Por Liszt Vieira, no site Carta Maior:
Após 3 semanas de (des)governo, aconteceu o que se esperava. A incompetência, mediocridade, ignorância, arrogância e violência só podiam gerar o caos. O baixo nível do Ministério só contribui para piorar. Depois de Davos, a desmoralização do governo brasileiro tornou-se definitivamente internacional.
Em meio a esse pântano de irracionalidade, há alguns segmentos racionais. São eles:
1) Alguns generais de direita que põem limites às alucinações presidenciais, como foi o caso da base militar americana no Brasil ou da transferência da embaixada para Jerusalém.
2) Sergio Moro, embora muito enfraquecido, porque se vê obrigado a engolir a corrupção e a cumplicidade da famiglia bolsonaro com o crime organizado das milícias,
3) Paulo Guedes, representando o Deus Mercado que acha ótimo o presidente não entender nada de economia.
Temos pela frente duas possibilidades. Alguns jornalistas afirmaram que o governo se aproxima do final, pelo impeachment ou renúncia. Creio que ainda é cedo para essa previsão. Não sabemos ainda se o Governo vai conseguir maioria para aprovar as chamadas Reformas, principalmente a da Previdência. A desmoralização do Executivo provoca, indiretamente, o fortalecimento do Legislativo, onde tem peso o baixo clero, a turma do "toma lá, dá cá".
A hipótese de renúncia é improvável. Ninguém renuncia ao poder se não for forçado a isso. O caso, já citado, do ex presidente Jânio Quadros foi diferente. Ele fez uma manobra achando que o Congresso ia votar a seu favor e que ele voltaria ao Poder nos braços do povo. Por proposta do então deputado Almino Afonso, o Congresso decidiu que renúncia é um ato unilateral de vontade e que não cabia votação. Aprendiz de feiticeiro, o feitiço de Jânio voltou-se contra ele.
Por outro lado, ainda não se conhece a correlação de forças na Câmara dos Deputados. E os deputados do partido do presidente fazem parte todos do baixo clero. Viajaram à China, contrariando o guru do presidente, Olavo de Carvalho, que dos EUA, onde mora, reclamou e excomungou os parlamentares do PSL.
A outra possibilidade é a de um presidente fantoche, segurado na coleira pelos generais do governo. Vai ficar falando sobre armas, escola sem partido, criticando o PT, as terras indígenas etc, sempre imitando Trump com frases curtas via twitter ou whatsapp, mas não vai decidir nada de importante.
Essa hipótese supõe um controle estrito sobre a fala e as ações do presidente. Sobre a fala não parece haver problema. Ele diz uma coisa, os militares vetam, e ele desdiz. Já ocorreu várias vezes, vai continuar ocorrendo.
No que se refere às ações, o problema será mais difícil de resolver. Nenhuma coleira conseguirá controlar os impulsos emocionais e completamente irracionais do presidente eleito. Em seus 27 anos chafurdando no baixo clero da Câmara dos Deputados, ele se destacou apenas por defender tortura, estupro, guerra civil, violência das milícias e grupos de extermínio, e por discriminar mulher, negro, gay e índio. Assim, se ele ultrapassar o limite, a coleira pode converter-se em degola.
Outro fator que certamente vai desgastar o (des)equilíbrio emocional do presidente é o conflito entre a agenda econômica neoliberal do Guedes e seu passado "sindicalista" de defender aumento de salário para militares e policiais. A reforma da Previdência será o primeiro confronto, mas não o único.
Ainda é cedo para dizer qual dessas duas hipóteses - degola ou coleira - é a mais provável. Ambas são possíveis. E ambas descortinam um horizonte sombrio. Basta ver o recente decreto do presidente em exercício, general Mourão, publicado em 24/1 passado, alterando as regras da Lei de Acesso à Informação e permitindo que assessores com cargo de comissão DAS-6 imponham sigilo a dados do governo que podem tornar-se secretos por 25 anos. E Moro continua fazendo cara de paisagem.
Vão varrer a corrupção para baixo do tapete. Quanto menor a transparência, maior o autoritarismo e menor a democracia. Mas é bom não esquecer que tudo isso, paradoxalmente, pode fortalecer as forças democráticas que serão obrigadas a redobrar esforços e lutar com mais afinco para assegurar a sobrevivência da democracia no Brasil.
* Liszt Vieira é professor da PUC-Rio
Após 3 semanas de (des)governo, aconteceu o que se esperava. A incompetência, mediocridade, ignorância, arrogância e violência só podiam gerar o caos. O baixo nível do Ministério só contribui para piorar. Depois de Davos, a desmoralização do governo brasileiro tornou-se definitivamente internacional.
Em meio a esse pântano de irracionalidade, há alguns segmentos racionais. São eles:
1) Alguns generais de direita que põem limites às alucinações presidenciais, como foi o caso da base militar americana no Brasil ou da transferência da embaixada para Jerusalém.
2) Sergio Moro, embora muito enfraquecido, porque se vê obrigado a engolir a corrupção e a cumplicidade da famiglia bolsonaro com o crime organizado das milícias,
3) Paulo Guedes, representando o Deus Mercado que acha ótimo o presidente não entender nada de economia.
Temos pela frente duas possibilidades. Alguns jornalistas afirmaram que o governo se aproxima do final, pelo impeachment ou renúncia. Creio que ainda é cedo para essa previsão. Não sabemos ainda se o Governo vai conseguir maioria para aprovar as chamadas Reformas, principalmente a da Previdência. A desmoralização do Executivo provoca, indiretamente, o fortalecimento do Legislativo, onde tem peso o baixo clero, a turma do "toma lá, dá cá".
A hipótese de renúncia é improvável. Ninguém renuncia ao poder se não for forçado a isso. O caso, já citado, do ex presidente Jânio Quadros foi diferente. Ele fez uma manobra achando que o Congresso ia votar a seu favor e que ele voltaria ao Poder nos braços do povo. Por proposta do então deputado Almino Afonso, o Congresso decidiu que renúncia é um ato unilateral de vontade e que não cabia votação. Aprendiz de feiticeiro, o feitiço de Jânio voltou-se contra ele.
Por outro lado, ainda não se conhece a correlação de forças na Câmara dos Deputados. E os deputados do partido do presidente fazem parte todos do baixo clero. Viajaram à China, contrariando o guru do presidente, Olavo de Carvalho, que dos EUA, onde mora, reclamou e excomungou os parlamentares do PSL.
A outra possibilidade é a de um presidente fantoche, segurado na coleira pelos generais do governo. Vai ficar falando sobre armas, escola sem partido, criticando o PT, as terras indígenas etc, sempre imitando Trump com frases curtas via twitter ou whatsapp, mas não vai decidir nada de importante.
Essa hipótese supõe um controle estrito sobre a fala e as ações do presidente. Sobre a fala não parece haver problema. Ele diz uma coisa, os militares vetam, e ele desdiz. Já ocorreu várias vezes, vai continuar ocorrendo.
No que se refere às ações, o problema será mais difícil de resolver. Nenhuma coleira conseguirá controlar os impulsos emocionais e completamente irracionais do presidente eleito. Em seus 27 anos chafurdando no baixo clero da Câmara dos Deputados, ele se destacou apenas por defender tortura, estupro, guerra civil, violência das milícias e grupos de extermínio, e por discriminar mulher, negro, gay e índio. Assim, se ele ultrapassar o limite, a coleira pode converter-se em degola.
Outro fator que certamente vai desgastar o (des)equilíbrio emocional do presidente é o conflito entre a agenda econômica neoliberal do Guedes e seu passado "sindicalista" de defender aumento de salário para militares e policiais. A reforma da Previdência será o primeiro confronto, mas não o único.
Ainda é cedo para dizer qual dessas duas hipóteses - degola ou coleira - é a mais provável. Ambas são possíveis. E ambas descortinam um horizonte sombrio. Basta ver o recente decreto do presidente em exercício, general Mourão, publicado em 24/1 passado, alterando as regras da Lei de Acesso à Informação e permitindo que assessores com cargo de comissão DAS-6 imponham sigilo a dados do governo que podem tornar-se secretos por 25 anos. E Moro continua fazendo cara de paisagem.
Vão varrer a corrupção para baixo do tapete. Quanto menor a transparência, maior o autoritarismo e menor a democracia. Mas é bom não esquecer que tudo isso, paradoxalmente, pode fortalecer as forças democráticas que serão obrigadas a redobrar esforços e lutar com mais afinco para assegurar a sobrevivência da democracia no Brasil.
* Liszt Vieira é professor da PUC-Rio
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