Por Jeferson Miola, em seu blog:
O general Paulo Sérgio de Oliveira, Comandante do Exército, além de até o momento ainda não ter punido Eduardo Pazuello pela participação ostensiva em atividade político-partidária flagrada ao vivo pela TV e mídias sociais [23/5], também autorizou a nomeação do general transgressor na Secretaria de Assuntos Estratégicos da presidência.
De acordo com o Decreto 8.798/2016, por delegação presidencial compete ao Comandante do Exército a “autorização de oficial para ser nomeado ou admitido para cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, inclusive da administração indireta”.
Isso significa que este transgressor general da ativa, ainda sem a punição que, pela gravidade, poderia ser, inclusive, a exclusão das fileiras, assumirá cargo político porque autorizado pelo seu chefe hierárquico, o general Paulo Sérgio.
Não é pública a justificativa do Comandante para autorizar a nomeação. Caso, contudo, Pazuello tenha sido nomeado à sua revelia, a única maneira de Paulo Sérgio atestar que é leal à legalidade e ao papel profissional do Exército e não a um projeto partidário, será pedindo demissão. Caso contrário, terá sido cúmplice de indevida intromissão política no Exército e do jogo de cena montado.
Ao comentar a transgressão disciplinar de Pazuello, o vice-presidente Mourão encenou, dizendo que a “regra tem de ser aplicada para evitar anarquia nas Forças Armadas”.
É por demais manjado, em que pese o costumeiro jogo de cena do Mourão e de outros agentes do partido militar, que eles próprios programam a anarquia com o objetivo de incendiar as tropas para, assim, manter permanentemente acesa a mobilização política nos quartéis e na “família militar”.
O clima de “crise militar” não passa de versão plantada eficazmente pelo partido dos generais na imprensa; é pantomima ensaiada para simular falsos conflitos no meio castrense, como se existisse um confronto entre setores legalistas e golpistas das Forças Armadas, e não um projeto de poder militar que os unifica e assegura a eles privilégios e prestígio insondáveis.
Com o simulacro de crise nos quartéis, o partido militar atribuiu a si próprio o papel de “guardião da ordem” e, assim, espertamente reforça sua posição de poder e se credencia para o exercício inaceitável de tutela sobre o pouco que ainda resta de democracia e institucionalidade no país.
A CPI da Pandemia, que já reúne fundamentos robustos para responsabilizar Bolsonaro pela carnificina e crimes contra a humanidade, não é a principal preocupação do partido militar. Para os propósitos deles, aliás, a CPI tem sido altamente funcional.
A Comissão adotou um itinerário de investigação que safa a cara deles, os reais responsáveis pela hecatombe [aqui]. A desvinculação dos comandantes militares do maior morticínio da história do país vale como um prêmio; é uma anistia pelas centenas de milhares de homicídios que teriam sido evitados, não fosse a condução irresponsável e criminosa no enfrentamento da pandemia por meio de um general da ativa do Exército brasileiro.
Ao responsabilizar Bolsonaro pelas catástrofes sanitária e humanitária, a CPI entrega ao partido militar os motivos para o descarte daquele que está se tornando inconveniente para a continuidade do projeto de poder que eles planejam seja duradouro.
A “operação descarte” não é nenhuma novidade; é regra não escrita no script original do planejamento estratégico dos generais. Com a operação descarte, o “bombeiro e racional” Mourão assume o lugar do “incendiário e incontrolável” Bolsonaro – os militares são, ao mesmo tempo e por dinâmicas paralelas, combinadas e coordenadas, [i] a causa do caos e [ii] a garantia da ordem.
O que de fato perturba o partido militar e explica o tumulto que provocam para gerar instabilidade política, é a candidatura virtualmente imbatível do Lula para 2022 e o potencial de crescimento da mobilização de massas que tomou as ruas do país no último 29 de maio, e que pode inaugurar um novo ciclo de resistência e conflitos no país.
A nomeação do transgressor Pazuello para cargo político no governo, neste sentido, deve ser entendida como provocação do partido militar com o objetivo de afrontar ainda mais o poder civil e as instituições da República neste momento em que a continuidade do projeto de poder militar se confronta com dificuldades mais complexas.
Ao partido dos generais interessa estimular o caos político, o simulacro de crise militar e a ameaça permanente de intervenção militar. Eles vieram para tumultuar, reprimir, destruir, exterminar e saquear. Mas, como exímios mestres na arte da dissimulação e da mentira, sempre vão jurar que não é “nada disso daí”.
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