Por Eduardo Maretti, na Rede Brasil Atual:
O presidente Jair Bolsonaro resistiu, durante a semana, a demitir o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, apesar das pressões no Senado – a começar do próprio presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) – e também de governadores. Em seu papel na conduta desastrosa durante a pandemia pelo governo Bolsonaro o “chanceler” protagonizou, por exemplo, hostilidades contra a China, um dos principais parceiros comerciais do Brasil, além de fornecedora de vacina e de matéria prima para a fabricação de imunizantes contra a covid-19. Mas, em evento virtual de 30 anos do Mercosul nesta sexta (26), Bolsonaro discursou ao lado de Paulo Guedes (Economia) e do próprio Araújo, num claro sinal de apoio.
Desta vez, todos estavam de máscara. Em mais um de seus inúmeros vexames internacionais, em viagem a Israel no início do mês, Araújo foi repreendido publicamente em um evento oficial por se apresentar sem máscara. O “chanceler” participava de uma coletiva de imprensa ao lado do colega ministro das Relações Exteriores em Israel, Gabi Ashkenazi. Em situação constrangedora, ele se apressou em obedecer aos israelenses, colocando a proteção facial, que estava em seu bolso.
Ao posicionar Araújo à sua direita, Bolsonaro estaria tentando mostrar que não cede a pressões e também que, se for trocar de ministro, que quer dar uma “saída honrosa” a Araújo. Da mesma forma como tentou fazer em relação a Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde. Mas a saída do chefe do Itamaraty do posto, mais cedo ou mais tarde, deve acontecer por motivos inclusive conjunturais, além das pressões.
Nazismo
A família de Ernesto Araújo tem relação com ideologias de extrema-direita. Mais especificamente, com o nazismo. Seu pai, Henrique Fonseca de Araújo, procurador-geral da República no governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), em 1978, “dificultou a extradição de um nazista responsabilizado por 250 mil mortes entre 1942 e 1943”, segundo reportagem da Folha de S. Paulo de fevereiro de 2019. De acordo com a matéria, o pai de Ernesto Araújo deu pareceres negativos à extradição de Gustav Franz Wagner, subcomandante do campo de concentração de Sobibor, na Polônia ocupada pelos nazistas. O pai do atual “chanceler” brasileiro morreu em 1996.
Para Tatiana Berringer, professora de Relações Internacionais da UFABC, a provável substituição do atual ministro, se confirmada, se deverá principalmente à mudança da política externa dos Estados Unidos com a eleição de Joe Biden. Segundo ela, a mudança no comando do Itamaraty obedece à necessidade de “uma reorientação, um ajuste”, diante da mudança nos Estados Unidos, além dos equívocos na política externa “errática” durante a pandemia.
Pressão do Senado
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, foi claro sobre o que a classe política espera do Itamaraty. “Muito além da personificação ou do exame sobre o trabalho específico de um chanceler, o que se tem que mudar é a política externa do Brasil”, disse na quinta-feira (25). Segundo ele, “as relações internacionais precisam ser mais presentes num ambiente de maior diplomacia”. O senador afirmou ainda que a mudança “é algo que está evidenciado a todo os brasileiros que enxergam a necessidade de o Brasil ter uma representatividade externa melhor do que tem hoje.”
Ernesto Araújo, a “unanimidade negativa”
Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o ex-chanceler Celso Amorim classificou Araújo – representante da corrente do “guru” Olavo de Carvalho no governo Bolsonaro – como uma “unanimidade negativa” no Brasil e no mundo. “É o mínimo de dignidade ele sair. O chanceler está sendo criticado por todos, ele é uma unanimidade negativa”, ironizou.
Em 2017, Ernesto Araújo escreveu o artigo “Trump e o Ocidente”. Nele, defendeu o ex-presidente republicano dizendo que ele recuperaria “um passado simbólico, histórico e cultural das nações ocidentais”. Do artigo do hoje quase ex-chanceler, se depreende que Donald Trump seria uma espécie de mensageiro divino, que teria vindo à Terra com uma missão épica. “Somente um Deus poderia ainda salvar o Ocidente, um Deus operando pela nação – inclusive e talvez principalmente a nação americana”, escreveu o ainda “chanceler” brasileiro.
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