Já o aumento do Judiciário é atacado como sabotagem do Congresso a Bolsonaro.

Em compensação, ontem circularam intensamente trechos da fala de Bolsonaro na noite de sexta, como aquela em que ele criticou a prova do Enem, tomando como pregação da tal ideologia de gênero a questão que deu como exemplo de dialeto a linguagem da comunidade LGBT.

“Essa prova do Enem, com a linguagem particular daquelas pessoas, é um absurdo. Vai obrigar a molecada a aprender sobre isso? Não vai ter questão dessa forma no ano que vem porque nós vamos ver a prova antes”.

E ainda a parte em que ele compara o centro acadêmico da UnB a “um ninho de ratos”, com camisinhas e maconha pelo chão. “Vão me chamar de fascista, vão me chamar de ditador, mas vamos tentar mudar isso aí, tá ok? Boa parte do dinheiro nas universidades é jogado fora".

Essa convicção da extrema-direita e dos conservadores de que existe um aparelhamento ideológico da educação brasileira explica o incentivo às delações de professores e o empenho pela aprovação do projeto Escola Sem Partido, que Bolsonaro apoia. Ele planeja mudar a lei que estabelece a escolha de reitores a partir de lista tríplice votada pela comunidade acadêmica.

O PT e o “comunismo” seguem como temas bem cotados.
 
Em circulação, o vídeo em que um pastor da Igreja Universal “exorciza” uma “entidade de esquerda” do corpo de uma mulher possuída, que guincha e se estrebucha.
A performance termina com um quadro negro dividido em duas colunas.
 
Na da esquerda, a lista das desgraças que a esquerda traz: vícios, doenças, brigas, suicídio e outros mais. Na da direita, virtudes e conquistas, como paz, prosperidade, libertação, sucesso e autocontrole.

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