Por Jair de Souza
O número de mortes por covid-19 no Brasil já ultrapassou os 260.000. Para Bolsonaro, o panorama não é tão grave e, portanto, pedir por vacinas e protestar por isso é fazer mi-mi-mi, é ser mariquinha.
Pode parecer uma monstruosidade que um governante pense assim e procure retirar importância de uma cifra tão escandalosamente elevada de mortes. Mas, do ponto de vista dos interesses do governo Bolsonaro e daqueles que se identificam com sua política econômica, tudo faz muito sentido.
Mas, que grupos sociais podem ser beneficiários de uma política que favorece o crescimento das mortes como as que estão ocorrendo no Brasil no momento?
Os grandes beneficiários das políticas do governo Bolsonaro são aqueles que aspiram que os recursos do Estado sejam usados prioritariamente para cumprir com as pautas econômicas que eles consideram as mais importantes. Dentre estes, em primeiro lugar, estão aqueles que possuem grandes quantidades de títulos da dívida pública. Ou seja, aqueles que vivem do rentismo, os capitalistas financeiros.
Na lógica de Bolsonaro e dos que defendem suas políticas econômicas, o fato de que a covid-19 atinja com muito maior rigor as parcelas da população mais vulneráveis e aquelas com menos potencialidades de atuar produtivamente na economia e de gerar riquezas tende a ser algo que vai de encontro ao que eles consideram positivo.
Explicando: cada idoso aposentado que sucumbe é uma aposentadoria a menos para os cofres públicos; cada morador de rua que falece é um gasto a menos com assistência social para o Estado; cada desempregado que seja levado de roldão pela covid-19 significa menos dispêndios que o Estado terá que fazer em seguro desemprego; etc., etc. Em outras palavras, o elevadíssimo número de mortes vai acabar redundando em uma diminuição de gastos por parte dos organismos do Estado.
E por que os citados grupos se beneficiam com a eliminação desses gastos? É que eles ganham a certeza de que o dinheiro público vai estar disponível para cobrir os pagamentos daquilo que eles consideram ser o mais sagrado na vida humana: a garantia de que o pagamento pontual dos títulos da dívida pública dos quais eles são detentores seja religiosamente respeitado pelo Estado.
Sabemos que esses mesmos elementos que pressionam para que o governo reduza ao máximo os investimentos em saúde pública, em educação pública, em assistência social, etc. somente estão dispostos a aceitar de bom grado a elevação de gastos públicos se for para dirigi-los aos setores relacionados com a segurança pública, para garantir que a ordem não seja perturbada. Se for para investir no fortalecimento das forças policiais de repressão que atuam para impedir manifestações de protesto popular, aí tudo bem. Dá para aceitar.
Dentro desta lógica, ainda que possa parecer monstruoso, desumano, indecente, canalhesco, isto faz sentido, uma vez que, para quem coloca os ganhos econômicos acima de tudo, não há aí nenhuma contradição fundamental. Se existem grupos que apoiam as atitudes do governo Bolsonaro que provocam essas mortes é porque eles lucram com elas. Ou seja, pelo menos de incoerentes eles não podem ser acusados.
No entanto, o que poderia justificar que entre os apoiadores do governo Bolsonaro uma boa porcentagem seja constituída de seguidores de igrejas que se dizem cristãs e que, além disso, sejam em sua maioria trabalhadores de poucos recursos? Como é possível que uma pessoa que esteja imbuída dos sentimentos de Jesus não se sinta indignado e angustiado com o descaso com que Bolsonaro trata a questão das mortes pela pandemia?
Será que para os seguidores de Jesus a morte de pessoas de mais idade pode ser considerada aceitável, visto que eles já não produzem e só gastam recursos do Estado? Alguém poderia imaginar Jesus lavando suas mãos diante da morte de moradores de rua, pois assim estaríamos economizando recursos públicos com seres improdutivos? Algum cristão de verdade é capaz de acreditar que para Jesus a morte evitável de tantas pessoas não seria um motivo para tristeza e preocupação?
Portanto, se você for banqueiro, grande portador de títulos públicos, alguém que viva dos rendimentos financeiros, ou coisa pelo estilo, siga adiante em seu apoio a Bolsonaro e a sua política da morte. Com isso, você vai estar sendo coerente com seus interesses econômicos. Mas, por outro lado, se você for um seguidor sincero de Jesus, alguém que valoriza a vida e o respeito aos sentimentos dos outros, então, afaste-se dessa insensibilidade humana, afaste-se desse pensamento cruel, ou seja, afaste-se dos impulsos do diabo e sinta-se solidário com aqueles que estão perdendo seus entes queridos nesta pandemia. Ajude a combater a política da morte.
* Jair de Souza é formado em economia pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.
1 comentários:
Ou dizes que a árvore é boa e seu fruto bom, ou dizes que é má e seu fruto mau. Porque é pelo fruto que se conhece a árvore. MT:12,33. Então, o cristianismo de certos evangélicos andam de mãos dadas com a hipocrisia, pois dizem que seguem o Deus da vida e na verdade cultuam o Deus da morte, o deus que vai contra a todos os ensinamentos bíblicos.
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