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Desde a primeira vez que fui a Cuba, no distante final de julho de 1978, estive na Ilha umas trinta vezes, às vezes por poucos dias, outras por semanas.
Além de amigas e amigos, ganhei irmãos.
E sempre, desde aquela estreia em terras cubanas, tive pontos de discordância, e em algumas ocasiões fiz críticas ao que acontecia.
Jamais deixei de expor o que pensava, mas numa única situação: estando em Cuba.
Das muitas coisas que aprendi com Eduardo Galeano e me servem de guia, trago aqui a definição feita por Carlos Fonseca Amador, um dos fundadores da falecida Frente Sandinista na Nicarágua: o verdadeiro amigo é aquele que critica na frente e elogia pelas costas.
Conheci de perto períodos de bonança na Ilha, e muitos períodos de vicissitude.
E jamais, em tempo algum, deixei de ver nos olhos dos cubanos, conhecidos ou anônimos, algo que tanta falta faz na nossa América Latina: uma mistura equilibrada de dignidade e orgulho.
É, de longe, o povo mais generoso e solidário entre os tantos que conheci e frequentei e frequento.
Essa generosidade, essa solidariedade, muitas vezes ocorreram em países com claras diferenças e distância com Cuba que enfrentavam períodos difíceis.
Basta recordar a ação de médicos cubanos espalhados mundo afora, e não apenas em nações amigas.
Presenciei em várias ocasiões protestos de artistas jovens, e fiz parte de grupos de estrangeiros que mantêm com Cuba a mesma relação que eu e que buscam autoridades para levar sua preocupação ou, em algumas ocasiões, reclamação.
Foram duas as vezes em que, junto a outros escritores e artistas estrangeiros, fui levado diante do próprio Fidel Castro, que ouviu com serenidade nossas colocações e determinou providências.
Portanto, entendo o que está acontecendo.
E não esqueço em nenhum momento – algo, aliás, que ninguém de índole justa e com um mínimo de dignidade deveria esquecer – que o principal foco dos problemas enfrentados pelo povo cubano é, sim, o governo.
Mas não o de Cuba: o dos Estados Unidos da América.
Uma das mais cruéis perversidades na história contemporânea é o bloqueio imposto por Washington à Ilha. E só mesmo um povo íntegro e digno conseguiria sobreviver a essa maldade.
Washington bloqueia alimentos e remédios, impede o comércio, pune companhias navegadoras que aportam em Cuba.
Bloqueia insumos e equipamentos médicos, peças de reposição mecânica e de energia elétrica, e restrições absurdas são impostas às exportações cubanas.
É infinita a lista de prejuízos econômicos e sociais provocados pelos Estados Unidos, e isso há mais de sessenta anos.
Barack Obama prometeu reatar as relações com a Ilha e suspender o bloqueio. Balela.
Não fez nem uma coisa nem outra. Donald Trump não fez mais que apertar com rigor as medidas contra Cuba. E Joe Biden vai pelo mesmo caminho.
Sim, sim, os cubanos protestam contra a falta de alimentos, de remédios.
E a ignorância dos afoitos lança críticas à ditadura.
Estranha ditadura: o presidente Miguel Díaz-Canel foi para a rua conversar com manifestantes.
As de agora foram as manifestações mais amplas dos últimos 27 anos.
E de novo Washington quer aproveitar a tensa inquietação vivida na Ilha para apertar ainda mais o torniquete.
Só vai conseguir causar ainda mais dano ao país.
É uma perversão sem limites e sem fim.
E de novo será em vão: Cuba está viva e seguirá viva.
É uma sobrevivência heroica diante de uma política perversa e covarde alimentada e engordada por Washington.
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