Como se não bastasse a pandemia, há o Brexit. Resultado: a sensação de pandemônio se instalou, apesar de todos os pedidos de calma por parte das autoridades. Da Índia à Argentina, passando por vários países de várias latitudes, incluindo pelo menos uma dezena de europeus, os voos provenientes do Reino Unido foram bloqueados a partir da madrugada de segunda-feira, 21. A medida coincidiu com o aperto dos prazos para o Brexit, sem acordo no horizonte. O resultado deste desacerto é que milhares de caminhões se acumularam em filas de mais de 50 km. nos portos britânicos, com produtos de exportação para o continente. No Parlamento Britânico crescem as insatisfações com o desempenho do primeiro-ministro Boris Johnson.
Ao lado destas incertezas, medra uma desconfiança generalizada em relação ao comportamento prévio das autoridades responsáveis. A razão para o bloqueio dos voos provenientes do Reino Unido foi a descoberta de uma variação mutante do coronavírus naquele país que, se não é mais perigosa do que as anteriores, se propaga com muito mais rapidez, o que pode contribuir para acrescer a procura de sistemas hospitalares já à beira de um colapso em muitos pontos da Europa. Junto com a notícia da descoberta, vieram outras informações nada tranquilizantes, particularmente duas: já em setembro se sabia da existência desta nova mutação do vírus, e já no começo de dezembro se sabia de sua presença em outros países do continente europeu. Nada se fez a respeito.
Uma outra notícia gerou mais inquietações, porque incompreensível. Nos aeroportos alemães, havia autorização para o pouso de voos londrinos até a madrugada de domingo para segunda. Todos os viajantes estrangeiros tiveram de fazer o teste para a Covid-19 no próprio aeroporto. Obrigados a permanecer no local até a obtenção do resultado que, embora o teste fosse o rápido, demora algumas horas, tiveram de dormir em camas de campanha improvisadas. Porém os cidadãos alemães foram liberados imediatamente, sem teste! Pergunta perplexa: o vírus seleciona nacionalidades? Sem resposta.
Durante o ano a Alemanha se jactou de ser o país de maior sucesso no combate ao vírus. Em consequência disto, durante o verão tanto as autoridades quanto o público em geral relaxaram as medidas sanitárias de segurança. Resultado: durante o outono (hoje, 21, começa oficialmente o inverno no hemisfério norte), pagou-se o preço da incúria. A partir de outubro o número de casos de infecção começou a subir vertiginosamente, batendo recordes, muitas vezes ultrapassado a marca dos 30 mil diários.
A partir de novembro começou também a subir o número relativo de letalidades. E hoje há um consenso: as autoridades governamentais e sanitárias perderam um precioso tempo, durante o mês de novembro, para tomar as medidas mais rigorosas que a situação exigia. Muitas cidades e algumas províncias estão com a capacidade hospitalar esgotada. Falta pessoal: há chamados dramáticos para que estudantes de medicina, médicos e enfermeiros aposentados, pessoas que tenham qualquer experiência mais desenvolvida em tratamentos de saúde acorram aos hospitais. Estes cancelaram atendimentos e cirurgias de outras doenças e problemas, com exceção para aquelas de urgência urgentíssima.
Em muitos casos impõem-se variações da “escolha de Sofia”: os médicos têm de escolher quais pacientes da Covid-19 serão tratados, em detrimento de outros. Lares de idosos foram dizimados pela doença; muitos fecharam as portas, tal era o número de infectados e mortos. Não se descarta a possibilidade de se adotarem medidas mais duras, com toques de recolher, como já ocorre em outros países vizinhos. Falando-se destes, a falta de uma coordenação continental aumenta a sensação de insegurança. Enquanto alguns países fecham tudo, outros ainda abrem muita coisa… enfim, o pandemônio se generaliza. Há um frenesi em busca das vacinas, quaisquer vacinas.
Conselho que predomina entre os mais sensatos: tome a primeira que aparecer, assim que puder, pois a vacinação será feita em ondas sucessivas, a começar pelos profissionais da saúde, depois os mais idosos, os menos e assim por diante. Ao mesmo tempo, a extrema-direita e os negacionistas de todos os quadrantes políticos se mobilizam contra as medidas sanitárias. É verdade que não há nem Bolsonaro nem Trump na Europa, mas há milhares e milhares de bolsominions à solta. Para completar este quadro confuso, o rei da Suécia - país que apostou na “imunização do rebanho” - lamentou publicamente esta opção, dizendo que mais vidas poderiam ter sido salvas, se a a atitude fosse outra, mais prudente e rigorosa. Sabemos que o Brasil enfrenta uma situação caótica, com a colaboração do presidente e outras autoridades federais, além de jornalistas irresponsáveis, na disseminação do caos e da desinformação. Mas ele não está só, se é que isto serve de consolo.
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