Editorial do site Vermelho:
Ao completar mil dias da morte de Marielle Franco nesta terça-feira (8), uma coisa pode ser dita com segurança: impunidade. Esse é um grave flagelo que incentiva o crime no Brasil. Com o agravante de que, no governo Bolsonaro, cresceu a violência contra lideranças políticas e sociais. Além da violência física, há a violência política, ameaças e destruição de reputação por meio de propagação de fake news.
Além de haver um índice elevado de crimes não a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, lamenta que, apesar de registrar mais de 40 mil homicídios anuais, o Brasil continua sem prestar respostas às milhares de famílias que perdem todos os anos seus entes. “Os resultados da pesquisa mostram que o Estado está falhando ano após ano em responsabilizar os autores de homicídios e, dessa forma, deixa de garantir o direito à vida, à justiça e à memória a milhares de brasileiros”, afirma.
A impunidade chega às raias do absurdo. Sequer o país sabe exatamente a taxa de esclarecimento dos assassinatos ocorridos no país. Levantamento de 2020 do Instituto Sou da Paz indica que somente em dez estados e mais o Distrito Federal é feito esse tipo de aferição. E nesse conjunto de unidades da Federação apenas 32% dos homicídios dolosos são resolvidos.
Os assassinatos da vereadora pelo PSOL na cidade do Rio de Janeiro e do motorista Anderson Gomes, em 14 de março de 2018, seguem sem respostas básicas, como o motivo e o mandante do crime. O caso é apontado como fruto do submundo do crime carioca, mas as evidências de conotação política são fortes. É importante destacar que a então vereadora era cotada no PSOL como candidata a vice-governadora na chapa do partido pelo governo do Rio de Janeiro nas eleições de 2018.
Chama a atenção, nesse sentido, as falhas no período da investigação. São apontadas questões como a demora da polícia em ouvir testemunhas importantes, a troca no comando da investigação, a disputa entre órgãos responsáveis pelo caso e até ações para apontar um culpado logo, sem a comprovação da veracidade da acusação. Nesse festival de diversionismos, surgiram informações, ao que tudo indica falsas, de envolvimento de criminosos, logo depois descartados.
O clima de intimidação também é um ponto a ser considerado, como foi o caso da ex-assessora de Marielle, Fernanda Chaves, que teve de sair do país por não ter garantias de segurança. Outro fator relevante para se chegar à conclusão de que a impunidade é deliberada são as testemunhas que a polícia ignorou.
A mídia encontrou pessoas que estavam no local dos assassinatos, como um homem em situação de rua e uma mulher que passeava com os filhos no momento das execuções. Não houve a preocupação de colher os depoimentos dessas testemunhas, fato que ocorreu tardiamente, tempo suficiente para que as investigações tomassem outro caminho, que se mostrou errado.
Esse é um caso típico da inaceitável impunidade ainda reinante no país. De um lado, o Brasil ainda é o país da conivência com crimes para quem desfruta de alguma influência política e econômica. De outro lado, é ainda o país da tortura medieval para quem não tem onde se socorrer. Contribuem para isso as notícias de que a polícia destrói provas importantes com a mesma facilidade com que planta outras falsas. Como resultado, está disseminada pela sociedade a noção de que a lei não é igual para todos, de que a Justiça não é justa.
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