domingo, 23 de junho de 2019

Discutir a Lei de Abusos de Autoridades

Por Luis Nassif, no Jornal GGN:

É hora de se discutir seriamente a Lei de Abusos de Autoridades. Não pode prosseguir a escalada de ações abusivas, sob risco de se comprometer definitivamente a claudicante democracia brasileira.

Os setores responsáveis do Judiciário e do Ministério Público precisam se convencer que só uma lei superior separará o joio do trigo. A não ser que se espere que permaneça apenas o joio.

Alguns episódios desmoralizantes recentes de abusos que passaram impunes.

Tudo isso começou com a flexibilização da Constituição, a tal “mutação constitucional” liderada pelo então jurista Luis Roberto Barroso, tendo como álibi alguns avanços na ampliação dos direitos humanos.

Era apenas álibi para derrogar a Constituição abrindo caminho para o arbítrio e para o direito penal do inimigo. Sabia-se que, aberto o guarda-chuva da luta contra a corrupção, aceitando-se todos os abusos, o espírito do direito penal do inimigo se espraiaria sobre todo o corpo do judiciário e do Ministério Público, em uma repetição da maldição de Pedro Alexis, alertando para os abusos que seriam cometidos na porta da cadeia, pelos ecos do AI-5.

Barroso rasgou de vez a fantasia quando se tornou, ao lado de Luiz Edson Fachin, o principal avalista das arbitrariedades.

E agora? Vai se permitir o aumento da escalada do arbítrio, ou haverá uma maioria no Supremo contra os abusos?

O cientista político polonês Adam Przeworski está lançando o novo estudo sobre o fim das democracias, mostrando que elas não são liquidadas com um golpe, mas com a inoculação diária de pequenas doses de veneno, flexibilizando os princípios constitucionais.

Abaixo, uma pequena relação do efeito “mutação constitucional”.

O caso Cancellier

O reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo foi preso, humilhado, proibido de entrar no campus da Universidade Federal de Santa Catarina. Foi acusado de desvio de recursos, falsificação de inscrição de bolsistas. Está semana o inquérito chegou ao fim. Inocentou-o.

Nada ocorreu com as duas principais responsáveis, Juíza Janaína Machado e Delegada Erika Melena. Erika foi promovida para comandar a Polícia Federal em um estado do Nordeste. Depois, convocada para a equipe de Sérgio Moro no Ministério da Justiça.

Este é o mundo criado pelo Ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal.

O militar infiltrado

Um militar infiltrou-se em um grupo de namoro e armou uma arapuca para jovens estudantes, a caminho de uma passeata. Manipulou-se o inquérito, consideraram-se armas fatais meras garrafas de líquidos destinados a prevenir efeitos de gases e uma marreta de madeira, possivelmente plantada pelos policiais. Nada ocorreu com o militar. Os estudantes foram indiciadas como integrantes de uma organização criminosa, estragando sua vida.

Essa barbaridade é filha direta do lema de que qualquer manifestação contra o pensamento hegemônico é equiparado a corrupção e deve ser tratado com mão de ferro, de acordo com o direito penal do inimigo.

Mais um legado do Ministro Luis Roberto Barroso.

A invasão das universidades

O Tribunal Superior Eleitoral arma uma ofensiva contra as universidades, visando beneficiar a candidatura de Jair Bolsonaro. Em ação articulada, inúmeras universidades são ocupadas pela Polícia Militar, com autorização dos juízes eleitorais.

Mais uma herança de Luis Roberto Barroso.

A condução coercitiva de funcionários do BNDES

O procurador Anselmo Lopes e o juiz Ricardo Leite comandam uma operação atrabiliária de condução coercitiva com estardalhaço contra 40 funcionários do BNDES, incluindo mulheres grávidas, iniciando um apagão em todas as decisões do banco, com a perda total de referencial por parte dos funcionários. Nada aconteceu com eles.

A humilhação pública do réu Sérgio Cabral Filho

Duas cenas chocantes, ambas envolvendo o réu condenado Sérgio Cabral Filho, mostrando a selvageria implantada no país.

A primeira, a cena de Cabral sendo conduzido publicamente, algemado nas mãos e nas pernas pelo delegado Igor de Paula, da Polícia Federal. A segunda, do promotor André Guilherme Freitas, invadindo o presídio e humilhando sadicamente o réu.

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