Por Victor Farinelli, no site Carta Maior:
O golpe de Estado ocorrido na Bolívia no último domingo (10/11) mostrou clara características de racismo e intolerância política. E isso não é um acaso.
O professor José Luis Fiori, um dos maiores intelectuais brasileiros, fez um relato de alguns dos fatos que marcaram aquele início de golpe, e que mostram o tipo atitude que está por trás da avançada golpista:
O golpe de Estado ocorrido na Bolívia no último domingo (10/11) mostrou clara características de racismo e intolerância política. E isso não é um acaso.
O professor José Luis Fiori, um dos maiores intelectuais brasileiros, fez um relato de alguns dos fatos que marcaram aquele início de golpe, e que mostram o tipo atitude que está por trás da avançada golpista:
“Assim como outras tantas, a residência presidencial de Evo foi invadida, depredada e vandalizada. Na parede da sala, uma grande pichação: `Hijo de Puta´. Transmitido pelas TVs um vídeo amador mostrava o ato. Dentro da casa dezenas de jovens de classe média, incluindo muitas meninas adolescentes com casacos do Mickey Mouse. Quem vandalizou a casa de Evo inacreditavelmente foram estudantes de classe média. Mas algo grandioso se revela no próprio vídeo. Se a intenção era depredar a casa de algum político magnata, a surpresa foi geral. Uma casa austera, simples, sem luxo algum. Nenhuma ostentação de nada, nem uma única banheira de hidromassagem, nada. O box onde Evo tomava seus banhos é metade do meu. Ao lado de seu quarto uma salinha minúscula com uma esteira rolante e dois aparelhos de exercício. A mini-academia mais simples que já vi na vida. E é aí que o vídeo acaba mordendo o próprio rabo. Pois ao não encontrarem o luxo que esperavam só restou aqueles jovens mediocrizados pela vida a ridicularização do gosto simplório de seu ex-presidente indígena. E assim ao mirar um par de tênis numa pequena estante um jovem comenta sorrindo: "olha o mal gosto do índio". Eles bem que tentaram. Depredaram, vandalizaram, violentaram. Mas quem saiu digno e erguido, livre de todo aquele lixo que tentaram jogar-lhe, foi um homem nobre e digno chamado Juan Evo Morales Ayma”.
Mas além dos vândalos que destruíram a casa do presidente, o que podemos falar também dos líderes do processo? Falemos sobre os três nomes que são os mais visíveis, e que foram também os que convocaram os grupos causadores de vandalismo: a senadora Jeanine Áñez, autoproclamada presidenta do país, o jornalista Carlos Mesa, que perdeu a eleição presidencial contra Evo Morales no dia 20 de outubro, e o empresário e fundamentalista religioso Luis Fernando Camacho, que invadiu o Palácio Quemado com uma bíblia e lidera os grupos mais racistas de Santa Cruz de la Sierra.
Jeanine Áñez era, até a segunda-feira (11/11), somente a vice-presidenta do Senado. Os golpistas a alçaram como sua representante depois que as Forças Armadas obrigaram a renunciar as únicas quatro pessoas com direito constitucional de estar na linha de sucessão: o presidente Evo Morales, o vice-presidente Álvaro García Linera, a presidenta do Senado Adriana Salvatierra e o presidente da Câmara dos Deputados, Víctor Borda.
Além da cena lamentável de sua autoproblamação, diante de um Senado vazio – a autoproclamação de Áñez se realizou diante de um Senado vazio –, ela tem antecedentes de ser uma das figuras mais racistas da política boliviana. São conhecidas no país as suas críticas a Evo Morales atacando sua origem indígena, e tuítes onde ela crítica a utilização por parte do seu governo de símbolos indígenas, como a bandeira Whipala.
Por sua parte, o jornalista Carlos Mesa, candidato derrotado por Evo Morales nas eleições de outubro, é um ex-presidente do país, que governou entre os anos de 2003 e 2005, depois de ser vice-presidente durante o breve governo de Gonzalo Sánchez de Lozada (2002-2003).
Tanto o seu governo quanto o do seu antecessor foram marcados pela chamada Guerra do Gás, quando a população se revoltou porque o governo passou a priorizar o uso das reservas de gás natural produzido pelo país para as exportações a Brasil, Argentina e Chile, em detrimento das necessidades da população local. A repressão aos movimentos populares ordenada por Mesa e Lozada resultou em mais de 200 pessoas mortas, mais de mil feridos e cerca de 4 mil detenções arbitrárias.
Finalmente, o líder intelectual do golpe, o empresário Luis Fernando Camacho. Se trata de um fundamentalista religioso e figura proeminente da elite de Santa Cruz de la Sierra, reduto político dominado pela direita. Amigo da família Bolsonaro, Camacho chegou a visitar o Itamaraty em maio deste ano, cinco meses antes das eleições presidenciais.
Depois do golpe, Camacho passou a tentar esconder seu racismo, devido às críticas que recebeu por seu gesto de entrar no Palácio Quemado (sede do governo boliviano) com uma bíblia e realizar um culto, mas a verdade é que os grupos que realizaram queimas da bandeira indígena Whipala em vários edifícios governamentais do país no dia do golpe pertencem ao seu partido, o Centro Cívico.
Além disso, Camacho também está ligado ao escândalo internacional Panamá Papers, pelo qual teria sonegado mais de 50 milhões de dólares de suas empresas através de paraísos fiscais na América Central, segundo investigações do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, por sua sigla em inglês).
Mas além dos vândalos que destruíram a casa do presidente, o que podemos falar também dos líderes do processo? Falemos sobre os três nomes que são os mais visíveis, e que foram também os que convocaram os grupos causadores de vandalismo: a senadora Jeanine Áñez, autoproclamada presidenta do país, o jornalista Carlos Mesa, que perdeu a eleição presidencial contra Evo Morales no dia 20 de outubro, e o empresário e fundamentalista religioso Luis Fernando Camacho, que invadiu o Palácio Quemado com uma bíblia e lidera os grupos mais racistas de Santa Cruz de la Sierra.
Jeanine Áñez era, até a segunda-feira (11/11), somente a vice-presidenta do Senado. Os golpistas a alçaram como sua representante depois que as Forças Armadas obrigaram a renunciar as únicas quatro pessoas com direito constitucional de estar na linha de sucessão: o presidente Evo Morales, o vice-presidente Álvaro García Linera, a presidenta do Senado Adriana Salvatierra e o presidente da Câmara dos Deputados, Víctor Borda.
Além da cena lamentável de sua autoproblamação, diante de um Senado vazio – a autoproclamação de Áñez se realizou diante de um Senado vazio –, ela tem antecedentes de ser uma das figuras mais racistas da política boliviana. São conhecidas no país as suas críticas a Evo Morales atacando sua origem indígena, e tuítes onde ela crítica a utilização por parte do seu governo de símbolos indígenas, como a bandeira Whipala.
Por sua parte, o jornalista Carlos Mesa, candidato derrotado por Evo Morales nas eleições de outubro, é um ex-presidente do país, que governou entre os anos de 2003 e 2005, depois de ser vice-presidente durante o breve governo de Gonzalo Sánchez de Lozada (2002-2003).
Tanto o seu governo quanto o do seu antecessor foram marcados pela chamada Guerra do Gás, quando a população se revoltou porque o governo passou a priorizar o uso das reservas de gás natural produzido pelo país para as exportações a Brasil, Argentina e Chile, em detrimento das necessidades da população local. A repressão aos movimentos populares ordenada por Mesa e Lozada resultou em mais de 200 pessoas mortas, mais de mil feridos e cerca de 4 mil detenções arbitrárias.
Finalmente, o líder intelectual do golpe, o empresário Luis Fernando Camacho. Se trata de um fundamentalista religioso e figura proeminente da elite de Santa Cruz de la Sierra, reduto político dominado pela direita. Amigo da família Bolsonaro, Camacho chegou a visitar o Itamaraty em maio deste ano, cinco meses antes das eleições presidenciais.
Depois do golpe, Camacho passou a tentar esconder seu racismo, devido às críticas que recebeu por seu gesto de entrar no Palácio Quemado (sede do governo boliviano) com uma bíblia e realizar um culto, mas a verdade é que os grupos que realizaram queimas da bandeira indígena Whipala em vários edifícios governamentais do país no dia do golpe pertencem ao seu partido, o Centro Cívico.
Além disso, Camacho também está ligado ao escândalo internacional Panamá Papers, pelo qual teria sonegado mais de 50 milhões de dólares de suas empresas através de paraísos fiscais na América Central, segundo investigações do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, por sua sigla em inglês).
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