segunda-feira, 13 de julho de 2020

A luta para universalizar o acesso à internet

Por Guilherme Weimann, no site do Sindicato dos Petroleiros de São Paulo:

Nas últimas décadas, setores progressistas têm realizado um profundo debate sobre a necessidade de democratizar os meios de comunicação, monopolizados por grupos econômicos com origens familiares. O tema ganhou novos ingredientes com a consolidação da internet, principalmente pela carência de políticas públicas garantidoras de uma conexão universal.

No Brasil, 42 milhões de pessoas nunca acessaram a internet. Além disso, levantamento do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) – departamento do Comitê Gestor da Internet (CGI) – aponta que 70 milhões têm acesso precário ou não têm nenhum acesso à internet. Entre as pessoas que utilizam regularmente a internet, 56% acessam apenas pelo celular.

Ainda de acordo com a pesquisa, que leva em consideração o ano de 2018, 85% dos usuários das classes D e E acessam a internet exclusivamente pelo celular, 2% apenas pelo computador e 13% tanto pelo aparelho móvel como pelo computador.

Esse déficit, que também expõe a enorme desigualdade social brasileira, tornou-se ainda mais evidente durante a pandemia do novo coronavírus e, consequentemente, do isolamento social necessário para frear a propagação da doença. Essa é a opinião do jornalista, doutorando da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB) e integrante do Coletivo Intervozes, Marcos Urupá.

“Eu acho que a pandemia demonstrou claramente o fosso existente entre aqueles que têm e aqueles que não têm acesso à internet. Estudantes não conseguem acesso para se prepararem para o ENEM, por exemplo, e aí todo o debate sobre o adiamento da prova. Vários jovens tiveram o sonho de entrar na universidade postergado. São vários e vários relatos de casas, com cinco ou seis pessoas, onde existia apenas um celular com acesso à internet, que precisava passar por um rodízio de uso”, detalha Urupá.

Diante desse cenário, o pesquisador avalia que a principal bandeira no espectro da comunicação deve ser elevar o alcance da rede. “O meio de contornar o cenário atual seria a gente tentar fazer uma luta pela ampliação do acesso da internet no Brasil. Eu acho que a agenda mesmo, dialogando com o debate da conjuntura, tem que ser a popularização e a universalização do acesso à internet”, opina.

Essas reflexões foram feitas nesta sexta-feira (10), na 15º edição do SindiPapo, live criada durante a pandemia pelo Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro Unificado-SP). Além de Urupá, também participaram do bate-papo o jornalista, blogueiro e coordenador do Barão de Itararé, Altamiro Borges, e o diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Tadeu Porto.

Avanços e retrocessos

Dentro do campo da esquerda, uma das críticas recorrentes direcionadas aos governos petistas se refere à negligência quanto à regulamentação da mídia. Apesar disso, existe um consenso em relação a três episódios, reconhecidos como marcos para o setor.

O primeiro aconteceu em 2008, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei nº 11.652/2008, que criou a Empresa Pública de Comunicação (EBC) – incluindo a TV Brasil, a Agência Brasil, a Radioagência Nacional e um sistema público composto por mais oito emissoras de rádio.

Outro fato ocorreu em 2009, na I Conferência Nacional de Comunicação, quando foram aprovadas 700 propostas em Brasília (DF), após 27 conferências estaduais que reuniram, no total, aproximadamente 30 mil pessoas.

Por fim, mas não menos importante, transcorreu quando a ex-presidenta Dilma Rousseff sancionou o Marco Civil da Internet, em 2014, que definiu direitos e deveres de usuários e de provedores de serviços de conexão e aplicativos na internet, a partir de três princípios fundamentais: neutralidade, respeito à privacidade e liberdade de expressão.

“[O Marco Civil da Internet] foi exemplo para muitas legislações mundiais na garantia de direitos e deveres dos usuários. Quando o Brasil lançou o Marco Civil deu um salto enorme, foi uma resposta a uma modelagem que estava se construindo de vigilantismo e punitivismo na internet. Não à toa existem muitos projetos no Senado e na Câmara propondo mudanças na neutralidade de rede e responsabilização de plataformas”, ressalta Urupá.

Apesar desses avanços inegáveis, o pesquisador pondera sobre o enfraquecimento da Telebrás durante o governo Dilma. “O enfraquecimento da Telebrás foi um retrocesso quando o assunto é internet. A Telebrás deveria ser a controladora das políticas de banda larga no Brasil. Porque, hoje, o Estado brasileiro se ausentou tanto desse setor que a gente não tem nenhum player. O próprio setor do petróleo tem agentes privados, mas um agente público muito forte. Nós temos bancos públicos também, que fazem esse papel. Mas no campo da internet não temos isso, o que nos torna reféns para implementar essas políticas”, explica.

Disputa nas redes

O coordenador do Barão de Itararé, Altamiro Borges, também aponta a ascensão dos blogueiros como fenômeno significativo dos governos petistas. “Como diria [o filósofo marxista Antonio] Gramsci, na crise de representação dos partidos burgueses, a imprensa ocupou o papel de partido do capital. Como a imprensa estava com uma postura muito acirrada com os governos Lula e Dilma, no caso do Lula por uma questão de classe, e no caso da Dilma até por uma questão de misoginia, essa blogosfera foi se constituindo como um contraponto”, recorda.

Para o jornalista, a mudança na atual conjuntura não se refere à relevância dos blogs, mas à ascensão de uma extrema direita articulada nas redes sociais. “A extrema direita se organizou melhor, preparou-se internacionalmente, com o papel do Steve Bannon, por exemplo. Ela investe muita grana em robôs, não é coisa para amadores. Ela investe em impulsionamento e estudos de perfis psicológicos. Por outro lado, essa linguagem do ódio e da mentira tem muita força na internet. Ela se espalha muito mais rápido que a linguagem do racional, do iluminismo”, pondera Borges.

Nesse sentido, o diretor da FUP, Tadeu Porto, considera impossível utilizar de grande parte da estratégia da direita. “A esquerda ficou para trás na comunicação, entre aspas, porque se manteve fiel a valores que considera caros, e a gente não estava errado. Porque é muito mais fácil você viralizar pelo ódio, é uma questão de ferramenta, não é somente uma questão de conteúdo. É muito mais fácil você viralizar pela polêmica, é muito mais fácil você alcançar mais pessoas com notícias rasas. E a direita navegou nisso com força”, aponta.

Por outro lado, o petroleiro reconhece a competência desses setores conservadores. “A direita também teve alguns méritos. Eu acho que o nosso papel agora é se apropriar dessas ferramentas. Ou seja, lives para poder conversar, webnários para poder aprofundar, grupos de WhatsApp para coordenar. Pegar os métodos e encaixar os nossos conteúdos, sem perder os nossos valores”, avalia Porto.

Assista o bate-papo completo [aqui].

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