Por Silvio Caccia Bava, no jornal Le Monde Diplomatique-Brasil:
Cinquenta e oito milhões de brasileiros e brasileiras elegeram Jair Bolsonaro presidente da República. Isso representa 39% do total de 147 milhões de pessoas aptas a votar. Temos então que 89 milhões de brasileiros e brasileiras, ou 61% dos eleitores, não votaram nele. Destes que não votaram em Bolsonaro, 47 milhões votaram em Haddad; quase 30 milhões não compareceram às urnas; votos brancos e nulos somaram 14 milhões de eleitores. Está dada uma ampla base potencial para a organização de um bloco de defesa da democracia e dos direitos sociais, configurando a possibilidade de criação de uma forte oposição política ao governante eleito.
Pela visão autoritária e repressiva do governo eleito, que se propõe a destituir direitos por atacado no começo de seu governo, a enquadrar os movimentos sociais como terroristas e a tratar com violência a oposição, não faltarão motivos para que a oposição se articule.
Como Bolsonaro não tem experiência de gestão nem equipe de governo e demonstrou não se entender nem com seus principais assessores, também é previsível que surjam crises internas já no início da gestão. Essas crises dificultarão a implementação de estratégias de crescimento e governabilidade, prenunciando que a retomada do crescimento e a redução do desemprego não serão conquistadas a curto prazo. Ao contrário, com os cortes previstos na área social, Bolsonaro vai encurtar o cobertor de proteção social das políticas públicas justamente quando os mais pobres delas mais necessitam, o que vai aumentar a pobreza e a exclusão e elevar a tensão social e política.
A política como narrativa midiática tem seus limites; não terá como enfrentar a realidade de crescente exclusão que será imposta às maiorias. Muitos daqueles que votaram em Bolsonaro como expressão de sua crítica ao conjunto do sistema político vão encontrar “mais do mesmo”, uma verdadeira continuidade do governo Temer em suas tentativas de compor maiorias no Congresso e impor suas políticas neoliberais.
As instituições democráticas estarão sob tensão. O presidente eleito e seus assessores mais próximos já declararam que, se não conseguirem operar suas políticas no cenário democrático, não terão dificuldades em adotar a via autoritária. Assim, tanto o Judiciário como o Parlamento poderão se tornar frentes de conflito importantes e angariar eventuais aliados ao bloco de oposição. É até pertinente se perguntar se Bolsonaro, como foi com Fernando Collor, o caçador de marajás, terminará seu mandato.
Particularmente as últimas semanas da campanha eleitoral apresentaram inovações importantes na busca da eleição de Haddad, todas de aproximação com o povo e com respeito à diversidade de opiniões, buscando um ambiente solidário e de diálogo. Vimos em muitos lugares iniciativas para tentar virar votos. Em muitas praças e logradouros públicos do país, militantes pela democracia armavam mesas e cadeiras e faziam o convite: “Se você vai se abster ou anular seu voto, venha comer um pedaço de bolo, tomar um cafezinho e conversar com a gente”.
Talvez esteja embutida nessas práticas uma crítica importante aos partidos de oposição, especialmente ao PT, de que o jogo só muda se os militantes políticos se aproximarem do povo, buscando sua participação e seu envolvimento na defesa da democracia.
Em pouco tempo, o apoio ao governo poderá se esvair. Se hoje já é possível identificar que as eleições foram manipuladas pela difusão maciça de falsidades e mentiras nas redes sociais, pelo uso de tecnologias digitais para impulsionar mensagens financiadas ilegalmente por empresas ou mesmo por grupos no exterior, é preciso denunciar esses acontecimentos para todos os brasileiros e impedir que essas estratégias de convencimento continuem.
Não há como deixar de considerar a possibilidade de que os militares, seja por meio do vice, seja por decisão do alto comando, diante de uma crise que se agudize, entendam que é sua responsabilidade assumir diretamente o governo. Várias declarações recentes de generais da reserva respaldam essa possibilidade.
Neste cenário, as manifestações em defesa da democracia e da Constituição, as mobilizações de rua, a discussão com o povo sobre o impacto das políticas que serão implementadas e a disputa das narrativas nas mídias sociais são o caminho para organizar a resistência democrática e ampliar, para além dos partidos de oposição, uma frente democrática, um amplo leque de solidariedades que possa vir a mobilizar energias de mudança e recuperar a democracia, sacrificada neste momento pelo impacto das fake news.
Não se trata, porém, de olhar para trás e recuperar o modelo da democracia liberal, assinando outra vez um cheque em branco para o candidato que se elege. É preciso criar uma nova democracia, na qual o cidadão e a cidadã se reapropriem do poder de decidir sobre sua vida, sobre o destino de seus territórios e sobre o futuro do Brasil.
Pela visão autoritária e repressiva do governo eleito, que se propõe a destituir direitos por atacado no começo de seu governo, a enquadrar os movimentos sociais como terroristas e a tratar com violência a oposição, não faltarão motivos para que a oposição se articule.
Como Bolsonaro não tem experiência de gestão nem equipe de governo e demonstrou não se entender nem com seus principais assessores, também é previsível que surjam crises internas já no início da gestão. Essas crises dificultarão a implementação de estratégias de crescimento e governabilidade, prenunciando que a retomada do crescimento e a redução do desemprego não serão conquistadas a curto prazo. Ao contrário, com os cortes previstos na área social, Bolsonaro vai encurtar o cobertor de proteção social das políticas públicas justamente quando os mais pobres delas mais necessitam, o que vai aumentar a pobreza e a exclusão e elevar a tensão social e política.
A política como narrativa midiática tem seus limites; não terá como enfrentar a realidade de crescente exclusão que será imposta às maiorias. Muitos daqueles que votaram em Bolsonaro como expressão de sua crítica ao conjunto do sistema político vão encontrar “mais do mesmo”, uma verdadeira continuidade do governo Temer em suas tentativas de compor maiorias no Congresso e impor suas políticas neoliberais.
As instituições democráticas estarão sob tensão. O presidente eleito e seus assessores mais próximos já declararam que, se não conseguirem operar suas políticas no cenário democrático, não terão dificuldades em adotar a via autoritária. Assim, tanto o Judiciário como o Parlamento poderão se tornar frentes de conflito importantes e angariar eventuais aliados ao bloco de oposição. É até pertinente se perguntar se Bolsonaro, como foi com Fernando Collor, o caçador de marajás, terminará seu mandato.
Particularmente as últimas semanas da campanha eleitoral apresentaram inovações importantes na busca da eleição de Haddad, todas de aproximação com o povo e com respeito à diversidade de opiniões, buscando um ambiente solidário e de diálogo. Vimos em muitos lugares iniciativas para tentar virar votos. Em muitas praças e logradouros públicos do país, militantes pela democracia armavam mesas e cadeiras e faziam o convite: “Se você vai se abster ou anular seu voto, venha comer um pedaço de bolo, tomar um cafezinho e conversar com a gente”.
Talvez esteja embutida nessas práticas uma crítica importante aos partidos de oposição, especialmente ao PT, de que o jogo só muda se os militantes políticos se aproximarem do povo, buscando sua participação e seu envolvimento na defesa da democracia.
Em pouco tempo, o apoio ao governo poderá se esvair. Se hoje já é possível identificar que as eleições foram manipuladas pela difusão maciça de falsidades e mentiras nas redes sociais, pelo uso de tecnologias digitais para impulsionar mensagens financiadas ilegalmente por empresas ou mesmo por grupos no exterior, é preciso denunciar esses acontecimentos para todos os brasileiros e impedir que essas estratégias de convencimento continuem.
Não há como deixar de considerar a possibilidade de que os militares, seja por meio do vice, seja por decisão do alto comando, diante de uma crise que se agudize, entendam que é sua responsabilidade assumir diretamente o governo. Várias declarações recentes de generais da reserva respaldam essa possibilidade.
Neste cenário, as manifestações em defesa da democracia e da Constituição, as mobilizações de rua, a discussão com o povo sobre o impacto das políticas que serão implementadas e a disputa das narrativas nas mídias sociais são o caminho para organizar a resistência democrática e ampliar, para além dos partidos de oposição, uma frente democrática, um amplo leque de solidariedades que possa vir a mobilizar energias de mudança e recuperar a democracia, sacrificada neste momento pelo impacto das fake news.
Não se trata, porém, de olhar para trás e recuperar o modelo da democracia liberal, assinando outra vez um cheque em branco para o candidato que se elege. É preciso criar uma nova democracia, na qual o cidadão e a cidadã se reapropriem do poder de decidir sobre sua vida, sobre o destino de seus territórios e sobre o futuro do Brasil.
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