Foto: Manuel Balce Ceneta/AP |
O anúncio por parte do secretário de Estado estadunidense Michael Pompeo da nomeação do neoconservador Elliott Abrams para o cargo de enviado especial para a Venezuela, em 24 de janeiro, não passou despercebido. A imprensa interpretou a decisão de confiar a esse homem a missão de trabalhar para a queda de Nicolás Maduro como uma declaração de independência de Pompeo em relação a Donald Trump. De fato, seu desafortunado antecessor, Rex Tillerson – ex-presidente e diretor geral da ExxonMobil –, estava esperando somar-se a Abrams em sua equipe. Mas Trump se opôs, apesar da pressão de seu megadoador de extrema-direita Sheldon Adelson – que parece obter o que quer do presidente. A causa dessa rejeição? Abrams havia se unido a outros neoconservadores para criticar Trump durante as primárias republicanas em 2016. Até mesmo os esforços do genro do presidente, Jared Kushner, mostraram-se inúteis: o então conselheiro do “inquilino da Casa Branca”, Steve Bannon, conseguiu convencer Trump de que a reputação “globalista” de Abrams tirava seu crédito.
Segundo a revista Bloomberg, essa promoção revela uma “mudança”: “Suas posições representam uma política externa que Trump atacou durante sua campanha – sobretudo, o apoio à Guerra do Iraque, que critica já há certo tempo. Mas Abrams, da mesma forma que o presidente, parece ter mudado” (1). Essa ideia de que “as pessoas mudam” também figura entre as explicações avançadas de Abrams para ignorar seu papel no escândalo do Caso Irã-Contras – quando a administração do presidente Ronald Reagan financiou seu apoio aos “contras” antissandinistas da Nicaragua por meio da venda secretas de armas a Teerã –, apresentado como insignificante. No entanto, embolado nessa questão, Abrams teve que declarar-se culpado em relação às acusações de ocultar informação ao Congresso. O distrito de Columbia o impediu de exercer a advocacia, sendo posteriormente indultado pelo presidente George Bush pai. “Não acredito que isso tenha a menor importância”, comentou. “Não nos interessamos pelo que passou na década de 1980, mas sim no que passa em 2019” (2).
Da Micronésia à América Central
Considerando o passado de Abrams, o ano de 2019 ameaça ser desastroso para o povo venezuelano. Ele foi assistente subalterno no Congresso, antes de ser nomeado para a administração de Reagan para uma série de cargos relacionados a direitos humanos na América Central, e esteve de novo na ativa na segunda administração do presidente George W. Bush filho. Desempenhou depois um papel militante em uma think tank, o Council on Foreign Relations (Conselho de Relações Internacionais), e de várias organizações de judeus conservadores. Exceto Henry Kissinger e Richard “Dick” Cheney, poucos altos funcionários estadunidenses fizeram tanto para promover a tortura e os assassinatos em massa em nome da democracia. Depois do Caso Irã-Contras, sua ascensão às altas esferas da política exterior estadunidense, com ajuda de um tratamento midiático que o faz passar por uma personalidade respeitável, lança luz sobre a realidade desse pequeno mundo. E, em particular, sobre sua falta de preocupação pelos valores que os políticos estadunidenses se comprometeram legalmente a defender.
No começo de sua carreira, a serviço dos senadores democratas Henry “Scoop” Jackson e Daniel Patrick Moynihan, Abrams participa dos esforços dos neoconservadores para converter o Partido Democrata dos anos 1970 ao intervencionismo bélico. Mas, afastados dos altos cargos da administração pelo presidente James Carter, acabam mudando de lado. “Nós estávamos completamente marginalizados”, reclamou Abrams. “Nós só tivemos uma posição insignificante: negociador especial. Não para a Polinésia. Nem para a Macronésia. Mas para a Micronésia” (3). Depois de construir um confortável ninho na administração de Reagan, ascende rapidamente ao escalão do Departamento de Estado. Passa pelo posto de secretário adjunto de Estado para as organizações internacionais, logo – ironicamente – para os “direitos humanos” e, finalmente, para assuntos interamericanos. Nesse último posto, protege o secretário de Estado George Shultz da ira dos reaganianos ávidos para entrar em guerra contra a União Soviética, realizando uma série de conflitos de poder na América Central.
Massacres e atos de genocídio
Poucas vezes a extrema-direita latino-americana contou com um aliado estadunidense tão enérgico como Abrams. Inclusive quando se trata de massacres de centenas, até milhares de camponeses inocentes em El Salvador, Nicarágua, Guatemala ou mesmo Panamá (que George Bush pai acabou invadindo), ele sempre sabe como encontrar um bode expiatório para mascarar sua responsabilidade: jornalistas, ativistas em busca de justiça e até as vítimas.
Em março de 1982, o general guatemalteco Efraín Ríos Montt chega ao poder mediante um golpe de Estado. Então secretário adjunto de Estado para os direitos humanos, Abrams se apressa em felicitá-lo por haver “trazido consideráveis progressos” na questão dos direitos fundamentais. Insiste no fato de que “o número de civis inocentes assassinados diminui progressivamente” (4). No entanto, no mesmo momento, segundo um documento desconfidencializado, o Departamento de Estado recebe “acusações bem fundamentadas referentes a massacres em grande escala de homens, mulheres e indígenas perpetrados pelo exército em uma área remota”. Mas isso não é obstáculo para que Abrams peça ao Congresso que forneça aos militares guatemaltecos armas sofisticadas, com a desculpa de que o “progresso deve ser recompensado e incentivado”. Em 2013, a comissão para a memória histórica, criada sob os auspícios das Nações Unidas, reconhece o general Ríos Montt culpado de “atos de genocídio” contra os Ixil Maias do departamento de Quiché.
Promovido, em 1985, ao cargo de secretário adjunto de Estado para assuntos interamericanos, Abrams não deixa de condenar as organizações que denunciam os assassinatos em massa perpetrados pelo general-ditador Ríos Montt e, depois, por seus sucessores, Óscar Mejía Víctores e Marco Vinicio Cerezo Arévalo. Em abril de 1985, a ativista guatemalteca María Rosário Godoy de Cuevas, dirigente do Grupo de Apoio Mútuo, uma organização que reunia mães de desaparecidos, é encontrada morta em um carro roubado junto com seu irmão e seu filho de três anos. Não satisfeito em sustentar a hipótese (pouco crível) do acidente cometido pelo regime, Abrams persegue nos tribunais aqueles que exigem a abertura de uma investigação. Quando o The New York Times publica uma carta aberta que questiona os números do Departamento de Estado sobre os assassinatos em massa, redigida por uma mulher testemunha de uma execução sumária ocorrida a plena luz do dia em Cidade de Guatemala que não teve repercussão na imprensa, dirige uma carta ao editor-chefe e mente descaradamente. Chega ao extremo de citar um artigo imaginário, publicado em um jornal inexistente, a fim de provar que, na verdade, o assassinato havia sido inventado pela imprensa.
Em 1982, o The New York Times e o Washington Post publicam artigos que apontavam um massacre cometido um ano antes, por tropas formadas e equipadas pelos Estado Unidos na região de El Mozote, em El Savador. Em socorro aos assassinos, Abrams declara diante de uma comissão do Senado que os artigos “não são críveis” e que “visivelmente” se tratava de um “incidente instrumentalizado” pelas guerrilhas. Em 1993, a Comissão da Verdade das Nações Unidas conclui que cinco mil civis foram “deliberada e sistematicamente” assassinados em El Mozote.
Em 1985, quando o ditador panamenho Manuel Noriega ordena a tortura e assassinato por decapitação do guerrilheiro Hugo Spadafora, Abrams se mobiliza no Departamento de Estado e no Congresso para impor um silêncio sobre o assunto. “[Noriega] nos ajuda muito”, explica (…). “Não causa problemas. (…) Os panamenhos prometeram que nos ajudarão a combater os ‘contras’. Se levar eles a juízo, já não poderemos contar com eles” (5).
Uma legitimidade de “especialista”
Abrams está implicado no escândalo dos Irã-Contras em vários níveis. Em 1986, um piloto mercenário estadunidense é abatido quando transportava armas ilegais destinadas aos “contras” nicaraguenses. Abrams aparece, então, na CNN para certificar que o governo estadunidense não tem nada a ver com esses voos. “Seria ilegal”, explica. “Não temos o direito de fazer e não o faremos. Em hipótese alguma era uma operação do governo estadunidense. (…) Se as coisas sucedem assim, se estadunidenses são assassinados e seus aviões abatidos, é porque o Congresso não atua [financiando os ‘contras’]”. Em seguida, repete diante das comissões do Congresso que o voo não foi “nem organizado, nem ordenado, nem financiado pelo governo estadunidense”. Em várias ocasiões, assegura ao Congresso que “a função do Departamento de Estado [na questão de ajuda aos ‘contras’] não era arrecadar fundos, mas sim tentar obtê-los do Congresso”. Mente em todos os episódios. As entregas de armas são financiadas pelo tenente-coronel Oliver North e pela CIA.
Quando faz essas declarações, Abrams acabava de voltar do Brunei, onde havia arrecadado fundos para os “contras”. Em 1991, a revelação dessas falsificações o leva a ser condenado por ocultar informações ao Congresso.
Apesar de Abrams não ter conseguido fazer parte da administração de Bill Clinton, é contratado por seu sucessor, George W. Bush filho, para trabalhar no Conselho Nacional de Segurança em questões relacionadas a Israel e Palestina. Sua maior conquista na época, revelada por David Rose na Vanity Fair, é impedir que as eleições de 2006 desemboquem em um governo de coalização entre Hamás e Al Fatah na Cisjordânia e em Gaza, conspirando com o segundo para obrigar o governo eleito, dominado pelo Hamás, a exilar-se em Gaza (6). Essa manobra marca uma divisão, cujo fim não se vislumbra, entre facções incapazes de negociar uma paz duradoura com Israel (se Israel concordar com isso). Finalmente, segundo uma investigação do jornal britânico The Guardian (7), Abrams havia encorajado, em 2002, o golpe de Estado militar na Venezuela contra o governo democraticamente eleito de Hugo Chávez (que fracassou depois de uma imensa mobilização popular).
Nenhum desses fatos sobre armas impediu o Council on Foreign Relations de aceitar Abrams entre seus membros permanentes em 2009, conferindo-lhe, assim, uma legitimidade de “especialista”. Esse prestigiado think tank só manifestou certo embaraço quando seu novo membro atacou o presidente Barack Obama por ter nomeado para o cargo de secretário de Defesa Charles Hagel – um “antissemita” que, segundo Abrams, “parece ter problemas com os judeus” (National Public Radio, 7 de janeiro de 2013). Richard Haass, o diretor da organização, considerou o comentário um “absurdo” (ABC, 13 de janeiro de 2013). Por outro lado, nenhum membro pareceu incomodado por sua participação em manipulações eleitorais, massacres ou genocídios. Sua nomeação ao Council on Foreign Relations e, agora, para o posto de enviado especial dos Estados Unidos para a Venezuela mostra o controle que exercem os conservadores sobre a política exterior estadunidense.
Notas
Segundo a revista Bloomberg, essa promoção revela uma “mudança”: “Suas posições representam uma política externa que Trump atacou durante sua campanha – sobretudo, o apoio à Guerra do Iraque, que critica já há certo tempo. Mas Abrams, da mesma forma que o presidente, parece ter mudado” (1). Essa ideia de que “as pessoas mudam” também figura entre as explicações avançadas de Abrams para ignorar seu papel no escândalo do Caso Irã-Contras – quando a administração do presidente Ronald Reagan financiou seu apoio aos “contras” antissandinistas da Nicaragua por meio da venda secretas de armas a Teerã –, apresentado como insignificante. No entanto, embolado nessa questão, Abrams teve que declarar-se culpado em relação às acusações de ocultar informação ao Congresso. O distrito de Columbia o impediu de exercer a advocacia, sendo posteriormente indultado pelo presidente George Bush pai. “Não acredito que isso tenha a menor importância”, comentou. “Não nos interessamos pelo que passou na década de 1980, mas sim no que passa em 2019” (2).
Da Micronésia à América Central
Considerando o passado de Abrams, o ano de 2019 ameaça ser desastroso para o povo venezuelano. Ele foi assistente subalterno no Congresso, antes de ser nomeado para a administração de Reagan para uma série de cargos relacionados a direitos humanos na América Central, e esteve de novo na ativa na segunda administração do presidente George W. Bush filho. Desempenhou depois um papel militante em uma think tank, o Council on Foreign Relations (Conselho de Relações Internacionais), e de várias organizações de judeus conservadores. Exceto Henry Kissinger e Richard “Dick” Cheney, poucos altos funcionários estadunidenses fizeram tanto para promover a tortura e os assassinatos em massa em nome da democracia. Depois do Caso Irã-Contras, sua ascensão às altas esferas da política exterior estadunidense, com ajuda de um tratamento midiático que o faz passar por uma personalidade respeitável, lança luz sobre a realidade desse pequeno mundo. E, em particular, sobre sua falta de preocupação pelos valores que os políticos estadunidenses se comprometeram legalmente a defender.
No começo de sua carreira, a serviço dos senadores democratas Henry “Scoop” Jackson e Daniel Patrick Moynihan, Abrams participa dos esforços dos neoconservadores para converter o Partido Democrata dos anos 1970 ao intervencionismo bélico. Mas, afastados dos altos cargos da administração pelo presidente James Carter, acabam mudando de lado. “Nós estávamos completamente marginalizados”, reclamou Abrams. “Nós só tivemos uma posição insignificante: negociador especial. Não para a Polinésia. Nem para a Macronésia. Mas para a Micronésia” (3). Depois de construir um confortável ninho na administração de Reagan, ascende rapidamente ao escalão do Departamento de Estado. Passa pelo posto de secretário adjunto de Estado para as organizações internacionais, logo – ironicamente – para os “direitos humanos” e, finalmente, para assuntos interamericanos. Nesse último posto, protege o secretário de Estado George Shultz da ira dos reaganianos ávidos para entrar em guerra contra a União Soviética, realizando uma série de conflitos de poder na América Central.
Massacres e atos de genocídio
Poucas vezes a extrema-direita latino-americana contou com um aliado estadunidense tão enérgico como Abrams. Inclusive quando se trata de massacres de centenas, até milhares de camponeses inocentes em El Salvador, Nicarágua, Guatemala ou mesmo Panamá (que George Bush pai acabou invadindo), ele sempre sabe como encontrar um bode expiatório para mascarar sua responsabilidade: jornalistas, ativistas em busca de justiça e até as vítimas.
Em março de 1982, o general guatemalteco Efraín Ríos Montt chega ao poder mediante um golpe de Estado. Então secretário adjunto de Estado para os direitos humanos, Abrams se apressa em felicitá-lo por haver “trazido consideráveis progressos” na questão dos direitos fundamentais. Insiste no fato de que “o número de civis inocentes assassinados diminui progressivamente” (4). No entanto, no mesmo momento, segundo um documento desconfidencializado, o Departamento de Estado recebe “acusações bem fundamentadas referentes a massacres em grande escala de homens, mulheres e indígenas perpetrados pelo exército em uma área remota”. Mas isso não é obstáculo para que Abrams peça ao Congresso que forneça aos militares guatemaltecos armas sofisticadas, com a desculpa de que o “progresso deve ser recompensado e incentivado”. Em 2013, a comissão para a memória histórica, criada sob os auspícios das Nações Unidas, reconhece o general Ríos Montt culpado de “atos de genocídio” contra os Ixil Maias do departamento de Quiché.
Promovido, em 1985, ao cargo de secretário adjunto de Estado para assuntos interamericanos, Abrams não deixa de condenar as organizações que denunciam os assassinatos em massa perpetrados pelo general-ditador Ríos Montt e, depois, por seus sucessores, Óscar Mejía Víctores e Marco Vinicio Cerezo Arévalo. Em abril de 1985, a ativista guatemalteca María Rosário Godoy de Cuevas, dirigente do Grupo de Apoio Mútuo, uma organização que reunia mães de desaparecidos, é encontrada morta em um carro roubado junto com seu irmão e seu filho de três anos. Não satisfeito em sustentar a hipótese (pouco crível) do acidente cometido pelo regime, Abrams persegue nos tribunais aqueles que exigem a abertura de uma investigação. Quando o The New York Times publica uma carta aberta que questiona os números do Departamento de Estado sobre os assassinatos em massa, redigida por uma mulher testemunha de uma execução sumária ocorrida a plena luz do dia em Cidade de Guatemala que não teve repercussão na imprensa, dirige uma carta ao editor-chefe e mente descaradamente. Chega ao extremo de citar um artigo imaginário, publicado em um jornal inexistente, a fim de provar que, na verdade, o assassinato havia sido inventado pela imprensa.
Em 1982, o The New York Times e o Washington Post publicam artigos que apontavam um massacre cometido um ano antes, por tropas formadas e equipadas pelos Estado Unidos na região de El Mozote, em El Savador. Em socorro aos assassinos, Abrams declara diante de uma comissão do Senado que os artigos “não são críveis” e que “visivelmente” se tratava de um “incidente instrumentalizado” pelas guerrilhas. Em 1993, a Comissão da Verdade das Nações Unidas conclui que cinco mil civis foram “deliberada e sistematicamente” assassinados em El Mozote.
Em 1985, quando o ditador panamenho Manuel Noriega ordena a tortura e assassinato por decapitação do guerrilheiro Hugo Spadafora, Abrams se mobiliza no Departamento de Estado e no Congresso para impor um silêncio sobre o assunto. “[Noriega] nos ajuda muito”, explica (…). “Não causa problemas. (…) Os panamenhos prometeram que nos ajudarão a combater os ‘contras’. Se levar eles a juízo, já não poderemos contar com eles” (5).
Uma legitimidade de “especialista”
Abrams está implicado no escândalo dos Irã-Contras em vários níveis. Em 1986, um piloto mercenário estadunidense é abatido quando transportava armas ilegais destinadas aos “contras” nicaraguenses. Abrams aparece, então, na CNN para certificar que o governo estadunidense não tem nada a ver com esses voos. “Seria ilegal”, explica. “Não temos o direito de fazer e não o faremos. Em hipótese alguma era uma operação do governo estadunidense. (…) Se as coisas sucedem assim, se estadunidenses são assassinados e seus aviões abatidos, é porque o Congresso não atua [financiando os ‘contras’]”. Em seguida, repete diante das comissões do Congresso que o voo não foi “nem organizado, nem ordenado, nem financiado pelo governo estadunidense”. Em várias ocasiões, assegura ao Congresso que “a função do Departamento de Estado [na questão de ajuda aos ‘contras’] não era arrecadar fundos, mas sim tentar obtê-los do Congresso”. Mente em todos os episódios. As entregas de armas são financiadas pelo tenente-coronel Oliver North e pela CIA.
Quando faz essas declarações, Abrams acabava de voltar do Brunei, onde havia arrecadado fundos para os “contras”. Em 1991, a revelação dessas falsificações o leva a ser condenado por ocultar informações ao Congresso.
Apesar de Abrams não ter conseguido fazer parte da administração de Bill Clinton, é contratado por seu sucessor, George W. Bush filho, para trabalhar no Conselho Nacional de Segurança em questões relacionadas a Israel e Palestina. Sua maior conquista na época, revelada por David Rose na Vanity Fair, é impedir que as eleições de 2006 desemboquem em um governo de coalização entre Hamás e Al Fatah na Cisjordânia e em Gaza, conspirando com o segundo para obrigar o governo eleito, dominado pelo Hamás, a exilar-se em Gaza (6). Essa manobra marca uma divisão, cujo fim não se vislumbra, entre facções incapazes de negociar uma paz duradoura com Israel (se Israel concordar com isso). Finalmente, segundo uma investigação do jornal britânico The Guardian (7), Abrams havia encorajado, em 2002, o golpe de Estado militar na Venezuela contra o governo democraticamente eleito de Hugo Chávez (que fracassou depois de uma imensa mobilização popular).
Nenhum desses fatos sobre armas impediu o Council on Foreign Relations de aceitar Abrams entre seus membros permanentes em 2009, conferindo-lhe, assim, uma legitimidade de “especialista”. Esse prestigiado think tank só manifestou certo embaraço quando seu novo membro atacou o presidente Barack Obama por ter nomeado para o cargo de secretário de Defesa Charles Hagel – um “antissemita” que, segundo Abrams, “parece ter problemas com os judeus” (National Public Radio, 7 de janeiro de 2013). Richard Haass, o diretor da organização, considerou o comentário um “absurdo” (ABC, 13 de janeiro de 2013). Por outro lado, nenhum membro pareceu incomodado por sua participação em manipulações eleitorais, massacres ou genocídios. Sua nomeação ao Council on Foreign Relations e, agora, para o posto de enviado especial dos Estados Unidos para a Venezuela mostra o controle que exercem os conservadores sobre a política exterior estadunidense.
Notas
(1) Jennifer Jacobs y Nick Wadhams, “‘Never Trumpers’ can get State Department jobs with Pompeo there”, Bloomberg, Nueva York, 31 de enero de 2019.
(2) Citado en Grace Segers, “US envoy to Venezuela Elliott Abrams says his history with Iran-Contra isn’t an issue”, CBS News, 30 de enero de 2019.
(3) Citado en Sidney Blumenthal, The Rise of the Counter-Establishment. The Conservative Ascent to Political Power, Union Square Press, Nueva York, 2008 (1ª ed.: 1988).
(4) Elisabeth Malkin, “Trial on Guatemala civil war carnage lives out U.S. role”, The New York Times, 16 de mayo de 2013.
(5) Citado em Stephen Kinzer, Overthrow: America’s Century of Regime Change from Hawaii to Iraq, Times Books, Nueva York, 2006.
(6) David Rose, “The Gaza bombshell”, The Hive, 3 de marzo de 2008.
(7) Ed Vulliamy, “Venezuela coup linked to Bush team”, The Guardian, Londres, 21 de abril de 2002.
* Publicado originalmente no Le Monde Diplomatique Espanha.
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