Por Joaquim Ernesto Palhares, no site Carta Maior:
A dança de Queiróz foi emblemática. Verdadeiro deboche em cima da Justiça e daqueles que, embalados pelo “combate à corrupção”, elegeram Jair Bolsonaro. Estamos falando em movimentação atípica na conta de membro do “staff” da família do presidente, assessor de um senador da República, envolvendo a primeira-dama do Brasil.
Segundo o presidente é mais um “rolo” do Queiróz que, apesar de intimado a prestar esclarecimentos, não apareceu. Será que, agora, amigo de presidente se apresenta à Justiça quando quiser? E conta com entrevista chapa-branca? Não faz muito tempo, aliás, que um presidente da República sofreu condução coercitiva, apesar de se dispor a prestar todos os esclarecimentos possíveis.
Sim, parece que a direita pode tudo, pelo menos neste momento.
Daí a pergunta: o que nos cabe fazer?
Em primeiro lugar, nós devemos cobrar o estrito cumprimento da lei de todas as autoridades (polícia, Ministério Público, Poder Judiciário).
Em segundo lugar, nós não podemos cair nas armadilhas e polêmicas criadas pelos membros deste governo. As asneiras propaladas por ministros e filhos de Bolsonaro fazem parte de uma estratégia de comunicação, muito próxima da utilizada pelo governo Trump de criar uma polêmica atrás da outra. Claro que devemos repudiar absurdos – inclusive, para evitar que eles se naturalizem –, mas precisamos mostrar o objetivo dessas falas: capturar a atenção das pessoas, disseminar ignorância e confusão, gerar mais ódio e polarização, consolidar a imagem do inimigo interno. Quanto mais tempo perdermos com esses absurdos (e estamos respondendo diuturnamente), menos tempo teremos para disseminar o debate e a pauta que realmente importa.
Em terceiro lugar, precisamos estar atentos a duas pautas fundamentais: a rapinagem do patrimônio nacional e a devastação dos direitos (sociais, trabalhistas, humanos e individuais). Práticas iniciadas com o golpe de 2016, a venda do patrimônio nacional e a destruição da capacidade competitiva de setores fortes da nossa economia (Petrobras, Embraer etc.) serão aceleradas pelos garotos de Chicago – representantes de financeiras e corporações internacionais – à frente de postos-chaves do país.
Da mesma forma, acompanhamos a deslegitimação de conquistas e direitos sociais. É espantoso assistir aos direitos trabalhistas, em especial a aposentadoria, apresentados como peças de um catálogo antigo. E que fique muito claro: a possível cizânia entre imprensa (Globo à frente) e governo Bolsonaro passa longe do gabinete de Guedes.
Os veículos de comunicação que expulsaram do poder Dilma Rousseff sem crime de responsabilidade e prenderam Lula, impedindo-o de retornar à presidência, continuam alinhadíssimos, veiculando as medidas neoliberais – privatizações (teremos até secretaria para isso), teto de gastos, diminuição do Estado etc. – como única saída para o abismo que eles nos jogaram.
Em quarto lugar, precisamos unir a oposição a este governo em uma grande plataforma alternativa, com um projeto de desenvolvimento, de sociedade e de país capaz de trazer esperança e um novo fôlego à luta. Na minha modesta visão, somente um projeto compreendido e assumido por cada brasileiro, como seu projeto de país, poderá conter este e outros governos de direita.
Nós estamos lidando com gente que se elegeu aceitando procedimentos fraudulentos. Pessoas que evitaram propositalmente o debate, preferindo confundir a população em vez de esclarecê-la, por meio da disseminação de mentiras, calúnias e informações contraditórias. A esquerda não perdeu o debate, ele simplesmente não existiu.
Acabamos de viver uma das piores eleições de todos os tempos, baseada em preconceitos e slogans. Sim, a democracia deveria ter sido radicalizada durante os governos petistas, mas isso não foi possível, apesar de vários conselhos que efetivamente funcionaram como os de Educação, Saúde, Cultura. No campo da Comunicação, vocês sabem tão bem quanto eu, vivemos um retumbante fracasso.
Eu inclusive me sinto envergonhado de ver um deputado de direita à frente de um projeto que poderá, efetivamente, enfrentar o poder da Rede Globo, com o apoio de emissoras como Record, SBT, Bandeirantes, Rede TV, combatendo uma excrescência, apoiada pelo governo petista, chamada bônus por volume (BV).
Trata-se de um montante pago pelos meios de comunicação (principalmente a Globo) às agências de publicidade conforme o volume de propaganda negociado entre eles. O BV foi institucionalizado pela lei 12.232/2010, com anteprojeto de José Eduardo Cardozo, permitindo, de forma oficial, que a família Marinho detivesse o monopólio da publicidade no Brasil (clique aqui e entenda o BV).
As negociações estão abertas e até agora, tudo indica, a Rede Globo vem guardando suas fichas.
Recusou-se a investigar o paradeiro de Queiróz, contrariamente ao que fez nos tempos de PC Farias; tampouco execrou a dança do assessor da família Bolsonaro, adotando postura totalmente oposta à que teve em relação à deputada petista Ângela Guadagnin, cuja dança foi execrada pela emissora e intitulada “dança da pizza”. Ângela, ao contrário de Queiróz, não devia nenhuma explicação à Justiça, apenas comemorava a absolvição de colegas no Plenário do Congresso Nacional.
Outro aspecto é que, na contramão do que vivemos ao longo de treze anos de governos petistas, pelo menos enquanto Moro for ministro, a emissora da família Marinho não poderá mais se refestelar com informações, relatórios e, sejamos sinceros, releases do Ministério Público Federal. Queiróz, por exemplo, será investigado no mais completo sigilo.
O que sairá dessa briga, ainda não sabemos. O importante é não perder o foco no Brasil. Não podemos perder tempo batendo boca com leitores de Olavo de Carvalho e bolsominions em geral. Não vamos a lugar nenhum com isso, precisamos discutir e fazer política.
Partidos orientados por princípios de esquerda e compromissados com a democracia precisam colocar seus assessores em comissões da Câmara e do Senado, para que possamos ter um acompanhamento de perto do que está acontecendo. As coisas começam nessas comissões. Não podemos ficar reféns da Rede Globo, muito menos do SBT, Record e cia., descobrindo na véspera o que será votado no dia seguinte.
Em suma: trabalho não falta, mas para que possamos executá-lo, com a eficiência que o momento histórico exige, nós precisamos da sua colaboração. Ajude-nos a conquistar, neste mês de janeiro, mais duzentos parceiros doadores. Isso nos permitirá projetar uma série de atividades que vocês vão acompanhar e participar de perto. Estamos tentando, a todo custo, manter a Carta Maior um veículo de conteúdo aberto.
Você, leitor assíduo, pode nos ajudar nessa luta. Com apenas R$1,00 por dia (R$30,00/mês), você garante que nosso conteúdo permaneça disponível a todos. Se puder DOE MAIS (clique aqui e confira opções de doação) e não se esqueça de se cadastrar no nosso site (clique aqui) para receber nossos boletins. Mais do que nunca, precisamos estar conectados frente a qualquer eventualidade.
Sigamos juntos em defesa dos ideais que nos unem.
Caberá a nós mostrar que não, a direita não pode tudo.
* Joaquim Ernesto Palhares - Diretor da Carta Maior.
A dança de Queiróz foi emblemática. Verdadeiro deboche em cima da Justiça e daqueles que, embalados pelo “combate à corrupção”, elegeram Jair Bolsonaro. Estamos falando em movimentação atípica na conta de membro do “staff” da família do presidente, assessor de um senador da República, envolvendo a primeira-dama do Brasil.
Segundo o presidente é mais um “rolo” do Queiróz que, apesar de intimado a prestar esclarecimentos, não apareceu. Será que, agora, amigo de presidente se apresenta à Justiça quando quiser? E conta com entrevista chapa-branca? Não faz muito tempo, aliás, que um presidente da República sofreu condução coercitiva, apesar de se dispor a prestar todos os esclarecimentos possíveis.
Sim, parece que a direita pode tudo, pelo menos neste momento.
Daí a pergunta: o que nos cabe fazer?
Em primeiro lugar, nós devemos cobrar o estrito cumprimento da lei de todas as autoridades (polícia, Ministério Público, Poder Judiciário).
Em segundo lugar, nós não podemos cair nas armadilhas e polêmicas criadas pelos membros deste governo. As asneiras propaladas por ministros e filhos de Bolsonaro fazem parte de uma estratégia de comunicação, muito próxima da utilizada pelo governo Trump de criar uma polêmica atrás da outra. Claro que devemos repudiar absurdos – inclusive, para evitar que eles se naturalizem –, mas precisamos mostrar o objetivo dessas falas: capturar a atenção das pessoas, disseminar ignorância e confusão, gerar mais ódio e polarização, consolidar a imagem do inimigo interno. Quanto mais tempo perdermos com esses absurdos (e estamos respondendo diuturnamente), menos tempo teremos para disseminar o debate e a pauta que realmente importa.
Em terceiro lugar, precisamos estar atentos a duas pautas fundamentais: a rapinagem do patrimônio nacional e a devastação dos direitos (sociais, trabalhistas, humanos e individuais). Práticas iniciadas com o golpe de 2016, a venda do patrimônio nacional e a destruição da capacidade competitiva de setores fortes da nossa economia (Petrobras, Embraer etc.) serão aceleradas pelos garotos de Chicago – representantes de financeiras e corporações internacionais – à frente de postos-chaves do país.
Da mesma forma, acompanhamos a deslegitimação de conquistas e direitos sociais. É espantoso assistir aos direitos trabalhistas, em especial a aposentadoria, apresentados como peças de um catálogo antigo. E que fique muito claro: a possível cizânia entre imprensa (Globo à frente) e governo Bolsonaro passa longe do gabinete de Guedes.
Os veículos de comunicação que expulsaram do poder Dilma Rousseff sem crime de responsabilidade e prenderam Lula, impedindo-o de retornar à presidência, continuam alinhadíssimos, veiculando as medidas neoliberais – privatizações (teremos até secretaria para isso), teto de gastos, diminuição do Estado etc. – como única saída para o abismo que eles nos jogaram.
Em quarto lugar, precisamos unir a oposição a este governo em uma grande plataforma alternativa, com um projeto de desenvolvimento, de sociedade e de país capaz de trazer esperança e um novo fôlego à luta. Na minha modesta visão, somente um projeto compreendido e assumido por cada brasileiro, como seu projeto de país, poderá conter este e outros governos de direita.
Nós estamos lidando com gente que se elegeu aceitando procedimentos fraudulentos. Pessoas que evitaram propositalmente o debate, preferindo confundir a população em vez de esclarecê-la, por meio da disseminação de mentiras, calúnias e informações contraditórias. A esquerda não perdeu o debate, ele simplesmente não existiu.
Acabamos de viver uma das piores eleições de todos os tempos, baseada em preconceitos e slogans. Sim, a democracia deveria ter sido radicalizada durante os governos petistas, mas isso não foi possível, apesar de vários conselhos que efetivamente funcionaram como os de Educação, Saúde, Cultura. No campo da Comunicação, vocês sabem tão bem quanto eu, vivemos um retumbante fracasso.
Eu inclusive me sinto envergonhado de ver um deputado de direita à frente de um projeto que poderá, efetivamente, enfrentar o poder da Rede Globo, com o apoio de emissoras como Record, SBT, Bandeirantes, Rede TV, combatendo uma excrescência, apoiada pelo governo petista, chamada bônus por volume (BV).
Trata-se de um montante pago pelos meios de comunicação (principalmente a Globo) às agências de publicidade conforme o volume de propaganda negociado entre eles. O BV foi institucionalizado pela lei 12.232/2010, com anteprojeto de José Eduardo Cardozo, permitindo, de forma oficial, que a família Marinho detivesse o monopólio da publicidade no Brasil (clique aqui e entenda o BV).
As negociações estão abertas e até agora, tudo indica, a Rede Globo vem guardando suas fichas.
Recusou-se a investigar o paradeiro de Queiróz, contrariamente ao que fez nos tempos de PC Farias; tampouco execrou a dança do assessor da família Bolsonaro, adotando postura totalmente oposta à que teve em relação à deputada petista Ângela Guadagnin, cuja dança foi execrada pela emissora e intitulada “dança da pizza”. Ângela, ao contrário de Queiróz, não devia nenhuma explicação à Justiça, apenas comemorava a absolvição de colegas no Plenário do Congresso Nacional.
Outro aspecto é que, na contramão do que vivemos ao longo de treze anos de governos petistas, pelo menos enquanto Moro for ministro, a emissora da família Marinho não poderá mais se refestelar com informações, relatórios e, sejamos sinceros, releases do Ministério Público Federal. Queiróz, por exemplo, será investigado no mais completo sigilo.
O que sairá dessa briga, ainda não sabemos. O importante é não perder o foco no Brasil. Não podemos perder tempo batendo boca com leitores de Olavo de Carvalho e bolsominions em geral. Não vamos a lugar nenhum com isso, precisamos discutir e fazer política.
Partidos orientados por princípios de esquerda e compromissados com a democracia precisam colocar seus assessores em comissões da Câmara e do Senado, para que possamos ter um acompanhamento de perto do que está acontecendo. As coisas começam nessas comissões. Não podemos ficar reféns da Rede Globo, muito menos do SBT, Record e cia., descobrindo na véspera o que será votado no dia seguinte.
Em suma: trabalho não falta, mas para que possamos executá-lo, com a eficiência que o momento histórico exige, nós precisamos da sua colaboração. Ajude-nos a conquistar, neste mês de janeiro, mais duzentos parceiros doadores. Isso nos permitirá projetar uma série de atividades que vocês vão acompanhar e participar de perto. Estamos tentando, a todo custo, manter a Carta Maior um veículo de conteúdo aberto.
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