quinta-feira, 16 de maio de 2019

Na rota das grandes lutas

Chapecó/SC, 15/5/19. Foto: Ana Laura Baldo/Estudantes NINJA
Por Haroldo Lima

Foi um espetáculo portentoso o que ontem se viu pelas praças e ruas do Brasil. Centenas de milhares de estudantes, professores, trabalhadores em educação e povo em geral desfilaram sua indignação, suas denúncias e sua criatividade em todos os 26 estados da Federação e no Distrito Federal.

Cortejos enormes e numerosos, de norte a sul do país, puseram-se em marcha na defesa da educação ameaçada. Não se viu a “bagunça” que o ministro da educação Abraham Weintraub enxergou nas universidades efervescentes brasileiras. Via-se protesto contra o descalabro e repulsa ao obscurantismo que reduz o governo federal a um organismo necrosado que se orienta por um farsante boquirroto acoitado nos Estados Unidos.

O movimento estudantil, dirigido pela União Nacional dos Estudantes e União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, toma seu lugar na coluna combatente, na rota das grandes lutas.

Essa é uma rota segura que vincou picadas indeléveis em todo o mundo, em especial na América Latina e no nosso Brasil.

Na Argentina, em 1918, foram os estudantes que começaram em Córdoba a movimentação que levantou na Argentina a bandeira da Reforma Universitária, de sentido democrático, que depois se estendeu para toda a América Latina.

Vê-se falar nas grandes jornadas que fizeram do ano de 1968 “o ano que não terminou”, como escreveu o brasileiro Zuenir Ventura. Mas foram os estudantes da Universidade de Paris em Nanterre e os estudantes da Sorbonne em Paris que desencadearam o movimento que paralisou a França e a Alemanha naquele ano memorável.

No Brasil, 1968 não passou em brancas nuvens. E também foram os estudantes que tomaram a frente dos grandes protestos então havidos, como a Passeata dos Cem Mil, no Rio de Janeiro, atos enfrentando a direita e a repressão em diversas ocasiões, pelo Brasil afora, como foi o caso da chamada Batalha da Maria Antônia, em São Paulo.

Daí por diante, com o endurecimento da ditadura, que usou seu mais draconiano instrumento, o Ato Institucional número 5, a luta se radicalizou e lideranças estudantis expressivas estiveram presentes em todos os movimentos que então surgiram, como a ALN, o MR-8, a Var-Palmares, o Colina e naquele que foi o mais significativo de todos, o Araguaia, dirigido pelo PC do B.

Nas campanhas pela Anistia e pela Constituinte, o papel da juventude e dos estudantes foi destacado, desembocando tudo nas Diretas Já e no apoio à ida ao Colégio Eleitoral para derrotar a ditadura dentro de sua paliçada.

Agora, durante esse governo fascistizante de Jair Bolsonaro, alguns diziam que os estudantes já tinham de certa forma ensarilhado suas armas. Nos episódios de 27 de março de 2019, na mesma famosa rua Maria Antônia, de São Paulo, os estudantes da Universidade Presbiteriana Mackenzie impediram o presidente Bolsonaro de adentrar o campus da universidade, em uma visita para a qual o presidente já estava em São Paulo. A palavra de ordem que então unificou a estudantada foi a de que Bolsonaro “não terá sossego em nenhuma universidade do Brasil”.

Percebia-se que a aparente apatia da estudantada era falsa, e que, frente a desafios onde estivessem presentes a defesa da liberdade e da independência nacional, de um momento para outro a turma reagia. A juventude desperta rápido.

Agora, chegamos em um teste decisivo. O governo retrógrado de Bolsonaro, pela voz da ignorância incrustada no ministério da Educação, como ministro, deu um brado horroroso. Três universidades deveriam ser punidas com um corte de 30% de suas verbas, a Universidade de Brasília, a da Bahia e a Federal Fluminense. A razão era que o ministro enxergou “balbúrdia” nessas unidades educacionais. O ministro, na sua obtusidade, confundia vida, liberdade, criação, vitalidade, com “balbúrdia”. Não só os protestos surgiram como mostrou-se ao ministro que aquelas três universidades eram das mais bem avaliadas do Brasil.

O ministro, flagrado na asneira que cometera, resolveu consertar o soneto: o corte não seria para as três universidades, mas para todas as federais. A emenda ficou pior do que o soneto: recuou, dando um passo à frente no terreno da estupidez. E foi aí que ele se deu mal.

O mundo educacional se levantou. Rápido, fez a manifestação de ontem, das maiores do Brasil.

Não se viu desordem, “bagunça” ou arruaça. O Bolsonaro, acoitado em Dallas, já que não o deixaram entrar em Nova Iorque, resolveu de lá gritar: “são idiotas úteis.” O diabo é que são algumas centenas de milhares de “idiotas úteis”, que ganham consciência, experiência de luta de rua, jeito de fazer manifestação.

As manifestações de 16 de maio foram um sucesso. Agora é aprender a lição do que dá certo: ter amplitude, chamar cada vez mais gente, mesmo os “arrependidos”, que devem ser bem recebidos, aprofundar a originalidade na propaganda preparatória do ato e no ato em si, não aceitar hegemonismos artificiais, mas não discriminar correntes políticas oposicionistas, atrair outros setores sociais, agitar mais bandeiras e faixas.

E assim vamos preparar a greve, organizada pelas centrais de trabalhadores, para o dia o 14 de junho. Esse é o filão das grandes lutas.

* Haroldo Lima é membro da Comissão Política Nacional do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil.

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